Escritores da Liberdade e as dinâmicas de grupo

“Freedom Writers”- Escritores da Liberdade, filme lançado em 2007, tendo Richard LaGravenese como diretor. O enredo retrata um cenário baseado em fatos reais, permeado pela agressividade, violência e ideais sociais. Expõe ainda o cotidiano de Gruwell (Hilary Swank), uma jovem professora com princípios igualitários no que se refere inclusão social e qualidade de ensino para todos. Instigada por esta ideologia, decidiu-se por iniciar sua carreira de docência numa escola de um bairro pobre, pois nesta instituição foi efetivado o programa de integração voluntaria.

Os alunos desta instituição vivenciam constante tensão racial, observa-se claramente a divisão por raças. Os estudos não são algo de preocupação imediata, outros âmbitos da vida requerem uma atenção preferencial. Ir à escola é uma “perda de tempo”. Gruwell, indaga a um integrante do conselho no decorrer do longa-metragem: qual é o intuito do programa de inclusão? Pois a instituição finge que ensina e os alunos fingem que aprendem. Portanto esta estratégia é apenas um paliativo, um modo para aliviar a consciência social.

No entanto, Gruwell não fica abatida com os empecilhos que surgem, a mesma lança mão de métodos diferentes de ensino-aprendizado para conseguir “ensinar seus alunos”, os mesmos, aos poucos retomam a confiança em si, vão aceitando novos conhecimentos e por meio desta nova vivência passam a reconhecer valores com tolerância e o respeito ao outro.

Ao analisar o filme “Escritores da Liberdade” compreende-se que num primeiro momento existem vários subgrupos na sala, estão atrelados a etnia dos integrantes do grupo, subdividindo-o em diversas “gangues”. Observa-se a divisão dos subgrupos no primeiro contato da professora com os alunos, os mesmos adentram a sala e agrupam-se nos seus lugares, com suas tribos.

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Zimerman e Osório (1997) salientam que os sujeitos vivem em grupos desde o nascimento, o primeiro grupo que o indivíduo faz parte é a família. A identificação com os grupos posteriores ocorre pela busca da “identidade individual e a necessidade de uma identidade grupal e social” (p. 26).

Eva, uma das personagens do longo inicia sua narrativa corroborando com a afirmativa supracitada, visto que, a identificação com o seu “povo” a faz parte do grupo e a incita a lutar pelo mesmo, e por suas convicções, por orgulho e respeito. Ver na figura paterna o líder do grupo, visto que, este é respeitado pelos demais, o mesmo a ensinou a amar o grupo.

Zimerman e Osório (1997) ao falar sobre os atributos desejáveis de um líder- coordenador do grupo apresenta alguns itens importantes, dentro quais se destacam o respeito, gostar de grupos e ser coerente. Todavia Andaló (2001) contrapõe alguns destes postulados, indaga se o mesmo, o líder- coordenador é apenas um mediador ou um super-homem.

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Eva considera o pai um herói, um super-homem, por este motivo é esquiva e hesitante para adentrar em outro grupo ou fazer algo que o desagrade.

Eva e os demais alunos são resistentes com a nova professora, não veem sentido para estarem frequentando a escola, pois acreditam serem inferiores e excluídos. Mas Mrs. Gruwell não desiste, e com o objetivo de aproximação utiliza-se de dinâmicas para demonstrar que todos têm algo em comum, passam por experiências similares, possuem gostos parecidos, portanto, são iguais.  Pouco a pouco, vai vencendo as resistências do grupo através do manejo das mesmas. Propiciou ainda, o encontro, o convívio com outros fora do subgrupo quando optou por separá-los.

Escritores da Liberdade 4Fonte: http://migre.me/vFux3

As resistências de um grupo referem-se a tudo que ocorre no grupo que dificulta atingir o objetivo, no caso do filme a aprendizagem (ZIMERMAN e OSÓRIO, 1997).  Ao se incluir no processo, descer do pedestal de professora, Mrs. Gruwell vai ganhando a confiança e começa a ser uma referência para seus alunos e desempenha o papel de coordenadora do grupo. Andaló (2001) enfatiza que o professor deve ter um diálogo com seu aluno, deve ser um mediador e não um herói, mas alguém que compreenda e o incentive ao processo de ensino-aprendizado.

Os papéis desempenhados pelos integrantes do grupo se evidenciam no filme quando a professora presenteia os discentes com cadernos que vão lhes servir como diários, quando convida os alunos para buscá-los na mesa, por uma pequena parcela de tempo se entreolham e então um deles toma coragem para tal ação.

Sabe-se que todos têm um papel no grupo, esse papel não é fixo, até mesmo quem não fala nada, interfere e participa da dinâmica grupal, pois o sujeito influencia o grupo e é por ele influenciado (ZIMERMAN e OSÓRIO, 1997). Vale ressaltar que, é possível que o papel que a pessoa assume no grupo é o mesmo que vivencia em outras áreas da sua vida, fixar-se em apenas um papel não é saudável, o ideal é que o sujeito assuma diferentes papéis.

Com a aproximação dos alunos e confiança que depositaram na docente, visto que, permitiram que a professora visualizasse o seu mundo através da leitura dos diários, este movimento eliciou a formação do grupo. Berstein (1989) postula que o grupo se caracteriza por um conjunto limitado de indivíduos, em prol da realização de uma tarefa-objetivo, atrelados por pelo tempo e espaço, de forma interdependente.

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Bastos (2010) cita que para Pichon-Rivière o grupo:

Apresenta-se como instrumento de transformação da realidade, e seus integrantes passam a estabelecer relações grupais que vão se constituindo, na medida em que começam a partilhar objetivos comuns, a ter uma participação criativa e crítica e a poder perceber como interagem e se vinculam (p. 164).

No longa metragem o grupo nasce do encontro da professora com os alunos, o espaço que dividem é a sala de aula, no qual a líder é a Mrs. Gruwell. Na perspectiva de Zimerman e Osório (1997) a mestra desempenha o papel de coordenador ativo, uma vez que, ela administra e elabora as dinâmicas, mas, vale ressaltar que, a mesma é flexível, observa-se tal postura no momento em que seus alunos concebem a ideia de convidar a mulher que abrigou Anne Frank, ela os apoia, dar-lhes o incentivo e corrobora para que o objetivo seja alcançado.

Verifica-se no momento supracitado a dinâmica grupal, a interação entre seus componentes, pois trabalham em equipe para obtenção da verba para que consigam conhecer Miep Gies, mulher que abrigou Anne.

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A oportunidade de vivenciar novas experiências, conhecer novos lugares, adquirir mais conhecimento e integra-se no grupo de colegas de sala fomentou a quebra de preconceitos, de etnocentrismo e oportunizou aceitar o outro através da identificação com esse (ZIMERMAN e OSÓRIO, 1997). Mailhiot (1991) enfatiza que o grupo propicia transformações relevantes nos integrantes através das múltiplas interações que o sujeito experiência em âmbito social, isto caracteriza o clima grupal.

Ao decorrer do filme os alunos se apropriam do espaço da sala, o grupo passa a ser família, e professora consegue o respeito e admiração. Nesse novo cenário mudanças são perceptíveis, os discentes adotam novas posturas, e quebram com o instituído. A exemplo nota-se a conduta de Eva que desobedeceu às regras do seu antigo grupo para fazer o “certo”. Bastos (2010) assegura que objetivo originário do grupo operativo é a mudança, na qual os componentes dos grupos passam a assumir outros papéis diferentes do habitual.


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Os outros discentes mudam ao decorrer do longa, buscam nova forma de ser e estar, passaram a valorizar os estudos e ansiavam por novas conquistas. O trabalho da Mrs. Gruwell é apreciado pelo conselho, no entanto, outro conflito surge, ela não tem licença para ministrar aula nas turmas avançadas (3 e 4 anos), sendo assim, é eminente o termino do grupo. Porém os estudantes não comungam de tal decisão, por isto, se juntam e buscam sensibilizar o conselho através de várias ações para que então a professora possa lecionar nas turmas posteriores.

Zimerman e Osório (1997) salientam que o grupo pode ser aberto ou fechado, sendo o grupo aberto quando o sujeito sai e o grupo acaba apenas para ele, no fechado o grupo termina pelo tempo, o tempo de duração já foi previamente discutido na etapa de planejamento. No que se refere ao filme o grupo é fechado, pois os alunos vão para a turma avançada, a professora fica e um novo grupo será formado, ou seja, o tempo de duração do grupo é baseado no calendário letivo. Mas, no mesmo tempo o grupo é aberto, visto que, se um aluno desistir do ano letivo as aulas continuarão sem ele.

O objetivo acima citado é alcançado, a professora consegue continuar no grupo, e no final do filme, fica subentendido que a mesma os acompanha até a faculdade, uma vez que, ela passa dar aulas na Universidade. Por meio do filme “Escritores da Liberdade” pode-se analisar a dinâmica grupal. Pode-se observar a formação de um grupo, compreendo como se deu a integração dos seus membros e as potencialidades de mudanças que o grupo fomenta no indivíduo, uma vez que, o grupo é propagador de mudanças, influência o sujeito, e este é também é influenciado.

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O grupo eliciado no longa metragem serviu como facilitador na busca por conhecimento, e foi relevante na quebra de velhos estigmas, preconceito e discriminação. Mesmo o grupo não tendo mudando o cenário de violência e agressividade que os seus intrigantes fazem parte, conseguiu operar mudanças significativas no jeito de ser e de viver dos mesmos. Por fim, a mudança percebida no filme foi em âmbito micro, mas para atingir em proporção macro, a transformação perpassa essencialmente pela esfera micro.

REFERÊNCIAS:

ANDALÓ, C. S. A. O papel de coordenador de grupos. Psicol. USP vol.12 no.1 São Paulo,  2001.

BASTOS, A. B. B. I.  A técnica de grupos-operativos à luz de Pichon-Rivière e Henri Wallon. Psicólogo inFormação ano 14, n, 14 jan./dez. 2010.

BERSTEIN [et.al.]. Compêndio de psicoterapia de grupo/ Harold I. Kaplan e Benjamin J. Sadock … [ET.al.]; trad. José Octávio de Aguiar Abreu e Dayse Batista. 3.ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

EYGO, H. O Clube dos Cinco – sobre grupos em Kurt Lewin. Disponível em:< http://ulbra-to.br/encena/2013/12/27/O-Clube-dos-Cinco-sobre-grupos-em-Kurt-Lewin>. Acesso em: 11 de novembro de 2015.

MAILHIOT, G. B. Dinâmica e Gênese dos Grupos. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1991.

ZIMERMAN, D; OSÓRIO, L.C. & Colaboradores. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

Escritores da Liberdade cartaz

ESCRITORES DA LIBERDADE

Direção: Richard LaGravenese
Elenco: Anh Tuan Nguyen, Blake Hightower, David Goldsmith, Deance Wyatt
Ano: 2007
País: EUA
Classificação: 12