Síndrome de Down em quadrinhos

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Bem… o Logan nasceu com Síndrome de Down, Sr. Flavio. Nós precisamos fazer alguns exames e entãonaguhrnd, d,ddm,m sjimmnsksijkal…. Depois do Síndrome de Down, eu não estava ouvindo ou entendendo nada. Só queria que a médica calasse a boca. Apenas isso”. Flávio soube da deficiência do filho e não entendeu. O editor de arte conta que, até receber a notícia, desconhecia a Síndrome.

Alguns meses depois, Flávio Soares começou a escrever A vida com Logan, “um registro eletrônico da grande aventura chamada vida e do desafio de se criar um filho, tenha ele alguma síndrome ou não”, afirma. Recentemente, lançou um livro com o mesmo título que relata o cotidiano de Logan, hoje com oito anos, e os desafios.

Em entrevista ao (En)Cena, Flávio Soares fala sobre o blog, as histórias e a realidade de superação diária, tanto da criança portadora da Síndrome quanto da família.

Flávio com os filhos Logan (à frente) e Max. Crédito: Leo Luz

(En)Cena  –  Quando você começou a escrever o blog? O que te motivou a contar as histórias?

Flávio Soares – O blog começou em 2005, alguns meses após no nascimento de Logan e na época eu publicava apenas textos. As tirinhas vieram alguns anos depois (em 2009). A minha motivação maior era encontrar uma forma de “racionalizar” a síndrome de Down, entender do que ela se tratava afinal de contas com base no nosso (meu e de minha ex esposa) dia a dia com Logan. Nossa rotina era uma rotina comum, diferente dos relatos tristes que encontrei na internet quando ele nasceu. Foi a minha forma de dizer “não é bem assim”.

(En)Cena  –  O que você pretende com “A vida com Logan”?

Flávio Soares – Pretendo continuar o que conseguimos até agora: mostrar, através dos quadrinhos, o que é a síndrome de Down para pessoas que não têm necessariamente contato com essa realidade (eu mesmo não sabia nada a respeito do assunto até o nascimento do Logan). De certa forma, acredito que as tiras ajudam a derrubar alguns tabus e a esclarecer coisas comuns.

(En)Cena  –  Em novembro, o Logan fará nove anos, certo? Quais são as maiores dificuldades que ele enfrenta nessa fase da vida?

Flávio Soares – Correto. No momento ele tem um grande problema que é a fala – ainda está bastante enrolada e vamos precisar investir forte em fonoaudiologia daqui pra frente para compensarmos esse ponto. No mais, ele segue se desenvolvendo como uma criança comum. Está aprendendo a ler e a escrever – demorando um pouco mais que os colegas em alguns pontos, mas isso já era esperado e também está sendo tratado em sessões de psicopedagogia.

(En)Cena  –  Nessa tirinha,

você demonstra a grande insensibilidade que muitos têm ao conviverem com portadores da Síndrome de Down. Isso é comum? Qual maior desafio do pai de uma criança nessa condição?

Flávio Soares – Isso é comum por conta da falta de informação. 90% das pessoas que fazem comentários desse tipo não o fazem por maldade; fazem por desconhecimento. Isso está mudando aos poucos. A percepção que a sociedade como um todo tem da pessoa com deficiência, hoje, é diferente da que se tinha há 20 anos. Acho que o maior desafio é se colocar no lugar das outras pessoas, entender que em muitos casos não há “maldade” e ter a paciência para explicar – ou esclarecer – a realidade.

Há também, claro, o grande desafio das escolas. A maioria não está preparada para receber alunos com deficiência e não se preocupa em se preparar para isso. Novamente: o cenário hoje é muito melhor que o de 20 anos, mas ainda está longe do ideal.

(En)Cena – Em várias tirinhas, você retrata a relação de Barney e Mignola, os animais de estimação da família, com Logan. Essa relação é saudável? Você percebe que traz benefícios para o crescimento de Logan?

Flávio Soares –Eu sempre acreditei que bichos de estimação são importantes para o desenvolvimento das crianças. Elas crescem aprendendo a respeitar os animais. O relacionamento de Logan e Max com os bichos é muito tranquilo. Barney, infelizmente, não está mais conosco, mas Mignola segue firme e forte distribuindo seu mau-humor pela casa (risos).

(En)Cena  –  Logan é carinhoso?

Nessa tirinha você expressa o carinho que ele demonstra pelo pai. Qual característica do Logan que mais lhe chama atenção, lhe encanta?

Flávio Soares – Ele é muito carinhoso. Essa tirinha é uma das que não têm “exageros” para o lado do humor – necessário quando fazemos tiras em quadrinhos. A única parte “fabricada” foi ele carregando um banquinho. Todo o resto aconteceu de verdade. Ele é carinhoso desse modo com todo mundo. Acho que esta é a maior qualidade dele: esta capacidade de expressar amor sem nenhum tipo de receio. Ele gosta das pessoas e faz questão de deixar isso muito claro.

(En)Cena  –  Em julho, você e a editora Panda Books lançaram o livro “A vida com Logan”. O que você tem a dizer sobre essa proposta?

Flávio Soares – O livro é um trabalho inédito, baseado nas tiras em quadrinhos, voltado para o público infantil. A nossa proposta era de fazer um livro que pudesse ser lido na sala de aula e nas casas das crianças e que tivesse um “entendimento” para os pequenos e também servisse para esclarecer dúvidas dos adultos. Sem apelar para “didatismos”, numa linguagem agradável e que funcionasse com várias faixas etárias. Por isso nossa opção pelo formato de história em quadrinhos e não de “livro ilustrado”.

(En)Cena  –  Você e o Logan são felizes?

Flávio Soares – Muito. Acho que não é errado dizer que Logan é feliz morando com sua mãe e que também é feliz nos dias em que fica aqui em casa (eu e a mãe nos entendemos muito tranquilamente sobre a guarda dele), comigo, com o irmão mais novo e com a madrasta. É uma vida feliz, sim. Bem diferente do que me disseram que seria, quando ele nasceu.

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Uma Lição de Amor: a importância do cuidado nas relações parentais

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“Uma lição de amor” é um filme produzido e dirigido por Jessie Nelson, cuja direção permite que seus filmes sejam dotados de um incrível equilíbrio, entre a tensão e o lado cômico que norteia temas tão densos quanto este. O filme narra a história de Sam (Sean Penn) um homem de aproximadamente 40 anos, deficiente mental que luta na justiça pela guarda de sua filha, Lucy (Dakota Fanning), de sete anos.

São poucas as informações sobre a doença de Sam, o que podemos notar é que sua patologia está ligada a limitação da inteligência. Sam possui a capacidade intelectual de uma criança de sete anos, um dos fatores que o faz perder a guarda de Lucy.

Segundo Dalgalarrondo (2008) a inteligência é um conceito fundamental para psicologia, no entanto não há um único conceito para defini-la, o que se pode dizer é que a inteligência pode ser definida como um conjunto das habilidades cognitivas do indivíduo.

Com base na literatura, podemos considerar que Sam possui retardo mental moderado, conhecido também por oligofrenia moderada ou imbecilidade. Isso porque, portadores de Retardo Mental Moderado apresentam (baseando-se em testes de inteligência) um QI na faixa de 35 a 49, o que equivale a idade mental de uma criança de 6 a 9 anos. Apresentando sintomas tais como: desenvolvimento neuropsicomotor lentificado e incompleto (particularmente na linguagem e na compreensão) (DALGALARRONDO, 2008).

Apesar de sua condição mental, Sam tem uma vida normal, sua rotina é como a de qualquer outra pessoa; trabalha durante o dia, cuida de Lucy, sai com os amigos, faz compras e respeita as regras. Destaco aqui que, em casos de retardo mental moderado, a vida completamente independente na idade adulta dificilmente é alcançada. Não se sabe o histórico de vida dele e nem quais foram as condições de tratamento (estrutura, técnicas e supervisão) que ele recebeu. Pelo contexto do filme, podemos associar que o ambiente em que Sam foi criado possibilitou que ele desenvolvesse sua autonomia, podendo levar uma vida normal. É um homem apaixonado por Beatles, sabe todas as músicas e informações sobre a banda, até mesmo o nome de Lucy foi em homenagem a uma música da banda.Cenas assim, em que ele mostra sua paixão pela banda, ou quando está com seus amigos, que permitem que o filme tenha uma leveza e desvia um pouco do drama e tensão pelo quais estão passando Lucy e Sam.

Sam é o único responsável por Lucy, isso porquê a mãe da criança os abandonou logo após o nascimento da menina, ele, no entanto, não deixa de criar Lucy, e recebe a ajuda de alguns amigos (a maioria também com problemas mentais, sendo eles responsáveis pela parte cômica e leve do filme). Aqui associamos a outra característica de indivíduos com retardo mental moderado: apesar de serem desajeitados no contato interpessoal, eles gostam de interagir e estabelecem diálogos sempre.

O drama de pai e filha começa quando uma assistente social julga que Sam é incapaz de criar Lucy, levando em conta seu retardo mental e de que a criança está evitando seu desenvolvimento para se igualar ao pai. A justiça então fica com a guarda de Lucy e a encaminha para a adoção.

Sam ao se deparar com a situação se desespera e decide procurar por um advogado, com a intenção de recuperar a guarda de sua filha. Sabendo que se trata de algo muito difícil ele vai em busca de uma das melhores advogadas da cidade, que é claro, recusa o caso pelo fato de Sam não ter dinheiro para pagá-la. Mas, como quer provar que é capaz de aceitar causas humanitárias, que não trabalha só por dinheiro, Rita (Michelle Pfeiffer) volta atrás e resolve ajudá-los.

A partir daí começa a difícil tarefa de convencer o juiz que Sam é capaz de criar Lucy sem que isso afete seu desenvolvimento.  E não só a vida de Sam se transforma, Rita também aprende muito com seu cliente, principalmente ao que diz respeito a importância da atenção dos pais no desenvolvimento de seus filhos. Ela, por ser uma advogada tão famosa, acaba que deixando o filho sozinho, o que resulta num conflito entre mãe e filho. Quando começa a trabalhar no caso de Lucy, Rita se envolve no caso de maneira que beneficia a todos.

Não podemos analisar uma história, um caso ou um filme de um único ângulo, isso porque não existe somente “um lado da moeda”. “Uma lição de amor” traz além do tema central, outros temas que merecem atenção, que vale a pena serem discutidos e que possibilita muitas reflexões. Existe toda uma crítica por trás dos cuidados que os pais devem ter com seus filhos e da importância da participação dos pais no desenvolvimento dos filhos: atenção, carinho, amor, proteção, ensinamentos (regras, deveres, direitos). Podemos perceber também uma crítica em relação a forma como limitamos as pessoas portadoras de transtornos mentais. Será que realmente damos à elas autonomia suficiente? Por que um pai com deficiência mental não pode ajudar na criação de seus filhos?

Sam, durante toda sua luta pela guarda da filha, tenta de todas as maneiras provar que dentro das suas limitações é capaz de cuidar da filha, e é isso que ele mais gosta de fazer. É capaz de esquecer qualquer outra coisa, menos o que ajuda a criança a dormir quando está com dificuldades de “pegar no sono”. São detalhes pequenos, mas que, quando somados, mostram a grandiosidade e incrível capacidade de Sam de criar sua filha.

O que todos julgavam em Sam era se ele tinha capacidade de criar Lucy sozinho, mas ninguém se atentou que ele não queria essa exclusividade, a única coisa que Sam desejava era cuidar de Lucy. “O amor de Sam pela filha e a sua vontade de criá-la, nos faz refletir sobre até que ponto o ser humano é julgado por causa de seu estereótipo (FERNANDES e LEDUC. 2009, s/p)”.

Assim, o filme acaba por trazer, mais uma vez, a importância de se observar, de prestar mais atenção no “olhar para o outro”, mas de forma completa, sem pré-conceitos. Buscar entender o que o outro quer e espera, para depois obter alguma conclusão, se é que existe uma única conclusão.

“A inocência, a sinceridade e a bondade do personagem Sam nos transmite que tudo é possível quando há amor! A importância desse sentimento é demonstrada por uma das falas da personagem Lucy: “Tudo o que eu preciso é amor!”  (FERNANDES e LEDUC, 2009, s/p).

 

 

FICHA TÉCNICA

UMA LIÇÃO DE AMOR

Título Original: I’ am Sam.
Gênero: Drama
Direção:Jessie Nelson
Roteiro: Jessie Nelson, Kristine Johnson
Elenco: Brad Silverman, Dakota Fanning, Dianne Wiest, Doug Hutchison, Eileen Ryan, Janet Adderly, JennaBoyd, Joseph Rosenberg, Laura Dern, Loretta Devine, Michelle Pfeiffer, Richard Schiff, RussFega, Scott Paulin, Sean Penn, Stanley DeSantis, Wendy Phillips, Will Wallace
Produção: Richard Solomon
Fotografia: Elliot Davis
Ano: 2002

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