O feminino e o Masculino em: A Bela e a Fera

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O filme A Bela e a Fera de 2014, é uma produção franco-alemã adaptada do conto de fadas A Bela e a Fera de Gabrielle-Suzanne Barbot de Villeneuve, a Dama de Velleneuve. O conto de fadas original trata da redenção do amado de sua forma animal por meio do amor. No filme esse tema central se mantém, mas ocorreram algumas modificações na estória.

O filme se passa na França de 1810, onde um rico comerciante perde seus navios em um naufrágio. Ele é um viúvo e tem seis filhos: três homens e três mulheres, sendo a heroína Bela a mais nova de todos e a mais generosa, graciosa e humilde. Devido a essa catástrofe precisam se mudar para o campo e ficar longe da cidade, e assim o padrão de vida da família cai vertiginosamente.

No conto original Bela também é a filha mais nova de um rico mercador, que perde a sua fortuna. No entanto, esse tinha apenas três filhas e não há filhos homens. Como no filme as filhas mais velhas gostavam de ostentar luxo, com lindos vestidos, contrastando com a irmã caçula. Esse aspecto da personalidade de Bela a torna a favorita do pai. No conto original e no filme a heroína não tem mãe e vive em um estado simbiótico com o pai.  Essa é uma questão importante que começo abordando no aspecto pessoal.

Von Franz (2010) aborda que quando a heroína não tem mãe, supõe-se um complexo paterno. O animus na mulher se desenvolve, no geral, pela experiência dela com o pai pessoal, e encarna o arquétipo inato do pai, e a experiência se torna o complexo de pai na mulher, o que ira moldar suas relações com os homens em sua vida e o funcionamento da sua masculinidade interior.

O pai é o primeiro ser masculino com o qual a futura mulher entra em contato. Ele é então o outro, o estranho, algo a ser vivenciado e preenchido pelo mundo de imagens do inconsciente latente. Por isso a tendência na mulher a idealizar o pai.

Além disso, no desenvolvimento da personalidade a criança vive naturalmente na unidade mãe-filho. Quando um pai urobórico quebra a unidade mãe-filha e a menina o aceita ela sai da unidade com a mãe e entra no laço pai-filha. Uma mulher então confinada nesse laço pai-filha precisa passar pela aceitação de um homem diferente do pai. Se ela não passar por esse processo e não entrar nessa nova condição ela continuará em um incesto psicológico entre pai e filha (KAWAI, 2007).

Esse homem que quebra esse incesto psicológico é visto então como um monstro, que separou a filha do papai amado. E esse é o tema central de A Bela e a Fera.  Bela o enxerga como monstro e a redenção desse amado é quando ela se transforma pelo amor a esse homem, e o passa a enxergar como um homem desejável.

Mulheres nessa condição de incesto psicológico com o pai só conseguem se relacionar com os homens em forma de camaradagem. Em uma relação erótica ela o repudiará e se esquivará e toda investida romântica de um homem. Um dia então o pai de Bela, recebe a notícia de que um dos seus navios foi encontrado, e por isso ele resolve partir para a cidade. As duas filhas mais velhas, esperançosas em enriquecer novamente, encomendam-lhe vestidos e futilidades, mas Bela, preocupada com o pai, pede apenas uma rosa.

É importante notar que no filme o pai de Bela possui navios. O barco, ou navio representa um receptáculo feminino, tanto que é comum entre os marinheiros colocar um nome feminino em seus barcos. O barco também se associa a Lua e as deusas lunares. Ele também facilita o comercio, a comunicação e a difusão cultural. Além disso, trata-se de uma invenção humana que permite flutuar sobre as águas, simbolizando uma qualidade uterina (VON FRANZ, 2011).

Apesar de ser uma construção humana, o barco carrega em si (assim como as outras invenções humanas), uma qualidade de revelação divina, sendo uma invenção que nasceu dos deuses. Psicologicamente o barco nos permite navegar as águas do inconsciente, nos protegendo contra o afogamento.

Nos contos de fadas, quando um arquétipo não está presente ou desaparece irá reaparecer em uma nova forma. No filme a mãe morta de Bela reaparece novamente. O barco encontrado é justamente o favorito da mãe. Podemos então supor que o fato desse barco não haver naufragado, mostra que a heroína tem a proteção para adentrar nas águas do inconsciente coletivo. Sem essa proteção ela pode afogar. Em termos coletivos, na sociedade ocidental, temos muitas mulheres com complexo paterno, ou materno negativo. Isso ocorreu devido a valorização dos aspectos masculinos na consciência coletiva, e a repressão do feminino que naufragou na repressão, voltando para o inconsciente coletivo.

O pai após uma viagem angustiante onde descobre que seu filho mais velho esta envolvido em atividades ilícitas com um grupo de mercenários e assassinos. Durante a volta para casa, sozinho e fugindo do grupo de bandidos, acaba se perdendo na floresta em meio a uma nevasca indo se abrigar em um suntuoso castelo. Ele então vê uma bela rosa e decide levar para a filha, porém é condenado à morte pelo proprietário do castelo, a Fera.

A rosa é uma flor comumente associada à Afrodite, ou seja, ao feminino. É a rosa que une os dois homens e tira Bela da simbiose com o pai. A rosa também indica a união dos opostos. Isso significa que o amor, é um grande aliado e força motriz no processo de individuação, pois o amor é o combustível para que o indivíduo tenha força para romper com o laço familiar.

Von Franz (2010), ressalta que uma das atividades do animus negativo é furtar, pois ele precisa tomar a vida onde ele se encontra, matando todo o aspecto feminino da vida. O pai da heroína agora fraco e sem suas posses (energia) e começa a furtar tudo àquilo que tenha vida e com isso não consegue manter a força da ligação pai-filha. O tema do pai que entrega a filha ao noivo monstro é um tema familiar da mitologia. No conto Eros e Psique há esse tema da entrega da filha e da redenção do amado.

No conto original e também no filme, ao conviver com a fera, Bela percebe que ele é sensível e que está disposto a realizar todas as suas vontades a despeito de sua aparência. Ela se afeiçoa a ele, que a pede em casamento várias vezes, sendo recusado em todas elas. No entanto, com o tempo e a convivência, ela passa a enxergar o masculino de forma menos hostil.

A imagem de pai de Bela agora está no pólo negativo do arquétipo paterno, e isso interfere na forma como ela vê o masculino. Ou ele é um ladrão como o pai e furta sua feminilidade, ou é uma fera assustadora. E com a convivência ela terá de enfrentar essa projeção de hostilidade em relação ao masculino, por esse motivo, Bela reluta em aceitar esse homem como amado.

Mas no filme há algumas diferenças em relação ao original. Bela e Fera se reúnem todas as noites para jantar, e aos poucos vão se conhecendo. Bela, – assim como Psique no mito – contudo não obedece as ordens de seu anfitrião e tenta desvendar os mistérios do seu castelo mágico. Ela descobre então sua trágica história de príncipe arrogante que é transformado em um monstro devido um crime horrível.

No conto original a Fera foi um príncipe que ainda jovem perdeu o pai, e sua mãe partiu para uma guerra em defesa do reino. A rainha deixou-o aos cuidados de uma bruxa, que tentou seduzi-lo enquanto ele crescia; quando ele então recusou, ela o transformou em um monstro. No filme vemos que o príncipe era arrogante e estava à caça de uma corça com pelos dourados. Na verdade ele estava obcecado por ela e por matá-la. Até que um dia, mesmo a despeito dos pedidos de sua mulher, ele mata a corça e tragicamente descobre que se tratava de sua própria esposa, que era uma filha do deus da floresta.

Mudando o foco agora, e analisando o filme em relação ao príncipe, podemos supor que ele possui uma relação bastante falha com o feminino. Em suas relações predomina o Poder, ou seja, ele vê o elemento feminino como um troféu a ser conquistado. Ele precisa resgatar Eros em suas relações, pois onde falta Eros, o Amor, o poder se instala.

Em termos coletivos, na sociedade ocidental predomina esse aspecto de poder, onde impera a exploração da natureza em busca de satisfação egóica. A corça, é um animal associado à deusa Artemis, um deusa lunar, da caça e da natureza. A caça sempre fez parte do sistema psíquico humano. No entanto, Artemis nos mostra que a caça faz parte de algo sagrado e deve ser feito com respeito e devoção, uma vez que ela sempre existiu com o propósito de alimentar os homens e não para satisfazer a sede de poder humana.

No filme a esposa do Príncipe pode ser considerada como uma filha de Artemis e quando ele a mata é punido pelo pai da moça, o Deus da Floresta, que aparece a ele em forma de trovão. Bem o príncipe cometeu um grande erro de atentar contra a própria alma, e quando isso ocorre não ficamos impunes e o Self nos pune pelo ato. Bem Artemis é filha de Zeus, e no filme o pai da moça aparece como um misto de trovão e raio. Esse “pai” da anima representa para o príncipe uma figura do velho sábio, com o qual a princesa mantém um relacionamento de incesto psicológico, o que significa que por trás da anima está a possibilidade de um desenvolvimento interior do herói (VON FRANZ, 2005).

Conforme Von Franz (2005), esse pai sobrenatural da anima representa uma sabedoria suprema que está em contato com as leis do inconsciente. É força sobrenatural, e parte do espírito e da sabedoria que foi negligenciada no desenvolvimento da civilização. Esse animus da anima então pune o príncipe de sua arrogância e somente com o amor pela verdadeira personalidade dele poderia ser liberto. Isso significa que ele terá que olhar além das aparências e amar a alma feminina.

Em termos coletivos esse príncipe representa a forma como a consciência coletiva se coloca diante do feminino e esse pai espiritual, esse Zeus, representa um aspecto do deus mais primitivo. Nossa consciência moderna não tem deixado espaço ou vida suficiente à alma, o feminino e a natureza, e, ainda, tenta excluí-la. Em consequência, a anima do homem e o feminino na mulher e agarram a esse espírito primitivo, porque ela sente que ele lhe promete uma vida mais rica (VON FRANZ, 2005). No filme ele a resgata e pune a consciência transformando-a em um ser monstruoso. Se nos encararmos com certa dose de sinceridade veremos esse monstro em nós.

O fato de ele ser um deus pagão mostra que a cosmovisão, de certa forma, dava à anima do homem uma chance muito maior e mais abundante de viver. Por essa razão é muito mais fácil para a mulher e a anima no homem se voltar ao paganismo, pois nessa manifestação o feminino possui muito mais liberdade em se expressar de forma completa e plena. E Bela descobre toda essa estória por meio da ajuda do espírito da esposa e princesa morta, que lhe revela a tragédia.

Isso significa que a mulher presa ao animus pode alcançar uma feminilidade muito mais profunda do que se conhece na consciência.  Sob a ótica do príncipe podemos entender que ele então não se relacionava com a mulher real. Ele apenas idealizava as mulheres e assim sua anima o auxilia nesse processo de entrega a um ser real, e não a uma divindade.

A estória então prossegue de forma semelhante ao conto, onde Bela sente saudades da família de origem e pede para revê-la. Mesmo a contragosto a Fera permite que Bela visite sua família. Esse retorno ao lar de Bela pode representar uma regressão do ego ao inconsciente original. Nessa regressão, Bela confronta projeções reprimidas e sombrias inconscientes. No conto original as irmãs sentem inveja de Bela e tentam evitar que ela volte para o príncipe. No filme essa ação invejosa das irmãs é menos nociva e o problema de Bela está no irmão mais velho, que a rouba e leva os ladrões para o castelo do príncipe.

Isso mostra que a heroína está em um conflito com o aspecto sombrio de seu masculino interior, cuja ação negativa é a de roubar o valor e a energia da mulher. Esse animus negativo costuma rebaixar a mulher a uma situação abaixo de sua capacidade e desprezar a sua feminilidade. A mulher presa nesse animus negativo despreza toda a feminilidade e quando tenta estabelecer um vínculo amoroso com um homem sofre dolorosamente.

O animus pode aparecer nos sonhos das mulheres como um grupo de homens. Isso porque ele representa a coletividade, o julgamento, um tribunal, onde a mulher pode ficar presa. Ou seja, ela pode ser presa de julgamentos sem sentido e inférteis em relação a si mesma e aos outros. No filme há então um embate entre os opostos desse lado masculino da heroína. E nesse embate a Fera é ferida e morre, sendo salva de seu aspecto monstruoso e revivendo por meio da flor que cresce no tumulo da amada morta.

A Fera e o grupo se enfrentam e ambos morrem. Dois pólos opostos se enfrentam. Ambos se odeiam, pois até então eram semelhantes. Ambos desprezaram o elemento feminino.  Portanto, através desse embate com esse aspecto masculino que Bela alcança autonomia em seu relacionamento, quebrando a simbiose com o pai e o incesto psicológico. E ao quebrar a simbiose e identificação a heroína sente falta do homem, e sincronicamente a Fera morre. O aspecto animal, hostil e assustador se vão e ela pode ver realmente quem é seu marido, e seu lado humano pode se manifestar.

Ela conhece a sombra e a luz do príncipe e o ama. Muitas pessoas nesse estagio de retirada da projeção de anima e animus se separa por não suportar encarar o outro em sua humanidade.  Esse conto, portanto, nos mostra que a mulher, em termos coletivos, deve passar pela experiência de ficar presa ao seu animus fera (ou demônio), pois somente essa experiência o transforma em positivo e ela pode expressa-lo na realidade sem lesar sua feminilidade.

FICHA TÉCNICA

A BELA E A FERA


Direção: Christophe Gans
Elenco: Vincent Cassel, Léa Seydoux, André Dussollier
Gênero: Romance, Fantasia
Ano: 2014

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“Caminhos da Floresta” e a psicologia dos contos de fadas

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Com 3 indicações ao Oscar 2015:

Melhor Atriz Coadjuvante (Meryl Streep); Melhor Desenho de Produção (Anna Pinnock eDennis Gassner); e Melhor Figurino.

Caminhos da floresta é uma síntese de vários contos de fadas. No filme encontramos Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel, Cinderela e João e o pé de feijão. Todas as histórias desses personagens se entrelaçam ao redor dos personagens principais que são o Padeiro e sua Mulher, que foram amaldiçoados por uma bruxa e por isso não podem ter filhos.

 

É interessante observar que o nome do casal não é mencionado. Sobre isso podemos explorar algumas coisas. Bem os contos de fadas nos apresentam figuras arquetípicas, como o herói, a bruxa, fadas, ogros, etc. Ou seja, os contos nos apresentam figuras presentes no inconsciente coletivo, mas que não são humanas, mas representam aspectos da psique coletiva.

O Padeiro é o herói da trama e como herói ele representa um ego arquetípico que é edificado pelo Self. Ou seja, um modelo de ego ideal e um modelo de comportamento para a personalidade consciente. É aquele que age em harmonia com seus instintos e com a totalidade psíquica e que vai estabelecer o equilíbrio perdido da consciência coletiva.

 

 

O fato do padeiro não ter nome simboliza um caráter não pessoal e coletivo. Quando nomeamos algo damos forma a ele e trazemos ao nível pessoal. Essa impessoalidade do herói do filme é um pouco problemática, uma vez que não nos ligamos a ele de forma pessoal, em comparação aos outros heróis de contos de fadas, como Aladim, Peter Pan etc. Significando, então, que esse ego ideal ainda não é capaz de ser totalmente assimilado pela consciência humana.

 

 

O herói do filme é chamado pela sua função – a de padeiro. Ele não é um guerreiro, nem um nobre e não é valente. Sua função é sovar massa e assar os pães e doces do reino. O ato de sovar a massa e alimentar as pessoas está ligado a função sensação. Função essa que liga-nos à realidade, aos cinco sentidos e ao aqui e agora.

O fato de ele ser uma pessoa simples se opõe a ideia contemporânea que o homem precisa ser bem sucedido, um guerreiro másculo e viril. E essa figura do padeiro, que alimenta as pessoas e é sensível mostra justamente o que falta na nossa consciência ocidental para uma ampliação de horizontes.

 

E através dessa jornada narrada no filme, o padeiro entra em contato com a intuição (função essa que se opõe a sensação), simbolizada pela floresta e pelos seres que nela habitam. Ele como é visto terá de confiar naquilo que ele não vê. E não pode provar e a força que o impulsiona a isso é sua mulher que deseja ardentemente um filho.

A ação se inicia quando a bruxa – que também não tem nome – revela ao Padeiro e sua esposa que o pai dele roubou hortaliças de seu jardim, para satisfazer o desejo da esposa, e como punição ele teve de entregar a ela sua filha (Rapunzel), que agora vive em uma torre sem portas. Além disso, o pai do herói roubou alguns feijões do jardim da bruxa e a bruxa o puniu jogando um feitiço que deixou toda sua descendência estéril.

Mas a bruxa lhe oferece uma saída. Para reverter o feitiço o padeiro deverá conseguir quatro objetos até a meia noite. São eles: uma vaca branca, uma capa vermelha, um cabelo amarelo e um sapato que brilha como o ouro.

 

 

Bem todos os objetos solicitados pela bruxa pertencem aos personagens de contos de fadas. A vaca pertence a João, a capa a Chapeuzinho, o cabelo a Rapunzel e o sapato a Cinderela. E dessa forma todos esses personagens clássicos se fundem na história do casal e da bruxa.

Não vou entrar aqui nos detalhes da trama e nem de cada personagem de contos de fadas, pois o texto se tornaria longo demais. Os detalhes de Cinderela, Chapeuzinho, João e Rapunzel devem ser esmiuçados em textos diferentes. Vou apenas me ater ao simbolismo de cada um dos artefatos.

 

 

Bem os objetos solicitados pela bruxa são em numero de quatro. O quatro na psicologia analítica simboliza a totalidade. Dessa forma a jornada do herói no filme é em busca a totalidade. Além disso, as cores da vaca, da capa e do cabelo e sapato se referem a estados da alquimia conhecidos como albedo, rubedo e citrino.

O albedo simboliza uma purificação, um renascimento, o clareamento das ideias, a paz e a tranquilidade. É o momento no qual se ressurge das sombras. Mas é um estado impossível de ser mantido, e logo o citrino surge.

O citrino é um estágio intermediário. Nesse estágio há a transformação da prata em ouro. É o despertar do estado paradisíaco do albedo. A alma se volta para as questões mundanas, para a racionalidade.

A rubedo é o fogo, o sangue, o calor. Depois da calmaria do albedo, chegamos à paixão, ao desejo, à ação. É a transmutação através do fogo. É a vontade de agir. Nessa fase não há mais medo.

 

A cor e estado alquímico que falta nesses objetos é o negro da nigredo. Entretanto ela se apresenta simbolizada pela floresta escura, onde os personagens encaram seus medos e temores. Na segunda parte de filme, após os conhecidos finais felizes dos contos clássico terem ocorrido, a nigredo se faz presente.

Após o Padeiro e sua mulher conseguirem os objetos e a bruxa desfazer a maldição, o casal tem seu sonhado filho. E os personagens clássicos encontram seus finais felizes conhecidos. Até a bruxa consegue o que deseja, uma vez que sua intenção não era ajudar o casal, mas se tornar mais jovem e bela para que Rapunzel não tivesse mais vergonha dela.

 

 

Entretanto, um pé de feijão cresce sem o conhecimento dos personagens, e desse pé a esposa do gigante desce buscando vingança contra quem matou seu marido, ou seja, João. E após isso tudo muda, os personagens mostram seus aspectos sombrios, o príncipe, por exemplo, é infiel a Cinderela. E isso vem nos mostrar que na vida real após um final feliz vem sempre um novo desafio, um novo recomeço. A vida é cíclica e não sabemos quais novos desafios e aspectos sombrios nossos iremos encarar logo em seguida.

 

 

O fato de ninguém ter visto o feijão cair mostra que o desafio se formou no inconsciente primeiramente. Ao cair no solo ele é reprimido e pela consciência e se avoluma chegando a alcançar o céu.

Os gigantes nos contos de fadas simbolizam complexos autônomos de forte conteúdo emocional. Eles são representados como lentos e estúpidos. Psicologicamente também representam uma supervalorização de si próprio, mas que por vezes é necessária, pois caso contrário a pessoa não consegue realizar nada e assim sair de um estado que é apenas confortável. Os gigantes então representam certa megalomania do ego e por serem lentos e estúpidos mostram o tamanho do esforço que deve ser feito para sair da zona de conforto.

 

 

A gigante desce do céu, mostrando que um complexo e uma forte emoção atrelada a ele estava apenas no mundo das ideias, sendo racionalizada. Portanto, aquele final feliz escondia um segredo, uma megalomania inflacionaria que estava disfarçada e reprimida.

 

 

O feijão cai no solo e cresce atingindo o céu. Ou seja, esse pé de feijão tem a função de ligar dois mundos com a função de trazer o que há neles para o mundo humano. Na Mitologia o mundo subterrâneo e o céu representado pelo Olimpo não se misturavam. Cada um dos reinos tinha o seu deus regente e em raríssimas exceções eles iam ao reino um do outro. Apenas um deus podia transitar em todos os reinos e no mundo humano, esse deus era Hermes.

Podemos interpretar a vingança da mulher gigante como uma vingança contra a inflação humana. Uma deusa que desce dos céus para punir todos os eu tentam se igualar aos deuses.

 

 

A segunda parte do filme pode ser desconcertante para os mais sensíveis, pois mostra a noite escura da alma humana, a Nigredo. Ela mostra a vaidade, a ambição, a cobiça, a mesquinhez, o adultério, ou seja, toda a parte obscura que nossa sociedade judaico-cristã tenta de forma capenga reprimir.

 

O filme é então uma critica a essa sociedade, que busca finais felizes sem antes olhar suas mazelas, e que transfere para o outro seus aspectos sombrios ,(uma das cenas desconcertantes é quando os personagens tentam encontrar um culpado pela vinda da gigante) sem assumir seus erros e responsabilidades.

 

Enquanto olharmos apenas para a pureza, racionalidade (albedo), iluminação (citrino) e a ação (rubedo), e nos esquecermos e desprezarmos nossa sombra, não prestaremos a devida atenção aquilo que plantamos e sempre seremos pegos por gigantes vingativos. Somente com o enfrentamento dessa sombra podemos nos tornar mais humanos.

 

Trailer

 

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FICHA TÉCNICA DO FILME

CAMINHOS DA FLORESTA

Título Original (EUA): Into the Woods (Original)
Direção: Rob Marshall
Duração: 125 minutos
Classificação: 12 anos
Ano: 2015

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