Viktor Emil Frankl: uma biografia em busca de sentido

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Viktor Frankl nasceu em Viena (Áustria), no dia 26 de março de 1905, em berço judaico, sua família já contava com duas irmãs, seu pai era funcionário público, classe média alta, família vivia uma vida confortável até a chegada da Primeira Guerra Mundial, em 1914, que, assim como outras famílias judias mergulharam na pobreza e passaram depender de esmolas.

Aos 16 anos, enquanto fazia o ensino médio, em meados de 1920, Frankl se mostrava interessado nos estudos da Filosofia e Psicologia ministrou sua primeira palestra com o tema “O sentido da Vida” para o partido socialidade na Universidade Popular de Viena. Nessa mesma época, escreveu seu trabalho de conclusão de ensino médio, sobre a Psicologia do Pensamento Filosófico, publicado em 1923, nisso, começa a se corresponder com o famoso psicanalista Sigmund Freud que não só gosta muito do que lê, como o encoraja a continuar suas pesquisas e estudos.  

Em 1924, cursando o curso de medicina foi presidente do Partido Jovem Trabalhadores Comunistas, onde era membro ainda no ensino médio. Por seu envolvimento político, optou em ficar na Áustria mesmo com a invasão alemã na Segunda Guerra. Aos 19 (dezenove) anos, como estudante de medicina começa a estudar sobre casos de depressão e suicídio, com isso, publica seu primeiro artigo científico na revista International Journal of Individual Psychology. 

Fonte: encurtador.com.br/dopxF

Durante o seu egresso na Medicina desenvolvia lado a lado projetos como a prevenção ao suicídio para jovens estudantes e sempre ligando a filosofia e a psicologia, relacionando-os a vida e seus valores. Em 1926, em um congresso, fala pela primeira vez sobre Logoterapia, que segundo Frankl, seria a terapia focada em buscar o sentido da vida. Em seu livro “Em busca de Sentido” diz que: a logoterapia se concentra mais no futuro, ou seja, nos sentidos a serem realizados pelo paciente em seu futuro. (A logoterapia é, de fato, uma psicoterapia centrada no sentido.) Ao mesmo tempo a logoterapia tira do foco de atenção todas aquelas formações tipo círculo vicioso e mecanismos retro-alimentadores que desempenham papel tão importante na criação de neuroses. Assim é quebrado o autocentrismo (self center edness) típico do neurótico, ao invés de se fomentá-lo e reforçá-lo constantemente. Obviamente esta formulação simplifica demais as coisas; mesmo assim a logoterapia de fato confronta o paciente com o sentido de sua vida e o reorienta para o mesmo. E torná-lo consciente desse sentido pode contribuir em muito para a sua capacidade de superar a neurose (FRANKL, 1985, p. 68).

Para Viktor Frankl, o homem fica de forma centralizada, podendo ser interpretado como o resultado de um conjunto entre o corpóreo, o psíquico e o espiritual, tendo como impulso primário aquilo que chamou de “vontade de sentido”, ou seja, uma disposição a descobrir o sentido da vida, podendo ser encontrado em diversos campos como: a finalização de um trabalho/obra, no amor a si mesmo ou ao outro, na fé, enfim, sentidos diversos e singulares.

Sobre a Vontade de Sentindo, Frankl diz: a busca do indivíduo por um sentido é a motivação primária em sua vida, e não uma “racionalização secundária” de impulsos instintivos. Esse sentido é exclusivo e específico, uma vez que precisa e pode ser cumprido somente por aquela determinada pessoa. Somente então esse sentido assume uma importância que satisfará sua própria vontade de sentido. Alguns autores sustentam que sentidos e valores são “nada mais que mecanismos de defesa, formações reativas e sublimações”. Mas, pelo que toca a mim, eu não estaria disposto a viver em função dos meus “mecanismos de defesa”. Nem tampouco estaria pronto a morrer simplesmente por amor às minhas “formações reativas”. O que acontece, porém, é que o ser humano é capaz de viver e até de morrer por seus ideais e valores! (FRANKL,1985, p. 69).

Fonte: encurtador.com.br/cfFY8

Viktor Frankl fala sobre a Frustração Existencial: a vontade de sentido também pode ser frustrada; neste caso a logoterapia fala de “frustração existencial”. O termo “existencial” pode ser usado de três maneiras: referindo-se (1) à existência em si mesma, isto é, ao modo especificamente humano de ser; (2) ao sentido da existência; (3) à busca por um sentido concreto na existência pessoal, ou seja, à vontade de sentido (FRANKL,1985, p. 70).

O sentido da vida é algo a ser descoberto por cada indivíduo com impulsos primários ao longo da sua jornada, buscando encontrar respostas a suas vivencias diárias e colocando significados norteadores profundos. A Logoteria tem como tarefa ou objetivo principal ajudar o paciente a encontrar sentido em sua vida.

Em 1930, Viktor Frankl começou a ser conhecido e reconhecido em toda Europa como um homem à frente do seu tempo com 25 anos, no corrente ano, resolve fazer residência em neurologia e psiquiatria, nisso, assume uma ala conhecida por pavilhão do suicídio num hospital psiquiátrico em Viena (entre 1933 e 1937), ajudando a prevenir casos de suicídio feminino.

Em 1938, atendia em seu consultório de neurologia e psiquiatria era reconhecido como o criador do novo método de tratamento terapêutico, baseado em preencher o vazio existencial, mas teve que fechar depois do exército nazista anexar a Áustria. Nessa época, tornou-se chefe do Vienna’s Rothschild Hospital e Salva milhares de judeus da morte recusando-se a recomendar eutanásia aos pacientes com doenças mentais.

Fonte: encurtador.com.br/egKU2

Tilly Grosser, recém esposa de Viktor Frankl é obrigada a abortar o seu primeiro filho pelas tropas nazistas. Em 1942, seus pais, irmãs, esposa e ele próprio são encaminhados aos campos de concentração Theresienstadt e Auschwitz. Morrem: o pai e a esposa de exaustão, a mãe enviada à câmara de gás. A irmã sobrevive e foi refugiada na Itália.

Em 1945, acaba a Segunda Guerra e Viktor é libertado após três anos de trabalho forçado e condições sub-humanas. No mesmo ano, retornou para Viena e se tornou o chefe do departamento de Neurologia da General Polyclinic Hospital, escreveu suas ideias no livro “Em Busca de Sentido” em nove dias e lança em 1946. Casou-se novamente, teve uma filha, obteve o título de doutor em filosofia, tornou-se professor na Universidade de Viena (na qual permaneceu até 1990) e em outras universidades americanas, fundou e presidiu a Sociedade Austríaca de Medicina Psicoterapêutica.

Em 1992 foi fundado um instituto em Viena que carrega o seu nome (The Viktor Frankl Institute), considerada a terceira escola vienense, depois de Sigmund Freud e Alfred Adler e recebeu mais de 25 títulos honorários pelas suas ideias inovadoras e legado eterno transmitido em suas obras: Um sentido para a vida: Psicoterapia e humanismo, A vontade de sentido: fundamentos e aplicações da logoterapia, entre outros.

Em 02 de setembro de 1997, faleceu aos 92 anos, sendo vítima de colapso cardíaco.

REFERÊNCIAS

AQUINO, T. A. V. Viktor Frankl: Para Além de suas memórias. Rev. abordagem gestalt. [online]. 2020, vol.26, n.2, pp. 232-240. ISSN 1809-6867. Disponível em: http://dx.doi.org/10.18065/2020v26n2.10. Acesso em: 22 de abril de 2021.

FRANKL. V. E. Em Busca de Sentido. Edição Norte Americana – de 1985. Disponível em: < https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/58/o/Em_Busca_de_Sentido_-_Viktor_Frankl.pdf>  Acesso em: 20 de abril de 2021.

OLIVEIRA, K. G. O sentido da vida, a religiosidade e os valores na cultura surda. (Dissertação de Mestrado). João Pessoa-PB, 2013. Disponível em: https://repositorio.ufpb.br/jspui/bitstream/tede/4239/1/arquivototal.pdf Acesso em: 23 de abril de 2021.

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CAOS2019: “A busca feminina pelo corpo sarado”

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Psicóloga fez ricas pontuações sobre corpo, meio social e como a interação desses dois aspectos estão relacionados

Como parte da programação do CAOS 2019, ocorreu na tarde desta quinta-feira (23), na sala 223 do Ceulp/Ulbra, as sessões técnicas do Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia – Caos. O trabalho apresentado por Tainá Bernardes, psicóloga formada pelo Ceulp/Ulbra, teve como tema “A busca feminina pelo corpo sarado” e teve como orientadores a professora Doutora Irenides Teixeira, Fabiano Fagundes e Pierre Brandão.

Em sua pesquisa, a psicóloga fez ricas pontuações sobre corpo, meio social e como a interação desses dois aspectos estão relacionados. Tainá ressaltou que a mídia tem uma função muito parecida com a de um espelho, pois reflete a educação cultural e social dos indivíduos.

fonte: https://bit.ly/2wgLXN6

Com a autorização das donas, a Psicóloga analisou dois perfis do Instagram, com as seguintes características: duas mulheres, fisiculturistas, que concorriam na mesma modalidade. A partir dessa análise, ela percebeu que o corpo vem sofrendo  uma objetificação que se torna digna de investimento pessoal. Esses aspectos estão envoltos pela a era do consumismo e das influências midiáticas.

Para finalizar, ela trouxe a conceituação de Guy Debord sobre a sociedade do espetáculo, essa exposição midiática utiliza a representação como instrumento de manipulação dos sujeitos. Portanto, o corpo volta a ser cultuado e exposto nas mídias a partir das referências e significações subjetivas.

 

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O Regresso: a longa jornada em busca de vingança

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Lançado em 2015, The Revenant (no original) é um filme de drama / thriller parcialmente baseado no livro de Michael Punke que conta a história real de Hugh Glass, sendo escrito e dirigido por Alejandro González Iñárritu (indicado ao Oscar por Birdman ou A Inesperada Virtude da Ignorância) e com a colaboração de Mark L. Smith (Temos Vagas). O longa recebeu vários prêmios e indicações como o Oscar de melhor ator para Leonardo DiCaprio, Oscar de Melhor Fotografia, Oscar de Melhor Diretor, Prêmio Globo de Ouro: Melhor Filme Dramático, entre outros prêmios.

O filme se passa durante o século XIX no período conhecido como “Marcha para o Oeste’’. Durante esse tempo, os americanos eram incentivados através da Lei de Terras ou Lei do Homestead de 1862, a migrarem em direção ao “far West” até então desconhecido que gerava várias fantasias (como o cowboy, o sheriff, os conflitos com os indígenas, bandidos e sequestradores, as linhas férreas e entre outros) e questionamentos por parte dos cidadãos da época.

Ao longo do filme, os espectadores são apresentados à Hugh Glass (Leonardo DiCaprio, de  O Lobo de Wall Street) um homem simples que aparenta  ter um bom relacionamento com os índios Pawnee sendo casado com uma índia com quem tem um filho chamado Hawk ( Forrest Goodluck, em seu primeiro longa). Após a morte da esposa, Glass e o filho trabalham como guias ao longo do território dos Arikaras no Rio Missouri  para a “ Companhia de Peles Montanhas Rochosas ’’ . No entanto , após uma caçada bem sucedida a equipe dirigida pelo capitão Andrew Henry (Domhnall Gleeson, de Ex-Machina: Instinto Artificial) sofre um ataque dos índios Arikaras em uma das cenas que apresenta maior ação durante o filme , além de ser o primeiro contato do público com os outros personagens.

Fonte: https://bit.ly/2WEFBSY

Após o incidente, o grupo foge pelo rio e contra a vontade de John  Fitzgerald (Tom Hardy , de Mad Max : Estrada da Fúria) abandonam o barco deixando escondido em algumas pedras as peles que conseguiram levar . Depois de algum tempo , Hugh se ausenta do acampamento para caçar, até que é surpreendido pelo ataque de uma ursa que estava com os dois filhotes ,protagonizando uma das cenas mais realistas e fortes da obra ( neste momento a câmera se posiciona próxima ao rosto de DiCaprio para dar a sensação ao espectador de estar “ dentro do filme”).

Logo após o ocorrido Glass é socorrido por Jim Bridger (Will Poulter , de Maze Runner : Correr ou Morrer ) e os outros ficando gravemente ferido . Dessa forma ,o capitão Henry oferece uma recompensa de US$ 100,00  para aqueles que cuidassem de Hugh e o levassem para o forte ou dar a ele um enterro digno. Bridger, Hawk e Fitzgerald ( que só aceita o tratado após a desistência da recompensa pelos outros ) decidem  ficar  para cuidar do ferido , no entanto John demonstra ser  cruel  ao assassinar Hawk na frente de Glass , que estava impossibilitado de se movimentar e falar , deixando-o a própria sorte após enganar Jim afirmando que os Arikaras se aproximavam.

É nesta parte que o público pode compreender as motivações que fazem Hugh Glass se levantar e iniciar uma longa jornada em busca de vingança pela morte do filho e do próprio abandono no estado em que se encontrava. Ele acaba enfrentando dificuldades relacionadas aos ferimentos e à Natureza, que ganha um grande destaque com belas imagens feitas sem recursos artificiais para a iluminação através das lentes do diretor de fotografia Emmanuel Lubezki (Gravidade e Birdman) combinado com a bela e suave trilha sonora de Ryuichi Sakamoto (vencedor do Oscar com o longa O último imperador ) que se faz presente nos momentos certos , além da edição feita por Stephen Mirrione (Traffic) que consegue unir as personagens e a natureza sem se tornar algo muito artificial.

Enquanto Glass tenta se recuperar , Fitzgerald e Bridger percorrem o caminho até o forte (com o segundo apresentando vários remorsos ao longo do trajeto , incluindo conflitos com John) durante esse percurso o público consegue perceber que John Fitzgerald não é um “ vilão’’ comum , ele é apresentado como um homem com problemas, medos e receios tornando-se em algumas partes um indivíduo mais complexo do que o protagonista , já que seus objetivos não possuem tanta “clareza” como os de Glass ou outros personagens como o capitão Andrew Henry.

Fonte: https://bit.ly/2COjRMW

Outros personagens que apresentam um lado complexo no filme, são os indígenas que mostram os desafios e os conflitos que eles passam ao longo do enredo. Relações com a natureza e com os exploradores são frequentemente abordadas  como a busca de um chefe por sua filha, os vários vilarejos destruídos por guardas do governo ( inclusive é dessa maneira que a esposa de Glass é assassinada, ela e seu povo sofrem ataques dos guardas, sobrevivendo apenas Hugh e o filho ), há também uma cena onde uma mulher indígena é violentada por um explorador, porém o protagonista consegue ajuda-la enquanto foge com os cavalos deixando cair o cantil que mais tarde será de grande importância para o enredo .

Após a chegada de um explorador francês no forte, que pedia por socorro e comida, o grupo do capitão Henry faz uma descoberta decisiva encontrando o cantil de Glass junto ao francês indicando que ele estaria vivo, já que ele havia sido enterrado com o objeto em uma localidade distante do forte. É durante esse momento que, Fitzgerald foge assaltando o cofre de Andrew enquanto o grupo inicia uma expedição para encontrar o protagonista. Logo depois do relato sobre sua jornada, Hugh e henry se preparam para perseguir John e realizar suas vinganças, entretanto o capitão encontra o antagonista primeiro restando apenas um embate final entre Hugh Glass e John Fitzgerald.

O longa recebeu várias críticas positivas ressaltando a beleza dos cenários, que tiveram como locações para  as filmagens  o Canadá e a Argentina, a trilha sonora que mesmo nos momentos de maior tensão apresenta uma melodia calma e tranquila , o processo de maquiagem que recebeu vários elogios da crítica especializada e do público, além das performances dos atores recebendo destaque para Leonardo DiCaprio , pois na maior parte do tempo Glass devido o acidente não consegue falar ou se movimentar , sendo de grande importância os gestos e feições para a compreensão do estado de Hugh. Outro que merece destaque, é Tom Hardy que não apresenta “apenas um vilão” , mas um homem complexo cercado de medos , receios e desconfianças . A direção também apresenta  seus créditos,  se em Birdman  Iñárritu mostra uma jornada de sucesso que termina no esquecimento de um artista , em O Regresso ele conta uma história de superação, luta pela sobrevivência e desejo de vingança marcado por muito realismo.

Fonte: https://bit.ly/2htHfnQ

Entretanto, nem tudo é perfeito e o longa apresenta alguns detalhes que incomodaram tanto o público quanto a crítica, como o enredo ser considerado “simples de mais ’’, falta de desenvolvimento  de alguns personagens (como a relação de Glass e seu filho Hawk que muitos acreditaram ser “muito superficial’’), além de ser considerado cansativo (2h 36m) e perder o ritmo durante algumas partes do filme. O Regresso é sem dúvidas um belo filme a partir da visão estética possuindo belíssimas locações, grandes interpretações, excelente mistura entre direção e produção e embora possua seus pequenos defeitos é um bom filme para se assistir e apreciar os lindos cenários e a fotografia.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

Fonte: https://bit.ly/2htHfnQ

O REGRESSO

Título Original: The Revenant
Direção: Alejandro González Iñárritu
Elenco: Leonardo DiCaprio, Tom Hardy, Will Poulter, Forrest Goodluck;
Ano: 2015
País: EUA
Drama

REFERÊNCIAS:

https://www.planocritico.com/critica-o-regresso/

https://observatoriodocinema.bol.uol.com.br/criticas/2016/02/critica-o-regresso

www.adorocinema.com/filmes/filme-182266/criticas-adorocinema/

https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historia-america/marcha-para-oeste-nos-eua.htm

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E se a busca excessiva pela felicidade nos torna infelizes?

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Adotar pensamentos positivos de sucesso e felicidade, livrar-se dos negativos, esquecer-se de fracassos e viver sob a lógica de “você atrai o que você pensa” ou sob o culto ao “evangelho” do otimismo parece não chegar à solução desejada.

Pergunte a si próprio se você é feliz, e você deixa de sê-lo.
John Stuart Mill

Em uma sociedade obcecada pela busca da felicidade, somos paradoxalmente fracassados para encontrá-la. Ao contrário do que se imagina, a vida moderna pouco contribui para o aumento da felicidade da população. O acréscimo do capital das grandes nações e toda a facilidade advinda dos meios tecnológicos parece não ter ocorrido concomitante ao aumento do bem estar das pessoas. Talvez, sejamos a sociedade mais deprimida e cansada de todos os tempos.

Os adoecimentos psíquicos de hoje com alta prevalência tais como depressão, burnout, TDAH são, na perspectiva do filósofo contemporâneo Byung-chull Han, efeitos de uma sociedade da positividade, que se alimenta do excesso de tudo que maximize o desempenho das pessoas:  superprodução, superdesempenho e supercomunicação. Essa sociedade, na visão do filósofo, consequencia em uma geração vítima de infartos psíquicos: esgotamento e depressão. E este mesmo sujeito, esgotado e deprimido, encontra-se em uma busca desesperada por liberdade, maximização do desempenho, prazer e felicidade (HAN, 2017).

 Os livros de autoajuda, talvez a apoteose da sociedade pós-moderna na busca pela felicidade, são repletos de conteúdos tais como: 10 passos para a felicidade, 7 hábitos de pessoas de sucesso, como influenciar pessoas, como ter uma mente milionária e como desenvolver liderança etc. Eles demonstram que a busca por soluções simplistas para os problemas complexos dos homens é bastante rentável e popular. Alguns autores chamam de regra dos 18 meses para explicar que a pessoa mais inclinada para comprar um livro de autoajuda é a mesma que 18 meses antes comprou um livro deste gênero que, obviamente, não solucionou seus problemas e não trouxe a desejada felicidade. Não há pesquisas, de rigor científico, que comprovem a eficácia desses conteúdos.

Paradoxalmente,  as tentativas de eliminar tudo o que é negativo, como os  fracassos, as incertezas, tristezas, sofrimentos e a ansiedade não só não resolvem o problema, como podem torná-los mais poderosos, gerando vidas sufocantes e sem sentido. O fracasso dessas tentativas é exemplificado pelo psicólogo Daniel Wegner (1994) e a teoria do processo irônico: nosso esforço para evitar e eliminar pensamentos  e comportamentos negativos os tornam predominantes. Não existe abordagem simples para a felicidade. A imersão no positivismo e otimismo não nos deixa mais felizes.

Sem o propósito de demonizar a busca por soluções práticas aos incômodos da vida (eventualmente, elas são bem-vindas e necessárias), a intenção é estimular a reflexão que essa busca excessiva da felicidade, centrada no culto ao otimismo e anulação do negativo, é contraproducente! Isto porque as estratégias utilizadas são baseadas em soluções simplistas e universais que não comportam os problemas humanos complexos. Contraditoriamente, podem produzir resultados indesejados, ou seja, pode gerar mais infelicidade e insatisfação. Adotar pensamentos positivos de sucesso e felicidade, livrar-se dos negativos, esquecer-se de fracassos e viver sob a lógica de “você atrai o que você pensa” ou sob o culto ao “evangelho” do otimismo parece não chegar à solução desejada.

O psicólogo Steve Hayes tem uma abordagem interessante para explicar como a fuga de situações emocionalmente difíceis pode ser uma armadilha e acabar aumentando o problema. A linguagem teria um papel protagonista nesse cenário, isto porque somos ensinados, desde criancinhas, a discriminar e nomear não apenas componentes externos do mundo objetivo, mas também pensamentos, memórias, sentimentos e sensações corporais, os denominados eventos privados (SKINNER, 2003) ou subjetivos.  Nossa cultura e sociedade nos ensina que a felicidade é cotidiana e almejada e a tristeza é ruim e deve ser evitada, e se nos sentirmos tristes é porque temos um problema que deve ser encontrado e eliminado (SABAN, 2015).

Por meio da aprendizagem, somos instruídos  a atribuir o status de causalidade à sentimentos e pensamentos para explicar porque estamos em um determinado estado ou porque fizemos o que fizemos. Hayes denominou de “silogismo lógico” o sistema em que esse processo ocorre, que funcionaria sob cinco aspectos de raciocínio. 1) Todo comportamento é causado; 2) razões são causas; 3) pensamentos e sentimentos são boas razões; 4) os pensamentos e os sentimentos são causas e, finalmente, 5) para controlar o resultado devemos controlar as suas causas. Logo, por associação, acabamos chegando ao resultado de para controlar o resultado devemos controlar os sentimentos e pensamentos. (HAYES, 1987). Assim, trazendo esse raciocínio para nosso tema específico, a felicidade (um efeito) seria produto (causa) de pensamentos e sentimentos positivos. Talvez o mercado dos livros de autoajuda e o evangelho do otimismo  e da motivação sejam fundamentados nessa perspectiva.

Mas esse caminho é cheio de armadilhas! Sentimentos e outros estados privados não são passíveis de controle direto. Um exercício bobo, porém didático, para ilustrar esse pressuposto: experimente não pensar, durante um minuto, em urso polar. Conseguiu? Eu imagino que não. Vamos tentar mais uma vez: agora imagine que você está conectado a um detector de mentiras de excelente precisão  e que pode captar qualquer reação de ansiedade sua. Então, você recebe a instrução de que você não pode de maneira alguma sentir ansiedade e, caso você sinta, levará um tiro na cabeça. Advinha o que você sentirá?

Hayes (1987) assinala que não precisamos mudar sentimentos e pensamentos para modificar outros comportamentos ou ter uma vida bem sucedida. O problema, na verdade, não seriam os pensamentos e sentimentos, mas nossa tentativas de controle e nossa fugas que visam eliminar vivências subjetivas aprendidas como “negativas” tal como a tristeza, o oposto da felicidade.

Quantas decisões tomamos na tentativa de eliminar incômodos, desconfortos, incertezas?  Vivências subjetivas estas que aprendemos serem negativas e contraditórias à felicidade. É claro que fugir de eventos difíceis e dolorosos (os aversivos!) têm um valor importante para nossa sobrevivência. No entanto, se dependermos de eliminar tudo o que é negativo para sermos felizes, jamais seremos. E negar esse “lado” da experiência humana pode resultar em alívio imediato (um reforço negativo), mas em longo prazo produz vidas de desespero, medo, ansiedade e, conforme bem colocou Sidman (1995, p. 231) “esmaga a engenhosidade e a produtividade, transforma a alegria em sofrimento, confiança em si em medo e amor em ódio.” As coisas dão errado, relacionamentos acabam, demissões acontecem e as pessoas morrem! A vida não é um laboratório! Uma porção de eventos são incontroláveis e nos esquivar de tudo que é ruim e tentar cultivar sempre pensamentos positivos não parece produzir os resultados que são vendidos por aí.

Viver plenamente, na abordagem do psicólogo Hayes, não significa não vivenciar sentimentos, pensamentos, sensações corporais e memórias, mas vivenciá-los como de fato são: sentimentos, pensamentos, sensações corporais e memórias que se transformam em um fluxo contínuo de experiências e contextos. Ou seja, seus pensamentos e sentimentos fazem parte de você, mas  não são você.

 Precisamos superar a ruminação e planejar saídas reais para o que nos paralisa, para o que nos torna infelizes. Aprendemos a primeiro nos sentir motivados e com vontade de agir para, então, agir, mas que sentido tem esperar se sentir como se estivesse fazendo algo ANTES de fazê-lo? Somos tão incrivelmente dinâmicos e versáteis e temos a capacidade de coexistir com a “vontade de não fazer” e, ainda assim, fazer, por exemplo.

Para além do que já foi discutido, não podemos deixar de lado a existência de uma “indústria da felicidade” que associa o consumo de bens à experiências felizes e produz lucros gigantescos para o capitalismo. A Coca-Cola indica: abra a felicidade! O Magazine Luiza chama: vem ser feliz! E o Baú da Felicidade está há 50 anos associando produtos e dinheiro à felicidade. Através da mídia, somos bombardeados de narrativas e imagens de pessoas alegres, sorridentes e esteticamente consistentes com o padrão cultural vigente e suas histórias de sucesso e  felicidade emparelhadas a roupas, calçados, celulares, cerveja, carros, status social etc. Em contrapartida, a “felicidade” gerada pelo consumo de bens parece não ter duração e profundidade em sua natureza. Ao que é possível perceber, é, na verdade, instantânea,  frágil e fugaz. Pegando emprestado o termo de Bauman sobre a sociedade pós-moderna, é possível compreender que esse tipo de felicidade (se é que podemos denominar assim) é, na verdade, líquida: ela escorre pelas mãos e não tem durabilidade. Citando a psicóloga Lauriane Santos em seu post em uma rede social: sapatos novos calçam pés, roupas novas vestem corpos. Nenhum deles traz felicidade… talvez tragam uma euforia pontual, a qual é dissolvida na próxima coleção primavera-verão.

Ser feliz é uma meta? Certamente, muitas pessoas responderiam que sim. Quando somos questionados sobre o que desejamos da vida é comum a resposta: ser feliz! Ou mesmo, ter dinheiro e ser bem sucedido, muitas vezes concebidos como sinônimos de felicidade.

Metas são objetivos a serem alcançados e são planejadas com tempo pré-definido para ser operada e gerar os resultados. Mas se a felicidade é uma meta, e metas têm prazos de validade, estaria a felicidade condicionada ao eterno cumprimento de metas? Eleger a felicidade como meta talvez não seja efetivo. O filósofo Han é categórico ao afirmar que  “o sentimento de ter alcançado uma meta definitiva jamais se instaura […] não é capaz de chegar à conclusão. A coação do desempenho o força a produzir mais. Assim, jamais alcança um ponto de repouso da gratificação” (2015, p. 85). Nos aniversários, nas festas de réveillon, nas mudanças e conquistas, desejar felicidade ao outro faz parte de uma prática verbal culturalmente estabelecida e mantida.  E aqui cabe mais uma reflexão: a felicidade parece estar sempre em algum lugar que não seja o presente; parece que habita não o agora, mas um futuro que custa chegar (ou nunca chega). Parece que as coisas que mais tememos e desejamos se encontram em um lugar não vivido: o futuro.

Essa é mais uma armadilha da felicidade. É óbvio que podemos (e devemos) planejar e prever situações futuras que nos gerem boas vivências subjetivas. O problema reside no fato de estarmos demasiadamente presos às expectativas de felicidade futura e nos resignarmos do único momento que nos pertence: o agora.

Outra “face” da felicidade é a segurança, que seria consequência de controle, previsibilidade e rigidez. No entanto, há um erro importante já explorado anteriormente: o controle é frágil e a busca desenfreada por segurança pode até nos deixar mais inseguros. A única constante da vida é sua impermanência! E se viver é estar em um constante fluxo de experiências, interações com outrem e com coisas, alternâncias entre perdas e ganhos, dor e gozo… se a vida é, em uma inerência, finita, talvez o que nos paralisa, o que nos entristece não seja essa “sentença”, mas a tentativa contraproducente de eliminá-la e de fugir dela. Mais uma vez reitero que a busca por segurança também tem um valor importante para a sobrevivência, a questão discutida são os excessos do controle de processo naturais da vida, mas que são aprendidos como negativos e acabam se tornando alvos de esquivas, como as tristezas e ansiedades.

E então, o que deixa as pessoas felizes? A famosa pesquisa de Harvard do Departamento de Desenvolvimento Humano,  respondeu ao questionamento sobre o que faz as pessoas felizes e saudáveis.  Por 75 anos, monitoraram 724 homens. Dois grupos: secundaristas de Harvard e garotos de um dos bairros mais pobres de Boston. A abordagem da pesquisa envolveu desde questionários e conversas com familiares, a exames de sangue e tomografia dos  cérebros. Não é a fama, a riqueza, ou trabalhar mais e mais, a mensagem mais clara é: bons relacionamentos nos mantém felizes e saudáveis.  Conexões sociais com a família, comunidade e amigos são importantes e a solidão mata. Não se trata da quantidade de pessoas próximas e não é casual estar em um relacionamento amoroso ou casado produzir, necessariamente, felicidade. O importante é a qualidade dos relacionamentos de proximidade que as pessoas nutrem (MINEO, 2017).

No leito de morte, é provável que seja difícil encontrar alguém que deseja ter passado mais tempo trabalhando, por exemplo. Em síntese, relacionamentos íntimos de qualidade são melhores preditores de felicidade e saúde do que genes, QI, status social e dinheiro (MINEO, 2017). É uma conclusão que vai ao encontros de sabedorias antigas e confronta o culto vigente da felicidade condicionada a consumo de bens.

“O dinheiro não traz felicidade!” Talvez Bill Gates e um morador de rua tenham visões diferentes ante essa afirmativa. A questão que fica é: tendo suas necessidades básicas contempladas,  o dinheiro traz felicidade? No Japão, uma das maiores potências  do mundo, é um país rico, mas infeliz. A “obsessão “ dos japoneses pelo desenvolvimento econômico pode ter sua raiz na necessidade de reerguer o país após destruição da Segunda Guerra Mundial. A questão é que o índice de suicídio e overworking (morte por excesso de trabalho, originalmente conhecido lá como “karoshi”) são assustadores e ascendentes. As pessoas estão morrendo de tanto trabalhar! (GORVETT, 2016)

Paralelamente, o pequeno país Butão concebe a felicidade como responsabilidade do governo, que tem o dever de dispor condições favoráveis a ela para sua população. Lá foi criado a Felicidade Interna Bruta (FIB) como indicador de desenvolvimento da nação, pautada em valores de colaboração, convivência com a comunidade, respeito a natureza, espiritualidade. É um modelo alvo de algumas críticas, no entanto, apresenta parâmetros na direção de sérias pesquisas sobre a felicidade como sendo uma consequência não do consumo de coisas, mas de relações de qualidade.

A Dinamarca, nação com alto padrão de vida e igualdade social, com educação gratuita até a faculdade e saúde universal para toda a vida é um dos países mais felizes do mundo. Para além disso, o que deixa realmente os dinamarqueses felizes, de acordo com o economista Cristian Bjonrskov, é o alto nível de confiança que as pessoas têm entre si e nas instituições (PREVIDELLI, 2014).

Por fim, este texto não tem a pretensão de esgotar as discussões sobre a felicidade nos tempos atuais e outras perspectivas, não abordadas aqui, podem dialogar e até mesmo apresentar posicionamentos contrários ao que foi exposto. O diálogo é bem vindo e deve acontecer. Mas por ora, é isto! E para finalizar, gostaria de levar o leitor a uma última reflexão: imagine a felicidade de algo muito bom te acontecer, como realizar um grande sonho…

Ainda terá sentido se você não tiver alguém importante para compartilhar?

Happiness only real when shared (Into the wild, 2008)

REFERÊNCIAS: 

GORVETT, Z. ‘Morrer de tanto trabalhar’ gera debate e onda de indenizações no Japão. BBC News, 2016. Disponível em:<https://www.bbc.com/portuguese/vert-cap-37463801>. Acesso em 01 dez. 2016.

HAN, B. Sociedade do Cansaço. Petrópolis: Vozes, 2017.

HAYES. S. C. A Contextual approach to therapeutic change. In N. Jacobson (Ed.) Psychotherapists in clinical practice: Cognitive and Behavioral Perspectives. New York: Guilford, 1987, p. 327-387. Tradução experimental Adriana C. B. Barcelos; Verônica Bender Haydu. Disponível em: <http://www.uel.br/grupo-estudo/analisedocomportamento/pages/arquivos/Hayes_%20Texto%20ACT.pdf>. Acesso em 20 mar. 2017.

MINEO, L. Goog genes are nice, but joy is better. The Harvard Gazette. Health & Medicine. 2017. Disponível em:<https://bsc.harvard.edu/links/good-genes-are-nice-joy-better>

SABAN, M. T. Introdução à Terapia de Aceitação e Compromisso. Belo Horizonte: Artesã. 2015.

SKINNER, B. F. Ciência e Comportamento Humano. 11. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

SIDMAN, Murray. Coerção e suas Implicações. Campinas: Psy. 1995.

PREVIDELLI, A. O que torna a Dinamarca o país mais feliz do mundo. Abril, 2014. Disponível em:<https://exame.abril.com.br/mundo/o-que-torna-a-dinamarca-o-pais-mais-feliz-do-mundo/>. Acesso 01 dez. 2018.

WEGNER,  .D. M. Ironic processes of mental control. Psychol Rev. 1994 Jan;101(1):34-52. Disponível em:<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8121959>. Acesso em 02 dez. 2018.

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“Obsessão feminina pelo corpo sarado” é tema de Psicologia em Debate

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O evento acontece no dia 1º de agosto às 17h na sala 203 do CEULP

“A obsessão feminina pelo corpo sarado: um estudo de caso com fisiculturistas na rede social instagram” será pauta de discussão no “Psicologia em Debate”, que acontecerá no próximo dia 1º de agosto na sala 203, a partir das 17h. O tema será apresentado pela egressa de Psicologia Tainá Bernardes, do CEULP/ULBRA. O tema foi desenvolvido pela Psicóloga em seu Trabalho de Conclusão de Curso, que teve a orientação da Profa. Dra Irenides Teixeira.

“Psicologia em Debate” é um espaço permanente para apresentação de trabalho de pesquisa e extensão, TCC, entre outros, dos estudantes de psicologia do CEULP/ULBRA, dando oportunidade de divulgação das atividades desenvolvidas no curso. Entre os objetivos do projeto está a instrumentalização dos alunos e o estímulo para que mais acadêmicos se envolvam em atividades científicas. 

O evento acontece desde fevereiro de 2016 sempre às quartas-feiras, das 17h às 18h, na sala 203, prédio da Psicologia, no CEULP. A atividade é gratuita e vale horas complementares.

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A busca pelo corpo perfeito

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Recentemente a dupla de acadêmicas Joice Reitz e Nayara Ferreira Marques, que se apresentaram no Psicologia em Debate no CEULP/ULBRA, sobre o tema “Mídia, mídia minha… como faço para ter uma barriguinha?”, argumentaram sobre o discurso que a mídia transmite para atender as necessidades de mudança do corpo, que alimenta uma indústria para a mudança do corpo perfeito. O corpo vai além da estrutura corporal, ele agrega valores na vida da pessoa, traz muitas demandas e possibilita que a pessoa vá até você. A propaganda do corpo ideal é forte nos dias atuais, chega até ser forçosa.

As acadêmicas disseram que a percepção e preocupação com o corpo mudam de acordo com as épocas. No século XX usava-se o espartilho para modelar o corpo das mulheres, prática que teve de ser abandonada por questões de riscos à saúde. Essa ideia é vigente até hoje, porque as pessoas tem que ter o corpo perfeito. A prática dos exercícios é saudável, mas o endeusamento do corpo é doentio, abordaram. Na busca pelo corpo perfeito, a pessoa termina sendo julgada.

Fonte: http://zip.net/bhtHbj

Mas o que nós somos afinal? Somos estruturas que precisam ser mudadas a todo o momento? As pessoas tendem a buscar essa ideia de corpo perfeito. O corpo passa a ser visto como algo modificável, e com isso desencadeia-se doenças como a bulimia e anorexia. De acordo com as acadêmicas a moda muda todos os dias, ela não é a mesma. O imperativo da moda é modificar-se e o espaço que o sujeito tem dentro da moda é mudar constantemente. Neste contexto, o movimento Dadaísta surge como quebra das formas tradicionais e em um momento a imprensa percebeu que os movimentos estavam tentando influenciar as pessoas, então ela compra essa ideia.

Ainda de acordo com as acadêmicas é difícil modificar a moda, pois ela é o espelho da sociedade. Modelos não magras geram estranhamento com a realidade. Elas estão fora do padrão de beleza exagerada. A indústria da beleza investiu nessa ideia e por isso não quer perder. Ela prega a auto aceitação. E as pessoas terminam patologizadas porque não conseguem entrar nesse padrão.

Fonte: http://zip.net/bhtHbj

Vemos o quanto a sociedade é produto do seu meio. Hoje, a maior parte das pessoas busca esse ideal de corpo perfeito e em nome desse buscar doentio, terminam se prejudicando ou até perdendo suas vidas. Não raro sabe-se pelas notícias, ainda que veladas, quantas jovens morrem para atingirem o peso ideal. É a ditadura da beleza falando mais alto que a qualidade de vida dos indivíduos. Percebe-se o desenfrear a que chegou o ser humano. Muitos fazem até cirurgia para remoção de duas costelas a fim de modelar o corpo. O ser humano é um eterno insatisfeito, e está em busca de mudança constante porque não basta ser como é. Faz-se necessário produzir algo além, como se o corpo fosse um objeto.

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“Whiplash” e a sofrida (e instigante) busca pela perfeição

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Com cinco indicações ao OSCAR:

Melhor Filme, Melhor Ator Coadjuvante (J.K. Simons), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Edição e Melhor Mixagem de Som 

“O homem é uma corda esticada entre o animal e o super-homem, 
uma corda por cima do abismo” – Friedrich Nietzsche

“Whiplash: em Busca da Perfeição” é uma das mais agradáveis surpresas de 2014. Não por menos, acabou com uma indicação ao Oscar, para Melhor Ator Coadjuvante, em decorrência da atuação de J.K. Simmons, intérprete do durão professor de música Terence Fletcher, e estreante em grandes premiações. O longa já havia mostrado força no Festival de Sundance 2014, onde recebeu enorme destaque. Ele segue a lógica da busca obsessiva pela perfeição artístico/profissional, numa dinâmica em que o espectador se vê diante de ações compulsivas, ásperas e angustiantes, elementos que parecem comuns às “gestações” dos gênios da arte.

O filme conta a estória do jovem Andrew Neyman, que desde cedo sempre sonhou em brilhar como baterista. Ao entrar num conservatório como substituto, se depara com um professor controverso, que se utiliza de métodos nada aprazíveis para tentar explorar o máximo de seus alunos e, quem sabe, despertar-lhes para as disputadas – e escassas – originalidade e precisão artística. Neste processo, os alunos são levados a extremos, onde a coerção, a chantagem psicológica, a humilhação e até eventuais ameaças contra a integridade física são uma constante. A brilhante atuação de Simmons sintetiza uma faceta nada romântica dos bastidores de um profissional da arte, tema já explorado pelo filme “Cisne Negro”.

Whiplash joga luz sob alguns dos assuntos mais contemporâneos, sendo que dois deles saltam aos olhos: a tênue linha que separa, como diz Zygmunt Bauman, a “ambição” da obsessão (que pode desembocar para um transtorno psíquico), e a conturbada presença de personagens que lutam contra a predominância do niilismo, mesmo que isso ocorra de forma inconsciente.

Sob o primeiro aspecto, Freud já dizia que apesar de o homem ser feito de carne, vive “como se fosse de ferro”. As demandas enfrentadas pelas pessoas, seja porque assim elas procuraram, como no caso do filme, seja porque lhes são impostas e/ou inerentes, como as questões relacionadas à própria contingência da vida – a impotência diante do adoecimento e da morte, por exemplo -, são litígios que parecem insolúveis. De quebra, Andrew se apresenta como a síntese de uma geração que tem o enorme desafio de superar limites que se mostram quase que como intransponíveis. No entanto, eximir-se desta dinâmica – que à primeira vista pode parecer cruel, mas ela tem seu lado positivo – elimina qualquer possibilidade de originalidade. Entregar-se a ela sem um mínimo de amadurecimento, no entanto, pode resultar em sérios danos, como no caso do aluno, no filme, que por não suportar a pressão do professor, acaba por cometer suicídio.

De acordo com Wielenska, é possível diferenciar um objetivo de vida de uma compulsão e/ou obsessão. No caso do objetivo, há sempre a possibilidade de o personagem submeter-se a processos de correção e até de total mudança de rumo. Há uma flexibilidade maior em relação às demandas, algo que se traduz numa espécie de “reconhecimento” do tamanho da distância a se percorrer para atingir dado alvo/objeto. Já as compulsões se caracterizam pela excessiva busca de produzir “sensação subjetiva de paz, redução da ansiedade, da insegurança e do medo”, numa velocidade sempre desafiadora. Andrew parece se enquadrar no perfil de personagem ambicioso.

Em outro aspecto, há pessoas – como o professor Terence Fletcher – que lutam para sair da mesmice e obter o melhor de si, e dos outros, através de suas ações compulsivas, excêntricas e originais. Fletcher poderia ser considerado a personificação do adepto do “anti-niilismo” predominante, já que nega certas morais da tradição (ele não é nada politicamente correto), normas estas que desencadeiam a chamada “doença da vontade” e a “mesmice social”. Fletcher, assim, encarna alguém que abraça o pensamento dos extremos de Nietzsche, naquele sentido mesmo que

“pode contribuir para os seres humanos do século XXI a repensarem os valores pelos quais pautam sua existência. É preciso radicalizar experimentalmente a consequência do cultivo dos principais valores de nosso tempo (bem-estar, individualismo consumista), a saber, o vazio de sentido que mais cedo ou mais tarde se impõe para quem segue irrefletidamente nessa senda. Assim, seria possível reverter os resultados niilistas de certas práticas contemporâneas no extremo oposto de uma existência decidida para construir sua própria individualidade, a partir da base instintiva da natureza”. (ARALDI, Clademir – 2010)

A originalidade comum na genialidade, portanto, é algo que se expressa numa vida que se propõe a experimentar o novo e até o subversivo. No fundo, “é quase sempre o temor de ferir o espaço de jogo individual que move os atores a preocupar-se um pouco com os outros no palco contemporâneo de luta por destaque”. Há, por esta ótica, um niilismo que “se insinua através do individualismo ‘associal’”. Há de se destacar que Neyman não se satisfaz através do fugaz (e compulsivo, no sentido mais vulgar) apelo consumista. Antes, acaba por “mergulhar na radicalização do niilismo” para, ao fim, transcendê-lo. E “radicalizar o niilismo é a única possibilidade para superá-lo”, reforça Araldi, em referência à Nietzsche.

Andrew Neyman “abocanha” a própria vida quando passa a ditar um ritmo que lhe é peculiar, ordenado a partir dele, sob sua regência. Ele passa a olhar o professor com uma impetuosidade que não reflete desdém, pelo contrário, trata-se de uma segurança que está além de qualquer convenção. Depois de uma longa e sofrida batalha, desperta. Já o “professor-carrasco” lembra os poetas aclamados pelo filósofo de Röcken, “impudicos para com as suas vivências. Antes, prefere explorá-las”. Nasce, sob as cinzas de muito sofrimento e dedicação, um artista forjado para a autenticidade. O percurso é tenso, perturbador. Mas talvez a estória (ou história) seria menor se assim não se desenrolasse.

 

Referências:

Sinopse de “Whiplash: Em Busca da Perfeição”. Disponível em  http://www.adorocinema.com/filmes/filme-225953/ – Acessado em 22/02/2015;

Perfil de JK Simmons. Disponível em http://www.cineclick.com.br/perfil/j-k-simmons – Acessado em 22/02/2015;

Transtornos Obsessivos. Disponível emhttp://www2.uol.com.br/vyaestelar/comportamento_toc.htm – Acessado em 22/02/2015;

O niilismo como doença da vontade humana – entrevista com Clademir Araldi. Disponível emhttp://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3702&secao=354 – Acessado em 22/02/2015;

COMTE-SPONVILLE, André. Dicionário Filosófico. São Paulo: WMF, 2011;

O Livro da Filosofia (Vários autores) / [tradução Douglas Kim]. – São Paulo: Globo, 2011;

MORA, José Ferrater. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2001;

RACHELS, James. Os elementos da filosofia da moral. 4. ed. São Paulo, SP: Editora Manole, 2006;

 

 

Mais filmes indicados ao OSCAR 2015: http://ulbra-to.br/encena/categorias/oscar-2015


FICHA TÉCNICA DO FILME

WHIPLASH: EM BUSCA DA PERFEIÇÃO

Título original: Whiplash
Lançamento: 8 de janeiro de 2015 (1h47min)
Dirigido por Damien Chazelle
Elenco: Miles Teller, J.K. Simmons, Paul Reiser, Melissa Benoist,  Jayson Blair, dentre outros
Gênero: Drama, Musical
Nacionalidade: EUA

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motivação

Motivação: a droga do século

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Profissionais especializados em processos motivacionais estão se proliferando por aí. Nas empresas, consultores de RH são peças fundamentais para manter os funcionários motivados. Mas, para que eles precisam de motivação? Para fazer um trabalho que não os realiza e receber um salário que não os compensa por isso. Mesmo os que recebem bem precisam de motivação. O baixo salário nem sempre é o problema. Quando o trabalho não realiza, busca-se a motivação no pagamento. Mas, e quando o pagamento, mesmo generoso, não nos realiza da maneira que o trabalho deveria realizar? Aí é preciso buscar motivação em outros lugares. Onde? Profissionais da motivação são especialistas em inventá-las e em nos convencer de que as metas e os objetivos propostos por eles podem nos dar o sentido que buscamos em vão num trabalho estafante.

Quando o namoro está ruim, buscamos motivação na promessa do casamento. Quando o casamento está ruim, buscamos motivação nos filhos. E para criar os filhos buscamos motivação na ilusão de que com eles estabeleceremos, finalmente, a relação ideal; ilusão essa que acaba quando os filhos crescem e a relação com eles acaba sofrendo dos mesmos problemas básicos de todas as outras. A promessa do casamento nos motiva a continuar ignorando o fato de que o namoro está ruim; os filhos nos motivam a fugir da realidade de um casamento que não está dando certo; a ilusão da relação ideal é a motivação que sempre nos leva a buscar nos outros a intimidade que não temos com nosso próprio eu; e as metas e objetivos do trabalho nos motivam a acreditar que há um sentido em toda a vida que deixamos de viver para trabalhar. A motivação do namoro não está no namoro em si, pois o namoro é ruim. O mesmo vale para o casamento, a criação dos filhos e o trabalho. Consequentemente, temos uma pessoa cujo relacionamento amoroso é insatisfatório, que se entrega a um grande fardo para criar os filhos e que deixa de viver para trabalhar, mas que, no entanto, está extremamente motivada e entusiasmada com tudo isso. E facilmente confundimos a pessoa motivada com a pessoa feliz! Pois, que outra definição temos para ‘felicidade’? Estamos habituados a pensar que as pessoas mais motivadas são as pessoas mais felizes, aquelas cuja vida tem mais sentido! Para o senso-comum, a motivação é o segredo da vida bem vivida! Ela é tão importante que se fosse possível transformá-la em pílulas, todos nossos problemas estariam resolvidos! E não é justamente essa a grande promessa dos antidepressivos vendidos como água atualmente?

Quando as relações familiares, amorosas e de trabalho são insatisfatórias, que motivação pode compensá-las? E quando não se tem uma família, um lar, um trabalho, um futuro? Que motivação pode ajudar a passar por cima de tudo isso? Será possível fugirmos da violência e da destruição? Há alguma motivação que possa compensar uma vida não vivida e nos ajudar a evitar nossa própria destrutividade? Será que a pessoa motivada com a vida consegue isso?

Se a pessoa motivada é tão feliz assim, por que ela é tão ansiosa? Se é tão feliz, por que não consegue encontrar paz? Se seu interior é tão cheio de vida, por que precisa tanto da confusão e da algazarra exterior? Por que ela não consegue ficar um momento a sós consigo, usufruindo da vida abundante que existe nela mesma? Por que ela bebe, fuma e se envolve em relacionamentos sofríveis? O que ela busca senão a destruição da vida que diz amar tanto? Se a pessoa motivada soubesse viver, será que precisaria de tantas motivações? Por que é preciso ter motivações para auxiliar a vida? Por que não vivemos agora, logo de uma vez? Por acaso não temos a vida aqui, agora, em nossas mãos? Por que não conseguimos entrar em contato direto com a vida para vivê-la simplesmente? Muitas perguntas; nenhuma resposta.

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