Em “Mundo do trabalho: Construção histórica e desafios contemporâneos”, Livia de O. B. e Oswaldo H. Y. apresentam “a complexidade e o dinamismo do que se pensa sobre o trabalho, as diferentes concepções sobre o trabalho, as condições históricas em que surgiram, as influências dessas concepções nas relações de poder e na atualidade”. Inicia-se fazendo uma relação do mito de Sísifo com o trabalho inútil e desesperançoso, questionando se há realmente a necessidade de se pensar no trabalho como tortura.
A frase “primeiro o trabalho, depois o prazer”, ao mesmo tempo que coloca o trabalho como prioridade, coloca-o oposto ao prazer. Mas, mesmo com algumas reclamações em relação ao trabalho, o ser humano continua a executá-lo, “ora para garantir a subsistência, ora para ir muito além dela” (BORGES; YAMAMOTO, 2014). Segundo os autores:
O conceito do trabalho passou a ocupar um lugar privilegiado no espaço da reflexão teórica nos dois últimos séculos. Apesar disso, podemos falar de trabalho humano desde os primórdios da humanidade, sendo exemplos, as comunidades de caçadores e coletores 8.000 anos a.C., a incipiente agricultura no Oriente Médio, na China, na Índia e no norte da África, o trabalho escravo nas civilizações antigas e a relação servil na Idade Média […] (BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 26)
Os filósofos clássicos exaltavam a ociosidade, enquanto referiam-se ao trabalho como degradante, inferior e desgastante. O trabalho era reduzido ao esforço físico, braçal e manual dos escravos, por isso tal concepção. Entretanto, na Idade Média, essa concepção passa a se tornar inadequada, devido ao surgimento do capitalismo, que reflete mudanças concretas na organização do trabalho e na sociedade, interessando ao capitalista ampliar a mais-valia (capital).
O trabalho se transforma em mercadoria, valendo tanto quanto os rendimentos do detentor do capital, o que contradizia os objetivos do regime capitalista de se buscar máxima lucratividade. Para mudar isso, ocorreram grandes transformações na vida dos operários e da sociedade. Esses operários tiveram que se adaptar a nova realidade, o que não era fácil, gerando desgostos e, por consequência, má produtividade. Para resolver isso, o regime capitalista se utilizou do discurso teórico do Protestantismo, que pregava o trabalho como um chamado de Deus e como um meio para ser merecedor da graça divina.
Marx e Smith falam sobre os trabalhos produtivo e improdutivo. O primeiro apenas diferencia-os, enquanto o segundo faz um julgamento de valor, colocando o produtivo como mais importante, pois valoriza a mais-valia e sugerindo que o improdutivo deve ser reduzido ao seu mínimo, pois só gera custos para a sociedade. De acordo com os autores:
Para Marx, o trabalho, que deveria ser humanizador, sob o capitalismo, é o contrário, pois na forma de mercadoria é: alienante […]; explorador […]; humilhante […]; monótono […]; discriminante […] embrutecedor […]; submisso […]. Observamos que a obra marxiana não se constitui em uma mera crítica ao trabalho sob o capitalismo, mas cria valores e novas expectativas em torno do trabalho (BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 30).
Entre o final do século XIX e início do século XX surge o Taylorismo, construção da administração científica (complementadas por Fayol). “Taylor define como objetivo principal dos sistemas em administração, assegurar o máximo de prosperidade ao patrão e, ao mesmo tempo, o máximo de prosperidade ao empregado” (BORGES; YAMAMOTO, 2014). Na mesma perspectiva integrativa, surge movimento conhecido como Fordismo. “Suas contribuições consistiram em inovações tecnológicas (mecanização) e econômicas (produção em massa afetando as normas de consumo e de vida), tendo desdobramento tanto na organização do trabalho quanto na gestão de pessoal.” (LEIA; NEFFA apud BORGES; YAMAMOTO, 2014).
Surge a revolução keynesiana, que “conduz a análise do mercado de trabalho a um plano macroeconômico […] Keynes pressupôs uma concepção mais complexa do próprio trabalho […] Elucidou a inter-relação entre público e privado, passando a ter em conta sua interdependência” (BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 41). Conseguinte, surge o Estado de Bem-estar, que “inaugura uma nova visão de progresso associado à ideia de bem-estar social. Ocorre um distanciamento da noção clássica do sucesso como consequência do trabalho duro”(BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 43). Esse modelo não foi aplicado em todo o mundo nem em todos os setores econômicos.
Aparecem duas novas concepções sobre o trabalho. A primeira considera impossível a superação da alienação no trabalho, pois
Esse distanciamento do indivíduo do que ele faz e do resultado do que faz, ao lado de outros aspectos da contemporaneidade, como o incentivo ao consumo, impede-o, por sua vez, de se reconhecer como membro de um coletivo e, ao mesmo tempo, incapacita-o de ser sujeito do exercício do poder (GORZ apud BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 59).
A segunda alude ao laço social, que
[…] interpreta as transformações, envolvendo os modos de produção e gestão do trabalho, em várias implicações para o sujeito trabalhador e para a organização da sociedade. Uma delas seria a dualização da sociedade, em que uma parte tem acesso a trabalhos enquanto outro segmento (periferia) vivencia a exclusão social […]. Outra é ampliar as possibilidades do trabalhador de desenvolver um trabalho prenhe de sentido, especialmente apoiado na contribuição social (BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 61).
E assim se deram as grandes e variadas transformações sobre o trabalho. Fato é que ele sempre existiu, mudando a concepção de acordo com cada época. São nítidas as contribuições de cada autor citado, pois todos fizeram história e participaram do processo de consolidação do trabalho como busca de crescimento do homem.
REFERÊNCIAS:
BORGES, L. de O.; YAMAMOTO, O. H. Mundo do trabalho: Construção histórica e desafios contemporâneos. Psicologia, organizações e trabalho no Brasil, v. 2, p. 25-72, 2014. Disponível em: <http://www.larpsi.com.br/media/mconnect_uploadfiles/c/a/cap_01989.pdf>. Acesso em 13 dez 2016.