Oxumaré é um Orixá complexo, suas funções são múltiplas. Na Mitologia yorubá é considerado o Orixá dos movimentos e de todos os ciclos.
Senhor da mobilidade e da atividade, é representado pela cobra e pelo arco-íris, por isso é considerado o senhor de tudo o que é alongado, como, por exemplo, o cordão umbilical.Em sua mitologia é filho mais novo e preferido de Nanã. É irmão de Omulu, Ewa e Ossain.
Representado por uma serpente que morde a própria cauda, se mostra como símbolo da continuidade e permanência. Ao mesmo tempo em que representa a movimentação e mobilidade da Terra, com seus movimentos de rotação e translação, segundo Verger, Oxumaré enrola-se em volta da terra para impedi-la de se desagregar. Se perdesse as forças, isso seria o fim do mundo. Portanto, ele controla os movimentos para que não sejam nem rápidos nem lentos demais.
Seus domínios estão nos movimentos regulares, que não podem parar, como a alternância entre chuva e sol, dia e noite, frio e calor, positivo e negativo. O arco-íris, a grande serpente colorida, representa a comunicação entre o céu e a terra, um elo entre os dois. A ligação entre o velho e o novo, entre os homens e seus antepassados é assegurada pelo cordão umbilical.
Ainda sobre Oxumaré, Verger em Orixás diz:
“Oxumaré é, ao mesmo tempo, macho e fêmea. Esta dupla natureza aparece nas cores vermelha e azul que cercam o arco-íris. Ele representa também a riqueza, um dos benefícios mais apreciados no mundo dos iorubás.”
É o Orixá da tese e da antítese. Oxumaré é então um Orixá ambíguo. Macho e fêmea, belo (arco-íris) e perigoso (serpente), céu e terra, exprime, portanto a dualidade, a união dos opostos. A vida se expressa por meio do conflito entre os opostos, estar vivo é estar em meio aos opostos, dia e noite, sofrimento e prazer, calor e frio. Podemos afirmar, então, que Oxumaré exprime a vida humana, encarnada.
Arquétipo, onde está sintetizada a duplicidade humana, seu corpo mortal e seu espírito imortal. A imagem da serpente que engole a própria cauda, enrolada ao redor do planeta pode ser comparada ao trunfo XXI do tarô, O Mundo. Neste trunfo, está representada a Ouroboros, símbolo da eternidade, dos ciclos da vida, a espiral da evolução, a dança da morte e ressurreição.
A Ouroboros está ao redor de uma figura metade macho, metade fêmea, simbolizando os opostos, o negativo e o positivo. E também aparece rodeada por quatro animais, que simbolizam os quatro elementos.
Esse trunfo, assim como Oxumaré, nos remete a um universo ordenado, em harmonia com os ciclos da vida e em consonância com o Self. É então, a totalidade, a harmonia, o equilíbrio, mas também o início de uma nova jornada, não mais centrada no ego.
Outro paralelo está na mitologia judaico-cristã, onde a serpente simboliza o mal, a queda do homem, Satanás. E no arco-íris, símbolo da aliança de Javé com o seu povo, após o dilúvio.
Oxumaré é uma imagem ideal. Como seres humanos, essa totalidade raramente é encontrada. Mas como arquétipo Oxumaré mostra a necessidade de movimento e de transformação. Ele é o movimento psíquico, a dinâmica entre o inconsciente e o consciente, a relação entre ego e Self.
Sem esse arquétipo, a vida psíquica se torna estagnada e o processo de individuação paralisado. Esse arquétipo, quando ativado na dinâmica psíquica do individuo, leva a descoberta dos opostos dentro de si. Negá-los é negar a vida. A dualidade é condição humana e aceita-la é o princípio da individuação.
E assim é a caminhada humana, sempre mudando, crescendo, sempre em movimento. Em estado de renovação, sem nunca alcançar o centro, o Self, mas sempre em direção à totalidade.
Referências:
BARCELLOS, M. C. Os orixás e a personalidade humana. Rio de Janeiro: Pallas, 2010.
JUNG, C. Os Arquétipos e o inconsciente coletivo. 2 ed. Petrópolis, RJ, Vozes 2002.
VERGER, P. F. Orixás. Círculo do Livro.