O legado de Jobs na atuação de Tim Cook

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O empresário que mesmo diante da responsabilidade herdada, não deixou de pensar em si mesmo e nos outros. 

Certamente já vimos muitas pessoas manuseando smartphones, tablets, notebooks e computadores com um símbolo da maçã. A empresa americana Apple é uma das mais bem sucedidas do mundo em quesito de tecnologia e dispositivos da atualidade. Fundada pelo notório Steve Jobs ( 1955-2011), a empresa é atualmente comandada por Tim Cook. Como atual CEO da empresa, Cook teve e tem a missão de continuar o legado notório deixado por Jobs, honrando o objetivo da empresa: revolucionar o mercado tecnológico e de publicações digitais. 

Nascido em 1960 em Mobile, nos Estados Unidos, formou-se em Engenharia de Produção Industrial pela Universidade de Auburn no início da década de 80 e durante 12 anos trabalhou na IBM (International Business Machines Corporation). Neste período atuou como vice-presidente sênior nas operações de internet. 

Após finalizar seu ciclo de trabalho na IBM, Cook foi diretor de operações da Intelligent Electronics. No final dos anos 90, o próprio Steve Jobs pediu que Tim integrasse o time da Apple e se tornasse o braço direito dele. Neste tempo, se tornou um homem de negócios da empresa e auxiliou na reconstrução do grupo ao lado de Jobs.

Durante algumas vezes substitui Jobs nas funções de CEO, a última quando este precisou se ausentar para tratar da doença terminal. No final de 2011 Steve Jobs faleceu e Tim assumiu como CEO oficialmente e em 2014 esteve nos noticiários quando declarou abertamente ser homossexual. 

De acordo com a Fortune 500, o empresário gosta de fazer caminhadas ao ar livre, ciclismo e ir à academia. Muito discreto quanto a sua vida, ele é conhecido por ser solitário e sua vida pessoal é pouco conhecida. Quanto a sua orientação sexual, declarou que é muito feliz em ser homossexual e que na empresa, todos sabem, mas procura focar nos produtos e clientes da empresa, Tim é o primeiro CEO ser abertamente gay.

Tim passou a ser uma referência fundamental à frente da Apple. Em seus primeiros anos como CEO, lançou vários produtos e promoveu upgrade nos já comercializados. Um exemplo são os queridinhos iPhones. Esse aparelho se tornaram funcionais e facilitadores do cotidiano das pessoas, com vários aplicativos voltados à aprendizagem, segurança e saúde. A ideia de fazer com que todos os aparelhos se conectassem a partir de um mecanismo em comum foi um diferencial, aumentando as vendas e tornando a empresa uma das mais valiosas no mundo. Além disso, esse diferencial da comunicação entre os aparelhos Apple também contempla um aspecto funcional socialmente relevante: a exclusividade, uma vez que a conexão se dá somente entre dispositivos da empresa. 

Tim Cook é um dos CEOs mais bem sucedidos do mundo
Fonte: encr.pw/buHjV

A tecnologia vem a cada ano tornando-se um facilitador de informações com praticidade e custo benefício. As antigas máquinas, que eram do tamanho de uma mesa, foram diminuindo a sua proporção e hoje cabe na palma da mão. Com a inovação das IA (Inteligência Artificial) fica mais fácil checar notícias, analisar tendências, conhecer pessoas e comprar coisas, ao passo que estes aparelhos são de fácil liquidez e a cada ano que passa uma nova atualização é lançada. 

A fluidez nas informações podem tornar os usuários vítimas de fake news e promover impactos negativos à saúde mental. Em uma entrevista para a Bustle,  Tim Cook declarou: “Sempre achei que a tecnologia deveria servir a humanidade e não o contrário. E sempre me preocupei com o fato de as pessoas usarem demais a tecnologia. E assim, lançamos o Screen Time para tentar dar às pessoas uma leitura real da quantidade de tempo que realmente gastam em seus dispositivos porque, geralmente, é muito mais do que dizem” (FATHI, 2021). 

De acordo com Picon et al. (2015) a liquidez pode tornar os usuários das tecnologias e aplicativos dependentes dela, um exemplo é que torna tudo tão mais fácil que as pessoas não necessitam mais tanto do outro para poder resolver problemas diários. A facilidade e o rápido acesso a informação pode gerar vícios em passar cada vez mais tempo na frente das telas em busca de algo novo, como uma roupa, uma nova compra e também uma notícia quente das celebridades. 

Tim começou a preocupar-se que as pessoas estariam passando tempo demais nas redes e com isso pudessem ser afetadas na saúde mental, na qual também declarou que “A saúde mental é uma crise”. Cook utilizou o próprio exemplo como CEO da Apple em que utiliza a meditação como forma de combater o estresse diário enfrentado no trabalho (FATHI, 2021).

Fathi (2021), informa que Tim planejou que os seus dispositivos da Apple fossem utilizados para criatividade e não para “rolagens sem fim e sem sentido”, mencionando discretamente o uso excessivo das mídias sociais. Esta forma de explorar a criatividade fez com que a Apple desenvolvesse aplicativos para verificar o tempo que o usuário permanece conectado e quanto tempo gasta em cada aplicativo. Apps como Saúde, Apple Books, Casa, e o recém- chegado Freeform no iOS 16, permite o usuário criar seus projetos de forma livre e compartilhar com outras pessoas.  

Cook na IAPP GLOBAL PRIVACY SUMMIT 2022
Fonte: l1nq.com/cy3xT

Cardoso (2022) informou no seu artigo que Cook explicou ainda que para manter o legado de inovação e criatividade deixados ainda pelo antigo CEO, alegou que o diálogo e a boa interação entre as equipes de trabalho possam permitir que surjam idéias “realmente inacreditáveis” e que não seguem nenhum caminho singular, elas partem de qualquer canto da empresa. 

Outro quesito bastante defendido por Tim é a privacidade do usuário. Os dispositivos da Apple são valorizados pela segurança que oferecem, uma vez que o acesso por terceiros é cheio de obstáculos. O próprio sistema Apple se encarrega de vasculhar a web e não necessita que sejam instalados aplicativos de antivírus, por exemplo. 

Mas a privacidade vai além disso, Tim declarou que ela é “direito humano fundamental” e que o objetivo da empresa é fazer com os que os usuários se tornem os seus próprios comandantes, deixando que eles decidam quem deve ou não ver os seus dados, mantê-los ou vendê-los. Esta é uma forma de oferecer mais segurança e autonomia, e que esta deve ser uma responsabilidade do próprio usuário e não de uma empresa (CARDOSO, 2022).

Em 2021, no aniversário de 10 anos da morte de Steve Jobs, Tim Cook voltou a declarar sobre o legado do seu mentor e comentou que foi fundamental que ele tenha sido um visionário em pensar em evoluir a tecnologia. Em uma carta publicada, Tim revelou que sente saudade e que lembra dele todos os dias que o admirava não só pelo profissionalismo, mas como um ser humano. Contou ainda que se sente muito realizado por todos os dias trabalhar em dispositivos que conectam pessoas. 

Steve Jobs e Tim Cook
Fonte: l1nq.com/ULVI9

Cook revelou que Jobs gostaria dos produtos que encontraria na empresa, com provavelmente dois apontamentos, amaria muitas coisas e com certeza poderiam melhorar ainda mais. Disse que eles nunca estão satisfeitos, trabalham sempre pensando no amanhã, e que o legado deixado pelo ex-CEO possui grande influência nas tomadas de decisões e na forma como as equipes desenvolvem produtos novos. 

Por fim, vemos na história de Tim, que o aprendizado é constante, mesmo que o legado deixado por Jobs seja ainda muito valioso, o mundo se renova a cada dia e este deve ser o pontapé para a criatividade e surgimento de ideias inovadoras, que podem transformar e tornar a experiência do usuário única e especial a cada dia. Tim Cook é sem dúvida um homem de muito sucesso, que soube levar adiante o que aprendeu, investindo em inovação. Sem dúvidas os resultados podem ser vistos na grande valia da Apple no mercado.

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Como fugir da barbárie sem celulares e tablets em “À Espera dos Bárbaros”

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Filme do cineasta francês Eugène Green coloca em perspectiva essa crítica do “Media Life” de Mark Deuze sobre as nossas vidas cada vez mais mediadas por dispositivos tecnológicos.

Um grupo de seis pessoas está com medo: souberam através das redes sociais que os bárbaros estão chegando. Eles batem à porta da casa de um casal de magos, pedindo para se esconder do perigo iminente. Mas os magos impõem uma condição: deixar seus celulares e tablets num cesto na entrada, para iniciarem uma viagem iniciática e mística no presente e para o passado. Sem wi-fi e Internet, o grupo sente-se nas trevas – como saberão do avanço dos bárbaros sem Internet? Esse é o filme francês “À Espera dos Bárbaros” (“En Attendant Les Barbares”, 2017), de Eugène Green, uma experiência ao mesmo tempo documental e ficcional sobre nossa condição em um mundo tecnológico: a mídia está para nós assim como o peixe está para a água. Sem nossos dispositivos tecnológicos nos sentimos fora d’água. Mas esta não seria a oportunidade de nos religar com o outro e com a realidade? Filme sugerido pelo nosso leitor Fernando Câmara.

A mídia está para nós assim como o peixe está para a água. Mas a questão é: será que temos uma boa vida com as mídias, assim como os peixes na água? Essa é a pergunta feita pelo pesquisador Mark Deuze em seu livro “Media Life” (Polity Press, 2012) a partir de uma prosaica constatação: não vivemos mais com as mídias, mas vivemos nas mídia – nossas relação com as mídias se tornaram onipresentes, universais, quase que codificando os nossos genes. “Gostemos ou não, todos os aspectos de nossas vidas têm lugar nos meios de comunicação”, afirma Deuze.

Há muito as mídias deixaram de ser apenas conteúdo: tornaram-se num ambiente, um mundo em permanente construção, um novo mundo que aparentemente nos dá liberdade, mas é uma liberdade contida no horizonte de eventos midiáticos.

Fonte: encurtador.com.br/hHIQS

A certa altura em “Media Life”, Deuze alerta para um “Apocalipse Zumbi” no qual perdemos as fronteiras entre o público e o privado, entre o individual e o coletivo.

À Espera dos Bárbaros (En Attendant Les Barbares, 2017) do cineasta francês Eugène Green coloca em perspectiva essa crítica do “Media Life” de Mark Deuze sobre as nossas vidas cada vez mais mediadas por dispositivos tecnológicos. A tal ponto que os dispositivos se tornam a realidade, nossas próprias vidas. E, ao invés de extrairmos deles informações, tudo o que obtemos é medo, persecução e desorientação.

Paradoxalmente, Eugène Green vai discutir esse tema não através de uma linguagem contemporânea sci-fy, cyber alguma coisa, como um thriller contendo narrativas de ação com máquinas ou inteligências artificiais nos perseguindo e roubando nossas identidades.

Fonte: encurtador.com.br/IQSU9

Um mundo cheio de História

O filme vai abordar o tema da maneira mais tradicional, conservadora e histórica possível: primeiro, a narrativa nos transporta para Toulouse e seu magnífico patrimônio histórico, com imagens estáticas de lugares, obras de arte e arquitetura sacra. Um mundo cheio de História.

E segundo, parte do filme é falado em língua occitana (língua românica falada no sul da França surgida na Baixa Idade Média), num estilo teatral, quase sem cenografia, filmado em ambientes mal iluminados, e com muitos olhares dirigidos diretamente para a câmera, com atores recitando versos occitano-silábicos.

Inicialmente, Eugène Green foi convidado para filmar um workshop de atores. Mas ao invés de fazer um simples documentário, Green criou um projeto de filme. Selecionou doze de 35 candidatos presentes no workshop e escreveu o roteiro com uma pequena equipe composta por um diretor de fotografia, um engenheiro de som e um assistente.

Fonte: encurtador.com.br/oBDIX

O resultado foram 75 minutos de uma estória que, em muitos aspectos, lembra Esperando Godot, peça do teatro do absurdo de Samuel Beckett – homens e mulheres estão ali para se esconder da chegada dos “bárbaros”, uma ameaça indeterminada, vaga. Quem são eles? Os godos? Visigodos? Os hunos? Ou serão os norte-americanos? Eles podem vir de qualquer parte. E aquele grupo de homens e mulheres pedem ajuda para um casal de magos que iniciará o grupo em uma viagem iniciática.

O Filme

Uma noite, seis pessoas batem na porta da casa de um casal de magos. Estão preocupados com a “invasão dos bárbaros”, cuja chegada foi anunciada pelas redes sociais.

Os magos aceitam acolher aquele grupo, mas com uma condição: que depositem seus celulares, tablets e fones de ouvido numa cesta de vime na entrada. Mas como eles saberão dos avanços das hordas bárbaras sem um wi-fi e Internet?

Fonte: encurtador.com.br/hlmwQ

Há um pequeno momento de dúvida e tensão naquele grupo. Mas acabam aceitando as condições diante da necessidade urgente de um refúgio.

Os magos conduzirão aquele grupo em uma espécie de viagem iniciática, dividida entre uma reflexão sobre o presente (quem é cada um deles, suas identidades e problemas) e depois sobre o passado. Percebemos que cada um daqueles personagens representam tipos-ideais da sociedade moderna: um típico casal de classe média (os “bobos”, como se referem) que tentam engravidar sem sucesso; um jovem que vive nas ruas, egresso de bairros periférico; um empresário que pensa em entrar na política; um jovem poeta celibatário às voltas em diálogos com um fantasma feminino com quem trava longos diálogos sobre vida e morte – na verdade o fantasma é a filha dos magos, morta aos 20 anos.

E uma artista plástica que se recusa a pincelar uma tela por considerar um ato violento que profana a pureza de uma superfície branca…

A casa é escura. Mas os magos prometem que o grupo encontrará a luz a partir das trevas. E o que são essas trevas? A ausência de qualquer mediação tecnológica entre eles. Para começar, o casal de “bobos” indaga: o que faremos para passar o tempo sem Internet? Ora, discutirão os temas delicados de relacionamento que jamais discutiram por causa dos dispositivos tecnológicos.

Fonte: encurtador.com.br/wMUVW

Enquanto isso, o empresário sentará lado a lado com o jovem das ruas, discutindo temas sobre desemprego, representação política etc.

Mas a segunda parte da viagem iniciática é a mais densa – é sobre o passado, a História, que parecem terem sido esquecidas num mundo de mediações tecnológicas.

Então, os magos convocam “aparições” que declamarão um excerto do “Romance de Jaufré”, um texto do século XIII do ciclo arthuriano, em occitana, cujo protagonista é um cavaleiro da Távola Redonda – suas traduções foram bem populares na Península Ibérica.

Após a primeira parte das discussões em que os fugitivos dos bárbaros se conheceram uns aos outros, agora sentam-se no chão para acompanhar a declamação daquele romance de cavalaria medieval.

Fonte: encurtador.com.br/cxP37

Apocalipse Zumbi

“Os bárbaros só vêm se nós os esperamos”. Essa afirmação feita pelo fantasma da jovem morta prematuramente é a chave da compreensão do filme e de toda a reflexão que Eugène Green faz sobre o papel dos dispositivos tecnológicos em nossas vidas.

Tal como em Esperando Godot, os bárbaros nunca aparecem. A ameaça bárbara só existe na e através das redes sociais. E após aquela viagem iniciática do grupo, os magos deram o melhor presente para todos irem além das mediações tecnológicas: a memória e a realidade do presente.

À Espera dos Bárbaros mostra que os verdadeiros bárbaros estavam o tempo todo naquela casa, na escuridão da ausência de wi-fi e Internet. O grupo teve um tratamento de choque de realidade. No final, a divisão apenas estava entre eles, porque um não conhecia a realidade do outro – isolados no solipsismo tecnológico dos dispositivos móveis, simplesmente ignoramos o presente, e muitos mais o passado.

Mas Eugène Green não é um ludita que deseja apenas que quebremos as máquinas, como fez um movimento de trabalhadores do século XIX contra as máquinas no ramo da fiação e tecelagem. O problema é que os dispositivos móveis deixaram de ser apenas um meio de transmissão de conteúdos. Acabaram moldando nossa percepção, criaram um horizonte de eventos, marcado pelo solipsismo, isolamento, criação de bolhas virtuais e incomunicabilidade.

Talvez, os verdadeiros bárbaros sejam aqueles que se aproveitam dessa condição atual de barbárie para incitar a cizânia, polarizações, intolerância e ódio – que, no contexto descrito pelo filme, é como jogar um fósforo num tanque de gasolina.

Daí nos encontramos com o “Apocalipse Zumbi” descrito no “Media Life” de Mark Deuze.

FICHA TÉCNICA DO FILME

Título original: En attendant les barbares

Direção: Eugène Green

Elenco: Fitzgerald Berthon, Hélène Gralet, Arnaud Vrech, Ugo Broussot, Anne-Sophie Bailly

País: França

Ano: 2017

Gênero: Drama

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O Psicólogo Dr Felipe Souza fala de sua experiência na inter-relação Psicologia-Tecnologia

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Dr. Felipe de Souza é um dos mais profícuos psicólogos a se utilizar das novas tecnologias para divulgar a prática profissional

O psicólogo e professor Doutor Felipe Luis Melo de Souza (UFJF), que atualmente faz pós-doutorado em Mindfulness pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), será o palestrante de abertura do Caos 2018 – Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia. O evento ocorre no dia 22 de maio, às 9h, no auditório central do Ceulp/Ulbra.

Dr. Felipe irá falar de sua experiência pessoal com o uso de novas tecnologias para a difusão da profissão. Dono de um dos maiores sites com conteúdos de Psicologia, o Psicologia MSN (com mais de 20 milhões de acessos), Dr. Felipe também tem um canal no Youtube com mais de 50 mil inscritos. Dentre os temas abordados no Caos, o psicólogo, professor e pesquisador irá falar sobre a interface entre Psicologia e Tecnologia, Dispositivos Eletrônicos e produção de conteúdo na Psi, Questões Éticas, além da aproximação dos saberes da Academia e o público em geral.

Abaixo, confira uma entrevista concedida pelo palestrante ao Portal (En)Cena, que irá abordar estes e outros assuntos.

(En)Cena – O Congresso Acadêmico de Psicologia do Ceulp/Ulbra, pela primeira vez, vai falar da interface entre Psicologia e Tecnologia. Você considera que este tema já é usual na área, ou ainda estamos abordando-o de modo tímido?

Dr. Felipe Souza – Acredito que, dada a importância do tema, a abordagem ainda é tímida. As novas tecnologias modificaram extremamente o comportamento humano nas últimas décadas, permitindo mudanças significativas nas comunicações e interações entre as pessoas, na produção e disseminação de conteúdos e informações e, com as redes sociais, profundas modificações no modo como descrevemos à nós mesmos e narramos a nossa história (assim como a do outro), entre muitas outras áreas.

(En)Cena – Particularmente nota-se que você, como profissional de Psicologia, faz bom uso das tecnologias/redes/dispositivos para divulgar seus trabalhos. O que fazer para que os novos profissionais percebam o papel positivo deste panorama?

Dr. Felipe Souza – A produção de conteúdo, até pouco tempo atrás, era restrita aos meios de comunicação e às grandes editoras. Com as inovações da tecnologia, hoje podemos criar e enviar conteúdos do nosso consultório ou casa para o mundo. É uma possibilidade incrível que muitos profissionais não enxergam. Antigamente a divulgação de nosso trabalho na psicologia consistia em cartões de visita, lista telefônica e propaganda boca-a-boca. Hoje, investindo muito pouco, com um celular comum conseguimos gravar vídeos, por exemplo, e ter uma audiência enorme, não só no curto prazo, mas também depois de anos. As possibilidades devem ser aproveitadas.

Fonte: https://bit.ly/2KwEKOb

(En)Cena – É possível ser eficaz na condução de um processo terapêutico à distância, com o uso/mediação de dispositivos eletrônicos/digitais?

Dr. Felipe Souza – O Conselho Federal de Psicologia regulamentou apenas a Orientação Psicológica Online e, em resolução, impede que o profissional da psicologia use o termo terapia ou processo terapêutico. Entretanto, embora a Orientação Online seja pontual – no máximo 20 sessões, é possível sim realizar um excelente trabalho.

(En)Cena – Percebe-se que você tem ampla formação acadêmica, inclusive com um pós-doutoramento em curso na Unifesp. Ao mesmo tempo é bem próximo do público a partir do uso de redes sociais eletrônicas, por exemplo. Esta é uma saída para que a academia e os profissionais se aproximem das pessoas?

Dr. Felipe Souza – A minha interação com o público veio de duas motivações: evidentemente, quis divulgar o meu trabalho na clínica, mas, principalmente, veio do meu senso de responsabilidade de compartilhar o que aprendi. Nunca me esqueço da fala do reitor da UFSJ na época da graduação que apontou a necessidade de contribuirmos com a sociedade de forma ampla, dado que a formação havia sido em uma Universidade Federal.

Como sempre gostei de ler e estudar, fui fazendo as formações por gosto. Só recentemente assumi o papel de professor. De certa forma, me via como um tradutor, ou seja, da linguagem rebuscada e por vezes tortuosa dos livros e artigos científicos eu transformava para uma linguagem acessível para quase todos.

Portanto, acredito sim que as redes sociais devem ser usadas cada vez mais pelos pesquisadores, como um meio para mostrar para a população a relevância das pesquisas acadêmicas, e para ampliar o conhecimento de todos.

(En)Cena – Como fazer bom uso destes recursos sem ferir os preceitos do Código de Ética do Psicólogo?

Dr. Felipe Souza – Não existe muita saída senão conhecer o Código e fazer uso do setor de Orientação e Fiscalização dos CRPs. Aliás, muita gente não sabe, mas o setor de Orientação ajuda muito nas dúvidas que possamos ter sobre a atuação e os seus limites.

(En)Cena – Qual o futuro da Psicologia, diante desta revolução tecnológica em curso, e levando-se em conta que parte da Psicologia critica o uso destes dispositivos?

Dr. Felipe Souza – Difícil prever o futuro, mas pelo que já existe (sobre o que falarei na palestra), é inevitável que os psicólogos utilizem todo o potencial das tecnologias daqui para frente. E em dois sentidos: usar a tecnologia como fonte de dados de pesquisa – como o big data por exemplo – e para a elaboração de estratégias eficazes de intervenção.

(En)Cena – Você fará a palestra de abertura do evento. Além destas questões, o que pretende mais abordar?

Dr. Felipe Souza – Dependendo do conceito de tecnologia, podemos dizer que o ser humano já há muitos séculos não vive sem tecnologia. Como todo instrumento, pode ser utilizado de maneira positiva ou negativa. O fato é que não há como desenvolver um bom trabalho na psicologia (seja na pesquisa, seja na atuação profissional) sem acompanhar o progresso tecnológico. É provável que uma parte da nossa atuação seja incorporada nas tecnologias atuais ou a serem desenvolvidas, mas certamente a relação de ser humano para ser humano será sempre fundamental na cura e no desenvolvimento pessoal.

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A Disciplina e o Controle na atualidade

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Este texto tem como objetivo fazer um sobrevôo nos conceitos de Disciplina em Michel Foucault e Controle em Gilles Deleuze. Além de realizar uma articulação destes Dispositivos com o Processo de Produção de Subjetividade na Atualidade.

Os dispositivos disciplinares e de controle têm um papel fundamental na produção e reprodução da paisagem social na atualidade, sendo eles mesmos produção e produto. Por exemplo, geralmente nascemos no seio de uma família que, em alguns aspectos, nos moldará, assim como muitas outras instituições nos moldarão ao longo da existência. Entretanto, a família é determinada pelo tecido social no qual ela emerge; determinada pela composição de forças e pelas articulações entre os diferentes movimentos existentes no campo social. Pensemos, no século XVIII seria possível uma família composta por dois homens e uma criança adotada (sendo ou não através de vias legais)? Claro que não, pois o contexto social da época não possibilitava o surgimento deste tipo de configuração familiar.

Ao longo da vida passamos por dispositivos disciplinares, fechados e formatadores; estamos imersos em dispositivos de controle, abertos e moduladores. Nos dispositivos fechados, o poder de afetação se exerce, segundo Deleuze (1988):

[…] pela pura função de impor uma tarefa ou um comportamento quaisquer a uma multiplicidade qualquer de indivíduos, sob a única condição de que a multiplicidade seja pouco numerosa e o espaço limitado, pouco extenso. (p. 80).

Exemplo de tais dispositivos são creches, escolas, fábricas (empresas), quartéis, hospitais, asilos, presídios, universidades. Todos produzindo, a partir da disciplina, corpos“economicamente úteis e politicamente dóceis” (FOUCAULT, 2004). Passamos da família para a creche/maternal, desta para a escola regular, adiante para faculdade, trabalho… Cada uma destas instituições com sua lógica específica, mas todas operando através de uma anatomopolítica [1].

Ao mesmo tempo em que passamos por esta “via sacra”, temos os dispositivos de controle que, ao invés de moldes procedem por modulações; novas relações familiares, novas relações de amizade, de trabalho, novas percepções, novas pedagogias. Todas estas modulações se atualizando constantemente a partir dos movimentos delineados pela Lógica do Mundo Global. Nestes dispositivos, a função do poder seria, segundo Deleuze (1988): “[…] gerir e controlar a vida numa multiplicidade qualquer, desde que a multiplicidade seja numerosa (população), e o espaço extenso ou aberto” (p. 80).

A ciência, os diversos campos do saber, os meios de comunicação social, o marketing e os organismos internacionais são exemplos desses dispositivos. Todos produzindo modulações que são assimiladas e colocadas em prática. Assim sendo, podemos dizer que as lógicas dos dispositivos disciplinares são diluídas no campo social e intensificadas, continuamente, pelas modulações dos dispositivos de controle. No Mundo Global, onde a comunicação é instantânea em qualquer parte do planeta, cada vez mais a ciência (humana e exata), juntamente com estratégias de marketing e a atual conformação político-econômica do mundo, constituem as formas de ser e de viver hegemônicas na atualidade.

É como se os muros das instituições se tornassem permeáveis e as lógicas que anteriormente estavam restritas aos espaços fechados agora estivessem generalizadas no campo social. Vemos cada vez mais o atravessamento de lógicas diversas na mesma instituição. Antigamente os discursos que circulavam na instituição escolar diziam respeito somente ao registro das políticas públicas na área da educação; estando totalmente fechado a outros registros como, por exemplo, a justiça, a assistência social, os direitos humanos, etc. Atualmente, a escola, assim como outras instituições, está sendo atravessada por discursos de registros diversos, sendo modulada pelos mesmos. Um exemplo disso seriam as práticas [2]  de criminalização (falta de moral e/ou educação), de medicalização (falta de saúde e/ou sanidade), judicialização (falta de recursos para gerir conflitos e/ou educação) e pedagogização (falta de educação e/ou irresponsabilidade), que acontecem nas mais diversas instituições (escola, hospital, empresa, justiça…).

A partir do momento em que os processos de constituição de modos de ser e estar são produzidos no campo social, a modulação contínua deste produz – ao mesmo tempo – uma modulação nos modos de ser e estar. A velocidade dessa modulação e a fugacidade dos territórios consumidos geram sofrimento através da fragilidade da consistência subjetiva que estes elementos proporcionam. Quanto mais fragilidade mais sofrimento e maior vulnerabilidade à captura pelas centrais de distribuição de sentido e de valor [3]  do sistema (ROLNIK 1989).

Percebemos as lógicas disciplinares e de controle, disseminadas pelos seus respectivos dispositivos, como coexistentes na atualidade. Quando afirmamos que os muros das instituições se tornaram permeáveis, estávamos indicando que as lógicas disciplinares ainda existem, mas que são sistematicamente moduladas pelas lógicas de controle. Isto tem como efeitos, além da fragilidade subjetiva citada, a declarada crise permanente das instituições. Esta “dita” crise justifica a atualização sistemática das lógicas disciplinares pelos dispositivos de controle.

Na medida em que as instituições estão em “crise permanente” são criadas uma série de modulações para dar conta desta crise (DELEUZE, 1992, p. 221). Há reformas constantes no papel da escola, da família, das universidades, do sistema judiciário, etc. Se proliferam cursos de capacitação para preparar professores, pais, operadores do direito, conselheiros tutelares e outros. Nestas capacitações entra em cena a interferência de lógicas diversas na mesma instituição, resultado da diluição das lógicas disciplinares e da permeabilidade dos muros das instituições. O sistema judiciário cria escola de pais, a escola vira palco para a implementação da metodologia de resolução de conflitos chamada “justiça restaurativa” , e assim por diante.

REFERÊNCIAS:

DELEUZE, Gilles. Conversações. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.

DELEUZE, Gilles. Foucault. São Paulo: Brasiliense, 1988.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Rio de Janeiro, Petrópolis, Vozes, 2004.

ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. São Paulo: Estação Liberdade, 1989.

 [1] Termo utilizado por Foucault para se referir ao exercício do poder no corpo humano, constituindo uma política específica, caracterizada pela disciplina (FOUCAULT, 2004)

[2] Estas são práticas de controle da vida, uma vez que são produzidas quando se supõe que “falta” algo para que as pessoas consigam ter as rédeas de sua existência, restando somente tutela e controle por parte do Estado.  

[3] Rolnik utiliza este termo para se referir à mídia em geral como forma de captura, através da modulação contínua nas formas de ser e estar no mundo.


Nota: Texto extraido da dissertação de Mestrado intitulada Produção de Práticas e Projetos Sociais de Jonatha Rospide Nunes.

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