Comportamento agressivo e os transtornos psicopatológicos em crianças e adolescentes

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O comportamento agressivo pode ser expresso fisicamente por meio de luta e fuga; emocionalmente por raiva e ódio; fisiologicamente com taquicardia, face rubra; cognitivamente através da crença na conquista independentemente dos meios, também envolve manipulação; e verbalmente com o uso da palavra para controle expresso. A agressão apresenta uma função dentro do ambiente em que está sendo utilizada e a raiz do comportamento ofensivo pode ser ligada por fatores neurobiológicos, mas também pode ser fornecida e mantida pelo meio ambiente.

É comum que crianças e adolescentes apresentem comportamentos agressivos no decorrer de seu desenvolvimento, porém deve-se atentar a condutas frequentes e intensas, pois podem indicar sinais de psicopatologia. Dois aspectos importantes foram observados em relação a esses sinais de psicopatologia, a percepção que esses indivíduos têm do ambiente, se mostrando hipervigilantes e hiporresponsivos consigo mesmo e com os outros; e alteração no processo de solução de problemas, apresentando menos soluções verbais e mais respostas não-verbais.

O desenvolvimento sócio-emocional diz respeito à construção das habilidades sociais, em relação a agressividade tem-se por base o temperamento humano. O estudo de Cloninger, Svrakic e Przybeck (1993) aponta as seguintes dimensões para o temperamento: busca por novidades e sensações; evitação de dano e perigo; necessidade de contato e aprovação social; persistência. Chegou-se à conclusão de que os tipos de temperamento não constitui comportamento como bom ou ruim, é necessário entender todos os temperamentos, se são adaptativos ou desadaptativos e a situação/ ambiente que se apresentam.

O Transtorno de Déficit de Atenção/ Hiperatividade (TDAH) é caracterizado pelos sintomas: desatenção, hiperatividade e impulsividade. Os sintomas de desatenção são descritos pelo DSM-IV-TR (APA, 2002) como dificuldades de prestar atenção a detalhes ou cometer erros por descuido; dificuldades para manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas.

Fonte: encurtador.com.br/kqESU

Os sintomas de hiperatividade resumem-se à agitação das mãos ou dos pés; abandonar a cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado; correr ou escalar em demasia, em situações nas quais isto é inapropriado. O DSM-IV-TR (APA, 2002) divide o TDAH em três subtipos: predominantemente desatento, em que predominam os sintomas da desatenção (seis ou mais deles), predominantemente hiperativo/impulsivo, destacando-se os sintomas de hiperatividade e impulsividade.

Barkley (2002) afirma que TDAH não é sinônimo de conduta agressiva e que a presença desse tipo de comportamento está mais vinculada às condutas parentais do que necessariamente ao transtorno. Em um de seus estudos ele dividiu a amostra em dois grupos: crianças com TDAH (subdivididas em crianças com e sem comportamento agressivo) e crianças normais, fazendo com que cada uma delas interage com seus pais. Os resultados apontaram que as interações de crianças TDAH não agressivas com suas famílias eram bastante parecidas com as de crianças normais. Em contrapartida, no grupo TDAH agressivo, as interações eram mais negativas, com a presença de insultos e respostas impertinentes uns contra os outros.

O comportamento agressivo e as condutas anti sociais costumam estar profundamente relacionados. A definição de comportamento anti social compreende qualquer conduta que reflita a violação das regras sociais ou atos contra os outros, incluindo comportamentos como roubo, mentiras, vandalismo e fugas. Desta forma, pode-se sugerir que uma criança que apresenta comportamentos agressivos, tenderá, com maior probabilidade, a evoluir para práticas antissociais.

Os principais transtornos envolvidos com a expressão de comportamentos antissociais ou desafiadores são o Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de Conduta (TC). O TOD caracteriza-se especialmente pela presença de condutas de oposição, desobediência e desafio. Os comportamentos opositivos e desobedientes podem ser “passivos”, uma vez que a criança pode não responder ao pedido, mas pode apenas permanecer inativa.

Fonte: encurtador.com.br/rvyBM

O Transtorno Opositivo Desafiador em geral se manifesta antes dos oito anos de idade e tem pouca probabilidade de se iniciar depois do início da adolescência. Os sinais positivos frequentemente emergem no contexto doméstico, mas é comum estender-se a outras situações (APA, 2002). Um terceiro fator diz respeito às características de frequência, intensidade e diversidade dos comportamentos antissociais. Quanto maior o número, a gravidade e a complexidade dos atos, maior é a chance do Transtorno evoluir para a idade adulta (Robbins, Tipp & Przybeck, 1991).

Transtornos neuropsiquiátricos infanto-juvenis e comportamento agressivo geralmente ocorrem por razões muito afastadas da esfera dos transtornos psicológicos. Porém alguns comportamentos agressivos estão associados a uma série de transtornos neuropsiquiátricos. Tais problemas dessa natureza envolvem a agressividade física e/ou verbal, comportamentos opositores, desafiadores e anti-sociais, além de condutas de risco e impulsivas, podendo ser considerado como diagnósticos de Transtorno Bipolar do Humor (TBH), no Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) e nos Transtornos de Conduta (TC) na infância e adolescência.

O Transtorno Bipolar do Humor (TBH) caracteriza-se pela alternância de duas fases distintas:a maníaca (ou hipomaníaca) e a depressiva. Os critérios diagnósticos para um episódio maníaco incluem um período distinto de humor anormalmente elevado, expansivo ou irritável acompanhado de pelo menos três dos seguintes sintomas: auto-estima inflada, necessidade de sono diminuída, pressão para falar, fuga de idéias, distração, aumento de atividade dirigida ao objetivo e excessivo envolvimento em atividades prazerosas que tenham conseqüências negativas (APA, 2002).

O Transtorno de Conduta (TC) na infância e adolescência, é comportamento anti-social que compreende qualquer conduta que reflita a violação das regras sociais ou atos contra os outros, incluindo comportamentos como roubo, mentiras, vandalismo e fugas. Os principais transtornos envolvidos com a expressão de comportamentos anti-sociais ou desafiadores são o Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de Conduta (TC).

Fonte: encurtador.com.br/oqvyJ

TBH, TDAH e Transtornos de Conduta têm pontos comuns entre eles, presença de comportamento agressivo, e outros sintomas comuns dentre eles. Apesar de considerarem a possibilidade do diagnóstico diferencial entre tais transtornos, alguns estudos sugerem que a equação TBH + TDAH + Transtornos de Conduta pode formar uma entidade diagnóstica com fenótipo específico (Papolos & Papolos, 1999; Papolos, 2003).

O comportamento agressivo constitui-se de uma gama de atitudes sociais inábeis, a expressão agressiva frequente e intensa na infância e na adolescência apresenta inúmeras consequências desfavoráveis a curto, médio e longo prazo. Desta forma a compreensão do desenvolvimento infanto-juvenil parece conceder padrões mais amplos para o entendimento do comportamento agressivo. Devendo ser uma investigação mais criteriosa e com mais estudos, especialmente aqueles que se detenham às questões sobre classificação nosológica na infância e adolescência.

REFERÊNCIAS

American Psychiatric Association. DSM-5: Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais . Porto Alegre: ArtMed, 2014.

Barkley, R. (2002). Transtorno de Déficit de Atenção/ Hiperatividade. Porto Alegre: Artmed

Cloninger, C. R.; Svrakic, D. M. & Przybeck, T. R. (1993). A psychological model of temperament and character. Archives General Psychiatry, 50 (12), 975-990

Robbins, L. N.; Tipp, J. & Przybeck, T. (1991). Antisocial personality. Em: L. N. Robins & D. A. Reegier (Orgs.). Psychiatric disorders in America (pp.51-59). Nova York: The Free Press.

Papolos, D. & Papolos, J. (1999). The bipolar child: the definitive and reassuring guide to childhood’s most misunderstood disorder. New York: Broadway Books.

Papolos, D. (2003). Bipolar disorder and comorbid disorders: the case for a dimensional nosology. Em: B. Geller& M. DelBelo (Orgs.). Bipolar Disorder in Childhood and early adolescence (pp. 76-106). New York: The Guildford Press.

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O uso do Álcool na Pandemia

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Era 31 de dezembro de 2019, o mundo ouvia falar em um vírus desconhecido. No Brasil, nos preparávamos para a queima de fogos, para as promessas de um novo ano com 365 dias de oportunidades.

Em Wuhan – China, os médicos se depararam com os primeiros pacientes da doença nCoV 2019(Corona Vírus) em dezembro, apresentando sintomas de doenças já conhecidas como pneumonia, os mesmos, não respondiam de forma satisfatória ao tratamento e exames de imagem mostravam danos pulmonares severos. Os Especialistas estavam estarrecidos com a situação, mas, nem de longe, acreditavam se tratar de uma epidemia local, sequenciando uma pandemia global (Huang, 2020).

O ano começou, 2020 trouxe com ele a chance de um novo emprego, de grandes expectativas… Parecia um ano como todos os outros, escolheram a Globeleza, escolhemos nossos abadás de carnaval. Brasil, o país do carnaval, né?! Mas, a festividade passou. E com ela levou a folia, os abraços, os beijos, as carícias, os contatos, tudo.

Fonte: encurtador.com.br/jvU28

Na China, especialistas e pesquisadores corriam contra o tempo para identificar que novo vírus era esse, quais eram suas características, como se desenvolvia, etc. Imaginem, uma correria só! Cerca de 41 pacientes internados no hospital foram identificados como tendo infecção por nCoV 2019, confirmadas já em laboratório. A maioria dos infectados era masculina.

Dia 26 de fevereiro, o primeiro caso de um tal de COVID-19 aqui no Brasil veio à tona, a essa altura já sabíamos que era/é um vírus letal. “Ah, mas ele não aguenta nosso clima tropical”, disseram.  “Pode ser que essa nova variedade não chegue ao Brasil, como o da Sars não chegou, porque seu avanço foi possivelmente bloqueado pelas temperaturas altas das regiões tropicais”, disse o virologista Edison Luiz Durigon, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo – ICB-USP (FABESP,2020). Quem dera fosse verdade.

Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde anuncia que sim, COVID-19 é uma pandemia, ou seja, o mundo estava/está lutando, combatendo o mesmo vírus. E que por sua vez, ataca os pulmões e tem transmissão em velocidade recorde. O mundo entra em um filme de terror.

Fonte: encurtador.com.br/sCSVY

Nas últimas duas semanas, o número de casos de Covid-19 [doença provocada pelo vírus] fora da China aumentou 13 vezes e a quantidade de países afetados triplicou. Temos mais de 118 mil infecções em 114 nações, sendo que 4.291 pessoas morreram”. Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, 2020.

Como forma de tentar conter o avanço desenfreado da Covid – 19, a Organização Mundial de Saúde – OMS recomendou várias medidas preventivas, dentre elas, o isolamento social. Com a disseminação do vírus no mundo, aqui no Brasil, governadores e prefeitos adotam tais medidas com o intuito de não colapsar os hospitais. Veja só, nada de churrasco no fim de semana, nada de barzinho na sexta feira, cineminha, então nem pensar. Os brasileiros, povo de aglomeração estavam prestes a passar pela prova de fogo, uma quarentena (40 dias e 40 noites que se tornaram 365 dias).

Uns dias em casa sem poder convidar amigos e familiares?! Molezinha. Assim, o Brasil coloca a taxa de vendas de bebidas alcoólicas em 93,9%. Isso mesmo que você acabou de ler, 248,9 mil compras de cerveja entre 24 de fevereiro a 3 de maio de 2020, segundo a plataforma Compre&Confie (2020). Em casa + 0 coisas para fazer + tédio = cerveja, né?! Oh no, ou no, ou no, no, no (cantou que eu sei).

Fonte: encurtador.com.br/asDX8

O problema foi que algumas “pessoinhas” começaram a utilizar as redes sociais para fazerem divulgações MENTIROSAS, entre elas, que o álcool ajudava a prevenir o Corona Vírus (é mole?!), com isso a OMS (2020) divulgou um folheto chamado “Álcool e Covid-19: O que você precisa saber”, com o intuito de informar e combater as famosas Fake News. Ao invés de evitar a contaminação pelo novo coronavírus, o alto consumo de álcool debilita o sistema imunológico e ainda pode acarretar riscos de desconforto respiratório agudo (SDRA), o que já sabemos que é um dos cargos chefes da doença (OPAS/OMS, 2020).

Aqui no Brasil, nós já gostamos de beber uma cervejinha aqui outra ali, né?! E com tanto estresse, incertezas, o consumo de álcool foi para 42%, segundo a ONU (Brasil, 2020). O que nos remete pensar que usamos o álcool nesses momentos à procura de um efeito relaxante, equivocadamente.

Entenda que o aumento do uso de álcool não apenas pelos possíveis danos à saúde. Mas também pelas suas consequências no meio social. Em São Paulo, houve um aumento de 22% de casos de violência letal praticados em mulheres e 44,4% de violência doméstica. No Amapá, o aumento foi de 100% no que se trata de feminicídios durante a pandemia (FBSP,2020). É triste pensar que ainda estamos em tempos de pandemia, até onde esses números irão chegar?

Essa pandemia não tem sido fácil para ninguém, não tornemos esse momento ainda mais difícil! O uso excessivo de álcool pode debilitar seu sistema imunológico e ainda acarretar problemas ainda maiores dentro do seu lar. Caso precise de ajuda (e precisamos), procure um psicólogo no seu município, procure o Centro de Atendimento Psicossocial Álcool e outras drogas – CAPS AD, a Unidade Básica de Saúde, o Centro Comunitário de Saúde – CSC pelos canais de atendimento.

Fonte: encurtador.com.br/bmtDE

Vamos criar estratégias de enfrentamento mais saudáveis durante a pandemia para lidar com o estresse, o tédio, as incertezas e até mesmo o luto, que tal? Atividade física com a família, jogos de grupo, tira o jogo Uno da gaveta, aquele bom e velho dominó, vale até truco (jogo de cartas). E a cerveja? Coloque um dia da semana para apreciar a bebida, chamamos isso de redução de danos, capitou a palavra? Vamos reduzir os danos?

A falta de rotina nos deixa ociosos e com isso, a carga de estresse aumenta, então prepare seu calendário da pandemia, o dia do cineminha em casa com pipoca e suco (combina, né?!), com chocolate para dar uma equilibrada. Acorde, tome café da manhã reforçado, almoço saudável e a noite aquela cervejinha, porque equilíbrio é tudo.

Não tem conseguido controlar o humor, a agressividade, ou a carga de estresse está muito alta? Primeiro, respire fundo e depois, procure ajuda profissional. Sua família merece esse cuidado, sua namorada merece esse respeito e você merece esse carinho por si mesmo. Se cuide nessa pandemia com todos os protocolos de prevenção contra a COVID-19, beba com moderação e procure ajuda sempre que for necessário, você não precisa enfrentar tudo isso sozinho.

REFERÊNCIAS 

BRASIL. Ministério da Saúde. Resposta nacional e internacional de enfrentamento ao novo coronavírus. Brasília. Disponível em < https://coronavirus.saude.gov.br/linha-do-tempo/#jan2020> Acesso em: 01 de maio de 2021.

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Violência Doméstica Durante Pandemia de Covid-19 Edição 03. Nota Técnica. c2021. Disponível em: < https://forumseguranca.org.br/publicacoes_posts/violencia-domestica-durante-pandemia-de-covid-19-edicao-03/> Acesso em: 01 de maio de 2021.

GARCIA, L. P.; SANCHEZ, Z. M. Consumo de álcool durante a pandemia da COVID-19: uma reflexão necessária para o enfrentamento da situação. Cad. Saúde Pública vol.36 no 10 Rio de Janeiro 2020. E pub. Oct 26, 2020. Disponível em <https://doi.org/10.1590/0102-311×00124520> Acesso em: 01 de maio de 2021.

HOSPITAL SANTA MÔNICA. Uso abusivo de álcool durante a quarentena: os perigos do aumento de consumo. São Paulo. Pub. 29 de outubro de 2020. Disponível em: < https://hospitalsantamonica.com.br/uso-abusivo-de-alcool-durante-a-quarentena-os-perigos-do-aumento-de-consumo/#:~:text=A%20falta%20de%20uma%20rotina,n%C3%A3o%20segue%20mais%20essa%20regra.> Acesso em: 01 de maio de 2021.

HUANG, C.; WANG, Y.; LI, X.; REN, L.; ZHAO, J.; HU, Y.; et al. Características clínicas de pacientes infectados com novo coronavírus de 2019 em Wuhan, China. THE LANCET. volume 395, ISSUE 10223, P497-506,15 de fevereiro de 2020. Publicado em 24 de fevereiro de 2020. Disponível em <  https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30183-5> Acesso em: 01 de maio de 2021.

NEVES, U. Consumo de bebidas alcoólicas cresce 93,9% na quarentena. Portal PEDMED, pub. 20 de fevereiro de 2021. Disponível em: < https://pebmed.com.br/consumo-de-bebidas-alcoolicas-cresce-939-na-quarentena/> Acesso em: 01 de maio de 2021.

ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE.  Folha Informativa sobre a COVID-19. Brasília: OPAS/OMS https://www.uniad.org.br/wp-content/uploads/dlm_uploads/2020/04/PT_ALC_COVID_LONG_SHEET_11420OPAS.pdf> Acesso em: 01 de maio de 2021.

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O nome dela é Sabine: a importância do diagnóstico precoce do Transtorno do Espectro Autista

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O diagnóstico tardio do TEA acarretou a Sabine diversas consequências negativas, dentre elas o tratamento inadequado e a regressão do seu desenvolvimento, mudando totalmente o rumo de sua vida e história.

Elle s’appelle Sabine, ou sua tradução “O nome dela é Sabine”, se trata de um filme/documentário francês que estreou em 2007 e chegou a receber o prêmio da Federação Internacional de Críticos de Cinema do Festival de Cannes no mesmo ano. A diretora da obra, Sandrine Bonnaire, discorre de uma forma sensível acerca da vida e história da sua irmã mais nova, Sabine, que apresentou um desenvolvimento considerado “normal” na sua infância, mas começou a apresentar traços diferentes ao longo dos anos, sendo diagnosticada com Transtorno no Espectro Autista (TEA) tardiamente.

Fonte: https://bit.ly/2ZDWhyh

Sandrine construiu o referido documentário ao longo de 25 anos em que filmou sua irmã incansavelmente, a princípio somente com o intuito de mostrar à Sabine o seu passado de superação do TEA. O filme se divide em dois momentos, sendo o primeiro apresentando a juventude de Sabine, como uma garota alegre, espontânea, comunicativa, em pequenos registros de família em que ela viaja, se diverte, toca piano e dança, condição vivenciada até cerca dos seus 28 anos. Já o segundo momento retrata a realidade daquele momento de Sabine, após viver 5 anos em um hospício para tratamento do TEA, período no qual a personagem principal engorda cerca de 30 quilos, raspa os cabelos e passa notoriamente a viver fora da realidade com o uso de medicamentos fortes.

Fonte: https://bit.ly/30KVrPE

De acordo com a narrativa da diretora e irmã da protagonista, Sabine apresentou desde a infância comportamentos diferenciados em relação aos irmãos, o que levou os pais a matricularem em uma escola para crianças “anormais”. Somente por volta dos 12 anos de idade ela foi transferida para a escola em que os irmãos estudavam, momento muito marcante na vida da adolescente, pois suas “diferenças” passaram a ser nítidas: Sabine começou a apresentar comportamentos de automutilação e agressividade, acarretando sua desvinculação da escolarização formal e início de uma vida mais doméstica e isolada. Apesar dos comportamentos estereotipados, Sabine apresentava grande interesse em aprender e inteligência, pois mesmo com os estudos apenas domésticos a menina aprendeu a tocar piano, chegando a compor uma peça no instrumento.

De acordo com o DSM – 5, existem 5 Critérios Diagnósticos para a detecção do Transtorno do Espectro Autista, sendo alguns deles os déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, e a necessidade de que os sintomas se apresentem precocemente no período do desenvolvimento, tendo esse último a possibilidade de que os sintomas não sejam plenamente manifestos até que as demandas sociais excedam as capacidades limitadas, ou ainda, podem ser mascarados por estratégias aprendidas mais tarde na vida (APA, 2014). Tendo como base o último critério citado, pode-se dizer que o diagnóstico de Sabine foi realizado tardiamente, tendo em vista que os sintomas já estavam presentes desde sua infância, mas se tornaram relevantes apenas na sua idade adulta, levando a um tratamento inadequado e à sua regressão no que diz respeito ao seu repertório de comportamentos.

Fonte: https://bit.ly/2Ozsn7X

A busca por tratamento psicológico para Sabine aconteceu apenas por volta dos seus 28 anos de idade, pois após a morte do irmão, e consequente mudança para o interior da França, ela começou novamente a apresentar comportamentos agressivos e de automutilação. Após alguns pareceres médicos, Sabine recebeu um laudo que indicava comportamentos autísticos. Nesse momento a família decide interná-la numa clínica psiquiátrica, onde fica por cinco anos e na qual regride totalmente em seu desenvolvimento. Sandrine, então, ao ver a situação degradante em que a irmã se encontrava, decide tirá-la da clínica psiquiátrica e cria o seu próprio Centro Psiquiátrico, no qual a irmã passa a vivenciar o autismo de outra forma, inclusive retomando algumas das habilidades perdidas ao longo do tempo e, provavelmente, em decorrência do uso das fortes medicações.

Para Vorcaro e Rahme (2013), “a condição de inércia de Sabine, que lhe é prevalente, como testemunhamos a partir do filme, parece poder ser atribuída aos fracassos das suas tentativas de inserção social, além das perdas de convívio familiar, da iatrogenia das hospitalizações e da medicação.” O diagnóstico tardio do TEA acarretou a Sabine diversas consequências negativas, dentre elas o tratamento inadequado e a regressão do seu desenvolvimento, mudando totalmente o rumo de sua vida e história. Quando o TEA é diagnosticado tardiamente há um aumento considerável da probabilidade de fracasso do indivíduo em desenvolver seus relacionamentos com seus pares, ou seja, haverá prejuízos e dificuldades na sua vida social. Além disso, detectar o Autismo precocemente não tem como objetivo “rotular” a pessoa, mas diminuir e/ou extinguir comportamentos autísticos e ganhar tempo na estimulação e tratamento adequado, visando a melhora na qualidade de vida do indivíduo, estimulando sua independência (PESSIM; FONSECA, 2014).

FICHA TÉCNICA: 

Título original: Elle s’appelle Sabine
Direção: Sandrine Bonnaire
Elenco: Sabine Bonnaire
Ano: 2009
País: França
Gênero: Documentário.

REFERÊNCIAS:

ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtorno mental: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. 948 p. Tradução de: Maria Inês Corrêa Nascimento et al. Pág 50-51.

PESSIM, Larissa Estanislau; FONSECA, B.; RODRIGUES, Ms Bárbara Cristina. Transtornos do Espectro Autista: Importância e Dificuldade do Diagnóstico Precoce. Rev Cientifica Eletrônica (FAEF) Psico, v. 23, 2014. Disponível em: http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/pnnWsCHLoL9zOLE_2015-3-3-14-7-28.pdf

VORCARO, Angela; RAHME, Mônica. Ela se chama Sabine… Estilos clin.,  São Paulo ,  v. 18, n. 2, p. 251-267, ago.  2013 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-71282013000200003&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  08  jul.  2020.

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