Os Transtornos de Ansiedade são um interesse para muitas áreas da psicologia, em especial durante a gestação, que é um período crítico para a mulher no que tange aos aspectos biológicos, físicos e psicológicos, que passam por inúmeras mudanças. Aumentando ainda mais esse anseio, está o fato da gestação consistir na origem do desenvolvimento do ser humano. Apesar das várias condições sociais, econômicas e religiosas entre gestantes do mundo todo, bem como o papel da mulher no meio onde vive, a gestação deve transcorrer da melhor maneira possível, fato que pode ser prejudicado pelo adoecimento psicológico (FREGONESE, 2014).
O conceito de ligação mãe-bebê como não sendo apenas biológico é relativamente recente. Com o surgimento da psicologia como ciência, e o concomitante desmembramento de suas áreas, inferiu-se a correlação entre a saúde psicológica e biológica do indivíduo, portanto, quando as doenças psicológicas acometem o indivíduo, sua saúde mental também influencia a saúde física. Essa contingência, continua durante a gravidez, sendo agravada pelo fato de haver um indivíduo ligado à gestante ansiosa, totalmente depende dela no aspecto desenvolvimental (FREGONESE, 2014).
A ansiedade patológica consiste em uma experiência que ocupa um papel funcional na interação humana com o meio ambiente, podendo ocorrer também como sintoma de várias doenças, como distúrbio psiquiátrico ou sob a forma de “stress”. O conceito de ansiedade patológica é, portanto, diferente do sentimento de ansiedade (CASTILLO et al., 2000). Segundo Cury (2013) a ansiedade causada pela Síndrome do Pensamento Acelerado deve ser considerada o mal do século, atribuindo à sociedade moderna a responsabilidade por uma alteração no ritmo de construção dos pensamentos, gerando consequências para a saúde psicológica.
Ansiedade é um sentimento repulsivo de medo, angústia, que caracterizado por tensão ou inquietude proveniente de antecipação de perigo, de algo desconhecido ou estranho, passando a ser considerado patológico quando é desproporcional em relação a sua causa ou estímulo, ou qualitativamente divergente do que se espera como norma da faixa etária do indivíduo, passando a interferir na qualidade de vida, conforto emocional ou o desempenho diário (CASTILLO et al., 2000).
Todos os Transtornos de Ansiedade têm como principal manifestação um alto nível de ansiedade. O Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (1994), IV Revisão (DSM-IV), classifica como transtornos de ansiedade: Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), Transtorno do Pânico, Fobia Social (FS), Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOC), Fobias Específicas e Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT).
Vinculação biopsicológica entre o bebê e a mãe ansiosa
Desde a fase embrionária, a gestante se encontra ligada biologicamente ao pequeno ser sendo gestado dentro dela. A mulher defronta-se no processo de mudança para a parentalidade, com tarefas condicionantes para sua adaptação à situação, sendo a ligação com o feto uma delas. Na vinculação pré-natal, que ocorre a partir do início da gravidez, a gestante se imagina progressivamente no papel de mãe assim como idealiza uma imagem e representação cognitiva do bebê (SAMORINHA; FIGUEIREDO; MATOS, 2009).
A gravidez representa um período de grande sensibilidade no ciclo vital feminino, envolvendo grandes transformações fisiológicas, psíquicas e do papel familiar e social da mulher, como apontam Correia e Linhares (2007), tais mudanças podem servir de catalisadoras para um quadro de instabilidade emocional da gestante, seja no desenvolvimento de uma desordem patológica ou com o agravamento ou manifestação de uma desordem que já pré-existe. A exposição do bebê à psicopatologia da mãe, em casos de transtorno de ansiedade, no período pré-natal pode causar efeitos nocivos à sua saúde e desenvolvimento (CORREIA; LINHARES, 2007).
Entende-se por gestação o desenvolvimento desde a concepção até o nascimento. A fecundação é a união de um espermatozóide com um óvulo, formando assim um ovo que inicia o processo de multiplicação celular. O ovo se dirige ao útero, em busca de um lugar para se fixar, com circulação sanguínea capaz de oferecer oxigenação e alimentação, sendo formado então um novo tecido, a placenta, que é responsável pela fixação do ovo à parede do útero (MALDONADO; DICKSTEIN; NAHOUM, 2000).
Durante a gravidez, o organismo feminino produz hormônios sexuais e não-sexuais pela placenta, o que pode trazer mudanças orgânicas e comportamentais significativas, não condizentes com os comportamentos habituais. Verificando os sintomas comuns no primeiro trimestre, muitas vezes, devido à delicadeza da situação a gestante poderá passar por mudanças de comportamento (BAPTISTA; BAPTISTA; TORRES, 2006).
Nesse sentido, Fregonese (2014, p. 18) afirma que “durante a gestação os níveis de estrógeno e progesterona são superiores àqueles vistos nas mulheres fora do período gestacional e esse fator pode estar envolvido nas alterações de humor que ocorrem nessa fase”, salientando a influência do aumento dos níveis hormonais na gestante, portanto aumentando a possibilidade de instabilidade psicológica.
A gestante está exposta a preocupações como: alterações corporais que podem ser permanentes, modificações permanentes de personalidade, com a aproximação do parto, cirurgia, dores, medo de morrer, e mudanças na sua rotina de vida diária após o nascimento do bebê (BAPTISTA; BAPTISTA; TORRES, 2006). Essas preocupações são esperadas e recorrentes, porém podem propiciar o início da ansiedade patológica.
No contexto histórico, Fregonese (2014) afirma que nunca foi dada a atenção devida à saúde mental da gestante pelos profissionais da área, atribuindo o fato à crença popular de que a gravidez é um período de bem-estar e satisfação para a mulher, tendo baixa propensão para doenças psiquiátricas. “A prevalência de transtornos de humor e ansiosos são maiores no período gestacional em relação ao período pós-parto, com isso a gravidez não protege as mulheres do adoecimento mental” (FREGONESE, 2014, p. 16).
Complicações desenvolvimentais e obstétricas relacionadas à ansiedade e efeitos em indivíduos gestados por mulheres ansiosas
Perante o contexto de desequilíbrio psicológico, a mulher em período pré-natal apresenta com maior intensidade os sintomas ansiosos. Diversos estudos buscaram compreender as implicações da ansiedade no desenvolvimento pré-natal e nas complicações obstétricas. Conforme Fregonese (2014):
As mulheres diagnosticadas com desordem de ansiedade pré-natal apresentaram maior probabilidade de complicações obstétricas durante a gravidez. Por sua vez, as complicações atuaram como estressores crônicos durante a gestação. A ansiedade materna foi considerada como fator de risco ao desenvolvimento normal do feto. Fetos de mães com alto nível de ansiedade apresentaram altas taxas de batimentos cardíacos quando comparados aos fetos de mães com baixo nível de ansiedade. Desse modo, a ansiedade materna pré-natal contribui na predição de problemas comportamentais e emocionais em crianças avaliadas aos quatro anos de idade. (FREGONESE, 2014, p. 17)
Mães que apresentaram ansiedade tiveram também, filhos com maior probabilidade para desenvolver depressão e transtornos de comportamento na adolescência (FREGONESE, 2014). Analisando apenas bebês nascidos a termo, entende-se que os níveis desenvolvimentais do bebê se apresentam inversamente proporcionais aos níveis de ansiedade materna.
Portanto, acredita-se que a situação psicológica da mãe, com a saúde mental fragilizada pelos efeitos de transtornos de ansiedade, influencie negativamente o bebê, que durante o período pré-natal encontra-se dependente da mãe para qualquer ação no sentido desenvolvimental, passando por vários momentos críticos nessas fases delicadas, que podem ser afetadas.
REFERÊNCIAS:
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4. ed. Washington, 1994.
BAPTISTA, Makilim Nunes; BAPTISTA, Said Daher; TORRES, Erika Cristina Rodrigues. Associação entre suporte social, depressão e ansiedade em gestantes. Revista de Psicologia da Vetor Editora, v. 7, n. 1, p. 39-48, Jan. 2006. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psic/v7n1/v7n1a06.pdf>. Acesso em 31 de mai. 2016.
CASTILLO, Ana Regina G.L; RECONDO, Rogéria; ASBAHR, Fernando R; MANFRO, Gisele G. Transtornos de ansiedade. Revista Brasileira de Psiquiatria, Rio de Janeiro, v.22, n. 2, p. 20-23, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbp/v22s2/3791.pdf>. Acesso em 31 de mai. 2016.
CORREIA, Luciana Leonetti; LINHARES, Maria Beatriz Martins. Ansiedade materna nos períodos pré e pós-natal: Revisão da literatura. Revista Latino-Americana de Enfermagem, São Paulo, v. 15, jul. 2007. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rlae/v15n4/pt_v15n4a24.pdf>. Acesso em 27 de mai. 2016.
CURY, Augusto. Ansiedade– Como enfrentar o mal do século. São Paulo: Saraiva, 2013.
FREGONESE, Adriana Aparecida. Gestantes de Alto Risco com e sem histórico de óbito fetal ou neonatal: sintomas de ansiedade e depressão, capacidade para o relacionamento com o feto e estratégias de enfrentamento. São Paulo: Biblioteca Central da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, 2014.
MALDONADO, M. T; DICKSTEIN, J; NAHOUM, J.C. Nós estamos grávidos. São Paulo: Saraiva, 2000.
SAMORINHA, Catarina. FIGUEIREDO, Bárbara. MATOS, José Cruz. Vinculção pré-natal e ansiedade em mães e pais: Impacto da ecografia do 1º trimestre de gestação. Psicologia, Saúde & Doenças, Lisboa, v. 10, n. 1, p. 17-29, 2009. Disponível em: <http://www.redalyc.org/pdf/362/36219059002.pdf>. Acesso em 27 de mai. 2016.