John Stuart Mill – O indivíduo é soberano sobre seu próprio corpo e mente

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 Nascido em Londres, em oito de maio de 1806, John Stuart Mill estudou filosofia e economia e até hoje é considerado um pensador de grande renome do cenário do liberalismo e utilitarismo. Seu pai era o historiador e filósofo James Mill, o qual foi um dos fundadores do liberalismo na Inglaterra e tinha como intuito, emergir seu filho em estudos voltados ao utilitarismo para compor uma escola e repassar ensinamentos para as próximas gerações. Para assegurar a formação intelectual de John Stuart Mill, James Mill contou com o auxilio do amigo Jeremy Benthan (SIMÕES, 2008).

Simões (2008) traz que desde o inicio de sua infância, Mill começara a estudar grego, latim e aos doze anos tinha estudado grandes obras do Classicismo:

Desde sua infância, John Stuart Mill recebe uma formação compatível com uma carreira de pensador radical e subversivo: com a idade de três anos aprendeu o grego; aos oito já tinha lido, no original, Ciropédia, de Heródoto, As memórias de Sócrates, de Xenofonte, algumas vidas de filósofos escritas por Diógenes Laércio, parte de Luciano e o discurso pra Demonicoe O discurso a Nícoles, ambos de Isócrates, seis diálogos de Platão, entre outros. Nesse mesmo período começa a aprender latim (SIMÕES, 2008, p. 8).

Com o passar dos anos, Stuart Mill voltou-se ao estudo da história, filosofia, psicologia e lógica. Sua maturidade intelectual ultrapassava sua idade, fazendo com que já aos quinze anos se responsabilizasse a revisar algumas publicações de Jeremy Benthan. Posteriormente, elaborou artigos e começou a trabalhar, junto ao pai, nos escritórios da Companhia das Índias Orientais. Dessa forma, conseguiu unir estabilidade financeira e aprofundamento em seus estudos (SIMÕES, 2008).

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Boa parte dos escritos de Stuart Mill consiste em resenhas e arti­gos publicados em periódicos. Sua primeira obra, Lógica, tornou-se pública em 1843, alcançando grande popularidade, dentro e fora de debates intelectuais. Cinco anos mais tarde, em 1848, Mill publicou Princípios de economia política. Em seguida publica outras obras impor­tantes, como Sobre a liberdade (1859), Considerações sobre o governo representativo (1861), Utilitarismo (1863) e Sujeição das mulheres (1869). Os 67 anos vividos por Mill foi permeado por mudanças de grande importância no âmbito político, econômico e social de seu país. Tais mudanças tiveram como ponto de partida a Revolução Industrial, no século XVIII, o que estimulou o estudioso a enquadrar e responder os processos do movimento operário inglês (SIMÕES, 2008).

Com o grande interesse pelos aspectos políticos da época e com a popularidade conquistada por meio de suas obras, Mill engajou-se diretamente na carreira política e em 1865 foi eleito como representante por Westminster para o Parlamento. Contudo, sua atuação política não durou muito tempo, não sendo reeleito em 1868. Após sua derrota, Mill mudou-se para Avignon, na França, onde veio a falecer em dezesseis de maio de 1873.

Feito esta breve contextualização da vida e obra do autor supracitado, segue, portanto, considerações acerca de suas principais contribuições teóricas e práticas.

Principais conceituações

Mill escreve sobre a liberdade abordando se o ser humano é realmente livre e até que ponto a sociedade limita essa liberdade. Segundo ele, esse tema não é abstrato ou ligado à liberdade do querer, ela é vista no sentido social. (PAULA, 2007). Em uma de suas obras, Sobre a liberdade, escreve:

O assunto deste ensaio não é a chamada liberdade do querer, tão infortunadamente oposta à doutrina mal denominada “da necessidade filosófica”; e sim a liberdade civil ou social: a natureza e os limites do poder que a sociedade legitimamente exerça sobre o indivíduo. Uma questão raramente exposta, e quase nunca discutida, em tese, mas que influencia profundamente as controvérsias políticas da época, pela sua presença latente, e na qual talvez se reconheça a questão vital do futuro. Está tão longe de ser nova que, num certo sentido, tem dividido a humanidade desde, quase, as mais remotas idades. Mas no estágio de progresso em que as porções mais civilizadas da espécie entraram agora, ela se apresenta sob novas condições e requer um tratamento diferente e mais profundo. (MILL, 1991, p. 45)

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 Em sua visão, a liberdade está sempre voltada para questões de cidadania. A sociedade deve sempre se manifestar e se representar junto ao governo. Defende ainda uma democracia participativa e ampla. (PAULA, 2007).

Mill, ao tratar sobre liberdade individual, distingue duas coisas: a liberdade do indivíduo sobre si mesmo e o limite dessa liberdade em sociedade. Para que essa liberdade seja total sobre si mesmo, Mill estabeleceu três princípios: a consciência deve ser livre, ou seja, ele deve ter total soberania sobre si e nenhum domínio deve interferir na sua maneira de pensar; o indivíduo deve ter liberdade para ser diferente dos demais, cultivando aí a importância da livre opinião e da individualidade; deve existir liberdade de associação na sociedade, ou seja, a sociedade deve ser livre para tomar posicionamentos em conjunto. (PAULA, 2007).

Diante disto, torna-se observável que para Mill, “o ser humano só pode atuar conscientemente na sociedade na medida em que ele é soberano sobre si mesmo. Não existe maturidade individual ou política quando a soberania do indivíduo não é exercida.” (PAULA, 2007, p. 76).

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Sobre o outro aspecto que Mill colocou, de que o ser humano é limitado pela sociedade, ele fala que esse limite não é o fim da liberdade do homem e nem o total arbítrio da sociedade sobre o indivíduo, e sim que:

A única parte da conduta por que alguém responde perante a sociedade é a que concerne aos outros. Na parte que diz respeito unicamente a ele próprio, a sua independência é, de direito, absoluta. Sobre si mesmo, sobre o seu próprio corpo e espírito, o indivíduo é soberano. (MILL,1991, p. 53)

 Em outras palavras, o homem é livre até o ponto que não cause danos ao próximo. Todo indivíduo deve respeitar essa regra básica de convivência, sem ela, a vida em sociedade é impossível. (PAULA, 2007).

Mill, diferencia ainda a soberania sobre si mesmo e a limitação da ação do indivíduo em sociedade. Cada indivíduo deve ser responsável por seus próprios atos e ter consciência destes, para que realmente possa existir a participação do indivíduo na sociedade. A vida em sociedade só é possível se as diversas individualidades se respeitam e não entram em choque. (PAULA, 2007).

 

Individualidade e Utilidade.

De acordo com as argumentações de cunho moral e político de Mill, se fundamentam a liberdade de pensamento, expressão e liberdade de agir. Sendo relevante o agir e as opiniões distintas indispensáveis para o desenvolvimento humano (VITORINO, 2011).

A individualidade se refere a uma liberdade que não atinge os direitos e interesses dos outros, pois cada indivíduo é diferente, e é importante conhecer a diversidade assim como entender as condições diversas para que as pessoas se desenvolvam. Nesse contexto, a individualidade é influenciada pelos valores que a sociedade impõe, ou seja, uma forma de vida condizente com a maioria (VITORINO, 2011).

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De acordo com Vitorino (2011) Mill determina o princípio da utilidade ou da maior felicidade, sendo certas quando promove a felicidade e errada quando é o oposto da felicidade. Vitorino (2011) sintetiza sobre a “utilidade”:

Diferente de como ocorre em outras formas de liberalismo, o fundamento de legitimação do governo Mill não reside na teoria dos direitos naturais ou do contrato social. As formas de governo são avaliadas de acordo com a capacidade que têm de permitir que cada pessoa desenvolva suas próprias capacidades em busca de uma maior felicidade. A esse critério de julgamento ele nomeia “utilidade” (VITORINO, 2011, p.04).

 Livre expressão para o alcance da felicidade

De acordo com Burnham e Buckingham (2011), Mill foi influenciado por Jeremy Bethan e por David Hume nos aspectos do utilitarismo e do empirismo, embora aquele tenha se mostrado menos radical que estes dois.

Ainda de acordo com Burnham e Buckingham (2011), Mill impressionou-se com o seguinte pensamento de Bentham: “máxima felicidade possível para o máximo possível de pessoas” (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 192) e fez analogia com os princípios de Jesus de Nazaré, que preconizavam o desejo do bem ao próximo como o bem ao “si próprio”.

Mill era um intelectual para além da teoria, pois apesar de concordar com Benthan, ele se preocupava com a aplicação desse cálculo de felicidade para a vida das pessoas, no qual se utilizaria dos meios políticos para tal (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 192).

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Concluiu que para que isso fosse possível, a sociedade deveria permitir que o cidadão pudesse ir em busca de sua felicidade e que o governo deveria possibilitar os meios necessários. Cabe elucidar, também, que Will acreditava que essa busca era válida até certo ponto, pois caso a liberdade de outra pessoa fosse afetada, logo, encerra-se o direito de quem afetasse tal pessoa, sendo este o “princípio do dano”( BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 192).

Nesse sentido, Mill buscou estudar as variáveis que medissem a felicidade, ao contrário de Betham, que pregou a sua quantificação (duração e intensidade), defendeu que ela deveria, também, ser analisada pela qualidade do prazer sentido/vivido (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011). O referido autor, compreende, assim, a essência do prazer como primordial na “equação da felicidade”, destacando que a os prazeres advindos da inteligência são mais significativos que os básicos, fisicamente falando (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 192 – 193).

Cumpre delinear, o interesse de Mill em descobrir as motivações para esta tão almejada felicidade. Desse modo, elucidou dois diferentes desejos para o alcance do prazer, tais como, desejos imotivados e ações conscienciosas. O primeiro, respectivamente, refere-se aos desejos que vislumbram o prazer imediato, já o segundo remete aos comportamentos que são realizados pelo senso de dever, os quais trazem o prazer como consequência, ou seja, o sujeito sente tais ações como o caminho à felicidade (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011).

Idea de ser felizFonte: http://www.besame.cr/2016/una-mejor-manera-de-vivir-lo-que-queremos-de-verdad-76186.html

Burnham e Buckingham (2011) reforçam que Mill, nos seus escritos, sempre pregou a aplicação prática da liberdade legal. Para tanto, utilizou os preceitos básicos do utilitarismo, argumentando que os indivíduos deveriam exercer a liberdade de expressão, como força motriz, para o alcance de seus objetivos pessoais e sociais. Como exemplo, “foi o primeiro parlamentar britânico a propor o voto feminino como parte das reformas de governo” (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 193).

Dessa forma, pode-se dizer que John Stuart Mill colocava o sujeito como centro de seus pressupostos utilitários, ao passo que defende a independência do mesmo sobre seu corpo e mente, logo, sendo livre para agir e pensar como quiser, sem, assim, a intervenção de terceiros (sociedade e estado) (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011). Nesse ínterim, Burnham e Buckingham (2011) sintetizam dizendo que Mill,

[…] acreditava que, se a sociedade deixasse o indivíduo viver da forma que o fizesse feliz, isso lhe permitiria atingir todo seu potencial. O que beneficiaria toda a sociedade, já que as realizações dos talentos isolados contribuem para o bem geral (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 193).

menina-livre-para-voarFonte: http://amenteemaravilhosa.com.br/amo-minha-liberdade-deixo-livres-pessoas/

REFERÊNCIAS

BURNHAM, Douglas; BUCKINGHAM, Will. Sobre seu próprio corpo e mente, o indivíduo é soberano. In: Livro de Filosofia. São Paulo: Globo Editora, 2011. p. 190-193.

MILL, John Stuart. Sobre a liberdade. 2ª ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1991.

PAULA, Marcio Gimenes de. O Estado e o indivíduo: O conceito de liberdade em John Stuart Mill. Polymatheia: Revista de Filosofia.Fortaleza, vol. III, n º 3, 2007, P. 73-84.Disponível em: http://seer.uece.br/?journal=PRF&page=article&op=view&path%5B%5D=460&path%5B%5D=531. Acesso em: 01 de abril de 2016.

 VITORINO, Rodrigo Sousa. Sobre a Liberdade: Indivíduo e Sociedade em Stuart Mill. Revista CEPPG, N° 25, 2/2011, p. 197-212. Disponível em: http://www.portalcatalao.com/painel_clientes/cesuc/painel/arquivos/upload/temp/fdcff07f7fa5a0563a24cb83e40a3f5d.pdf.  Acesso em: 04 de abril de 2016.

 SIMÕES, Mauro Cardoso. John Stuart Mill e a liberdade. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed, 2008.