Vozes: quantos erros fazem um acerto?

Um casarão, uma piscina abandonada. Uma família se muda para uma nova casa que buscam reformar para revender, mas nela, o pequeno Eric escuta vozes que lhe ordenam a fazer desenhos que o perturbam, cenas de mortes e violência. É a partir dessa premissa que o filme Vozes (2020), dirigido por Ángel Gómez Hernández se inicia.

A família, que já possui o hábito de comprar casas para passá-las a frente por um valor maior, muda-se então para um casarão antigo. O que parece ser mais um bom negócio começa a encontrar os primeiros problemas quando o filho único da família, Eric, tem problemas de insônia e ansiedade, alegando para a psicóloga que o visita estar ouvindo vozes.

Inicialmente, parece que somos apresentados a mais um filme no qual a entidade perturba um personagem até seu fim derradeiro, no ápice da trama. No entanto, somos pegos de surpresa diante da morte por afogamento do personagem principal em poucos minutos do filme, na mesma piscina que dá início à primeira cena.

Em desespero diante da morte prematura de seu filho, Daniel, interpretado por Rodolfo Sancho, procura ajuda através de um autor que publica obras sobre psicofonia. Esse fenômeno diz respeito à tentativa de espíritos em se comunicar com pessoas vivas e apesar de aparentar determinado grau de ceticismo, Daniel busca por Gérman pois acredita que Eric está pedindo sua ajuda do além.

Gérman e sua filha se instalam na casa e começam a realizar os testes para verificar possíveis alterações sonoras no ambiente que podem indicar a presença de alguma entidade ou espírito. Muito rapidamente encontram resultados positivos quando tem provas não somente de ondas sonoras mas também de silhueta térmica no quarto da criança falecida, o que certifica a presença física de algum ser paranormal.

Na mesma noite em que os personagens tem conhecimento sobre a presença de algo no quarto de Eric, os fenômenos retomam com toda força e a produção se utiliza da velha e simples influência que os espíritos parecem ter sobre as pessoas vivas, alterando suas percepções auditivas e visuais baseadas em experiências pessoais marcantes. Sobretudo, não é apenas ver o que não está lá ou ouvir uma voz que não existe, essas alucinações promovem dano à vida dos personagens e eles percebem que estão encarando algo muito pior do que o esperado.

Alertados por uma pessoa da cidade e também diante de pesquisas, Gérman e sua filha descobrem que a casa funcionava há 300 anos como um tribunal, julgando durante a Inquisição as mulheres que acreditavam estar envolvidas com bruxaria. Diante disso, percebem estar num local em que houve muitas torturas e assassinato de mulheres inocentes em nome de uma moral religiosa torpe.

Investigando a origem dos fenômenos, deduzem que as pessoas mortas durante as torturas ainda estão na casa e aqui partimos para os momentos finais do filme, que contam com muito suspense e sustos clássicos de filmes de terror.

Após descobrirem o corpo de uma das supostas bruxas presa em uma gaiola numa espécie de porão da casa, Gérman afirma que, segundo a tradição, só se pode destruir uma bruxa com fogo e se decidir por dar cabo à esse plano é o que, afinal de contas, parece ter sido o erro dos personagens. Ora, se em outros momentos da história houve tamanho desrespeito à dignidade da pessoa humana e um claro ataque e perseguição às mulheres, não é possível vislumbrar o motivo pelo qual repetir o mesmo erro pode gerar um acerto. Por fim, preferimos acreditar que o objetivo do filme é incutir no telespectador uma reflexão acerca do tema, do que apenas uma falha no roteiro.

Se procurado um filme com um roteiro bem escrito, é possível que este não seja o mais indicado. Não fica claro o motivo da tortura da “bruxa” que assombra as pessoas na casa ou porque, ainda, ela se utiliza da voz do pai para atrair a criança para morte, nem como porque é o pai que chega a matar a criança. O filme inicia com Eric como personagem principal, mas depois que o profissional entra em cena para investigar os fenômenos, basicamente não se fala mais na criança, ficando a sensação das coisas não estarem encadeadas. No mais, o filme segue o modelo clássico de filmes de terror quando o tema é levar susto.

FICHA TÉCNICA:

Título Original: Voces
Direção:  Ángel Gómez Hernández
Elenco: Ana Fernández García; Rodolfo Sancho; Belén Fabra; Lucas Blas; 
Origem: Espanha
Ano: 2020
Gênero: Terror