Documentário “Carne e Osso” relata o adoecimento do trabalhador

O documentário “Carne e Osso”, dirigido por Caio Cavechini e Carlos Juliano Barros, associa imagens impactantes e depoimentos de funcionários que trabalham ou trabalharam nos frigoríficos brasileiros de abates de aves, bovinos e suínos. Diante disso, esse filme evidencia várias problemáticas do trabalho contemporâneo que podem ser discutidas.

De acordo com Antunes (2014), a indústria avícola é uma organização de trabalho praticamente taylorista e fordista; assim, de acordo com Ribeiro (2015), taylorismo pontua métodos padronizados de execução que deveriam otimizar a relação entre tempo e movimento.

 Quanto ao fordismo, para Ribeiro (2015), a implantação da esteira rolante trouxe a automatização e a mecanização do processo de trabalho. De tal modo, essa ferramenta se fundamenta como um meio de monitorar o ritmo do trabalho de forma automatizada e intensa.

 Assim, o documentário mostra essa organização Taylorista e fordista,  bem no início do filme, o funcionário desossa o frango e há um silêncio, depois inicia a música, dando uma sensação de rapidez para o telespectador, e, ao mesmo tempo, surge a esteira; depois aparecem as vozes dos trabalhadores com pontuações referentes ao sofrimento em todos os sentidos no trabalho. E a música começa a ter um ritmo mais rápido, enquanto há uma  visualização ampliada do contexto do ambiente; uma vez que mostra a mecanização, o ritmo por meio dos movimentos rápidos dos funcionários ao desossarem os animais.

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=4RUPJZYroeQ

 Diante do supracitado, ocasiona um aspecto no contexto do trabalho bastante cansativo para os trabalhadores. Assim, no decorrer do documentário, compreende-se esse sofrimento mental dos trabalhadores pelos relatos deles; uma vez que afeta o espectador ao ver como essas agroindústrias exploram o ser humano de tal modo, que essa situação acarreta consequências drásticas em vários contextos na vida do trabalhador, seja social, psicológica e física.

 Essa intensificação da produtividade na jornada de trabalho, pode ser compreendida em vários trechos do documentário, como um dos relatos de uma ex-funcionária: “Há trabalhadores que fazem até 18 movimentos com uma faca para desossar uma peça de coxa e sobrecoxa, em apenas 15 segundos”.

 Outro trecho mostra a mesma situação a partir do relato de outra ex-funcionária: “A gente começou desossar três coxas e meia e cada vez eles exijam mais. Até chegar desossar 7 coxas por minuto”. Em outro trecho do documentário: “Assim, o ritmo do seu trabalho vai diminuído, porque você está mais cansado, vai surgindo alguns problemas, estava me sentindo mal lá dentro. Tinha dia que chegava na empresa e me arrependia porque tinha ido. Muitas vezes trabalhávamos sobre a pressão do encarregado, às vezes estávamos fazendo o possível, e ele queria mais.”

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=4RUPJZYroeQ

 Esses trechos do documentário supracitado vão ao encontro das teses de Dal Rosso apud Costa (2008), para quem a intensificação adquire uma grande quantidade e/ou uma qualidade dos resultados do trabalho com igual perda de energia; uma vez que, no decorrer do tempo, o crescimento do expediente do trabalho gera mais efeitos com maior perda de energia devido a extensão da jornada.

Esse dispêndio de energia pode ser analisado no documentário pela fala do Desembargador Sebastião, este aponta que o volume de transtornos mentais, doenças neurológicas e doenças em geral tem aumentado bastante, especialmente por essa produtividade acelerada.

Esse contexto de certos frigoríficos coaduna com o texto de Burns (2016), ele aponta que os trabalhadores estão dopados e o mercado obrigando o indivíduo a se submeter a uma velocidade que não existe, de tal modo, que o corpo é um obstáculo, pois ele não suporta muita pressão, dessa forma, o corpo adoece, entra em pânico, deprime, fica ansioso. 

Por fim, o documentário “Carne e Osso” mostra a exploração de certos frigoríficos sobre os trabalhadores, como muitos funcionários foram demitidos quando já estavam adoecidos psicologicamente, fisicamente e neurologicamente.

REFERÊNCIAS

ANTUNES, R. Desenhado a nova morfologia do trabalho no Brasil. Estudos Avançados, 2014.

BRUM, E. Exaustos-e-correndo-e-dopados: Na sociedade do desempenho, conseguimos a façanha de abrigar o senhor e o escravo no mesmo corpo. El pais, Brasil,2016.

COSTA, J. Mais trabalho! A intensificação do labor na sociedade contemporâneo. São Paulo: Boitempo Editorial, 2008.

RIBEIRO, A. Taylorismo, Fordismo, Toyotismo. Lutas Sociais. São Paulo, 2015.