A importância da socialização para o desenvolvimento na infância e adolescência

Compartilhe este conteúdo:

O ser humano é um ser que está em constante mudança em todos seus aspectos, tanto no desenvolvimento físico, cognitivo quanto no psicossocial. Com isso, essas transformações ao longo do tempo constroem a sua personalidade e sua formação enquanto indivíduo. O contrário disso, afetaria este em algumas de suas habilidades, e não sendo trabalhada a tempo e de forma tecnicamente adequada, poderia acarretar em prejuízos significativos no desenvolvimento do ciclo de vida do sujeito.

Os estudos acerca do desenvolvimento da vida humana torna-se cada vez mais presente em diversas áreas: “incluem psicologia, psiquiatria, sociologia, antropologia, biologia, genética, ciência da família, estudos interdisciplinar sobre relações familiares, educação, história e medicina” (PAPALIA & FELDMAN, 2013, p.37). E muitos dos estudos atuais são dedicados a compreender a evolução dos indivíduos no contexto social, bem como dos fatores que contribui estando ou não em socialização, e os agravos que podem ser elencados com a ausência dessa habilidade.

No ano 2020, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que a COVID-19, doença causada pelo Novo Coronavírus estava se expandido e caracterizando-se como uma pandemia, que as pessoas precisavam se cuidar e um dos meios para evitar o contágio foi evitar o contato com pessoas infectadas, que levou ao surgimento de um novo comportamento, o de ficar em isolamento social. Este evento atípico e estressor fez com que as pessoas se confinassem em seus lares, aliado ao medo de contrair o vírus.

Neste cenário, a pandemia trouxe inúmeras mudanças na vida cotidiana da população de modo geral. Esse evento impactou na rotina de vida de crianças e adolescentes, devido ao fechamento de escolas, o tempo que passavam em casa dobrou, prevalecendo prejuízos aliado à perda do convívio social (FIOCRUZ, 2020). Desse modo, é fato que todas as crianças estão sujeitas as repercussões psicossociais e atrasos no desenvolvimento cognitivo no que se refere às habilidades voltadas à aprendizagem, linguagem, raciocínio, atenção e criatividade.

A ampliação das habilidades sociais pode culminar em um melhor convívio em sociedade e principalmente no ambiente escolar, contexto de convivência diária das crianças, além disso, pode contribuir para a expansão do desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial dessas crianças, mas é sabido que existem barreiras no que diz respeito à construção das relações sociais.

Durante todo o ciclo do desenvolvimento estamos inseridos em contextos que se configuram pela socialização. Logo, trabalhar questões relacionadas aos déficits, potencializando maneiras de enfrentamento com o intuito de reduzir possíveis problemas, justifica a respectiva intervenção. Podendo assim, o quanto antes, intervir de forma pontual para evitar situações agravantes no futuro. 

O desenvolvimento humano é um processo que ocorre durante toda a vida, contendo processos sistemáticos de mudança e aprimoramento, de modo geral em todos os aspectos da vida humana. E durante essas fases, as habilidades individuais tornam-se presentes e o não desenvolvimento das mesmas podem trazer sérios atrasos na vida dos sujeitos.

Segundo Papalia e Feldman (2013), o ser humano possui três principais domínios/aspectos que ao longo da formação da vida são desenvolvidos, tais como: desenvolvimento físico, a evolução do corpo e do cérebro. O desenvolvimento cognitivo está relacionado a aprendizagem e por último, o desenvolvimento psicossocial que se refere às relações sociais experienciadas pelos sujeitos.

Neste contexto, após o início da pandemia do COVID-19 e com os avanços nas áreas de tecnologia, um público que chega a ser afetado diretamente devido o contágio pelo o Novo Coronavírus são as crianças, a qual ficaram por meses isolados em suas casas sem poder interagir com outras crianças e tendo que lidar com o ensino escolar no formato online, sem convívio social. E apenas no ano de 2022, ou seja, após 2 anos de pandemia as aulas presenciais voltaram de maneira gradual, sendo necessário a ressocialização. De acordo com Vygotsky (1978) em seus estudos, conclui-se que as crianças aprendem por meio da interação social, compartilhando e aperfeiçoando sua capacidade de interagir.

Os impactos que esse período de transição traz consigo é claro no cotidiano das crianças, como por exemplo insegurança e incertezas afetando especificamente no funcionamento psicológico destas crianças (MURATORI & CIACCHINI, 2020), além de fatores estressantes como tédio, agressividade, ansiedade, inquietação, entre outros.

Outro fator é a globalização da economia, percebe-se que o individualismo ganha espaço e em seguida o consumismo, gerando consequências que afetam diretamente as relações sociais, tornando-as egocêntricas e por consequência causando o distanciamento das pessoas e impossibilitando a construção das habilidades sociais, assim gerando agravamento das desigualdades sociais. Segundo Papalia e Feldman (2013) “o desenvolvimento psicossocial pode afetar o funcionamento cognitivo e físico”, ou seja, sem socialização as crianças podem ter prejuízos em ambas as áreas.

Além dos fatores ambientais que interferem no processo de construção das habilidades sociais, é necessário considerar que esse é um processo de desenvolvimento interpessoal. Mesmo na ausência de transtornos específicos associados a dificuldades de relacionamento, as crianças não desenvolvem igualmente suas diferentes habilidades sociais, nem as desempenham com igual proficiência em todas as situações. (DEL PRETTE & DEL PRETTE, 2005, p 52).

Por outro lado, atualmente é cada vez mais notado a presença de comportamentos considerados socialmente inadequados, independente da faixa etária e principalmente após o início da pandemia. Onde muitas das reações esperadas e apresentadas pelas crianças ao longo do período pandêmico, tais como: “dificuldades de concentração, irritabilidade, medo, inquietação, tédio, sensação de solidão, alterações no padrão de sono e alimentação” (FIOCRUZ, 2020, pág. 4), são oriundos dos prejuízos associados à educação formal e a socialização dessas crianças em pleno século XXI.

Cunha e Rodrigues (2010), reforça a importância de promover o desenvolvimento de características pessoais trazendo um cunho positivo e mais adaptativo, sendo capaz de promover a saúde psicológica através de recursos, como a resiliência. Além disso, Botvin e Griffin (2004), afirmam que as intervenções em habilidades sociais produzem além da redução de comportamentos de risco, gerando saúde física, como também fortalece o bem-estar psicológico, aumentando o autoconhecimento, autocuidado e aprendizagem.

Seguindo tal perspectiva, é necessário um olhar direcionado aos estudos acerca das habilidades sociais, em especial com as crianças, buscando intervir e proporcionar uma diminuição da frequência de comportamentos considerados inadequados e assim promover a socialização, estimulando o contato e o convívio social no meio ao qual estão inseridas. Pois, as intervenções são benéficas, principalmente para o público infanto-juvenil, trazendo resultados positivos ao desenvolvimento psicossocial, gerando uma melhora na qualidade de vida como um todo. 

REFERÊNCIAS 

BOTVIN, G. J.; GRIFFIN, K.W. Life Skills Training: Empirical Findings and Future Directions. The Journal of Primary Prevention, Cambridge, v. 25, n. 2, 2004, p. 211-232. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1023/B:JOPP.0000042391.58573.5b. Acesso em: 16 set. 2021.

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Código de Ética Profissional dos Psicólogos, Resolução n. º 10/05, 2005.

Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução n° 196/96. Bioética 1996, 4(2), Supl:15-25

COELHO, N.M. A utilização do lúdico pelos estagiários de psicologia da clínica escola do CEULP/ULBRA – Trabalho de Conclusão de Curso – Palmas, 2013.

CUNHA, N.; RODRIGUES, M. C. O desenvolvimento de competências psicossociais como fator de proteção ao desenvolvimento infantil. Est. Inter. Psicol., Londrina, v. 1, n. 2, p. 235- 248, jun. 2010. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/eip/v1n2/a08.pdf. Acesso em: 20 de março de 2023.

Del Prette, Z. A. P. (2005). Psicologia das habilidades sociais na infância: teoria e prática. Petrópolis, RJ: Vozes.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ (FIOCRUZ). Saúde Mental e Atenção Psicossocial na COVID-19: Crianças na Pandemia COVID-19. Rio de Janeiro, 2020b. Disponível em: https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/wp-content/uploads/2020/05/crianc%CC%A7as_pandemia.pdf. Acesso em: 20 de março de 2023

Muratori, P., & Ciacchini, R. (2020). Children and the COVID-19 transition: psychological reflections and suggestions on adapting to the emergency. Clinical Neuropsychiatry, 17(2), 131-134. https://doi.org/10.36131/CN20200219

PAPALIA, D. E. e FELDMAN, R. D. (2013). Desenvolvimento Humano. Porto Alegre, Artmed, 12ª ed

Vygotsky, L. S. (1978). Mente na sociedade: O desenvolvimento do processo psicológico superior. Cambridge. MA: Harvard University Press.

Compartilhe este conteúdo:

Explorando a envelhecência: a vida e a funcionalidade na terceira idade

Compartilhe este conteúdo:

Por meio das vivências de seis indivíduos vibrantes, o documentário revela a plenitude da vida após os 60 anos, demonstrando como a rotina pode ser repleta de atividades e bom humor

O documentário “Envelhecência” mergulha profundamente na complexa e multifacetada experiência do envelhecimento. Com uma mistura envolvente de histórias pessoais e análises de especialistas, o filme oferece uma visão abrangente e perspicaz das diversas facetas desse estágio da vida. Através de relatos comoventes de indivíduos idosos e suas famílias, o documentário aborda uma variedade de questões enfrentadas pela população idosa, desde desafios de saúde até questões emocionais e sociais. São explorados temas como a solidão, a busca por propósito e significado na terceira idade, e as dificuldades enfrentadas para se manterem socialmente ativos e engajados na comunidade.

“Envelhecência” também oferece percepções valiosas de profissionais da área da saúde, psicologia e assistência social, que compartilham suas experiências sobre como lidar com os desafios específicos enfrentados pelos idosos. Dentre tais assuntos, o filme destaca a importância da conexão intergeracional e da valorização da sabedoria e experiência dos mais velhos na sociedade contemporânea. Ao longo do documentário, somos levados a refletir sobre como podemos criar ambientes mais inclusivos e solidários para os idosos, promovendo sua qualidade de vida e respeitando sua dignidade. “Envelhecência” nos inspira a reconhecer o valor intrínseco da velhice e a redefinir nossas percepções sobre o envelhecimento, oferecendo uma poderosa celebração da vida em todas as suas fases.

Casos da vida real

O documentário explora o conceito de envelhecimento com vitalidade e liberdade, mergulhando na revolução da longevidade e seu impacto tanto individualmente quanto na sociedade. Através de narrativas inspiradoras, o filme destaca pessoas que desafiam as expectativas sociais, encontrando alegria e realização em atividades como corrida e surfe, independentemente da idade. Enfatizando a importância da atividade física para a saúde e a superação das limitações associadas ao envelhecimento, ele também compartilha histórias tocantes de perseverança e autodescoberta. “Envelhescência” encoraja uma vida vivida segundo os próprios termos, incentivando a quebra de tabus e estereótipos sociais sobre o envelhecimento.

Judit Gaggiano exibe um corpo adornado com tatuagens e mais de 20 piercings, enquanto compartilha momentos em um moto clube ao lado de seu filho. Após escapar de um relacionamento abusivo, a morte do esposo desencadeou uma transformação profunda em Judit. Ela emergiu como uma versão completamente diferente de si mesma. Decorando seu corpo com tatuagens e piercings, trocando o blazer por uma jaqueta de couro, e se integrando a um moto clube, ela abraçou uma nova identidade com fervor.

Aos 84 anos, Oswaldo Silveira, maître de profissão, mantém uma rotina disciplinada ao acordar cedo todos os dias para calçar seus tênis e enfrentar de 10 a 15 quilômetros de corrida antes do trabalho. Em seu relato, ele compartilha as dificuldades de sua infância, marcada pela perda precoce da mãe, o que resultou na separação dos irmãos ao redor do Brasil. Iniciando sua jornada profissional aos 10 anos como garçom, ele gradualmente ascendeu a barman e hoje continua como maître. Desde tenra idade, Oswaldo demonstrou paixão pelos esportes, especialmente corrida e futebol. Aos 50 anos, decidiu abandonar o futebol para se dedicar inteiramente à corrida, rapidamente se destacando como maratonista. 

Ono Sensei, mestre de Aikidô, entra em sua nona década com a destreza e agilidade de um jovem, continuando a lecionar sua arte marcial com maestria. Sua vida é marcada por uma atitude ativa e saudável, estendendo-se além das práticas marciais. Além de ser um mestre de Aikidô, Ono Sensei também é acupunturista e dedica-se a ensinar técnicas de respiração diárias, com sessões que duram duas horas. Desde cedo, ele reconheceu a fugacidade da vida e a importância de mantê-la ocupada. Sua filosofia de vida reflete a crença de que a verdadeira felicidade reside na ocupação constante e significativa do próprio tempo.

Mesmo aos 74 anos, Luiz Schirmer continua a desafiar os céus com a mesma paixão que o impulsionou desde a adolescência: o paraquedismo. Em uma idade em que muitos optam por atividades mais calmas e seguras, Schirmer destaca-se ao persistir nessa aventura extraordinária. Cada salto é um testemunho não apenas de sua coragem e determinação, mas também de sua vitalidade e espírito indomável. É um exemplo inspirador de como a idade não precisa ser um obstáculo para perseguir paixões e conquistar novos horizontes.

Edmea Corrêa descobriu sua paixão pelas ondas após ultrapassar a metade de um século de vida. Aos 58 anos, iniciou sua jornada como surfista motivada pelo filho, que aos 24 anos enfrentou uma doença rara que o deixou cego. Inspirada por um projeto de surf adaptado para pessoas com deficiência visual, Edmea decidiu experimentar as ondas junto com seu filho. Desde a primeira aula, foi um encontro transformador. Ela se apaixonou pelo surf instantaneamente, descrevendo-o como “amor à primeira onda”.

Edson Gambuggi, aos 76 anos, tornou-se calouro na faculdade de Medicina, realizando um sonho que fomentou ao longo de toda sua vida. Apesar das tentativas durante sua juventude, as dificuldades do processo e as responsabilidades familiares o levaram a adiar esse objetivo. Em 1971, optou por cursar Direito, buscando estabilidade financeira e uma melhor qualidade de vida para sua família. No entanto, com a chegada da aposentadoria, o tempo ocioso trouxe à tona o desejo inabalável de estudar medicina. Para Edson, essa jornada representa não apenas a busca por conhecimento, mas também a realização de um propósito adiado por décadas.

O receio do envelhecimento é algo comum a todos nós, mas é mais recompensador aceitar esse processo em vez de lutar pela perfeição e juventude eterna. Envelhecer é uma parte natural e inevitável da vida e, embora apresente desafios, devemos sempre considerar a alternativa – morrer jovem, mesmo velho. Para tal, faz-se necessário manter um senso de humor e vitalidade, pois isso nos permite surpreender os outros e manter conexões sociais vivas. Oswaldo, por exemplo, destaca os benefícios da corrida e como ela contribui para uma vida longa e saudável. A sensação de realização e triunfo ao completar uma maratona é descrita por ele como indescritível, trazendo orgulho e impulsionando a autoestima. Abraçar o processo de envelhecimento e manter uma mentalidade positiva pode levar a uma vida gratificante e satisfatória.

O segredo, segundo “Envelhecência”, reside em concentrar-se na busca por interesses e em manter uma qualidade de vida elevada ao longo de toda a jornada, inclusive na velhice. Devemos evitar nos sentir perdidos ou inativos e é essencial aproveitar ao máximo o tempo que nos é dado, resistindo à ideia de nos considerarmos “velhos” prematuramente. Devemos valorizar a importância de permanecer ativos, buscando a felicidade e realizando atividades que nos tragam alegria. Faz-se importante lembrar também, que a velhice é uma etapa universal da vida, inevitável para todos, independentemente de outros aspectos sociais. Assim, é fundamental que construamos desde já uma base sólida para um envelhecimento futuro pleno e gratificante.

FICHA TÉCNICA

Um documentário de ProacSP (Incentivo de Cultura do Estado de São Paulo)

Direção: Gabriel Martinez

Produção: Samarah Kojima

Direção de fotografia: Daniel Dias

Montagem: Caio Rodrigues

Duração: 1:24:00

Disponível em:<https://www.youtube.com/watch?v=i4cLyLdK5EA>

 

Compartilhe este conteúdo:

Reflexões sobre Psicologia da Saúde, do Trabalho e do Desenvolvimento

Compartilhe este conteúdo:

Durante a jornada acadêmica, anos se passam e diversos professores deixam sua marca de maneiras distintas. Disciplinas variadas e conteúdos importantes contribuem para a construção da nossa visão de mundo. Com o tempo, amadurecemos, ampliamos nosso olhar e conseguimos relacionar diferentes contextos, desenvolvendo um raciocínio clínico.

Nossa mente se torna um banco de dados no qual, com o passar do tempo, conseguimos relacionar algumas variáveis. Este texto é fruto de uma dessas conexões entre conteúdos. Quero compartilhar um recorte de como a graduação tem sido uma experiência enriquecedora, somando-se a cada dia à minha vida.

O texto que trago aqui começou a ser construído quando li o seguinte relato:

“Um dia tenso. Chego ao hospital antes das sete horas, e quatro pacientes internados no andar já esperam minha visita. Não tive tempo de conversar com o médico que passou na véspera e estou atrasada. Impressionante como alguém que levanta da cama exausta consegue já estar atrasada às sete da manhã. Eu preciso ler os prontuários e entender o que ocorreu nas últimas 24 horas. A letra do colega não ajuda. Fico muito irritada. O estômago dói. Penso que deveria parar de tomar tanto café.

Entro no primeiro quarto: mulher, 39 anos, divorciada. Um filho adolescente ainda dorme profundamente no sofá de acompanhante. A mulher geme. Ela tem câncer metastático de pulmão. Não era tabagista. A dor está muito intensa ainda, apesar de utilizar uma bomba de morfina há três dias. Está difícil encontrar a dose ideal do analgésico, pois ela tem muita sensibilidade aos efeitos colaterais. Por um instante, olho a cena de um ponto de vista novo. Observo a mulher e, de repente, me transformo nela”. (ARANTES, 2019 p 42-43)

Esse trecho em específico retrata a intensa rotina de uma médica, uma realidade que muitos profissionais de saúde enfrentam em diferentes contingências, esse recorte chamou minha atenção devido a uma série de fatores, todos relacionados à minha jornada na graduação de Psicologia. No primeiro semestre de 2023, cursei a disciplina “Psicologia e Saúde em Diferentes Contextos”. Foi lá que ouvi pela primeira vez o termo “fadiga de compaixão”. Lembro-me de ficar intrigado e me questionar: “Como é possível que profissionais da saúde, que se dedicam tanto, possam ficar fatigados ao ter compaixão pelo outro?”. Hoje, percebo que esse questionamento refletia minha imaturidade e falta de compaixão em relação a esses profissionais.

Durante essa disciplina, ficou mais claro para mim a ocorrência desse fenômeno e sua natureza frequente e triste na vida desses profissionais; pessoas que se doam tanto que já presenciaram tantas formas de sofrimento que desenvolvem uma resistência a ele, chegando ao esgotamento. O livro de Ana Claudia Quintana Arantes aborda esse fenômeno da seguinte forma:

“A fadiga de compaixão ou estresse pós-traumático secundário ocorre preferencial- mente com profissionais de saúde ou voluntários que têm a empatia como principal ferramenta de ajuda. Pessoas que lidam com tanto sofrimento que acabam por incorporar a dor que não lhes pertence”. (ARANTES, 2019 p 41).

 

Passado um ano dessa disciplina, cheguei ao primeiro semestre de 2024, e como a grade curricular da minha universidade é flexível, algumas disciplinas indicadas para períodos específicos podem ser cursadas em outros momentos. Isso aconteceu comigo em relação à disciplina “Psicologia do Desenvolvimento II”, que é do segundo período e eu cursei no quinto semestre. Nessa disciplina, foi proposta a leitura do livro de Ana Arantes, o mesmo mencionado na aula de Psicologia e Saúde. Ao reler o livro, memórias e aprendizados anteriores voltaram à tona, mas agora foram encarados de outra maneira, tanto por ter passado por outras disciplinas quanto por estar cursando outra que ampliou meu olhar em relação ao outro.

A disciplina “Psicologia do Trabalho” tem abordado o contexto de intensificação e precarização do trabalho, questões que têm me sensibilizado e deixado mais atento a detalhes que se relacionam. Os relatos da médica e o fato da fadiga de compaixão estarem ligados à intensificação do trabalho e às altas demandas, vinculadas à responsabilidade de lidar com a vida humana, foram aspectos que se entrelaçaram em minha compreensão.

A relação entre a fadiga de compaixão e a intensificação do trabalho dos profissionais de saúde é complexa e muitas vezes subestimada. Com a crescente demanda por serviços de saúde, esses profissionais enfrentam uma carga de trabalho intensa, muitas vezes em mais de um local, combinada com a responsabilidade de lidar com o sofrimento humano diariamente.

A intensificação do trabalho na área da saúde vai além da carga horária ou da falta de recursos. Refere-se também à pressão por produtividade e eficiência, que muitas vezes sacrifica o bem-estar dos profissionais. Isso se traduz em jornadas longas, recursos limitados e uma carga emocional pesada ao lidar com o sofrimento humano. Além disso, a sobrecarga cognitiva e física dos trabalhadores pode levar à exposição a riscos e à deterioração da saúde. Em momentos de alta demanda, como em situações de emergência, o risco de acidentes aumenta. Conciliar rapidez e atenção com cuidado na execução das tarefas torna-se um desafio, principalmente quando o foco é garantir o restabelecimento das condições clínicas do paciente, pois existe uma alta demanda de pessoas que precisam ser atendidas, pessoas que estão em sofrimento, e a responsabilidade urgente de lidar com esse sofrimento, é direcionada para esse profissional. (FERNANDES et.al 2014)

Ana Arantes trás uma fala em seu livro que se relaciona com essa contingência de intensificação do trabalho dos profissionais da saúde: 

“Parece que cai bem socialmente dizer que você não teve tempo de almoçar, não teve tempo de dormir, não teve tempo de mexer o corpo, de rir, de chorar – não teve tempo de viver. A dedicação ao trabalho parece estar ligada a um reconhecimento social, a uma forma torta de se sentir importante e valorizado; tudo à sua volta tem a obrigação de entender que o mundo só pode girar se você estiver empurrando”. (ARANTES, 2019 p 38)

 

Para lidar com a fadiga de compaixão, muitas vezes ocorre o distanciamento afetivo, no qual se tenta separar as emoções do trabalho para evitar o esgotamento emocional. No entanto, essa abordagem pode levar à desconexão emocional e à redução da qualidade do cuidado prestado. Por isso, muitas vezes os profissionais da saúde parecem rudes, já que viram tanto sofrimento que desenvolvem uma tolerância ou se afastam das emoções das pessoas para se protegerem.

Diante desses diferentes contextos, percebo como é essencial que os sistemas de saúde reconheçam e abordem a fadiga de compaixão, fornecendo apoio emocional e recursos adequados para os profissionais, mostrando-lhes que também podem ser cuidados. No entanto, é importante que esses profissionais estejam conscientes da importância de cuidar de si mesmos. Como afirmado por Ana Claudia Quintana Arantes (2019 p. 38), “minha vida ficou mais plena de sentido quando descobri que tão importante quanto cuidar do outro, é cuidar de si”. 

REFERÊNCIAS:

ARANTES, Ana Claudia Quintana. A morte é um dia que vale a pena viver. Sextante, São Paulo:, 2019.

FERNANDES, R.C.P., LIMA, M.A.G; ARAÚJO, T.M. Tópicos em saúde, ambiente e trabalho: um olhar ampliado. UFBA, Salvador:, 2014

Compartilhe este conteúdo:

Como a família de Harry Potter impactou seu desenvolvimento?

Compartilhe este conteúdo:

Conflitos intrafamiliares, segredos e negligências fizeram parte do processo de desenvolvimento de Harry Potter.

Harry Potter é o personagem principal de uma saga de sete romances publicada pela autora J.K.Rowling. Os volumes da autora percorreram o mundo, tornando Harry Potter um dos personagens mais queridos da literatura fantástica. Em 1998 o primeiro livro era lançado e, em 2001 era adaptado para os cinemas. Os filmes e livros da saga Harry Potter marcaram a infância e adolescência de muitas pessoas, e ainda hoje são conhecidos mundialmente e consumidos pela população.

O primeiro livro introduz a história de Harry Potter, um garoto de onze anos que perdeu seus pais com apenas um ano de idade, em um confronto contra o Lorde das Trevas. No embate, seus pais se foram, mas Harry sobreviveu, ficando famoso no mundo dos bruxos por ter sido o único a sobreviver a um encontro com o poderoso bruxo.

Harry passou a viver com seus tios e o primo após a perda, que mantiveram em segredo as origens do garoto, assim como o fato de que ele possuía habilidades especiais. Ao completar onze anos, Harry recebe cartas que o convocam até Hogwarts, a escola de magia. Mesmo com as tentativas do tio de impedi-lo de recebê-las, Harry descobre a verdade e parte para a escola.

No primeiro volume da saga, Harry faz amizades, descobre mais a respeito de seus pais e aprende os segredos do mundo dos bruxos. Os leitores acompanham o desenvolvimento pessoal, social e acadêmico do garoto que, anteriormente, se sentia deslocado e sozinho.

Inicialmente, a autora contextualiza a criação do personagem principal narrando como eram suas relações com a família Dursley e os sentimentos do jovem bruxo. Harry, seus tios e seu primo compõem uma família marcada por disfuncionalidades que afetam o garoto de diferentes formas.

Uma família é compreendida como funcional quando os integrantes do sistema são capazes de prepararem-se para enfrentar crises internas e externas, que afetam diretamente a saúde familiar e o bem-estar dos membros.¹ Quando a família não consegue promover um desenvolvimento saudável para seus integrantes, não apresenta comunicação e capacidade de se adequar às mudanças, é caracterizada como sendo disfuncional.²

Boneco Funko Harry Potter.
Fonte: Imagem de PokeyArt no Pixabay.

Os primeiros anos de vida do sujeito são de extrema importância para um crescimento emocional saudável e configuram uma base para seu equilíbrio psicossocial. Sentimentos como abandono, perda, ausência, tristeza, humilhação, medo e angústia podem servir como origem para comportamentos antissociais.³ Torna-se possível, portanto, identificar diversos momentos na saga Harry Potter que contextualizam os leitores da criação que o personagem recebeu na casa de seus tios, sendo um crescimento marcado por violências e falta de atenção.

No primeiro livro da saga, Harry Potter e a Pedra Filosofal, a autora traz situações fundamentais para o entendimento da criação da criança. O garoto dormia em um pequeno cômodo localizado embaixo da escada, usava roupas antigas do primo – que muitas vezes estavam desgastadas, possuía um péssimo relacionamento com todos da casa, era responsável pelas tarefas domésticas e recebia muitos castigos da família. Ainda no primeiro volume, é apresentada a situação na qual é aniversário do primo de Harry, Duda. No entanto, apesar do protagonista precisar fazer o café da manhã do primo, não é convidado para as comemorações. Nesta cena, a pessoa responsável por ficar encarregada de Harry durante o passeio da família é impossibilitada, então seus tios começam a debater o que fazer com a criança.

Inicialmente, discutem a respeito das pessoas que poderiam monitorá-lo, na falta de opções, consideram deixar a criança sozinha em casa, mas concluem que a mesma “destruiria” a casa. Posteriormente, refletem a possibilidade de levá-lo ao passeio e deixá-lo no carro, para só então resolveram levá-lo à comemoração. A criança ainda recebeu uma ameaça do tio, que disse “a primeira gracinha que fizer, a primeira, vai ficar preso naquele armário até o Natal”⁴.

A família de Harry se recusa a mandá-lo para o colégio e, posteriormente, não querem arcar com nenhum custo de materiais escolares que o garoto possa precisar, não oferecendo qualquer tipo de suporte para que o protagonista possa partir para Hogwarts. No segundo livro, Harry Potter e a Câmara Secreta, o tio do personagem recebe pessoas importantes em casa. Por isso, Harry precisa ficar trancado em seu quarto e é proibido de descer até a sala, pois seus tios não querem que ele atrapalhe a reunião importante, mesmo assim, seu primo participa do encontro.

A cena se repete em outros momentos, nos quais Harry é impedido de participar de programas realizados pela família e precisa ficar em outro local enquanto isso. Além disso, o garoto é vítima de bullying do próprio primo e seus amigos, que atormentam-no diariamente, enquanto o mesmo não possui nenhum círculo de amizades.

A violência vivenciada por crianças tem o poder de prejudicar todos os aspectos de sua vida, não apenas psicológicos, mas também físicos, comportamentais, acadêmicos, interpessoais, entre outros fatores que seguem todo o seu crescimento.⁵ As situações experienciadas por Harry em sua casa são marcadas por humilhações, violência e negligência.

Entende-se que a violência é uma maneira de restringir a liberdade do sujeito, por meio de repreensão física, sexual e moral. Crianças que vivem em constantes experiências marcadas por ausências ou presenças intrusivas, conhecem somente os extremos da distância afetiva. Por consequência, nota-se que o personagem é marcado por características como introversão e baixa autoestima. Ao ir para Hogwarts, a escola de magia, e se deparar com um mundo fascinante, Harry deseja, em uma cena, ter oito anos novamente. Essa descrição exibe a falta de infância vivenciada pela criança, que se maravilhou ao ir para um lugar diferente pela primeira vez.

O personagem é tido pelos tios como um bode expiatório, sendo punido por situações das quais não é culpado. O pavor dos tios pelo mundo bruxo é transformado em raiva pelo garoto, que é negligenciado pela família e culpado por todas as coisas ruins que acometem o ambiente familiar. A autoestima do personagem também é afetada pela forma como a família Dursley. Ao conhecer o mundo bruxo, Harry Potter descobre que é famoso por ter sobrevivido ao confronto que matou seus pais. Ao mesmo tempo, o garoto questiona suas habilidades a todo tempo, sem entender o motivo pelo qual sobreviveu, não se achando capaz de tal feito, além de enfrentar diversos conflitos no início de seu ano letivo, duvidando de sua aptidão.

Para que uma criança cresça e se desenvolva bem, é imprescindível que haja amor, segurança e limites impostos.⁷ No entanto, Harry é criado com limites rígidos, falta de afeto e suporte. Isso possui profundo impacto nos momentos seguintes, quando o garoto parte para a nova vida e estabelece relações interpessoais com os demais personagens.

No passar dos livros, Harry Potter consegue desenvolver relacionamentos com os novos colegas, e é acolhido por figuras que exercem o papel de direcionamento e afeto. Um exemplo disso é a relação com a família Weasley, que aparece com um funcionamento totalmente oposto à família de Harry. Os Weasley são numerosos, não possuem condições financeiras tão boas, mas são amáveis, cuidam uns dos outros e acolhem Harry como se fosse da família. Em várias cenas, Harry recebe presentes de Natal enviados pela família acolhedora.

Livros da saga Harry Potter.
Fonte: Imagem de crizgabi no Pixabay.

Outros personagens que foram fundamentais para o desenvolvimento social do garoto foram Dumbledore, Hagrid, Sirius Black, entre outros. Todos foram figuras importantes, que direcionaram o protagonista, demonstraram afeto e apoio emocional.

Mesmo tendo conflitos com outros garotos do colégio, o personagem é capaz de formar seu próprio círculo de amizades, desenvolver suas relações e tornar-se confiante de suas capacidades no meio acadêmico, recebendo o apoio necessário para sua evolução. É possível acompanhar o crescimento de Harry ao longo dos volumes da saga, que se torna um indivíduo obstinado, comprometido e com boas relações interpessoais. Sem uma intervenção precoce, crianças inseridas em famílias disfuncionais vivem em um cenário repleto de perdas, abandono, separações e angústias, podendo desenvolver e perpetuar graves patologias transgeracionais.

O rumo da vida do protagonista muda ao distanciar-se de casa e passar a conviver com pessoas que o acompanham em sua jornada. O sujeito em risco sempre se sente desamparado, sozinho, e necessita de uma intervenção que possa mudar suas concepções e acrescentar em seus conflitos.³ No caso de Harry Potter, os leitores acompanham uma nova rota em sua vida, ainda que o garoto tenha que retornar à casa dos tios. Os problemas como baixa autoestima e introversão são, aos poucos, superados, graças à presença de situações e indivíduos.

REFERÊNCIAS

  1. GÓMEZ, MTO. La família funcional y disfuncional, un indicador de salud. Rev. Cubana Med. Gen. Itegr. 1999;13(2):591-5. 
  2. SANTÍ, PMH. La salud familiar. Rev. Cubana Med. Gen. Itegr. 1997;15(4):439-45.
  3. STRECHT,  P.  (2003).  À  margem  do  amor.  Notas  sobre  negligência  juvenil.  Lisboa: Assírio & Alvim
  4. ROWLING, J. K. Harry Potter e a pedra filosofal. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2000. p.23.
  5. GONÇALVES, Kellen Cristina. Ofendidos e Humilhados: O descortinar da violência infantil: Uberlândia MG  1976-1996. Uberlândia, 2009.
  6. STRECHT, P. (1999). Preciso de ti. Perturbações psicossociais em crianças e adolescentes. Lisboa: Assírio & Alvim.
  7. BLÉANDONU, G. (2003). Apoio terapêutico aos pais. Lisboa: Climepsi.
Compartilhe este conteúdo:

Intervenção naturalística à neurodiversidade

Compartilhe este conteúdo:

O Transtorno do Espectro Autista, o Transtorno de Déficit de Atenção, entre outros transtornos e atrasos no desenvolvimento podem ser, e graças ao desenvolvimento científico, são cada vez mais descobertos logo cedo, nos primeiros anos de vida, o que pode impactar de forma significativa na vida, e no desenvolvimento dos indivíduos com estes atrasos no desenvolvimento, ou desenvolvimento atípico. 

No entanto, como o diagnóstico se torna cada vez mais comum na sociedade, e encontramos também cada vez mais adultos sendo diagnosticados de forma tardia, os tratamentos mais diversos tem se proliferado em busca de ajudar no desenvolvimento de forma efetiva e eficaz, para dar mais qualidade de vida para estar crianças, e os tratamentos mais encontrados são, fonoaudiologia, tratamento medicamentoso, psicoterapia individual, musicoterapia, terapia ocupacional, fisioterapia, Padovan, e o tratamento intensivo com terapia ABA (Análise do comportamento Aplicada). 

Abordando um pouco acerca desta intervenção intensiva onde as crianças têm terapia em geral, todos os dias da semana, cerca de uma a duas horas por dia, a variar de acordo com a necessidade específica de cada criança, de suas necessidades, o ABA é comprovado como a intervenção mais eficaz no desenvolvimento de crianças atípicas. Porém dentro desta ciência existem diversos modelos de abordagens para esse tipo de terapia. Uma delas, é muito utilizada é o treino de tentativas discretas. 

O DTT (Treino de Tentativas Discretas) decompõe os comportamentos, para poder ensiná-los de forma isolada (Smith, 2001). A aplicação se dá por meio de um número predeterminado de tentativas, com uma contingência de três termos, antecedente, resposta e consequência, e conforme Ghezzi (2007), o DTT é um procedimento de ensino onde o aplicador tem total controle sob as oportunidades de aprendizado, manipulando variáveis para que se possa estabelecer um aprendizado de novas habilidades.

Além deste modo de intervenção com tentativas discretas, existem os modelos naturalísticos, como o Denver, que ao invés de o aplicador ter controle total do atendimento, no modelo Denver o terapeuta segue a criança e enquanto faz brincadeira da criança, faz a aplicação dos programas, este modelo se baseia em intervenções naturais que em envolvem a rotina familiar, onde o vínculo com a criança é de suma importância, a ponto de que a própria brincadeira seja o reforço da criança, não se fazendo necessário o uso de reforçadores externos, como outros brinquedos, aplausos.

Por ser um modelo de intervenção precoce e que se assemelha a rotina da criança, apresenta também resultados significativos, estas crianças podem ter seus sintomas minimizados, pois a plasticidade cerebral nesta fase é ainda mais latente, e nas últimas décadas foi percebido que as intervenções precoces reduziram a gravidade da linguagem e o comportamento intelectual e aceleraram a aprendizagem das crianças (ROGERS, 2014).

A intervenção Dever pode ser muito eficaz, e com aprendizado que dificilmente as crianças voltem a perder as habilidades adquiridas, por serem associadas a emoções positivas criam conexões neurais muito mais resistentes, e tendem a ter crianças com menos comportamentos inapropriados pelo vínculo terapêutico e forma de trabalho.


Referências 

GHEZZI, Patrick M. Discrete trials teaching. Psychology in the Schools, v. 44, n. 7, p. 667-679, 2007.

ROGERS, Sally J.; VISMARA, Laurie. Interventions for infants and toddlers at risk for autism spectrum disorder. Handbook of Autism and Pervasive Developmental Disorders, Fourth Edition, 2014.

SMITH, Tristram. Discrete trial training in the treatment of autism. Focus on autism and other developmental disabilities, v. 16, n. 2, p. 86-92, 2001.

Compartilhe este conteúdo:

Pica Pau: influência nos processos de desenvolvimento da criança

Compartilhe este conteúdo:

Pica Pau é um personagem da série estadunidense produzido pelo estúdio Walter Lantz, distribuído pela Universal Pictures. Sua criação teve origem em novembro de 1940 pelas mãos dos produtores Walter Lantz e Ben Hardaway(desenhista). Sua primeira aparição foi de forma secundária em um desenho ( Andy Panda). Em 1957 ganhou seu próprio espaço com ” the woody woodpecker” de forma traduzida show do pica pau. Em um primeiro momento, pica pau aparece como um pássaro louco, de cores fortes e chamativas, porém com o passar do tempo, sofreu diversas modificações.

Fonte: encurtador.com.br/gsJ28

Um personagem de época marcante que ultrapassa gerações, embora alvo de críticas por muitos adultos, por ser considerado uma má influência nas crianças, graças a sua personalidade ambígua e teimosa. Muitas vezes taxado como louco, preguiçoso, inconsequente, agressivo, trapaceiro e desonesto, os adultos geralmente esperam que um desenho seja algo inocente com transmissão de alguma lição ou positividade. De acordo com a visão Bettelheim os contos de fada trazem, em suas versões originais, um conteúdo riquíssimo para a formação psicológica da criança. Porém, à medida em que estes contos vão sendo adaptados, com estranha finalidade de “agradar” a sociedade, eles perdem o que tem de mais precioso: sua essência.

É nessa essência que embora pareça um pouco conturbada, podemos notar as diferentes manifestações psíquicas que o desenho nos traz e sua importância no processo de desenvolvimento da criança.

Noção de identificação

O fato de que existem vários personagens que representam o “mal” reforçando a ideia de que, a criança precisa ter algo ou alguém para descarregar a raiva, principalmente a que sente dos pais quando eles a impedem de fazer alguma coisa que queira muito. Os diversos personagens a serem enfrentados, remete para a criança um sentimento de que, o medo ou raiva que sente não é apenas dos pais, e que as mesmas também experimentam esse sentimento com outras pessoas( tios, avós, coleguinhas..) Além do fato de que o Pica-Pau não é sempre o ‘’bonzinho’’ trazendo a ambiguidade que demonstra; pessoas são boas e más .

Fonte: encurtador.com.br/nIK29

Objetos transicionais

Segundo Winicott existem objetos transacionais, que são a representação do próprio ‘’eu’’. No caso do Pica Pau sem dúvidas é sua risada marcante, que além de contar um certo deboche traz à tona conteúdos caóticos. Em um de seus bordões temos a seguinte fala: “‘Siga aquela motoca, siga aquele cavalo, siga aquela carroça, siga aquele chinesinho, siga a flecha, siga o chefe siga-me, olha, eu sou um bombardeiro…” (Pica-Pau). Para a criança não existe o caos, quem controla o mundo é o adulto, por isso elas se identificam muito com as transgressões de ordem.

Aprendendo a lidar com as consequências

O pássaro de cabeça vermelha não mede forças para derrotar seus inimigos, para as crianças os inimigos são os “chatos” e “implicantes” que não deixam elas fazerem o que querem, quando querem, logo elas fazem uma projeção justificando que o ato feito por ele foi certo. Quando ele não se dá bem chegam a ficar um tanto quanto frustradas, porém ao se ”dá mal” mostra às crianças que as mesmas precisam arcar com seus atos.

Vivenciando as diferenças

Em alguns episódios quando se veste de mulher, pode trazer algo representativo para muitas crianças, principalmente aquelas que se encontram em conflitos sexuais. Cada criança aprende e absorve os conteúdos de diversas maneiras, tudo depende do sentimento que passam pela sua mente, de forma inconsciente. Dessa forma o fato do pica pau se vestir de mulher pode ser encarado naturalmente, promovendo uma diversidade e aceitação.

Fonte: encurtador.com.br/dmE39

Não devemos apenas enxergar o personagem com nossa ótica moralista, mas entender que os trajetos do mesmo podem ser um ideal do inconsciente de diversas crianças, embora cada criança seja afetada de formas diferentes, o efeito causado surge no inconsciente ou pré- consciente da criança, emergido de diferentes situações conflituosas. A reflexão que fazemos é que se por um momento mudássemos a ótica do desenho seu sucesso não seria o mesmo, Pica Pau carrega em si um significado passivo de apreensão, principalmente para aqueles que se identificam, mesmo não tendo a mínima intenção de trazer lição alguma.

REFERÊNCIAS

RIBEIRO, Natássia Thais; SANTOS, Márcio dos. Da fantasia à realidade: uma análise, à luz da psicanálise, do desenho animado pica-pau. Campina grande, p. 1-9, 7 out. 2021. Disponível em: https://editorarealize.com.br/editora/anais/conages/2014/Modalidade_1datahora_18_05_2014_11_08_50_idinscrito_311_8c139e981403facaf411691b7348b4d4.pdf

PACHECO. Elza. As metáforas do Pica pau. Pesquisa Fasep. 2000 disponível em:https://revistapesquisa.fapesp.br/as-metaforas-do-pica-pau/. Acesso em 07/10/2021.

Compartilhe este conteúdo:

Cobra Kai – A omissão de uma vitória

Compartilhe este conteúdo:

Em nosso mundo, o gênero e a honra masculina estão muito atrelados a competitividade em competições esportivas. Isto é muitas vezes indicativo de a versão contemporânea da Jornada do Herói, ajustada para tempos fleumáticos e sem territórios inexplorados para ir em descoberta. Em Karatê Kid, filme lançado em 1984, temos um exemplo característico desse fenômeno: Daniel, um jovem que tem dificuldade de adaptação que sofre com a violência dos pais, é salvo por um especialista em artes marciais e este o subordina a um árduo treinamento. Como desfecho, ele se fortalece fisicamente e mentalmente, ganhando o torneio local contra quem o agredia, e para valorizar suas vitórias pessoais, ganha o afeto da garota por quem se apaixonou. Contudo, de modo diferente dos mitos, competições e contos de fada, a vida tem que continuar requerendo atitudes menos heroicas dos homens, tais como pagar contas, procurar um emprego e constituir uma família.

Deste modo a série Cobra Kai presente na Netflix e Youtube, segue contando a história do filme 34 anos depois, porém com os mesmos autores, com base na história de vida de Johnny, o vilão da história é derrotado da competição. Este é o primeiro inconveniente da crônica, transparecer que o vilão não simplesmente desaparece com o fim da crônica. Ele de maneira simplória continua sendo a mesma pessoa. Tendo uma vida de adulto para levar. E essa, porventura, não é das mais agradáveis: subsistindo por meio de trabalhos informais, morando em uma casa desarrumada, tendo que enfrentar o alcoolismo, sem amizade e sem ninguém para pedir um abraço e um beijo, esse vilão não dá sinais de aprendizado com suas dificuldades, continuando sendo uma pessoa arrogante que te proporcionava popularidade na adolescência, porém agora de forma totalmente desajustada.

Fonte: encurtador.com.br/buFIT

A narrativa demonstra como os torneios esportivos tem muita autoridade sobre a masculinidade atual. Onde podemos observar como o resultado de uma competição desagregou duas vidas, aonde uma levou o troféu de vencedora e a outra levou o título de derrotada, deixando a vida adulta em segundo plano diante dos defeitos da adolescência. Isto nos mostra o mal-estar e uma vida sem sentido que muitos sendo ao longo de sua trajetória vital.

Todo o enredo da série se aplica ao reencontro entre os dois personagens, ocasionado por um acidente no qual a filha de um dos personagens estava envolvida. Metaforicamente, podemos sugestionar que a rivalidade era uma questão a ser solucionada em suas vidas, e por mais que tentassem esquecer essa rixa, alguma hora ela iria ser colocada à tona diante deles, por meio de muitas coincidências, submetendo-os a lidar com isso.

Fonte: encurtador.com.br/biGV2

Evidente que este conflito leva os personagens de volta ao caratê, o que acaba levando suas vidas de volta a realidade.  Se tradando de Johnny, ele passa a ter atitudes que quebram uma inércia de décadas, colocando força e ressignificação a uma vida que parecia perdida. Já pelo lado de Daniel, entendemos um vazio que sempre esteve consigo, embora ele seja orgulhoso. Ele tentava de maneira aflita colocar regras e doutrinas do caratê em sua vida de comerciante, o que era visto de modo excêntrico. Agora ele percebe uma oportunidade perfeita para colocá-los em prática.

Neste regresso às artes marciais, uma nova chance aparece aos personagens que é: qual os papeis eles devem desempenhar em seus estágios atuais de vida, já que não podem simplesmente competir em torneios como no passado. Para isso, o quesito fundamental é o relacionamento com as novas gerações, o que se confronta os valores enraizados e os leva a importante desenvolvimento interno.

Compartilhe este conteúdo:

Breve histórico do lúdico como prática psicopedagógica e a sua importância na construção subjetiva da criança

Compartilhe este conteúdo:

Antes de abordarmos a história do lúdico, é importante frisarmos a origem da palavra, lúdico vem da palavra latina “ludus” que tem significado “jogo” (LEAL, 2011). Ao entendermos o significado da palavra, podemos verificar que ele nos leva a pensar em jogos, brincadeiras e o ato de brincar de maneira espontânea, porém não podemos esquecer de abordar que o lúdico foi distinguido como “traço essencial de psicofisiologia do comportamento humano” (LEAL, 2011).

E dessa forma a definição vai muito além de jogo, brincadeira ou algo semelhante, pois o lúdico traz em si valores e significados específicos para todas as fases do processo de desenvolvimento humano, ele traz valores que abrangem todo o ciclo vital (LEAL, 2011).

Antunes (2005) descreve que o processo lúdico e suas necessidades vão muito além do que o brincar espontâneo aborda e cobre, ainda vemos que Neves (2009) diz que a criança e o jovem podem apresentar resistência em ir à escola e em relação ao processo de ensino quando tais não demonstram a presença do lúdico, pois dessa forma não se mostra prazeroso, então não tende a prender a atenção e o interesse dos alunos sendo jovens ou crianças.

Carneiro (1995) denota sobre algo muito importante ao trazer que “todas as pessoas têm uma cultura lúdica, que é um conjunto de significações sobre o lúdico”. Podemos perceber que a cultura lúdica é construída de forma individual e subjetiva por cada um, não existindo uma receita ou fórmula única para todos, mas cada um a constrói a sua maneira e de um jeito único de cada indivíduo.

A cultura lúdica não é estática e imutável, mas ao decorrer da história ela se modificou e sofreu inúmeras alterações ao longo das transformações enfrentadas na sociedade, sendo assim, ela não se manteve de forma única sempre nem se manteve inalterável ao longo das épocas vividas, além de que o lúdico é manifesto de diversas maneiras e desde a época primitiva através da dança, luta, pesca e caça (ANTUNES, 2005).

Fonte: encurtador.com.br/eiE69

Desde a Grécia antiga existem relatos vindos de Platão que diziam que durante os primeiros anos de vida, a criança deveria ocupar seu tempo com jogos, porém é com o advento do cristianismo que os jogos caem em desuso por serem considerados profanos e pecaminosos, livres de significantes relevantes e pertinentes dentro do contexto cristão. Dessa forma podemos notar a gritante diferença entre a forma como o entendimento de jogos e brincadeiras no contexto da Grécia antiga onde era bastante valorizado e estimado, e ao transitar para algo sem valor a partir da concepção trazida pelo cristianismo.

Entretanto foi novamente a partir do humanismo que os jogos educativos voltaram a ocupar espaço e valor, pois novamente foram percebidos e considerados importantes dentro do processo lúdico pelo qual a criança está inserida durante a sua formação (ANTUNES, 2005).

Podemos encontrar outros teóricos no século XVI que também naquela época já falavam sobre a relevância do lúdico no processo educativo das crianças, e inclusive pesquisadores da área da educação também trabalhavam em cima dessa problemática, e nos Estados Unidos, Dewey considerava que o jogo poderia ser atrelado à vida, tornando-se seu habitat natural, onde ela aprender a viver, e Piaget também ressalta o quão valiosos os jogos e brincadeiras são para o processo de desenvolvimento intelectual da criança, pois eles vão muito além de uma forma de entretenimento infantil ou uma forma de distração para crianças (ANTUNES, 2005).

Por isso devemos nos atentar para a enorme importância do lúdico dentro do âmbito da saúde mental da criança e do ser humano em si, considerando a relevância dos pais se atentarem para tal e os educadores também, pois é onde a criança pode expressar-se livremente da maneira como ela entende o mundo, sente o mundo e as pessoas, e os objetos também (LEAL, 2011).

O lúdico possui grande valor para o processo de desenvolvimento da criança e não pode ser esquecido ou desmerecido, pois a partir dele, a criança terá mais uma ferramenta e mecanismo para se expressar e para manifestar suas questões pessoais sobre ela mesma, sobre o mundo e da forma subjetiva como ela percebe às coisas naquele momento da vida.

Fonte: encurtador.com.br/imRSW

De acordo com Silva (2015), o Brasil não possui estudos sobre a evolução dos brinquedos, porém podemos pensar no brinquedo dentro da sociedade francesa para entendermos um pouco de como era no Brasil, visto que fomos colonizados por povos europeus. Sendo assim, na França verificamos que a evolução dos brinquedos está intrinsicamente ligada aos grandes períodos da civilização ocidental, considerando o que era vivido na Grécia e em Roma a respeito da importância que o brinquedo possui para aqueles povos na época (SILVA, 2015).

Reforçando o que foi mencionado anteriormente, Platão (1948) foca e enfatiza bastante a importância de aprender brincando ao invés de aprender por um viés violento e opressor, pois desde aquela época, ele trabalhava o ensino de matemática de uma maneira lúdica, que nos dias atuais é bastante utilizada.

Onde Platão estudava e ensinava matemática com base naquilo que estava presente no contexto da criança, fazendo relação com questões e problemas concretos provenientes da vida, onde a criança estudava e aprendia matemática num grau elementar onde estava presente o jogo como uma forma de atrair a criança.

E o filósofo Aristóteles menciona que a educação infantil deve ser realizada através da utilização de jogos que imitem e reproduzam a vida adulta, as ocupações e as atribuições que o adulto carrega e exerce, de modo que a partir disso, a criança pudesse ser preparada para crescer e preparada para torna-se adulta e enfrentar a vida adulta, pois já iria possuir uma noção básica sobre tal (KISHIMOTO, 1994).

Podemos verificar que em Roma, os jogos já possuíam outra finalidade, eles eram praticados com a intenção e o objetivo de formar soldados e cidadãos obedientes e devotos, pois naquela época as crianças possuíam uma educação que abordava as questões físicas as questões englobadas com as de cunho estético e espiritual (KISHIMOTO, 1994).

Sobre isso, Kishimoto (1994) denota que:

“Posteriormente, parece que a prática de aliar o jogo aos primeiros estudos, justifica que as escolas responsáveis pelas instruções elementares tenham recebido nessa época, o nome de ludus, semelhante aos locais destinados a espetáculos e a prática de exercícios de fortalecimento do corpo e do espírito. A partir do século XVI, os humanistas começaram a perceber o valor educativo dos jogos, e os colégios Jesuítas foram os primeiros a recolocá-los em prática. A partir do momento em que o jogo deixa de ser objeto de reprovação oficial, incorpora-se no cotidiano dos jovens, não como diversão, mas como tendência natural do ser humano. Rabelais e Montaigne compartilham desse ideal, denunciando a crueldade e os castigos corporais dos tempos medievais. (KISHIMOTO, 1994).”

Fonte: encurtador.com.br/lyIV3

O autor pontua que os colégios de jesuítas foram uns dos primeiros a perceber a importância do lúdico na educação infantil, após a idade média e incorporaram à sua rotina, em contraponto com os séculos passados, na idade média, onde qualquer desvio de comportamento era imediatamente punido com castigos físicos.

O que chama bastante a atenção nos ocorridos do século XVI, foi a fundação do instituto dos Jesuítas Inácio de Loyola, que foi um militar e parte da nobreza da época, e lá são percebidos os primeiros sinais da importância dos jogos de exercícios dentro do processo de formação do ser humano, e trata de forma antecipada o seu uso dentro do sistema educacional e a organização do mesmo.

Porém, foi através da intervenção do exercício feito de maneira lúdica que as crianças substituíram o ensino escolástico, que consistia na conciliação ensinamentos cristão com o pensamento racional, e o ostracismo, que era o exilio após o cometimento de algum erro, e tais tipos de ensino foram substituídos pelo emprego de tábuas murais (SILVA, 2015).

No período do Renascimento, o exercício físico era bastante considerado e com grande valor, sendo eles: “exercícios de barra, corridas, jogos de bola parecidos com o futebol e o golfe são comuns” (SILVA, 2015). Foi nesse período que o jogo de cartas educativos foi criado por um frade franciscano chamado Thomas Murner, que possuía o objetivo de conduzir o ensino da filosofia.

E também ao decorrer do século seguinte os jogos com finalidade educativa ganharam ainda mais espaço, pois eram considerados importantes para o processo de compreensão e entendimento. E o aparecimento do movimento científico amplia os jogos que a partir disso tornam-se inovações científicas no século XVII (SILVA, 2015).

Foi no século XVII que ocorreram as publicações da enciclopédia, que fomentaram o surgimento de novos jogos, e os jogos se tornaram ainda mais populares, principalmente os jogos de cunho educativo (KISHIMOTO, 1994).

Fonte: encurtador.com.br/bqK48

Silva (2015) cita alguns acontecimentos também bastante importantes na história do lúdico:

“Segundo Emílio, em Rosseau demonstrou que a criança tem maneiras de ver, de pensar e de sentir que lhes são próprias, demonstrou que não se aprende nada senão por meio de uma conquista ativa. Áries (1986, p. 177), a infância, entendida como período especial, traz em decorrência a adoção de práticas educativas que prevalecem até hoje. A criança passa a ser vista de acordo com sua idade, brinca com cavalinho de pau, piões e passarinhos, tem permissão para se comportar de modo distinto do adulto. Com o termino da Revolução Francesa, no início do século XIX acontece o surgimento das inovações pedagógicas com Rousseau, Pestalozzi e Froebel, que aponta duas facetas nos brinquedos: o objetivo e a ação de brincar. A ação do sujeito, a relação estabelecida pela inteligência, que julga relevante para o desenvolvimento infantil. Segundo Pestalozzi (1827-1946), a escola é uma verdadeira sociedade, na qual o senso de responsabilidade e as normas de cooperação são suficientes para educar as crianças, e o jogo é um fator decisivo que enriquece o senso de responsabilidade e fortifica as normas de cooperação. Froebel (1782-1852), discípulo de Pestalozzi, estabelece que a pedagogia deve considerar a criança como atividade criadora, e despertar mediante estímulos, suas faculdades próprias para a criação produtiva.” (SILVA, 2015).

Silva, neste comentário, aponta que a criança aprende melhor a partir de uma “conquista”. Ou seja, ela se apodera do conhecimento, por vontade própria, e não passivamente. Também o autor traça um lineamento histórico, desde o término da Revolução Francesa, onde começaram a surgir as primeiras inovações pedagógicas, e também o conhecimento de que a partir do brincar a criança enriquece seu senso de responsabilidade e também aprende a cooperar de forma mais efetiva.

Porém foi no século XX que a psicologia infantil surgiu através da elaboração de pesquisas e teorias que tratam que tratam a respeito da relevância do ato de brincar dentro do processo de construção de representações infantis. Foi nesse período do século XX que surgiram pesquisas de cunho psicogenético provenientes de Piaget, Bruner e Vygotsky que iniciaram as primeiras atividades de caráter curricular dos novos tempos (KISHIMOTO, 1994)

Nessa fase aconteceram vários estudos que atrelavam a influência do contexto dentro do comportamento humano, mostrando como o ambiente do qual o indivíduo faz parte o influência dentro da sua formação e dentro do seu desenvolvimento (LEAL, 2015). E Kishimoto (1994) aborda sobre a maneira como a cultura apresenta uma forma de continuidade histórica e uma “especificidade que pode se refletir nas condutas lúdicas, faz emergir a valorização dos brinquedos e brincadeiras tradicionais como nova fonte de conhecimento e de desenvolvimento infantil”.

Kishimoto (1994) traz considerações importantes sobre os brinquedos e o ato de brincar no processo de desenvolvimento infantil:

“Partindo do pressuposto de que, manipulando e brincando com materiais como bola, cubo e cilindro, montando e desmontando cubos, a criança estabelece relação matemática e adquire noções primarias e física e metafísica. Aliando a utilização de materiais educativos que domina, aos dons, ao canto e às ocupações manuais (recorte, colagem, tecelagem, dobradura, etc.), o autor das atuais caixas de construção elabora uma proposta curricular para a pré-escola que contém em seu bojo a relevância do brinquedo.” (KISHIMOTO, 1994, p 12).

Fonte: encurtador.com.br/orGMY

O autor, neste comentário, pontua que a criança adquire melhor conhecimentos matemáticos brincando. A partir de brinquedos que tem formato de bola, cubo e cilindro, a criança apercebe melhor as formas circulares, geométricas, entre outras e aprende a ter mais noção de espaço, podendo se apropriar melhor de conteúdos de física e metafísica.

Conforme Silva (2015), na França, a primeira escola maternal trabalhava tricô, Geografia, História, Botânica, Educação Moral e Cívica, exercícios para o corpo, desenho, recorte e recursos como o passeio, para educar crianças de quatro e sete anos de idade”, e era através dos jogos que os alunos eram motivados e atraídos a estudar história, e por meio das brincadeiras aprendiam sobre respeito, submissão e admiração ao regime vigente da época, e “os jogos de ganso, de cartas e de loto, veiculam à semelhança do século anterior a propaganda política”.

Por meio de jogos magnéticos as crianças aprendiam história, geografia e matemática, pois a ciência já havia avançado na época e permitia tal feito, além de que através das fábulas de La Fontaine e os contos de Perrault, os jogos de cubo e os puzzles surgiram, além de jogos como bazar alfabético que forneciam suporte para o aprendizado do vocabulário e o jogo chamado poliglota permitia que as crianças aprendessem até cinco línguas ao mesmo tempo (KISHIMOTO, 1994).

Aqueles jogos que surgiram no século XIX foram utilizados até a primeira guerra mundial, porém durante o período da guerra foram perdendo espaço para os jogos militares que surgiram na época, e logo após a guerra, os jogos militares foram dando lugar aos jogos esportivos, e trens elétricos começaram a surgir juntamente com autoramas e bicicletas, o que apontava para um momento onde o esporte era mais bem estimado do que o militarismo (SILVA, 2015).

De acordo com Kishimoto (1994), os brinquedos eram ainda mais produzidos devido as propagandas de natal e outros tipos de propagandas que faziam menção a instruir crianças de forma divertida fazendo uso de brinquedos e jogos educativos, e os brinquedos ocupam maiores espaços e dessa forma, passam a ser adaptados e personalizados de acordo com as preferências e os gostos das crianças.

Foi nessa época também que Ovídio Decrolv ao continuar os estudos e produções de Froebel, criou um conjunto de materiais destinados a educação de crianças com algum tipo de deficiência mental, fazendo uso de materiais tidos como neutros e cartonados, para que essas crianças com essa demanda pudessem desenvolver aspectos relacionados a percepção, motricidade e ao raciocínio.

Em 1954 foi elaborado por Maria Montessori, uma metodologia de ensino voltada para crianças com deficiência mental, onde era utilizado os materiais criado por Itard e Seguin, com a finalidade de instalar a educação sensorial, porém no Brasil esse método chegou tempos depois através da Linha Lubienska – Montessori, que foi utilizado em escolas católicas onde estudavam apenas a elite da época. E a educação de crianças portadoras de algum tipo de deficiência foi algo que recebeu uma grande atenção e que teve grandes avanços após a utilização de brinquedos, e teve origem no século XVIII quando materiais específicos para surdos e mudos criados pelo Pe. De I’epeé em 1760.

Após isso foi Valentin Hauy no ano de 1784 que criou livros de auto relevo para crianças cegas. Itard e Seguin produziram inúmeros materiais analíticos voltados para a educação sensorial e intelectual de Victor, que foi o selvagem de Ayeron Decroly, e após isso se inspiraram na globalização para a organização de jogos intelectuais e motores que eram destinados às crianças com algum tipo de deficiência mental (MONTESSORI, 1954).

Referências:

ALMEIDA, P. N. Dinâmica lúdica: Técnicas e jogos pedagógicos. São Paulo: Edições Loyola,1992.

ANTUNES, Celso. O jogo e o brinquedo na escola. In: SANTOS, Santa Marli Pires dos. (Org.). Brinquedoteca: a criança, o adulto e o lúdico. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2008. Cap. 4, p. 37-42.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação, n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

SANTANNA, Alexandre; NASCIMENTO, Paulo Roberto. A história do lúdico na educação.

The history of playful in education. Revemat: Revista Eletrônica de Educação Matemática, Florianópolis, v. 6, n. 2, p. 19-36, maio 2012. ISSN 1981-1322. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/revemat/article/view/19400>. Acesso em: 20 de novembro 2020. doi:https://doi.org/10.5007/1981-1322.2011v6n2p19.

SANTOS, Cristiane Cimelle da Silva; COSTA, Lucinalva Ferreira da; MARTINS, Edson. A prática educativa lúdica: uma ferramenta facilitadora na aprendizagem na educação infantil. Revista Eletrônica do Curso de Pedagogia das Faculdades Opet, [s.i], v. 3, n. 1, p.74-88, dez. 2015. Disponível em: <http://www.opet.com.br/faculdade/revista-pedagogia/pdf/n10/ARTIGO6.pdf>. Acesso em: 04 mar. 2019.

SANTOS, S. M. P. Brinquedo e infância: um guia para pais e educadores. Rio de Janeiro: vozes, 2010.

SILVA, M. P. A importância do Lúdico na educação infantil. Trabalho de conclusão de curso licenciatura em pedagogia da Universidade Estadual da Paraíba UEPB. Julho 2015.

Compartilhe este conteúdo:

Autistas também praticam esportes

Compartilhe este conteúdo:

Será que autistas podem praticar esportes? Será que eles conseguem se sair melhor que os outros? Geralmente, os autistas são pessoas que conseguem ter grandes ganhos ou grandes conquistas naquilo que fazem por serem hiper focados e altamente interessados. Por outro lado, tem pouca assertividade ou pouca flexibilidade social, pouca empatia e não sabem lidar muitas vezes com situações que exigem automaticamente uma boa percepção social.

Normalmente, autistas não têm boa performance motora, espacial e executiva para cumprimento de atividades que envolvam esportes. Então, ele só vai ter vantagem se for fascinado, hiper focado naquele esporte.  

Os benefícios da prática esportiva são vários. O primeiro é ajudar o indivíduo a se socializar. A grande maioria dos esportes são sociais, exigem o compartilhamento, exigem estratégia que depende do outro, isso traz benefícios de estimulação de interação social e a melhora no comportamento social.  

Fonte: encurtador.com.br/gkI89

Melhor ainda, pois faz o autista se movimentar, porque normalmente eles não gostam de fazer exercícios. Preferem ambientes fechados, restritos, silenciosos e que envolvam tecnologias. Isso faz com que eles se restrinjam a atividades sedentárias e eleve o risco de, na fase adulta, desenvolver processos crônicos causados por sedentarismo, aumento do colesterol, maior risco de diabetes e hipertensão e, consequentemente, pode vir a ter problemas de maior exposição a eventos ou distúrbios que são gerados por esses problemas como AVC e infarto.    

Muitos questionam, mas eles precisam ter cuidados ao praticar esportes? Não há especificamente nenhum cuidado que o autista tem que ter. Ele só precisa entender e ser explicado que a prática de esportes requer cumprir regras e seguir uma rotina.  Ele vai ter que trabalhar determinadas atividades esportivas juntos com os outros, compartilhando jogadas, compartilhando interesses, compartilhando um espírito de equipe. Isso para o autista é muito difícil.

Os cuidados que os profissionais têm de ter com o autista é saber que ele tem dificuldades de entender linguagem de duplo sentido. Tem também dificuldade de organizar dentro dos pensamentos dele a sequência de uma jogada ou a sequência compartilhada de um processo social. Além disso, em uma jogada, eles têm menos coordenação motora. Por isso, vão precisar de um pouco mais de compreensão do educador físico para trabalhar a parte da psicomotricidade.

Fonte: encurtador.com.br/hkwG9

Uma coisa importante de dizer é que quem tem autismo tem pavio curto, na maioria das vezes são indivíduos que mudam de humor de uma hora para outra e não toleram muito passar por disparates ou situações onde eles são contrariados.  O esporte que eu sugiro para o autista é aquele que o agrada, o que traga menos estímulos indesejáveis. As recomendações de esportes são os que ajudam a melhorar a capacidade de percepção social como os esportes jogados em grupo.

Compartilhe este conteúdo: