Afinal, o que é o amor?

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Andei ensimesmada a procura de uma definição clara e precisa do que seja o amor, carecia saber acerca do que rondava minha mente e meu corpo, trespassando até meu mundo imaginário, fazendo-me ficar por horas a fio em meus devaneios.

Arriei meu cavalo, companheiro de longas datas, coloquei provisões em uma matula, verifiquei a moringa de água fresca e parti em busca de respostas.

Pois bem, fiquei sabendo de um polêmico rapaz lá em Röcken na Alemanha, diziam que era um grande sabedor de todas as causas, um grande estudioso.

 Foi uma longa viagem até que enfim cheguei e fui direto a ter minha entrevista com o Sr. Friedrich Wilhelm Nietzsche, que prontamente me recebeu, embora com cara de poucos amigos. Ao adentrar o recinto, pasmei-me com o ambiente, as paredes não se via, apenas um sem fim amontoado de livros, bem como nas mesas ali expostas. Sentei-me exausto da longa viagem, porém, não tinha tempo a perder; por impressão minha, notei que o cavalheiro à minha frente também não, suas atitudes era que o tempo urgia, denotava pressa em seus gestuais. Expliquei a ele minha visita e ele me convidou a sentar e pediu explicações mais detalhadas.

Senhor, necessito saber qual é a essência real do amor. Esperei alguns segundos que me pareceram séculos, e ele a passar a mão esquerda pela ponta do longo bigode, se colocou a pensar (pelo menos a meu ver não me julgou uma tola).

Eis que ele me olha seriamente e diz:

O amor é o estado no qual o homem vê as coisas quase totalmente como não são. A força da ilusão alcança seu ápice aqui, assim como a capacidade para a suavização e para a transfiguração. Quando um homem está apaixonado sua tolerância atinge ao máximo; tolera−se qualquer coisa. (Friedrich Nietzsche; Montecristo Publishing LLC, 2012 O Anticristo, p. 24).

Dito isso, levantou-se e sem cautela despediu-se, alegando o gosto pela solidão. Saí e me coloquei a indagar sobre a resposta recebida.

Instalei-me em uma pensão, onde passaria a noite para descanso e para me inteirar dos dizeres daquele homem tão peculiar. Fiz a devida assepsia do corpo, alimentei-me e logo procurei descanso, mas a mente trabalhava para desvendar o que para mim estava mais confuso do que antes, embora julgasse ser pura ignorância minha, pois o ensinamento tinha sido de grande monta.

Resolvi empreender viagem para reunir mais opiniões para assim sanar minha sede de saber. Acordei cedo, tomei um farto café da manhã e empreendi viagem rumo a Gdansk, na Polônia, minha entrevista era com o sr. Arthur Schopenhauer. Diziam deste homem, que era um pouco mais introvertido que o primeiro, de têmpera forte, era rude e franco, diziam dele também, que era sombrio e pessimista, sem meias verdades. Pensei cá comigo mesmo, que era disso que estava precisando. Apesar de minha determinação, sentia-se um tanto inquieto, pois em minhas pesquisas até a mãe de meu entrevistado o achava insuportável, mas embrenhei-me pelo caminho com tenacidade.

Fonte: Imagem de PIRO por Pixabay

Ao chegar deparei-me com um homem de poucas palavras, que por sua vontade, a entrevista seria ali mesmo na porta, muito a contragosto me recebeu e de pronto disse para haver brevidade em nossa entrevista, pois tinha muito a fazer. Pois bem, lancei-lhe a pergunta e reiterei a necessidade que tinha em saber dele toda verdade acerca dela.

Andou de um lado para outro, sempre de costas, virou-se e me disse:

[…] a origem do amor apaixonado propriamente dito, via de regra, será encontrada nestas considerações relativas, e apenas a origem da inclinação habitual, e fácil será encontrada nas considerações absolutas. De acordo com isso, não são exatamente as belezas regulares, perfeitas que costumam acender as grandes paixões. Para que nasça uma tal inclinação realmente apaixonada exige-se algo que só se deixa expressar mediante uma metáfora química: ambas as pessoas têm de se neutralizar mutuamente, como ácido num sal neutro. […] Para a neutralização mútua de duas individualidades que está em pauta exige-se que o grau determinado de masculinidade do homem corresponda exatamente ao grau determinado de feminidade da mulher, suprimindo-se com isso aquelas unilateralidades de modo preciso. (SCHOPENHAUER, 2004, p. 29-30).

Dito isto, calou-se, sendo-me impossível outra colocação a não ser bater-me em retirada. Confesso certa decepção, pois no meu íntimo espero mais do amor do que uma resposta rebuscada a cerca de uma conjunção carnal, mas como contrapor tanta sabedoria?

Pois bem, refletiria sobre esses achados depois, por hora partiria para mais uma empreitada. Há muito já ouvia falar de um cavalheiro muito ilustre e de tanto conhecimento como os meus outros entrevistados, o que li dele, me fazia pensar em uma resposta mais equivalente ao meu próprio pensamento, dizia ele que apesar das imperfeições e das diferenças humanas, que a plenitude é encontrada na realização de si mesmo.

Com renovada esperança me coloquei a caminho de Kesswil, na Suíça. Ao me deparar com o cavalheiro, logo de pronto, senti-me acolhido, e pela primeira vez senti que sairia dali encontrando as respostas que procurava. Este amável cavalheiro era Carl Gustav Jung.

Feitas as minhas indagações, me senti validado por meu interlocutor. Amigo, vou lhe ajudar, e disse:

“O desejo apaixonado tem dois lados: É a força que tudo exalta e, sob determinadas circunstâncias, também tudo destrói. É possível assim que um desejo ardente, já venha em si acompanhado de medo, ou que seja seguido ou anunciado por medo. A paixão acarreta destinos e com isso cria situações irrevogáveis”. (Jung apud Azevedo, 2001, p. 38)

Dito isto ele alegou que ia receber visita ilustre de seu velho amigo e parceiro de estudos, Sigmund Freud, se caso eu quisesse ali permanecer, poderia me deleitar de ensinamentos mais profundos.  Não achei de bom tom estar a atrapalhar a entrevista dos amigos. Despedi-me, agradeci e me coloquei em retirada.

No caminho, no trote do meu cavalo, meus pensamentos fervilhavam… Ora raios! Um diz que o amor nos cega a razão, o outro que o amor não passa de uma junção carnal em perfeita ordem, já o outro me fala de destruição de medos e destinos irrevogáveis. O que seria mesmo o amor?

Neste momento, descuidado que sou, nem me apercebi que meu companheiro de longas datas se encontrava no limite de suas forças em prol de minha busca incessante. Meu cavalo arriou-se ao chão. Fiquei desesperado, abraçava-o ao chão, chorava e sentia o quão egoísta fui, pensei só em mim, esquecendo-me do meu fiel amigo que tanto a mim dedicou, num ímpeto, dei a ele toda a agua que tinha, sem pensar na longa e dura jornada pela frente, ele foi abrindo os olhos pouco a pouco, e eu a pular de alegria feito uma criança por seu restabelecimento.

Foi quando num estalo tudo clareou, o que eu tanto buscava enxerguei naquele momento, o amor sempre esteve dentro de mim, eu era o amor, tudo que senti em relação ao Alasão refletiu-se de volta para mim em forma da resposta que eu precisava.

O amor está dentro de cada um de nós, basta saber acessá-lo e entender que cada um tem suas definições acerca dele, o meu era simples como água e minha intenção doravante era joga-lo ao universo, para que pudesse se espalhar como estrelas nas noites escuras, e quem sabe um dos meus entrevistados acima possam se iluminar com algumas dela.

E para você, o que é o amor?

Referências

GRISOLIA Luiza Moreira. (2008). Paixão como Projeção: Quando este sentimento aprisiona. Disponível em:  https://tede2.pucsp.br/handle/handle/18705. Acesso em 18/08/2022

Página 24: https://books.google.com.br/books?id=kL3UjvEoPZwC&pg=PR24, Parte 23, Friedrich Nietzsche; Montecristo Publishing LLC, 2012 O Anticristo
Fonte: https://citacoes.in/obras/o-anticristo-1748/

SILVA Ana Clécia 2019. REFLEXÕES SOBRE O AMOR NA FILOSOFIA DE ARTHUR SCHOPENHAUER. Disponível em: https://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/bitstream/123456789/21217/1/TCC%20-%20ANA%20CLECIA%20DA%20SILVA.pdf . Acesso em 17/08/2022

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Uma segunda chance para amar: uma canção de natal

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“Seja boa consigo mesma pois ninguém mais tem o poder de te fazer feliz” – George Michael

O Natal está chegando e com ele diversos filmes com temas natalinos despertam em nós uma chama de amor, bondade e sentimentos de mudança. Além dos tradicionais Movies de Natal outro elemento faz com que as pessoas despertem emoções que podem proporcionar uma atmosfera de felicidade verdadeira nas pessoas são as Músicas natalinas. Se misturar as duas coisas em uma só temos então um turbilhão de sensações, e esta é a proposta de Uma segunda chance para amar, uma comédia romântica inspirada nas músicas de George Michael, fazendo com que uma bela canção de amor valha a pena ser contada mais de uma vez.

O filme conta a história de Kate (Katarina) um ano após se recuperar de um trauma, ela vive em meio a sua autodestruição, afastada da família, amigos, cria problema no trabalho e não espera um milagre de natal. Trabalhando ainda em uma loja de produtos natalinos, Kate se frustra por não realizar seus sonhos e sente que depois do último natal nunca mais será a mesma. Eis que um rapaz surge em cena, não de modo convencional. Tom conhece Kate fora da loja e começa a questioná-la sobre seus desejos e perspectivas. A mesma não se apaixona de cara pelo Dom Juan, mas fica intrigada com suas concepções.

Tom é um londrino que vive a vida dia após dia, sem criar muitas expectativas, porém ele vive de tal forma que faz com que Kate se sinta bem, livre de preconceitos, ele apenas aceita ela como é, permitindo que sejam livres para viver intensamente seus sonhos. No entanto ele esconde um mistério, isso causará maior autonomia e autodeterminação em Kate, para que ela possa se libertar de seus medos e dúvidas que antes lhe causava dor e sofrimento.

Fonte: encurtador.com.br/aGHST

Além de um romance presente no filme, as músicas de George Michael cativam o público pela autenticidade de contar histórias parecidas com a vida real. A música utilizada como enredo para o filme Last Christimas em parceria com Wham!,   dita como a história seria no início da trama. Porém, a música que demonstra o crescimento e auto superação da protagonista é Heal the Pain, cuja amabilidade de outras pessoas podem criar condições adequadas para crescimento e mudança, embora o principal ingrediente para se alcançar o autodescobrimento é “Seja boa consigo mesma pois ninguém mais tem o poder de te fazer feliz”.

Outro tema tratado com igual relevância no filme diz respeito a xenofobia. No filme mostra que a família de Kate fugiu de sua terra natal, Iugoslávia, seus pais tentam se adaptar com as mudanças, contudo tiveram que fazer sacrifícios para cuidar das duas filhas. Uma outra questão mal resolvida na família é a sexualidade de sua irmã, que esconde de sua família sua orientação sexual, traçando um paralelo entre a aceitação homoafetiva do cantor diante de sua família.

Por fim temos a questão de caridade abordada na maioria dos filmes natalinos. Esse não é diferente, Kate muda depois que fica doente no último Natal, passando a ser uma pessoa bastante egoísta e indiferente com as questões alheias. Na sua jornada em busca de uma segunda chance a protagonista reflete sobre diversas questões inusitadas e uma delas é contribuir para que outras pessoas também tenham felicidade. Ela repara seus erros mais comuns e usa seu dom para ajudar as pessoas do abrigo e no fim junta todos da trama em um momento genuíno de altruísmo natalino.

Imagem relacionada

Título – Uma segunda chance para amar/ Last Christmas (Original)

Ano produção – 2019

Dirigido por Paul Feig

Duração – 1h43min

Elenco – Emilia Clarke, Henry Golding, Emma Thompson

Gênero – Comédia / Romance

País de Origem – Reino Unido/ EUA

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Para me encher de mim

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Eu tô precisando arrotar as palavras para calar dentro de mim.
Calar a voz que me soa ofegante nesse desespero de resolver a vida.
Calar pela espontaneidade e fazer as pazes com os sentimentos.
E saber que não vale tanto esse desgaste de explicar o que é melhor para mim.
É para mim e só para mim o meu bem maior.
É amar o meu sorriso e admirar os meus talentos.
É aprender com os meus desatinos.
É cuidar da minha dor e serenizar o meu coração.
É esvaziar de mim o que não mais me cabe.
Pra eu voltar a caber em mim.
Eu preciso esvaziar essa vontade de dizer “chega eu não aguento mais”.
Não posso absorver as bagagens que não são minhas.
E parar de pedir tanto para que não faz questão de entender a minha dor.
E aprender a me dar e me receber.
E lavar a minha alma de tudo o que me suja.
Eu preciso me desinfetar.
Eu preciso me desenhar, me reinventar.
Eu preciso esvaziar as desculpas descabidas. As palavras mal ouvidas.
Preciso esvaziar essa agressão de mim.
Isso é cuidar de mim.
Eu me esvazio de você!
Para me encher de mim.

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Último Romance: análise funcional

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Los Hermanos foi uma banda de rock alternativo criada em 1997 formada por jovens universitários do Rio de Janeiro. A composição era a seguinte: Bruno Medina, no teclado (estudante de Publicidade); Rodrigo Amarante, nos vocais, guitarra e percussão; Marcelo Camelo, vocais e guitarra (estudante de Jornalismo) e por Rodrigo Barba, na bateria (estudante de Psicologia).

A música “Último Romance”, com duração de 4:25 min, alvo da análise realizada – feita em tópicos –, tem como autor Rodrigo Amarante e está presente no álbum “Ventura”, lançado em 07 (sete) de maio de 2003. É importante destacar que a abordagem basilar do trabalho consiste na Análise Experimental do Comportamento (AEC), desenvolvida principalmente por Burrhus Frederic Skinner (1904-1990).

Eu encontrei-a quando não quis mais procurar o meu amor

O autor afirma que quando diminuiu a frequência da emissão do comportamento de procurar seu amor, o encontrou – o que para ele é um estímulo apetitivo/reforçador. Podemos inferir que ele se comportou dessa forma por várias vezes, e, após sucessivas punições positivas e negativas, respectivamente (exemplo: quando o homem convida uma mulher para um encontro e ela recusa; o homem começa a se relacionar e a mulher exige que o homem pare de jogar futebol – aqui, jogar é reforçador), diminuiu a frequência desse operante.

Fonte: http://zip.net/bdtKtk

E quanto levou foi pr’eu merecer / Antes um mês e eu já não sei…

O tempo decorrido entre a adequação do comportamento ao ambiente, de modo a obter consequências de cunho reforçadoras foi o suficiente para o organismo desenvolver maior repertório comportamental, de modo a pensar ser merecedor, ou seja, ter comportamento suficiente para responder de forma adequada aos estímulos ambientais acrescentados pelo outro na relação interpessoal/amorosa. O indivíduo está tão contente por causa desse contexto/ambiente apresentado que começa a repensar se de fato já teve a série de experiências necessárias para o enfrentamento dessa nova relação, se conseguirá se comportar da forma melhor adaptada possível.

E até quem me vê lendo o jornal na fila do pão sabe que eu te encontrei

O evento de encontrar a amada se mostrou tão reforçador para o indivíduo, que o mesmo generaliza a resposta. Noutras palavras, diante de ambientes diferentes (a fila do pão) ele continua se comportando da forma que se comporta quando está na presença da amada, demonstrando contentamento.

Fonte: http://zip.net/bmtJQz

E ninguém dirá que é tarde demais / Que é tão diferente assim / Do nosso amor a gente é quem sabe, pequena…

E é claro que as pessoas que fazem parte do meio social comum ao casal se comunicarão de forma verbal, seja com o comportamento de verbalizar que demorou muito para o homem da canção se relacionar com alguém, o que pode ser diferente – se para aquele ambiente for comum relacionamentos em faixas etárias menores, ou com outro tipo de funcionamento.

Fonte: http://zip.net/bqtKWw

Ah vai, me diz o que é o sufoco / Que eu te mostro alguém a fim de te acompanhar / E se o caso for de ir à praia eu levo essa casa numa sacola

Se a situação que a vida apresenta é apetitiva ou aversiva, não importa. Desde que o homem esteja compartilhando o ambiente que está com sua amada.

Eu te encontrei e quis duvidar, tanto clichê deve não ser / Você me falou pr’eu não me preocupar / Ter fé e ver coragem no amor!

A fala da amada (que compartilha da mesma comunidade verbal que ele) de que ele não precisava se preocupar com a possibilidade de término ou algo do tipo trouxe como consequência a sensação de segurança.

Fonte: http://zip.net/bytKrR

E só de te ver eu penso em trocar a minha TV / Num jeito de te levar a qualquer lugar que você queira / E ir onde o vento for / Que pra nós dois sair de casa já é se aventurar

Experiências corriqueiras (como sair de casa) apresentam reforço natural e arbitrário. Reforço natural no sentido de se livrar da possível sensação de tédio (exemplo de reforço negativo do tipo esquiva) e reforço arbitrário por estar com a amada (se for levado em consideração o potencial reforçador que a presença da amada traz por si só).

Me diz o que é o sossego que eu te mostro alguém a fim de te acompanhar / E se o tempo for te levar eu sigo essa hora e pego carona pra te acompanhar

Como na explanação supracitada, o ambiente que importa para o homem é estar diante da amada, já que a mesma se mostra um estímulo apetitivo para ele.

 

Referências:

http://g1.globo.com/platb/los-hermanos-15-anos/

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Relacionamentos Abusivos: uma forma patológica de amar

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Recentemente, pôde-se acompanhar através das mídias e redes sociais, a polêmica envolvendo o casal Marcos e Emilly, no reality show Big Brother Brasil, edição 2017. O BBB 17, transmitiu na edição deste ano um relacionamento abusivo. Emilly era alvo de constantes ataques psicológicos, e ameaças à sua integridade física, por parte de Marcos, que se mostrava extremamente agressivo e opressor. O Brother chegou a apontar o dedo e encurralar a jovem contra a parede algumas vezes, deixando-a em posição de subordinação e humilhação. Como resultado, Marcos acabou sendo expulso do reality, na noite desta segunda-feira.

Há bastante semelhança entre a questão dos relacionamentos abusivos, e a forma patológica de amar, trazida por Davi E. Zimerman. A psicóloga Raquel Silva Barreto, em entrevista ao Repórter Unesp, disse que uma “Relação abusiva é aquela onde predomina o excesso de poder sobre o outro. É o desejo de controlar o parceiro, de tê-lo para si. Esse comportamento, geralmente, inicia de modo sutil e aos poucos ultrapassa os limites causando sofrimento e mal-estar. ”

Fonte: http://zip.net/bwtG3z

Zimerman, psicanalista norte americano, traz em seu livro Manual de Técnica Psicanalítica, em específico no capítulo intitulado Uma forma patológica de amar: O vínculo tantalizante, uma temática de grande relevância, no que se refere aos vínculos constituídos em forma de relacionamentos amorosos. Ao caracterizar-se os participantes desse vínculo amoroso, identifica-se dois personagens, um é o Dominador-sedutor, e o outro é o Dominado-seduzido. Na maioria das vezes, o homem assume o primeiro papel, enquanto a mulher assume o segundo. No entanto, também existem casos em que os papéis se invertem.

Zimerman, confere uma série de características pertinentes a esses dois personagens. Características essas que conotam uma forma patológica de amar, uma vez que percebe-se os sofrimentos decorrentes de tal configuração amorosa. O indivíduo que se encontra na posição de Dominador-sedutor é aquele que detém o poder/posse sobre o outro, das mais variadas maneiras, objetivando ser a “coisa” mais importante para seu parceiro, instituindo uma dependência, provocando assim a sensação de que o outro não consegue viver sem ele. Já o sujeito que ocupa o lugar de Dominado-seduzido é o inferiorizado da relação, sempre se comportando de forma submissa, encontrando-se na maior parte do tempo rendido, curvado e suplantado, ao seu dono Dominador.

Fonte: http://zip.net/bntHxf

Nota-se que há uma complementação de um com o outro, visto que o Dominador encontra no Dominado aquilo que ele precisa, e vice-versa, o que de acordo com Zimerman torna a separação tão complicado e sofredora para ambos. O autor divide o Vínculo amoroso tantalizante em quatro partes, sendo elas: Domínio, Apoderamento, Sedução, e Tantalizante. É importante destacar que as quatro partes existem e se concretizam concomitantemente nesse tipo de relacionamento.

O Domínio acontece quando o Dominado “Exerce uma apropriação, quase indébita, através de uma desapropriação dos bens afetivos e de uma violência a liberdade do outro” (ZIMERMAN, 2003, p. 335 ). O Sedutor possui a necessidade de exercer poder sobre o Seduzido, e para isso ele usa de variados recursos que possam torná-lo grande e poderoso. A dominação pode ser de caráter intelectual, moral, econômico, político, religioso, afetivo (ZIMERMAN, 2003).

O Dominador não permite que o outro tenha autonomia e escolhas próprias e diferentes das suas, já que isso seria considerado uma perda do controle que ele exerce sobre o Dominado. Vale ressaltar que o Sedutor também usa de marcações no corpo do outro, percebidas em forma de chupões e arranhões, como forma de determinar seu poder/controle sobre seu parceiro. Quando o Seduzido curva-se a esse poder e controle, consequentemente sente-se subjugado e minimizado.

Fonte: http://zip.net/bftHsY

O Apoderamento é descrito pelo autor como sendo um “Poder e posse total em relação ao corpo, mente e espírito do outro” (ZIMERMAN, 2003, p. 335 ). De acordo com David E. Zimerman, o Dominador vê nessa atitude de posse, o único meio para conseguir o respeito e amor do outro, uma vez que na realidade ele sente medo de se encontrar desamparado em algum momento.

A Sedução consiste em uma das técnicas mais intensas usadas pelo Dominador-sedutor, com o objetivo de despertar no Seduzido uma espécie de fascinação e encantamento, fazendo com que o Dominado veja o Dominador como o “objeto” mais almejado e incrível que alguém poderia ter. Promete-se, “ (…) uma completude paradisíaca, que em pouco tempo se revelará como não mais do que ilusória e pelo contrário, se concretizará, como um emaranhado círculo vicioso de sucessivas decepções e renovadas ilusões (…)” (ZIMERMAN, 2003, p. 336 ).

A última parte que caracteriza esse vínculo adoecido, chamada de Tantalizante, pode ser explicada no seguinte excerto, “ Aquele que tantaliza, isto é, que espicaça ou atormenta com alguma coisa que, apresentada à vista, excite o desejo de possuí-la, frustrando-se este desejo continuamente por se manter o objeto fora de alcance, à maneira do suplício de tântalo. ” (ZIMERMAN, 2003, p. 337). É necessário explicitar aqui, que a escolha desse termo provém do Mito Grego de Tântalo, no qual Tântalo, por ter roubado o manjar dos deuses, foi castigado por eles, sendo acorrentado imerso nas águas de  um lago, sem conseguir se alimentar e beber, uma vez que às águas do lago trazem a comida, no entanto Tântalo nunca consegue alcança-la, consistindo-se num sofrimento eterno.

Fonte: http://zip.net/bjtHtk

A relação análoga entre o mito e a forma patológica de amar, é vista quando há esse constante “dar e tirar” por parte do Dominador, que sempre se coloca em posição de impedimento em assumir um relacionamento estável, acontecendo assim periódicos términos e reaproximações, provocando um constante sofrimento, comparado ao mito de Tântalo que nunca consegue obter o que deseja. Contudo, David E. Zimerman, traz ainda em seu livro que para haver uma dissolução dessa relação adoecida e desses papéis adoecidos, é de suma importância que ambos os personagens, passem por tratamento psicológico, indicado por ele, como preferencialmente de cunho psicanalítico.

REFERÊNCIAS:

ZIMERMAN, David. Manual de Técnica Psicanalítica. Editora: Artmed,  2003

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Florbela Espanca: “Deixa dizer-te os lindos versos raros que foram feitos pra te endoidecer!”

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Fonte: revistacult.uol.com.br

Aquela que passou a vida a procurar um verso deixou a nós inúmeros poemas. Florbela Espanca nasceu em Vila Viçosa-Alentejo, em Portugal, em 8 de dezembro de 1894. Filha ilegítima de João Maria Espanca e de Antonia da Conceição Lobo foi educada pela madrasta e pelo pai. Realizou estudos no Liceu em Évora e fez o curso de Direito na Universidade de Lisboa.

Florbela Espanca foi casada três vezes! Em 1913 casou-se em Évora com Alberto de Jesus Silva Moutinho, seu colega da escola. A primeira seleção de seus poemas está datada de 1916, em que reuniu sua produção poética elaborada desde 1915 e deu início ao projeto Trocando Olhares.Foram coletados oitenta e cinco poemas e três contos. Um ano mais tarde, como consequência de um aborto involuntário, a escritora teve infetados os ovários e os pulmões. Por causa disso, precisou repousar em Quelfes (Olhão), onde apresentou os primeiros sinais sérios de neurose.

Em 1919, o livro de sonetos Livro de Mágoas teve uma tiragem de duzentos exemplares que se esgotou rapidamente. No ano seguinte, sendo ainda casada, a escritora passou a viver com António José Marques Guimarães, alferes de Artilharia da Guarda Republicana. O casamento entre eles só pôde ser realizado em 1921.

A segunda coletânea de seus sonetos, o Livro de Sóror Saudade, saiu em 1923 em uma edição paga por seu pai. Nesta época, residindo em Lisboa, Florbela começou a dar aulas particulares de português para sobreviver. Em 1925, divorciou-se pela segunda vez e casou-se com o médico Mário Pereira Lage, que conhecia desde 1921 e com quem vivia desde 1924.

Em 1927, Florbela Espanca começou a colaborar no Jornal D. Nuno de Vila Viçosa. Naquela época procurava um editor para a coletânea Charneca em Flor, enquanto preparava um volume de contos, O Dominó Preto, publicado postumamente apenas em 1982. Ainda neste ano, a morte de seu irmão, Apeles Espanca, em um acidente de avião, foi devastadora para a autora. A poetisa tentou o suicídio pela primeira vez em 1928, quando teve agravada sua doença mental. Em homenagem ao irmão, escreveu os contos que compõem As Máscaras do Destino, que fora publicado postumamente.

Em outubro e novembro de 1930, Florbela tentou o suicídio duas vezes, na véspera da publicação da sua obra-prima, Charneca em Flor. Após o diagnóstico de um edema pulmonar, a poetisa perdeu definitivamente a vontade de viver. Não resistiu à terceira tentativa do suicídio e morreu em decorrência de suicídio por barbitúricos, em 1930, no dia de seu aniversário, com apenas 36 anos.

Segundo estudiosos de sua obra, ela deixou uma carta confidencial com seus últimos desejos, entre eles para que fossem colocados no seu caixão os restos do avião pilotado por Apeles quando sofreu o acidente. O corpo dela está, desde 17 de Maio de 1964, no cemitério de Vila Viçosa, a sua terra natal.

O poema Eu não abre o Livro de Mágoas, mas tem características de autobiográfica, da dor que a poetisa sofria:

Eu

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada… a dolorida…

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…

Sou aquela que passa e ninguém vê…
Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber porquê…

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!

A vida da autora pode ser resumida como uma vida cheia de amores, mas que nenhum deles fosse o “certo”. Neste poema, por exemplo, percebemos a presença do amor predestinado, do príncipe encantado que deveria encontrá-la e que nunca a encontrou. A última estrofe (ou terceto) é, talvez o que melhor resuma a vida amorosa de Florbela Espanca. Uma vida cheia de amores, sem que nenhum fosse o certo.

Em História da Literatura Portuguesa, António José Saraiva e Óscar Lopes (2000, p. 967) descrevem Florbela Espanca como sonetista de “laivos anterianos”1 e “uma das mais notáveis personalidades líricas isoladas, pela intensidade de um emotivo erotismo feminino, sem precedentes entre nós [portugueses], com tonalidades ora egoístas ora de uma sublimada abnegação que ainda lembra Sóror Mariana2, ora de uma expansão de amor intenso e instável […]”. E acrescentam que a obra da Florbela “precede de longe e estimula um mais recente movimento de emancipação literária da mulher, exprimindo nos seus acentos mais patéticos a imensa frustração feminina das […] opressivas tradições patriarcais”. Amar é um exemplo disso:

Amar!

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui… além…
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar!Amar!E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!…
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder… pra me encontrar…

A poesia de Florbela Espanca é caracterizada por um forte teor confessional. A poetisa não se sentia atraída por causas sociais, preferindo exprimir em seus poemas, os acontecimentos que diziam respeito à sua condição sentimental. Não fez parte de nenhum movimento literário, embora seu estilo lembrasse muito os poetas do romantismo.

Rolando Galvão, autor do artigo sobre Florbela Espanca publicado na página eletrônica Vidas Lusófonas, lembra a correspondência da poetisa com o irmão, Apeles, e com uma amiga próxima, que apenas viu em retrato. O autor do artigo ressalta os excessos verbais da escritora, provocados, segundo ele, pela sua imoderação para exprimir uma paixão. A sua exaltação do amor fraternal também é considerada fora do comum. Galvão repara que esses limites alargados na expressão do amor, da amizade e das afeições, são na obra florbeliana uma constante.

Outro aspecto bastante discutido acerca da poética de Florbela Espanca é o erotismo. Na maioria de suas obras Florbela Espanca retrata a sensualidade, o confidencial, a feminilidade e a erotização, uma vez que, através destas temáticas, a autora buscou a emancipação literária da mulher e ousou levar ainda mais longe o erotismo feminino . Sua produção é envolvida por sugestões advindas pelo uso das reticências. Um exemplo está no poema Se tu viesses ver-me hoje à tardinha:

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços…

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca… o eco dos teus passos…
O teu riso de fonte… os teus abraços…
Os teus beijos… a tua mão na minha…

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca…
Quando os olhos se me cerram de desejo…
E os meus braços se estendem para ti…

A primeira estrofe do poema “Se tu viesses ver-me hoje à tardinha”, há a presença de um desejo direcionado a alguém que certamente não estivesse disponível no sentido de não completar ou satisfazer suas expectativas amorosas. Na segunda estrofe surge a confissão de momentos de amor vivenciados, descrevendo detalhadamente situações amorosas, permanecendo apenas a saudade. Também é perceptível o erotismo na terceira estrofe, em que a poetisa retrata uma relação de elementos sensuais como beijo, seda vermelha, canto e riso. Além disso, o vermelho é um elemento de tradução do erotismo.

Outro aspecto que vai mostrar a presença do erotismo é a expressão “linda e louca” presente no primeiro verso desta estrofe, trazendo a ideia de uma mulher loucamente apaixonada que se sente linda aos olhos do objeto desejado. Na última estrofe o erótico é intensificado nos termos “sol” e “desejo”. Florbela Espanca deixa a nós leitores saudade sim… talvez… e por que não?

Saudades! Sim.. talvez.. e por que não?…
Se o sonho foi tão alto e forte
Que pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?… Ah, como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como o pão.

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar
Mais decididamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais saudade andasse presa a mim!

Convido vocês a ouvirem os poemas de Florbela Espanca recitados por Miguel Falabela. O áudio está no sítio: <http://www.prahoje.com.br/florbela/?p=247>. Não se esqueçam de nos dizer se gostaram.

Referências:

ESPANCA, Florbela. Poemas de Florbela Espanca. Edição preparada pó Maria Lúcia Dal Farra. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

____. Sonetos Completos. 7. ed. Prefácio de José Régio. Coimbra: Livraria Gonçalves, 1946.

____. As Máscaras do Destino. 4. ed. Prefácio de Agustina Besa Luís. Amadora: Bertrand Editora, 1982.

____. Contos Completos. 2. ed. Venda Nova: Bertrand Editora, 1995.

____. Obras Completas de Florbela Espanca, Lisboa: Publicações D. Quixote, 1992.

____. Obras Completas – Poesia (1903 – 1917). Coleção Obras Completas de Florbela Espanca. Vol. I. Lisboa: Publicações D. Quixote, 1985.

____. Poesia Completa. Prefácio, organização e notas de Rui Guedes. Coleção Autores de Língua Portuguesa – Poesia. Venda Nova: Bertrand Editora,1994.

____. Sonetos. Prefácio de José Régio. Lisboa: Bertrand Editora, 1982.

FARRA, Maria Lúcia Dal. Afinado desconcerto (contos, cartas, diário). São Paulo: Iluminuras, 2001.

____. Florbela Espanca. Rio de Janeiro: Agir Editora, 1994.

____. “Florbela inaugural”. Literatura portuguesa Aquém-Mar, Annie Gisele Fernandes e Paulo Motta Oliveira, pp. 197–211. Campinas: Editora Komedi, 2005.

____. “Florbela: um caso feminino e poético”. Poemas de Florbela Espanca. São Paulo: Martins Fontes, 1996, pp. V-LXI.

Notas:

1 Uma referência ao poeta português Antero de Quental.
2 Sóror Maria Alcoforado. Qualquer dia desses, contarei a vocês sobre a produção das cartas de amor desta freira portuguesa a um oficial francês…

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Acolher, cuidar e amar: a transformação do CAPS em lar

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O Centro de Atenção Psicossocial de Paraíso do Tocantins, cidade localizada a 60 km da capital Palmas, lembra mais uma residência habitada por enorme família que compartilha junto as alegrias e aflições do mundo contemporâneo. Seja pela forma como as coisas são coordenadas por ali, seja pela arquitetura e atmosfera residencial que o prédio da instituição carrega, reforçadas pelas enormes mangueiras e também pelo conjunto de residências ligadas a instituição.

O Centro abriga aproximadamente 165 usuários – Foto: Victor Hugo Morais

Se todo lar precisa de alguém para colocá-lo em ordem, nesta pequena casa, que acolhe aproximadamente 165 usuários, a coordenadora Lucimar Mota Alves assume este papel. Desde 2005, ela coordena o CAPS de Paraíso, de acordo com a mesma, “com disponibilidade, dedicação e muito esforço”.

Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário Luterano de Palmas – Ceulp/Ulbra, e atualmente, estudante de Pós-Graduação no Instituto Brasileiro de Educação e Cultura – IBEC, especialização em Saúde Pública, a coordenadora recebeu a equipe do portal Encena nas dependências do CAPS para falar sobre responsabilidade de administrar o centro destinado a pessoas com problemas relacionados a saúde mental.

(En)Cena – Para entender melhor como é coordenar o CAPS voltaremos exatamente quando tudo começou. Relembre para nós como se deu seu ingresso frente à coordenação da instituição e quais foram suas impressões iniciais acerca da administração de centro psicossocial?

Lucimar – A título de curiosidade comecei a trabalhar no CAPS em outubro de 2004, como enfermeira. Foi somente em janeiro de 2005 que assumi a coordenação do centro, a convite da Secretaria Municipal de Saúde que acreditou em minha capacidade. É evidente que todo novo trabalho gera ansiedade, medo e incertezas, aliás coordenar é um grande desafio, pois não só a saúde mental, mais qualquer outro tipo de particularidade médica exige responsabilidade, compromisso, seriedade, ética e profissionalismo.

 

(En)Cena – E quais foram seus primeiros passos na coordenação da instituição?

Lucimar – De imediato foi elaborado relatório situacional da instituição e encaminhado a Secretaria municipal de saúde para que as autoridades competentes observassem as condições reais do centro no momento em que assumi. Na época, a instituição funcionava normalmente, com isso dei continuidade no serviço que já vinha sendo prestado.

(En)Cena – Tecnicamente o que é coordenar o CAPS?

Lucimar – (risos) Bem eu planejo, estabeleço algumas metas, delego algumas competências e faço avaliações dos serviços prestados, tudo isso com disponibilidade, dedicação e muito esforço.

(En)Cena – A luta pela saúde mental dos usuários da instituição é maior do que as competências estabelecidas para quem coordena?

Lucimar – Com certeza. Não é o simples dever de trabalhar e cumprir horário. É trabalhar com amor e dedicação. É contribuir para que o usuário tenha condições iguais a de qualquer outro indivíduo e ser visto como um cidadão.

(En)Cena – E quais são as pessoas que te auxiliam nesta luta diária?

Lucimar – Ao todo são 19 funcionários que colaboram pela manutenção do serviço, sendo 11 do setor administrativo, com funções que vão de auxiliares administrativos a vigiais, e, oito da parte técnica voltada à assistência psicossocial como psicólogo, farmacêutico, médicos, assistente social entre outros. Minha relação com eles é a mais estreita possível, aliás trabalhamos com os mesmos objetivos. Além disso, tenho em mente que é preciso saber cultivar boa relação a partir da troca de experiências e de vínculos afetivos. Implica ainda na capacidade de sensibilizar-se na partilha do sofrimento e de garantir atendimento de qualidade ao usuário.

Graduada em enfermagem, Lucimar coordena o CAPS de Paraíso desde 2005

Foto: Victor Hugo Morais

(En)Cena – O time é completo?

Lucimar – Não, no momento o centro possui demanda de um psicólogo e um terapeuta ocupacional. Mas já foram tomadas as medidas cabíveis para resolver esta situação.

(En)Cena –  Mas exatamente qual é essa luta?

Lucimar – O CAPS de Paraíso é classificado com CAPS I, sendo preconizado pelo Ministério da Saúde a atender municípios de 20 mil a 70 mil habitantes com capacidade para acolher 165 usuários. O atendimento é dividido em três modalidades, sendo 25 no sistema intensivo, 50 no sistema semi-intensivo e 90 no sistema não intensivo. Os usuários são pessoas que apresentam intenso sofrimento psíquico, impossibilitados de entender a realidade e realizar projetos de vida. Por outro lado, não atendemos somente a cidade de Paraíso, mas também 15 cidades circunvizinhas, o que consequentemente aumenta a demanda de usuários.

 

(En)Cena – Qual é a demanda de pacientes que apresentam problemas relacionados a saúde mental em toda essa região?

Lucimar – Estima-se que 15% da população destas 16 cidades apresentam problemas relacionados à saúde mental. Inclusive revelo a vocês que estamos caminhando rumo ao CAPS II devido a grande demanda reprimida.

 

(En)Cena – E a instituição possui recursos suficientes para suprir todo o serviço psicossocial estabelecido?

Lucimar – Sim. A instituição possui recursos suficientes.

(En)Cena – Você tem esta afirmação por que também coordena o recurso?

Lucimar – Na verdade eu não administro os recursos destinados ao CAPS. Falo isso devido ao fato que sempre que solicitadas, as verbas são repassadas pela Secretaria municipal de saúde, responsável pela coordenação do recurso oriundos do Ministério  da Saúde, através de laudos emitidos a partir das APAC’s – Autorizações para procedimentos de Alta complexidade. Sempre encaminho ofícios de solicitação, atendidos frequentemente pela pasta.

 

(En)Cena – Qual o atendimento dado ao paciente do CAPS de Paraíso?

Lucimar – Quando uma pessoa é atendida no CAPS, ela tem acesso a vários recursos terapêuticos, atendimento individual, em grupo, medicamentoso, atendimento a família, oficinas terapêuticas e atividades comunitárias, também não esquecendo atividades prática como processo de humanização, responsabilidade e compreensão. Damos atendimento com competência e tolerância.

(En)Cena – E quanto ao controle dos medicamentos oferecidos na Instituição. Como se dá?

Lucimar – A necessidade de medicação de cada usuário do CAPS deve ser avaliada constantemente com os profissionais do serviço. O CAPS organiza a rotina de distribuição de medicamentos e determina a família como responsável quanto à administração dessa medicação no que tange seu consumo pelo usuário. Os medicamentos são enviados constantemente pela Secretária de saúde.

 

(En)Cena – Há políticas voltadas também para o acompanhamento das famílias dos usuários?

Lucimar – É sabido que não somente o usuário precisa de atendimento, mas a família também necessita, pois ela adoece junto. É preciso que tenhamos uma atenção especial às famílias fragilizadas, que muitas vezes não encontram-se preparados para lidar com parente  que apresenta transtorno mental. Membros da equipe técnica como assistentes sociais e psicólogos, além de outros profissionais, realizam visitas domiciliares a fim de acompanharem as condições tanto financeiras como emocionais, seja do usuário ou de seus familiares. As visitas são relatadas no prontuário do paciente e também registrada no livro de visitas.

(En)Cena – Lucimar é sabido também que os CAPS devem atuar na tentativa de reinserção social de seus pacientes. Como é feito este trabalho?

Lucimar – A reinserção social dos pacientes se dá a partir de diversas atividades, dentre elas o acesso ao trabalho. São realizadas oficinas de artesanato, onde usuários produzem produtos que posteriormente são vendidos ou apresentados em exposições. Fazemos exercícios dos direitos civis e, atuamos no fortalecimento dos laços familiares e comunitários. Além disso, realizamos o projeto Mostra de Cinema do CAPS que se encontra em sua 8ª edição, onde são apresentados filmes relacionados a saúde mental com efetiva participação da comunidade.

 

(En)Cena – Qual sua opinião acerca dessa aceitação social, ou seja, a população acolhe bem tanto o programa quanto o usuário?

Lucimar – Acredito que a população tem uma boa aceitação, pois quando levamos os projetos do CAPS para fora da Instituição somos bem recebidos. Afinal, a instituição tem reconhecimento, pois atua no alivio e amenização do sofrimento dos que ali buscam atendimentos.

(En)Cena – Quais são os parceiros do CAPS?

Lucimar – O centro tem como parceiros a Secretaria Municipal de Saúde, o Colégio Supremo, a Universidade Luterana Brasileira – Ulbra, Ruraltins, Frango Norte e demais entidades. Os apoios vão de ajuda em projetos desenvolvidos pelo centro à doação de alimentos, além da disponibilidade de estagiários para auxílio nos serviços desenvolvidos.

(En)Cena – Para finalizar vamos falar de futuro. Quais são seus próximos projetos ou planos para a instituição?

Lucimar – Atualmente, nós trabalhamos para a concretização da ampliação da estrutura física da unidade, visando oferecer à toda região o CAPS II. Paralelo a isso, busca-se a aquisição de mais profissionais a fim de atender com qualidade e prontidão toda a demanda existente.


Nota: texto originalmente publicado na Revista Laboratorio EU – www.revistaeu.blogspot.com – , do curso de Jornalismo do CEULP/ULBRA vinculada à disciplina de Produção Jornalística II – Revista orientada pela professora Jocyelma Santana.

 

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