Desafios da Docência no Ensino Superior: atuação de professores na rede privada

O ato de ensinar carrega singularidades e desafios que devem ser levantados, para assim ser possível entender o processo de aprendizagem e o contexto em que ocorre esse movimento. Levando em consideração o mundo volátil em que vivemos, faz-se necessário dar voz àqueles que fazem parte de ambientes escolares e acadêmicos, sendo essa uma forma de fomentar melhorias e constantes reflexões.

Em prol dessa escuta e da compreensão da realidade atual, o (En)Cena convidou diferentes professores da rede pública de diferentes níveis de ensino (maternal, fundamental, médio e superior) para falarem sobre os desafios de ensinar. Nestes espaços as professoras e os professores puderam relatar suas experiências pessoais e profissionais. As realidades narradas em cada entrevista são um convite para pensarmos sobre a educação, sua constituição, sua disseminação e em como ela pode ser aperfeiçoada para ser significativa a todos e todas:  “O educador se eterniza em cada ser que ele educa” (Paulo Freire)

Visando preservar a identidade de nossos convidados e pensando na potência do ato de ensinar livre de pressões institucionais, optamos por manter em sigilo o nome de todos os entrevistados. Entendemos que suas falas alcançam, contemplam e priorizam, ainda que de modo particular, professores e professoras da educação pública e privada de nosso país.

O entrevistado de hoje atua na área de Educação Física. Há mais de 15 anos está na docência, sendo assim, suas respostas carregam uma imensa bagagem profissional e pessoal, contribuindo ricamente para a série. Apesar de relatar certas dificuldades, seu desejo hoje é continuar trilhando seu caminho como professor e trazendo bastante motivação para confiarmos na força da educação.

Segue a entrevista na íntegra abaixo:

(En)Cena: Como foi a sua trajetória até se tornar professor? Por que você escolheu a docência?

Resposta: Trajetória da maioria da população com renda baixa, ou seja, achava muito distante a possibilidade de frequentar uma faculdade. Mesmo assim, criei oportunidades e fui trabalhar em uma universidade no corpo administrativo, o que me permitiu estudar e trabalhar. O desejo pela docência iniciou no primeiro semestre do curso e de lá para cá, mesmo com altos e baixos, o desejo é dar aula até eu ficar velhinho.

(En)Cena: Qual o seu principal objetivo como professor? Você diria que alcança tal objetivo a cada ano?

Resposta: No primeiro semestre da faculdade esta pergunta me foi realizada e a resposta foi: ” ser referência na área”. Alcancei sim o que desejava, mas ainda não me vejo como referência na área, entretanto, a cada ano os objetivos e metas para este fim são realizados.

(En)Cena: Levando em consideração que a escola/faculdade é um ambiente repleto de pessoas com características singulares, de que forma você lida com a diversidade subjetiva de cada estudante? Você percebe a escola como um ambiente inclusivo?

Resposta: É um trabalho árduo e acredito que, eu alcance o “sonho da inclusão” com menor proporção. Quando me deparo com tal situação, tenho a tendência a ajudar muito e deixar de lado o restante, o que não é bom para ambos os lados. Criar estratégias para um ambiente inclusivo não é fácil, mas precisamos pensar juntos. Ademais, dependendo da diversidade subjetiva é necessário um maior número de profissionais na relação ensino-aprendizagem.

(En)Cena: Como é ser professor do ensino superior na rede privada atualmente?

Resposta: Atualmente grande parte dos professores amam dar aula e com certeza gostariam de continuar ministrando aulas, no entanto, a atual situação do Brasil em geral para o ensino superior está muito complexa, tanto para federais como para as redes privadas. Mudanças intensivas nos “regramentos” para oferta e forma de acesso às vagas fez diversas instituições a serem obrigadas a adequar número de disciplinas, professores e valores. A pandemia trouxe avanços, mas os mesmos impactaram demasiadamente a oferta e qualidade do ensino.

(En)Cena: Como você avalia a escola nesse processo de formação de indivíduos e de que maneira, dentro da sua profissão, você consegue perceber que está contribuindo com esse movimento?

Resposta: Ainda no sentido da discussão das mudanças atuais, acredito que a forma de ensinar está mudando e a escola não está entendendo esta mudança, entretanto, existe um movimento na oferta de capacitações e reflexões aos professores. Percebo também que para a formação houve um aumento da parcela (esforço) individual considerável devido ao crescimento das redes sociais e comportamentos de consumo digital, o que direciona para uma certa independência do aprendizado, ou seja, o professor não é mais o detentor do conhecimento absoluto. Tento acompanhar as mudanças, mas elas estão rápidas e constantes, o que torna para mim o processo de amadurecimento mais lento e consequentemente a abrangência da contribuição menor.

(En)Cena: Como está a saúde mental dos professores na atualidade?

Resposta: Resiliência sempre. Acredito que esteja próxima de um descontrole.

(En)Cena: A educação é capaz de mudar vidas? De que forma? Como os professores podem influenciar esse processo?

Resposta: A educação permite mudar vidas pois possibilita acesso a um universo maior, permite autonomia, capacidade crítica, liberdade de propósito, criatividade, domínio de capacidades e habilidades as quais irão fomentar a cultura, pois a cultura importa. Os professores podem influenciar incentivando por meio de situações reais, aplicar o conhecimento.

(En)Cena:  Na sua opinião, para onde a educação está caminhando? O que podemos esperar de nossos jovens no futuro enquanto sociedade e qual o papel da escola na formação dessas crianças/jovens/indivíduos?

Resposta: A educação está caminhando para uma maior autonomia e a escola precisa proporcionar. Ademais, não deve se entregar a tendência do conhecimento raso e rápido. Várias profissões lidam com vidas e é necessário ética, compromisso, seriedade e excelência, características que são conquistadas com diversidade de experiências, sejam elas atuais ou “velhas”. Sobretudo, vejo que a capacidade crítica como a chave para um futuro melhor. Neste momento, temo pelo futuro por todo panorama que expressei aqui.

 Autora: Maria Laura Máximo Martins