Dislexia entra em pauta no filme “Como Estrelas na Terra”
12 de março de 2022 Bruno Riordan de Oliveira
Filme
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O Filme Como Estrela na Terra assistido em sala, foi gerado na Índia e narra a história de um garoto que tem dislexia, que se trata de uma dificuldade de leitura e escrita.
Inicialmente é essencial deixar explícito que a dislexia não se refere há uma doença e sim, de uma má formação do cérebro que faz com que o menino tenha dificuldade na aprendizagem, sobretudo associados à decodificação de códigos. Porém, o personagem do filme usufruía de uma escola normal, contudo repete uma vez a terceira série e não demonstra evolução alguma nos rendimentos. O garoto não consegue junto a turma no desempenho escolar e se instaura em uma melancolia.
O pai do garoto disléxico, bem como a mãe e todos que estão em convivência com ele, não compreendem que ele tem um distúrbio de aprendizagem, que a veracidade do garoto não está progredindo nos estudos seja algo severo, então o menino sofre muito com essa inaptidão da família, dos professores e alunos da escola, em especial a forma como o pai tratava o filho, pois não compreendia que ele estava passando de fato e acabava violentando a criança psicologicamente, fazendo com que a criança ficasse sem vínculo afetivo com uma das figuras primordiais que é o pai, sofredora, infeliz e com adversidades que a família não ajudava no momento mais preciso.
Em vista disso, o pai é convidado pela diretora da escola para um papo sobre a criança, e nervoso com muitas reclamações do seu filho decide colocá-lo em uma escola integrada, ou seja, um internato. Essa pratica do pai só acarretou problemas maiores, em primeiro lugar é porque o garoto fica muito aflito com isso, porém, é uma criança, não tem preparo para vivenciar uma separação dos pais especialmente quando se refere em relação a ir para um lugar onde a estrutura familiar é engessada e ele não tem uma pessoa que te de segurança.
O menino se machuca muito, por que não consegue entender o comportamento de seu pai, e sustenta a opinião de que foi descartado da família, ele entende tudo isso como um castigo por não conseguir aprender.
Todos esses quesitos abalam o garoto transformando-o em uma criança abatida, e sem disposição para aprender, até mesmo ele sendo infeliz como outras crianças, apenas uma coisa que ele queria fazer era voltar à sua casa, pois ficava com saudade de sua mãe, que tem um papel de carinho e afeto. Além do mais, o internato não cooperava para anulação dessas emoções, por assegurar um exemplo disciplinar rigoroso.
FICHA TÉCNICA DO FILME:
Título original:Taare Zameen Par
Direção:Aamir Khan
Elenco:Aamir Khan,Darsheel Safary,Tisca Chopra
REFERÊNCIAS
KHAN, Aamir. 2007. Como Estrelas na Terra – Toda criança é especial. Índia: Estúdio/Distrib: Aamir Khan Productions.
PINHEIRO, Mislene dos Santos. Resenha do filme “Como Estrelas na Terra, toda criança é especial”. In: Portal Educação, 2013. Disponível em http://www.portaleducacao.com.br/educacao/artigos/47245/resenha-do-filme-como-estrelas-na-terra-toda-crianca-e-especial#ixzz3DvPaRb00. Acesso: 30/ set. 2014.
LEMOS, Suely F. C., COSTA, Solange G., LIMA, Rita C. P. Representações sociais: Aplicabilidade nos estudos sobre a educação de jovens e adultos. Educação, Sociedade e Culturas, Rio de Janeiro, n. 39, p. 43-61, 2013.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem na escola e a questão das representações sociais. In: Luckesi. Disponível em http://www.luckesi.com.br/textos/art_avaliacao/art_avaliacao_eccos_1.pdf. Acesso: 30/ set. 2014.
SANTOS, Laércio Silva dos. Representações Sociais na Escola. In: Webartigos, Goiás: 2013. Disponível em http://www.webartigos.com/artigos/representacoes-sociais-na-scola/123238/#ixzz3ErilsPYn. Acesso: 30/ set. 2014.
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Maioria dos pais vê prejuízos na educação das crianças e adolescentes durante a pandemia, segundo pesquisa Datafolha
Para 65% dos pais ou responsáveis entrevistados na pesquisa, encomendada pela Fundação Lemann, Itaú Social e Imaginable Futures, as crianças da pré-escola terão o seu desenvolvimento comprometido; enquanto 69% dizem que os estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental terão atraso em seu processo de alfabetização, com prejuízo ao seu aprendizado;
Em relação aos adolescentes, 58% têm a percepção de que terão problemas emocionais por causa do isolamento e 58% acreditam que os alunos do ensino médio correm risco de desistir dos estudos;
Subiu de 24% para 30%, de setembro para novembro de 2020, o índice de pais e responsáveis favoráveis ao retorno das aulas presenciais, alegando principalmente os prejuízos na educação dos estudantes durante a pandemia em todos os níveis de ensino;
A pesquisa mostra também que os pais temem a Covid-19 e para 49% não há confiança na capacidade da escola de se adequar às normas de segurança sanitária, índice que era de 22% em setembro; em relação ao comportamento dos estudantes, 43% não confiam que irão cumprir os protocolos de segurança (índice de 24% em setembro).
São Paulo, fevereiro de 2021 – Após praticamente um ano letivo sem aulas presenciais, pais e responsáveis de estudantes de escolas públicas de todo o país acreditam que, se continuarem fechadas, as crianças da pré-escola terão o seu desenvolvimento comprometido (65%), enquanto aquelas dos anos iniciais do Ensino Fundamental terão um atraso em seu processo de alfabetização e isso irá prejudicar seu aprendizado (69%). Em relação aos adolescentes, a percepção é a de que tenham problemas emocionais por causa do isolamento (58%) e que os alunos do Ensino Médio correm o risco de desistir dos estudos (58%).
Estes dados são indicados na quinta edição da pesquisa Datafolha “Educação não presencial na perspectiva dos estudantes e suas famílias”, encomendada pela Fundação Lemann, Itaú Social e Imaginable Futures, realizada com 1.015 pais ou responsáveis de estudantes das redes públicas municipais e estaduais, com idade entre 6 e 18 anos, no período de 16 de novembro a 2 de dezembro de 2020.
Os prejuízos decorrentes da falta de aula presencial podem ser ainda maiores para os estudantes socialmente vulneráveis. Para 80% dos pais e responsáveis, eles correm o risco de ficar para trás por terem mais dificuldades para estudar em casa. A taxa dos que temem que seus filhos desistam da escola chegou a 35%. A diminuição da renda familiar é outro ponto de atenção: na pandemia a renda diminuiu para 47% dos entrevistados.
“Tantos meses de afastamento do ambiente escolar deixarãomarcas no desenvolvimento dos alunos, com a intensificação de problemas antigos, como a distorção idade-série, o abandono e a evasão, especialmente entre a população mais vulnerável. As redes que já começaram a realizar diagnósticos estão no caminho certo para propostas pedagógicas que ajudem na motivação dos estudantes e na recuperação das perdas de aprendizagem. É também urgente a construção de um planejamento coordenado de retomada das aulascom protocolos bem estabelecidos, com forte diálogo junto às equipes escolares e muito apoio aos professores, sob pena dos prejuízos à educação e à garantia de direitos de crianças e adolescentes se prolongarem por um extenso período”, afirma a gerente de Pesquisa e Desenvolvimento do Itaú Social, Patricia Mota Guedes.
O reconhecimento da importância da retomada das aulas presenciais traz, em contrapartida, a insegurança e o temor sobre o contágio da Covid-19. Apenas 19% dos pais ou responsáveis disseram que ‘confiam muito’ na capacidade da escola de se adequar aos protocolos de segurança sanitária na reabertura. E 43% deles não confiam na capacidade dos alunos de se adequarem às normas sanitárias, índice que era de 24% em setembro.
No cenário nacional, somente 5% das escolas frequentadas por estudantes das famílias que participaram da pesquisa reabriram em novembro, das quais 60% com aulas regulares e 66% em alguns dias da semana. Mais da metade dos alunos não foi para a escola (57%) e 79% dos pais entrevistados disseram que receberam orientações sobre a reabertura.
Para o diretor executivo da Fundação Lemann, Denis Mizne, uma boa comunicação das escolas com pais, responsáveis e alunos pode fazer diferença para orientar e criar uma relação de confiança. “É um período de insegurança natural devido ao cenário de pandemia, mas este momento é também uma oportunidade para estreitar e fortalecer o contato com as famílias, que vêem agora com mais clareza a importância da escola no desenvolvimento das crianças e dos adolescentes“, diz Mizne. “É importante este vínculo para motivar alunos e familiares e evitar a evasão escolar”, afirma.
APRENDIZADO NA PANDEMIA
Para 79% dos pais, as escolas deram apoio durante o período sem aulas presenciais, principalmente nos anos iniciais do Ensino Fundamental (87%). O suporte consistiu principalmente em professores disponíveis para tirar dúvidas dos responsáveis, orientações gerais sobre como apoiar os estudantes para fazerem as atividades e sugestões para motivá-los a participar.
As atividades a distância possibilitaram aos alunos o desenvolvimento de algumas competências. Na percepção dos pais, foram desenvolvidas habilidades como usar a tecnologia para estudar e aprender, não desistir diante das dificuldades e pesquisar e ampliar o conhecimento sozinho.
Os pais e responsáveis também tiveram um aprendizado neste ano de aulas em casa. Dos entrevistados, 50% destacam como aspectos mais importantes acompanhar e apoiar os estudantes na aprendizagem; 35%, estar aberto a diferentes dinâmicas e tendências de ensino; e 29%, estar em contato com os professores e com a direção da escola, além de estabelecer e acompanhar rotinas de estudos.
No entanto, houve dificuldades dos estudantes para organizar as rotinas de estudo com autonomia, além de capacidade de adaptação e flexibilidade. O índice dos que percebem dificuldade em manter uma rotina das atividades em casa alcançou 69%. Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, chega a 72%.
A motivação é um fator crítico para o engajamento e observa-se um processo de desmotivação desde maio de 2020, quando ocorreu a primeira edição da série de cinco pesquisas realizadas até agora pelo Datafolha. Enquanto em maio 46% dos estudantes estavam desmotivados, em novembro o percentual é de 55%.
Deve-se considerar que houve um incremento no índice de alunos que receberam atividades por equipamentos e material impresso, de 34% para 63% no período de maio a novembro de 2020. No entanto, cai o tempo dedicado para as atividades.
Em um período letivo tão atípico, uma questão é fundamental: evitar a evasão escolar. A pesquisa segmentou os estudantes em quatro categorias: ‘Adaptados’, ‘Superadores’, ‘Resilientes’ e ‘Em risco’. Considerando os dados apurados de maio a novembro, observa-se que o grupo dos estudantes ‘Em risco’ mantém-se estável em cerca de um terço, similar ao grupo dos ‘Resilientes’. Quando perguntados qual a expectativa para 2021, 34% afirmam estar otimistas, enquanto 36% estão razoavelmente otimistas.
Brincar é parte primordial na vida da criança, tão importante a ponto de a Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos reconhecê-lo como direito de toda criança (GINSBURG, 2017). Sendo um fenômeno tão comum, o brincar desperta interesse da Psicologia devido à influência que exerce na infância e à motivação interna por trás desse fenômeno. A versão online do dicionário Michaelis explica o termo brincar como “entreter-se com objetos ou atividades lúdicas e simular situações da vida real”. Pearson (s. d.) diz haver dificuldade na conceituação de brincar, mas revela um modelo que identifica cinco características que atestam uma provável brincadeira, são elas: não-literalidade; simulação de emoção real; motivação interna e livre escolha.
Embora o senso comum deduze não acontecer nada enquanto as crianças gastam tanto tempo “só jogando”, como se o brincar fosse apenas uma indulgência concedida aos pequenos (CALDWELL s.d.), Vázquez (2015) escreve que a brincadeira não é apenas entretenimento como também fator por trás do desenvolvimento infantil, através da qual são ativadas a afetividade, a motricidade, inteligência, criatividade e sociabilidade; assim sendo, o brincar, de certo modo, é a razão de ser da infância. Valério (2016) confirma ao frisar que isso não compreende apenas diversão prazerosa, mas também um meio através do qual a criança expressa seus sentimentos e aprende. Há quem diga que os pequenos conhecem a vida jogando, pode-se parafrasear tal afirmação por uma frase mais abarcadora, “os pequenos conhecem a vida brincando”.
Em virtude disso, a brincadeira deve ser vista como algo sério, pois a criança investe toda sua afetividade nisso (ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008). Utilizam o brinquedo para externar suas emoções, construindo um mundo a seu modo e, dessa forma, questionam o universo dos adultos. Elas já nascem em um meio pautado por regras sociais e o seu Eu deve adaptar-se a essas normas. Na brincadeira, ocorre o processo contrário: são as normas que se encaixam em seu mundo. Não é uma tentativa de fuga da realidade, mas, sim, uma busca por conhecê-la cada vez mais. No brincar, a criança constrói e recria um mundo onde seu espaço esteja garantido. As pressões sofridas no cotidiano de uma criança são compensadas por sua capacidade de imaginar; assim, fantasias de super-heróis, por exemplo, são construídas (MELO & VALLE, 2005 apud ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008).
Aberastury enfatiza a brincadeira infantil como externalização dos medos, angústias e problemas que a criança enfrentou; assim, ela revive ativamente tudo o que sofreu passivamente, por fim modificando um final que lhe foi penoso, consentindo relações que seriam proibidas na vida real. Melo e Valle (2005 apud ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008) escrevem que, através do brinquedo e sua ação lúdica, a criança expressa sua realidade, ordenando e desordenando, construindo e desconstruindo um mundo que lhe seja significativo e corresponda às suas necessidades intrínsecas para seu desenvolvimento global. Ginsburg (2007) segue linha semelhante ao ressaltar que, durante uma brincadeira, a criança está navegando em um mundo perfeitamente criado somente para suprir suas necessidades; além disso, por mais que seja pouco verbal, o infante pode ser hábil a expressar suas visões, experiências e mesmo frustrações através do brincar.
À medida em que a criança cresce, suas necessidades mudam ou são acrescidas outras, assim sendo, é inevitável que a forma de brincar se transforme e os próprios brinquedos sejam substituídos por outros. “[…] Assim, como as necessidades das crianças vão mudando, é fundamental conhecê-las para compreender a singularidade do brinquedo como uma forma de atividade” (ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008).
“[…] Uma criança muito pequena sempre deseja algo de imediato. Ninguém jamais encontrou uma criança com menos de 3 anos de idade que planejasse fazer algo específico em um futuro próximo. O intervalo entre o desejo e a satisfação é muito curto. Entretanto crianças um pouco maiores, em idade pré-escolar, já estão sujeitas a desejar algo impossível de ser realizado imediatamente. Vygotsky (1998) conclui que o brinquedo surge dessas necessidades não realizáveis de imediato. Eles são construídos quando a criança começa a experimentar tendências não realizáveis: para resolver a tensão gerada pela não realização de seu desejo, a criança envolve-se em um mundo ilusório e imaginário onde seus anseios podem ser realizados no momento em que quiser. Esse mundo é o brincar” (ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008).
Vê-se a aquisição da capacidade de imaginar e o desenvolvimento desse processo através da brincadeira; a criança já não está limitada ao mundo físico, aos fenômenos captados por seus olhos, mas ao seu pensamento concreto une-se o pensamento abstrato, permitindo ao infante a diferenciação entre o brinquedo e a ideia que este representa. Vygotsky (1998 apud ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008) diz que, através do brinquedo, a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés de uma esfera visual exterior, tornando-se dependente das motivações e tendências interiores, estando imune aos incentivos dos objetos externos.
Poder imaginar é uma capacidade sinalizadora de amadurecimento e evolução cognitiva da criança, e um importante passo gradual na sua autonomia em relação aos pais e ao mundo em geral. Vygotsky (1998 apud ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008) escreve que o criar uma situação imaginária não é algo acidental na vida da criança, mas a primeira manifestação da independência da criança em relação às restrições situacionais.
O brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança. […] essa zona de desenvolvimento proximal é um domínio psicológico em constante transformação, refere-se ao caminho de amadurecimento de suas funções, ou seja, ações que, hoje, a criança desempenha com a ajuda de alguém conseguirá, amanhã, fazer sozinha. Ao brincar ela se solta e se permite mais, vai além do comportamento habitual para sua idade e de suas atitudes diárias. Ela se torna maior do que realmente é na realidade. Assim, o brincar vai despertar aprendizagens que se desenvolverão e se tornarão parte das funções psicológicas consolidadas do indivíduo (OLIVEIRA, 1995 apud ROLIM; GUERRA; TASSIGNY, 2008).
Assim sendo, fica evidente a importância da brincadeira na vida criança, uma atividade que não somente beneficia o infante no presente como também retumbará em benefícios no seu futuro. Como escreve Santamaría (sem data), brincar significa indagar, conhecer, descobrir tudo o que é necessário para tornar-se adulto. Como certa vez disse o pedagogo Fred Rogers, a brincadeira é realmente o trabalho da infância.
Dicionário Michaelis. Disponível em <http://www.michaelis.uol.com.br>. Acesso em: 16 set. 2017.
CALDWELL, Bettye M. Importance of Play in Early Childhood Education. Fisher-Price. Disponível em <http://www.fisher-price.com>. Acesso em: 14 set. 2017.
GINSBURG, Kenneth R. The importance of play in Promoting Healthy Child Development and Maintaining Strong Parent-Child Bonds. AAP Gateway. Disponível em <http://www.aappublications.org>. Acesso em 17 set. 2017.
PEARSON, Charese. Importance of Play in the Early Childhood Classroom. Miami University. Disponível em <http://www.miami.edu/>. Acesso em 15 set. 2017.
ROLIM, Amanda Alencar Machado; GUERRA, Siena Sales Freitas; TASSIGNY, Mônica Mota. Uma leitura de Vygotsky sobre o brincar na aprendizagem e no desenvolvimento infantil. Humanidades. Fortaleza, v. 23, n. 2, p. 176-180, jul./dez. 2008.
SANTAMARÍA, Marisa Alonso. La importancia del juego para el aprendizaje del niño. Disponível em <http://www.guiainfantil.com/>. Guía Infantil. Acesso em 17 set. 2017.
VÁZQUEZ, Cristian. ¿Por qué el juego es tan importante para los niños? Eroski Consumer. Disponível em <http://www.consumer.es/>. Acesso em 14 set. 2017.
VALÉRIO, Joana Simão. A importância do brincar no desenvolvimento da criança. Psicologia.pt. Disponível em <http://www.psicologia.pt/>. Acesso em 14 set. 2017.
Artigo originalmente publicado no site: <https://comunidadepsi.com/>.
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A gestão democrática na escola como garantia de preservação subjetiva
A gestão democrática escolar deve ser realizada para que os alunos vistos como agentes sociais sofram mudanças e transformações através de atuações que englobem a comunidade local e também a comunidade escolar, e que tenham o objetivo de construir uma sociedade baseada no respeito e no aperfeiçoamento da qualidade de vida (LÜCK, 2007). Morais e Felgar (2013, p. 10) apontam que: “um dos maiores desafios do gestor é conhecer os valores, as crenças, a cultura que norteiam as ações daqueles que fazem parte da instituição escolar, reconhecendo as medidas necessárias para que estes não se distanciem dos princípios, diretrizes e objetivos da educação”.
O gestor deve estar sempre atento e em estado de alerta para que ao mesmo tempo que ele tenha que ser flexível e passivo, ele também seja ativo e técnico, o que exige desse profissional uma enorme capacidade de mediar às questões de uma forma onde as demandas possam ser resolvidas da melhor maneira possível, entretanto para que isso ocorra, o gestor deverá considerar todo o contexto da situação e das pessoas envolvidas, levando em consideração aspectos individuais e subjetivos, porém agrupando as questões levantadas à teoria e às normas que sua profissão exige.
Para que a gestão democrática continue sendo implantada ou seja ainda mais implantada e utilizada, é necessário que o gestor esteja comprometido em construir e implantar esse modelo de gestão, o que exige um grande esforço. E segundo Castiglioni (2007), existem três grandes desafios para a gestão democrática, sendo: a profissionalização e modernização da gestão escolar, o que carrega também outros aspectos como “a formação dos gestores, inovação tecnológica e a cultura do planejamento, monitoramento e a avaliação presentes na gestão da escola“ (CASTIGLIONI, 2007 p. 15 ).
Quando o gestor não está atento ao que está acontecendo, ele pode recair em algo denominado como educação bancária, que corresponde a uma espécie de crítica que Paulo Freire realizou direcionada à burocratização da escola e também da gestão escolar, que conta com a racionalidade sendo feita de forma instrumentalizada, o que automaticamente retira a participação dos atores educativos dentro da tomada de decisões da gestão escolar, que é algo que acaba criando e mantendo um comportamento de alienação e repressão (ALCANTARA et al, 2018).
No que corresponde a gestão da escola, Castiglioni (2007 apud MORAES; FELGAR, 2013):
“a) formação dos gestores – observa-se uma formação inicial precária, onde não se tem um foco na função diretiva; quanto à formação continuada pode ser considerada pouco significativa ora por ser muito teórica ora por ser muito técnica;
b) inovação tecnológica – vai muito além de equipamentos tecnológicos, pois engloba, também, serviços, ideias e formas de realização e manutenção da instituição, como maneira de garantir a qualidade do processo educacional;
c) planejamento, monitoramento e a avaliação – muitas escolas ainda realizam seus planejamentos somente com objetivos de cumprir normas legais; não realizam o acompanhamento dos indicadores e resultados e a avaliação ainda está sendo utilizada como forma de pontuação. (ibidem)” (CASTIGLIONI, 2007 apud MORAES; FELGAR, 2013).
No que corresponde à democratização da escola, a gestão escolar na atualidade enfrenta alguns desafios sobre inclusão e respeito às diversidades (MORAES; FELGAR, 2013). Pois não podemos esquecer que a educação sofreu inúmeras mudanças ao longo da história, assim como a sociedade também, e com a gestão escolar não poderia ser diferente, cada época possui suas demandas especificas e assuntos que devem ser trabalhos.
Sabemos que muitas situações provocam discussões intensas dentro da comunidade escolar e também dentro da sociedade de uma forma geral, pois apesar de que as escolas estão realizando debates e projetos sobre o assunto de inclusão e de diversidade, a forma como essas pessoas são vistas e suas necessidades reais ainda é distante da realidade, o que de alguma maneira atrapalha a democratização da gestão escolar.
No que tange a participação da comunidade, que corresponde a um elemento fundamental da democratização da escola, Castiglioni (2007) denota que essa participação não é integral e/ou completa em todos os segmentos escolares disponibilizados para essa ação. Muitos indivíduos da comunidade alegam que a participação nos Conselhos é desnecessária que tomam tempo ou que, até mesmo querendo participar, a decisão final sempre é do diretor. Apesar de considerarmos as possíveis variáveis envolvidas nesse processo, a adesão da comunidade e dos pais ainda é baixa ou mínima, o que gera impactos diretos na gestão escolar democrática.
Para Castiglioni (2007), no processo de humanização da escola podemos perceber que existe influência das mudanças culturais e morais que a sociedade perpassa ao longo da história, visto que, a escola se tornou um lugar fundamental para discutir e elucidar assuntos que podem contribuir para a resolução dos desafios existentes na escola e na gestão escolar, e um desafio que aparece bastante na fala da comunidade escolar na atualidade é a respeito da indisciplina e sobre violência física e moral que ocorre nas escolas, onde existem casos onde professores , alunos e funcionários da instituição são agredidos e violentados, e também casos onde os próprios alunos se agridem entre si.
A indisciplina tem sido um assunto bastante levantado na escola pelos professores, alunos, funcionários e pelas famílias e pela sociedade, pois é frequente que alguém esteja sofrendo algum tipo de violência ou esteja imerso num conflito devido à falta de disciplina em alguma questão. E existem muitos casos onde os pais transferem para a escola a obrigação moral e cívica de introduzir e implantar valores nos filhos, o que causa consequentemente bastante atrito entre os educadores e os pais, pois a escola não deve substituir o papel da família nem deve ensinar o que não faz parte dela.
Muitas vezes nos deparamos com professores e gestores despreparados para lidar com as situações que ocorrem, o que gera um enorme prejuízo no sistema, o que gera grande desconforto em todos.
A verdade é que os passos dados na direção da construção da gestão compartilhada ainda são lentos e inexperientes. Como disse Paulo Freire “A superação da inexperiência democrática por uma nova experiência: a da participação, está à espera” (…). (FREIRE, 2007, p. 91). Ainda há muito caminho a percorrer, tendo em vista a recente democratização do país, e por este motivo ainda existem muitos entraves no que diz respeito a gestão democrática, seja ela escolar ou não.
O Brasil, ainda espera para poder gozar livremente dos benefícios de ser uma organização democrática, onde sejam promovidos a participação, a reflexão e o estabelecimento do diálogo com os atores educativos. Somente assim é que se poderão impulsionar os caminhos para a gestão democrática, até o momento em que os atores envolvidos no sistema educacional possam refletir sobre sua existência (ALCÂNTARA; BORGES; FILIPAK, 2018).
Para Freire (2007), o ideal de uma “educação como prática da liberdade”, será o momento em que a gestão ou a escola sejam capazes de proporcionar “uma organização educativa e pedagógica democrática, autodeterminante e autônoma” (ALCANTARA; BORGES; FILIPAK, 2018, p. 7). Outro ponto que não pode ser esquecido é o fato de que a democratização da escola engloba muito mais do que a gestão de direção da escola, pois, segundo Freire (2003), a democratização da escola implica na hermenêutica do ato de ensinar:
“[…] avançamos pouco em matéria de democratização de nossa educação. Democratização a que nos entregamos inteiros. Na divisão de Educação, a da escola, a das diferentes relações que nelas se estabelecem -educadores, educandos, pais, mães, zeladores, educadores, escola, comunidade. Democratização da escola quanto à sua maneira de compreender o ato de ensinar.” (FREIRE, 2003, p. 125).
Portanto, se tomarmos como meta a gestão democrática postulada por Paulo Freire, pode-se dizer que já caminhamos um pouco, demos alguns passos em sua direção, mas ainda estamos distantes do ideal por ele almejado.
ALCÂNTARA, Luiz Alberto de; BORGES, Valdir; FILIPAK, Sirley Terezinha. Fundamentos da gestão escolar democrática em Paulo Freire. Revista Espacios, Curitiba, v. 39, n. 43, p.1-9, jan. 2018. Disponível em: <http://www.revistaespacios.com/a18v39n43/18394320.html>. Acesso em: 27 de novembro de 2020.
ARRETCHE, M. Federalismo e políticas sociais no Brasil: problemas de coordenação e autonomia. São Paulo Perspectiva, São Paulo, v. 18, n. 2, p. 17-26, abr./jun. 2004. http:// dx.doi.org/10.1590/S0102-88392004000200003.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Termo de Referência nº 03/2014. PROJETO CNE/UNESCO – 914BRZ1144.3. Documento técnico contendo estudo analítico sobre o panorama nacional de efetivação da gestão democrática na Educação Básica no Brasil. Brasília: 2014.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília, 1988.
Durante recente participação em live com os alunos do curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra, a professora Dra Adriana Ziemmer Gallert, falou acerca da educação como algo que nos faz pensar muito sobre o futuro e com ele as mudanças necessárias para se adaptar às rápidas transformações. Adriana pontuou sobre a necessidade de o profissional adaptar-se ao contínuo aprimoramento como pessoa e, também, como educador. “Acredito que um professor que tenha consciência dessas questões é um grande fator positivo na vida do acadêmico”, comentou Adriana.
Dentre outros tópicos destacados na entrevista, a educadora também enfatizou que a pandemia tem gerado um enorme impacto na educação e na vida dos alunos e professores, pois mesmo aqueles que antes tinham, ou mesmo ainda têm, resistência em relação ao uso de plataformas digitais se vêm forçados à adaptação, ao aprimoramento.
Adriana trabalhou por muito tempo no Ceulp/Ulbra, voltou para o Rio Grande do Sul há cerca de 3 anos e meio, tem Mestrado e Doutorado em educação pela UNB, é professora na Ulbra do Rio Grande do Sul e coordenadora acadêmica da unidade Guaíba e, também, no Rio Grande do Sul, sendo que em Palmas atuou na direção acadêmica. Confira este e outros tópicos na entrevista que segue:
(En)Cena –Como que fica o professor nesse contexto de mudança?
Adriana Ziemmer Gallert – Falar sobre o professor para mim é sempre uma paixão, eu gosto muito de falar e fazer reflexões sobre a nossa profissão. É uma profissão que eu escolhi para mim e que me alegra muito frente a tantos desafios que nós temos, primeiro a gente precisa pensar sempre, eu penso que a nossa profissão é uma profissão de intensas mudanças, o tempo todo nós somos desafiados a repensar as nossas práticas, porque o tempo todo nós estamos inseridos no contexto social, é uma profissão diretamente relacionada com pessoas e, sendo relacionada com pessoas, nós estamos inseridos em contextos sociais, culturais, políticos, econômicos, enfim, estamos em meio a esse todo no qual nos traz muitos desafios para que nós estejamos a todo momento sendo impulsionados para mudar, só que ao mesmo tempo a nossa profissão se constitui com uma tensão constante porquê nós somos profissionais que sabem que precisamos mudar e estudar as mudanças mas realmente alguns de nós têm dificuldades e é resistente à mudanças, nós temos culturalmente, dentro da profissão, um grupo grande de profissionais que sabe das dificuldades mas que realmente não encara, não enfrenta essas mudanças. É especial falar sobre isso nesse contexto porque nós estamos agora vivendo um momento onde nós somos muito tensionados pela mudança dado o contexto que estamos de pandemia, isolamento social e a reconstrução do fazer docente.
(En)Cena –Você acredita que não vai ser possível mais, mesmo que nós queiramos, voltar a ser o que era porque, por exemplo, os alunos já estão entrando na onda de interações que não são mais aquelas interações “clássicas”, “tradicionais” e que já são mediadas por dispositivos eletrônicos para tirar dúvidas. Enfim, então a gente vai ser forçado a se reinventar, na sua opinião?
Adriana Ziemmer Gallert – De uma hora para outra nós de turmas presenciais fomos desafiados realmente a nos reinventar, a nos recriar dentro de um cenário muito novo, novo como nós conversamos na outra live que não é tão novo assim, mas novo no sentido de ser professor com ferramentas novas, com ferramentas diferentes que antes nós conhecíamos mas ainda não usávamos ou não conhecíamos realmente e precisamos aprender muito rapidamente a usar e com certeza isso traz um impacto muito grande, muito significativo nesse sentido. No momento em que nós escolhemos a nossa profissão, essa profissão tem relação com algo pessoal da nossa vida que nos leva à fazer a escolha por estarmos nessa profissão e esses motivos que nos levaram a fazer essas escolhas estão relacionados com situações da nossa história e, quando nós nos deparamos com a profissão nós vamos adentrando no universo que demanda formação e desenvolvimento de competências tanto pessoais quanto profissionais necessárias no cotidiano.
Você mencionou os mecanismos de defesa frente às mudanças quando aquele contexto de trabalho se torna uma espécie de rotina e não provoca a transformação da mudança, não traz a necessidade de mudança e é meio natural que haja uma espécie de comodismo em relação a fazer as mesmas práticas e nesse contexto fomos desafiados a mudar nosso perfil, o nosso jeito de sermos e isso apresenta para nós uma mudança em relação à concepção do que é efetivamente exercer essa profissão, o que significa realmente sermos professores neste contexto, entender que a profissão passa por um contexto diferente de desafios e esses desafios com certeza vêm para ficar, acredito muito que a docência não será mais a mesma quando nós voltarmos ao ensino presencial.
(En)Cena –Um aspecto que você relatou na última questão que me chamou a atenção também e que de vez em quando eu até penso sobre isso, sobre a ideia de nós profissionais da educação de fato assumirmos essa área, assumirmos que essa é a nossa bandeira no caso e não reforçar alguns discursos (claro que a gente tem que lutar pela melhoria da categoria e, também, para que as coisas melhorem para que nós tenhamos cada vez mais condições de exercer a profissão).
Adriana Ziemmer Gallert – Sim, como a nossa profissão se configura dentro do contexto das escolhas que nós fazemos e no espaço que nós ocupamos, nesse momento nós temos também o cenário do valor da educação e do valor da ciência frente ao cenário da pandemia.
Fonte: Acervo pessoal da entrevistada
A necessidade que eu vejo, nós enquanto universidade, é de repensarmos muito o nosso trabalho e o nosso papel também no contexto de profissionais, professores no ensino superior que estão preparando profissionais para exercerem as suas profissões, as suas escolhas profissionais, isso tem sido um desafio muito grande nesse momento, e que tem nos levado internamente na universidade a reflexões muito ricas e muito valiosas, porque nós pensamos assim, nós estamos atuando como professores num contexto que nós não fomos preparados, ninguém foi preparado para viver a vida numa situação de pandemia, nós não fomos preparados para isso e aí nós estamos dentro da universidade nesse momento tendo o desafio e, digamos assim, um privilégio também de preparar profissionais para esse contexto, por que que eu falo do privilégio também? Os profissionais que nós na universidade preparamos, que terminaram o seu curso de graduação por exemplo no ano passado, os nosso egressos concluíram sua formação, são formados pela nossa universidade, eles estão atuando nesse contexto e no ano passado nós não preparamos eles para atuar e serem profissionais no cenário da pandemia.
Os estudantes que estão conosco hoje, estão nas nossas aulas tendo a oportunidade de refletir conosco sobre como ser um profissional nesse contexto ou então como ser um psicólogo no contexto da pandemia, como ser um engenheiro no contexto da pandemia, como ser um farmacêutico no contexto da pandemia, como ser um professor de educação básica no contexto da pandemia.
(En)Cena –E a gente não fica só na perspectiva de um cenário futuro, pois já estamos inseridos nisso, nessa problemática.
Adriana Ziemmer Gallert – Exatamente, isso passa a fazer parte do contexto da formação, inclusive hoje de manhã eu estava assistindo a webinar do representante do Conselho Nacional de Educação onde ele trazia exatamente esse desafio para nós no ensino superior, nós precisamos repensar a formação porque nós precisamos inserir dentro do nosso contexto de formação discussões e o desenvolvimento de competências profissionais necessárias para atuar em situações muito difíceis porque nós não sabemos quando de repente novas situações como essa vão acontecer, infelizmente.
A humanidade precisa se preparar para viver situações assim novamente… se uma vez aconteceu, outras vezes podem acontecer e nós precisamos ter uma estrutura organizacional para isso, e o papel da universidade é esse de preparar realmente esses profissionais para contextos diferentes, contextos desafiadores… então essa tem sido uma tônica muito forte de discussões dentro da universidade quando a gente pensa o papel do professor e a importância do professor está muito aberto a aprender, a trabalhar novas competências, tanto dele como professor nos processos de ensinar, de aprender, de avaliar quanto preparando os profissionais para atuar nas suas áreas dentro de contextos como esses que são muito difíceis.
(En)Cena –E esse professor de hoje, o professor do presente e o professor do futuro, como construir esse professor? Nós não vamos poder usar as mesmas metodologias… O que é metodologia ativa? E o que é aprendizagem ativa?
Adriana Ziemmer Gallert – Falar sobre metodologias ativas é um movimento e assunto bastante atual dentro do contexto do nosso trabalho que vem como um processo, digamos assim, tem um processo pedagógico, que enquanto princípio ele já vem há muito tempo sendo discutido, ele não é algo totalmente novo, mas enquanto conceito sim, é um movimento grande, que tenta incentivar os professores que utilizam metodologias ativas nas suas práticas e mais uma vez nós precisamos ter dentro da educação e da pedagogia um entendimento da questão dos modismos pedagógicos.
Então, às vezes o professor hoje compreende – muitas vezes sem um estudo mais aprofundado em relação ao que são as metodologias ativas – que, por exemplo, utilizar recursos digitais nas suas aulas já significa estar trabalhando com metodologias ativas e na verdade não é isso, na verdade é uma simplificação do conceito de metodologias ativas, que por sua vez tem outros princípios e outros conceitos que precisamos entender e um deles é realmente compreender que dentro desse processo, professor e alunos são ativos no ensino-aprendizagem, se o processo for presencial, se ele for a distância, se ele utilizar recursos digitais… isso passa pelo planejamento do professor. Então está muito mais relacionado a uma concepção do que é a aprendizagem efetivamente para que as metodologias sejam pensadas, para que a aprendizagem seja realmente eficaz.
Fala-se que a metodologia ativa tem como princípio uma aprendizagem ativa e quando a gente fala em aprendizagem ativa isso também traz para mim uma reflexão em relação ao aprender e o que é aprender efetivamente, quando nós nos mobilizamos para buscar algo novo para aprender e entendemos que sempre o processo de aprendizagem perpassa por algo que acontece no sujeito que está aprendendo e esse sujeito que aprende, quando ele aprende efetivamente, quando ele se apropria de algo, alguma coisa modifica nele, seja nos processos cognitivos, seja nos processos subjetivos de aprender… ou seja, há uma transformação, há uma mobilização diferente dentro desse sujeito, a aprendizagem aconteceu e ela foi ativa porquê houve uma transformação, houve uma mobilização desses processos dentro do sujeito e aí eu até questionaria dizer e associar a palavra ativo com aprendizagem, ela é sempre ativa quando ela realmente acontece independente até do método porque o processo é dentro de nós, é dentro desse sujeito que está aprendendo.
(En)Cena – É, me parece que no método tradicional isso também ocorre quando há obviamente essa volição, essa vontade por parte do acadêmico, do educando. O que diferenciaria então, nesse caso? Por que a gente teria que falar de metodologia ativa?
Adriana Ziemmer Gallert – Então, parece que a aprendizagem independe do método. Digamos assim, que no entendimento desse conceito que eu coloquei que a aprendizagem está relacionada a essa transformação de processos sim. Se nós formos pensar, o método que você aprendeu e o método que eu aprendi quando estávamos na escola, que era um método tradicional, também foi uma boa aprendizagem. Nós também aprendemos quando éramos crianças, adolescentes…
A necessidade da mudança nos métodos de ensinar é porque compreendendo a aprendizagem dentro do contexto em que nós estamos, a sociedade hoje é outra, nós estamos inseridos em um contexto cultural, no contexto social onde a interação entre as pessoas é muito intensa, em que as pessoas são protagonistas do processo de sua vida, elas querem participar, elas tem vontade de falar, de interagir, de se posicionar e tudo isso traz então para dentro do processo de trabalho do professor a necessidade realmente de um replanejamento e pensar quais então são as estratégias metodológicas mais adequadas, não para que a aprendizagem seja ativa mas para que o sujeito se sinta inteiro no processo de aprendizagem, para que ele se sinta motivado e queira participar das atividades que são propostas e aí há então a necessidade de pensar metodologias ativas.
(En)Cena – Não é possível inferir que só pelo fato de estarmos conduzindo as aulas de forma remota isso, por si só, seja de fato uma metodologia ativa, sim?
Adriana Ziemmer Gallert – Exatamente, se o entendimento do conceito de metodologias ativas fossem simples assim, ou seja, só focar em recursos digitais e utilizar e dizer que estou fazendo metodologias ativas na minha aula então automaticamente esse contexto em que nós estamos colocaria para nós que estamos todos vivendo no contexto de metodologias ativas e não é isso. Muitos professores neste cenário de pandemia não conseguiram fazer exatamente esse entendimento e esse trabalho pedagógico de retornar as suas aulas com metodologias virtuais, com tecnologias virtuais para colocar as pessoas num processo ativo… aquilo que o professor muitas vezes fazia na aula presencial é que ele ficava um tempão falando como se a aprendizagem acontecesse somente dessa forma, só pelo ouvir e a gente sabe que não é somente assim pois é muito fazer, vivenciar, o conviver para que aquela aprendizagem se torne realmente efetiva, então muitos professores não conseguiram se adaptar…
Os professores marcam uma aula online com os alunos e eles ficam falando muito tempo e aí nós precisamos pensar nesse tipo de aula que, quando nós falamos o aluno está em casa participando da nossa aula, ele tem muitas variáveis em volta que tiram a atenção dele porque ele está dentro do contexto da casa dele, está junto com a família, está junto com o filho, com variáveis concorrentes e muitos deles não têm espaço adequado e ideal dentro da sua casa para poder participar das aulas online e aí se o professor ficar falando, falando… perdeu esse aluno, perdeu mais do que na aula presencial porque ele se distrai por conta da situação que acontece, então até na nossa aula de metodologias remotas nós precisamos pensar no planejamento do tempo dessa aula, quanto tempo é possível ficar falando e que estratégias eu tenho que usar dentro de uma aula virtual para que meu aluno saia da imagem da foto dele (Câmera Desligada) e ele se apresente, ele participe efetivamente daquele encontro e isso também é muito necessário.
E tudo isso passa então pelo planejamento, pela concepção que o professor tem do que é aprender dentro desse contexto, dentro dessa necessidade que as pessoas têm de falar, de interagir, de se posicionar, de serem questionados, de serem instigados para que os seus motivos pessoais sejam aguçados, isso é um grande desafio para os professores.
(En)Cena – Este processo de aprendizagem ativa, às vezes, parece ser algo difícil também para o aluno… qual sua dica para que haja a adesão deles?
Adriana Ziemmer Gallert – Nós precisamos mostrar para nossos estudantes, sempre, como a aprendizagem acontece de forma mais efetiva e o aluno, estudante, ele precisa entender que uma aprendizagem só de ouvir já passou… não é mais assim. Porque as informações mudam muito rápido, elas estão em muitos lugares, as informações podem ser acessadas a hora que nós precisarmos, elas estão mudando e nós temos que atualizar o tempo todo e transformar essa informação em conhecimento, aí sim a aprendizagem acontece e esse é o grande diferencial, e como que nós aprendemos a transformar informações em conhecimento sendo que nós estamos falando do ensino superior?
Trabalhar nesse sentido, de que aquele nosso estudante que ainda nos vê como uma fonte única de acesso ao conhecimento precisa compreender que não é mais assim, nós somos um dos recursos da aprendizagem em termos de conhecimento e, aí sim, nós somos um grande potencial e podemos contribuir com a vida deles em relação ao desenvolvimento das competências, que serão necessárias para a vida toda porque os conhecimentos vão mudar, outras competências profissionais também serão exigidas.
(En)Cena – O educador, neste caso, tem que ter a capacidade de atenção redobrada, já que obviamente tem muitos pontos a serem conectados, tem muitos setores ali dentro da dinâmica da sala de aula onde ele vai ter que ativar esses setores para não haver um processo de descompensação das partes, tipo uma pessoa que polarize muito o discurso… é um reinventar-se no final das contas. Enfim, mudando de assunto, especificamente em relação avaliação, teve ganhos? Teve prejuízos? Não mudou nada? Como você vê isso?
Adriana Ziemmer Gallert – Bom, eu vejo que estamos todos aprendendo muito, primeiramente em relação a essas questões e quando a gente fala no processo das aulas, o jeito de ensinar, o jeito de trabalhar as abordagens, desenvolver as competências, propor atividades até que foi um processo menos doloroso, não tranquilo mas menos doloroso, mas quando chegou no momento das avaliações nesse período de isolamento social começamos a perceber que falar de avaliação nesse contexto é um grande desafio para nós pois eu penso que passa bastante pelo que você falou das nossas concepções, aquilo que nós acreditamos que é realmente educação.
Fonte: Acervo pessoal da entrevistada
Aquele professor que ainda está arraigado naquela concepção de que o processo é de transmissão do conhecimento, que ainda infelizmente não entendeu que esse não é mais o principal do nosso trabalho – ele continua sendo importante sim, pois o conhecimento continua sendo a base de nosso trabalho mas não é só isso, é o conhecimento a serviço de algo, do desenvolvimento de algo maior que são as competências -, esse professor que ainda está centrado só no conhecimento, para ele está sendo um sofrimento pensar nessa avaliação ou ele não está acreditando realmente.
Muitas vezes alguns deles estão vivendo no processo difícil de entender que realmente é possível utilizar as ferramentas diferentes para avaliar o desenvolvimento dos nossos estudantes, porque se eu estou centrado somente no conhecimento e para mim ainda a prova conceitual, aquela prova “o que é isso, que é aquilo?” é o que eu fazia no presencial, o processo avaliativo realmente não faz sentido dentro de um contexto onde nós estamos vivendo agora, porque o aluno tem acesso à internet, ele tem acesso aos materiais, ou seja, ele vai fazer avaliação com consulta sim e além disso eles têm grupos de WhatsApp no qual tiram dúvidas, onde o professor não participa… então quando eles têm dificuldades em alguma questão eles vão colocar lá, eles vão debater e eles vão aprender juntos.
Então para esse professor mais tradicional realmente é difícil. Eu fico imaginando, não consigo pensar exatamente qual é a solução que ele acha pra isso pois acho que não tem muita solução, mas o professor que já entendeu que o processo mudou, que o nosso trabalho é realmente potencializar o desenvolvimento de competências e para isso então nós vamos buscar os conhecimentos, nós vamos buscar as ferramentas que precisamos para desenvolver competências, para esse professor a avaliação tem outras possibilidades. Nós podemos utilizar o instrumento de prova? Podemos! Mas uma prova com questões que avaliam o desenvolvimento de competências e não uma questão onde eu encontro a resposta pesquisando no Google.
Além disso nós temos várias outras ferramentas também dentro desse universo de trabalho das plataformas, os ambientes virtuais aos quais possibilitam vários tipos de instrumentos de avaliação diferentes onde nós podemos sim criar atividades avaliativas que elas, inclusive, são mais trabalhosas, exigem mais do nosso estudante no sentido de que realmente as competências serão desafiadas no seu desenvolvimento. Então a avaliação nesse momento coloca em xeque as concepções que o professor tem, do que é aprender, do que é ensinar, do que é avaliar, o professor que já conseguiu dar um salto no seu desenvolvimento profissional, ele já consegue vislumbrar outras possibilidades, ele consegue construir outros caminhos que são sim coerentes com as estratégias que ele utilizou na própria ferramenta.
(En)Cena – O professor, hoje, não é um mero detentor de conhecimento. Ele é um mediador, um curador… mas o formato de centralização do processo educativo ainda é muito forte, sim?
Adriana Ziemmer Gallert – Eu vejo que muitas vezes o professor está realmente centrado ainda no papel do professor como figura que detém o conhecimento, o papel daquele profissional que não pode errar, que tem que saber tudo sempre, que não consegue quando o aluno, por exemplo, faz uma pergunta em sala dizer assim: “nossa eu não sei, vou pesquisar, vamos pesquisar juntos, eu também preciso aprender, isso é novo para mim também”.
Esse professor que não consegue ter essa postura realmente tem dificuldades em aceitar que ele precisa aprender, e aceitar que ele pode sim dizer “eu não sei, eu preciso aprender”. E o professor que realmente se compreende como profissional em constante transformação é um profissional que sempre tem algo a aprender, que gosta de aprender, a gente precisa gostar de aprender, a gente precisa gostar de ver o quanto nós vamos nos tornando pessoas melhores à medida em que nós vamos aprendendo mais, conhecendo mais, nos desafiando, nos permitindo, também nos transformar e aprender algo novo, acho que isso é tanto do professor quanto do aluno, permitir-se viver situações diferentes, isso também impulsiona em nós processos de aprendizagem, e para esse professor é mais fácil, digamos assim, ver que, por exemplo, “ainda tenho mais a aprender, eu não sei tudo e nunca vou saber de tudo”…
(En)Cena – Gostaria de te agradecer pelo tempo que você dedicou para esta conversa…
Adriana Ziemmer Gallert – Eu agradeço muito o convite mais uma vez e gostaria de deixar um abraço a todos, pois é sempre muito especial estar com todos vocês.
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Educar as pessoas para a convivência em rede – (En)Cena entrevista Edvaldo Couto
O (En)Cena entrevista o Pós-Doutor em Educação Edvaldo Couto que irá abordar a “Violência e maus tratos emocionais em mídias sociais” em minicurso.
Durante os dias 21 a 25 de agosto de 2017, semana em que se comemora o Dia do Profissional de Psicologia, o Caos – Congresso Acadêmico de Saberes da Psicologia– será realizado no Ceulp/Ulbra e contará com uma série de atividades que irão se debruçar sobre um dos temas mais emergentes da contemporaneidade, a violência. Temas como ‘Manejo clínico de vítimas de violência doméstica’, ‘Violência no Trânsito’, ‘Prevenção ao Suicídio e automutilação’, ‘Violência nas redes: em que momento nos tornamos tão insensíveis ao outro?’, ‘Alienação Parental no contexto sociojurídico’, ‘Violência e Sofrimento Psíquico no Trabalho’, ‘Arquétipos da violência nos contos de fada’ e ‘Mídia, Corpo e Violência’ serão alguns assuntos abordados, dentro de uma programação que envolve aproximadamente 30 atividades.
Edvaldo Couto. Foto: arquivo pessoal
Um dos palestrantes confirmados no evento é o professor da UFBA Edvaldo Souza Couto, que possui pós-doutoramento em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Doutorado em Educação (UNICAMP), Mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e graduação em Licenciatura Plena em Filosofia pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC). É professor Titular na Universidade Federal da Bahia (UFBA), no Departamento de Educação II. É professor permanente no programa de pós-graduação em Educação e um dos coordenadores do GEC: Grupo de pesquisa Educação, Comunicação e Tecnologias. É bolsista do CNPq (PQ 2). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação, Comunicação e Tecnologias e também na área de Filosofia, com ênfase em Estética Contemporânea: Escola de Frankfurt (Benjamin e Adorno) e Simondon. Estuda principalmente os seguintes temas: estética; corpo e tecnologia; sexualidade e tecnologias digitais; filosofia da técnica; educação, comunicação e tecnologias digitais; cibercultura e novas educações; software livre; leitura e escrita na era digital; currículo e formação de professores; redes sociais na internet.
Abaixo, confira a entrevista concedida ao portal (En)Cena.
(En)Cena – Há autores que criticam e outros que defendem o uso irrestrito das redes, sobretudo no âmbito da comunicação. Em que medida, para os jovens, uma comunicação violenta, na internet, pode representar um perigo? E qual sua opinião sobre a eventual irreversibilidade do uso de redes sociais eletrônicas por jovens e adultos jovens?
Edvaldo Couto – Vivemos a era das conexões e as pessoas organizam a sua vida por meio das redes. Essa é uma característica da cultura digital. Não tem volta. Desejamos conexões mais seguras, velozes e baratas. A desconexão não é uma reivindicação. A vida online é cheia de situações de violência porque as pessoas são violentas. É preciso educar as pessoas para o convívio nas redes. Conviver com os outros, com todas as diferenças próprias dos outros, é o nosso desafio. Devemos usar as redes para promover sociabilidades e ampliar as regras e experiências do bem-viver.
Edvaldo Couto. Foto: arquivo pessoal
(En)Cena – Estaríamos diante de uma crise de curadoria, ou de uma nova revolução no modo de fazer comunicação?
Edvaldo Couto – Em toda parte vemos pessoas conectadas e criando soluções para os mais diversos problemas. Vivemos uma época de revolução dos nossos modos de vida e hábitos de comunicação em rede. Por isso devemos todos defender liberdade de usos da internet. A internet não pode e não deve ter controles governamentais, institucionais ou empresariais, não pode e não deve ser limitada, com sites e acessos proibidos. Onde tem pessoas conectadas e produzindo livremente coisas extraordinárias acontecem.
(En)Cena – Como as novas configurações de “trocas” de informações podem impactar nos processos educacionais e na formação identitária das gerações futuras?
Edvaldo Couto – Vivemos a cultura digital. Nossa geração e as que estão vindo vivem e viverão conectadas por meio de tecnológias móveis e ubíquas. Isso significa que vivemos uma era de trocas intensas entre pessoas que vivem em rede, o que chamamos a internet das pessoas, mas também começamos a era das trocas intensas de comunicação entre os objetos, o que chamamos internet das coisas. Esses dois modos se fundem e logo pessoas e objetos estaremos todos conectados. E a vida será mais dinâmica, interativa. E também mais vigiada. Qualquer experiência educacional que estiver fora das conexões não terá como sobreviver. Nosso desafio é ensinar e aprender em redes sociocomunicativas, é estimular a produção colaborativa e a difusão de saberes. É isso que chamamos de inteligência conectiva.
(En)Cena – De que forma as subjetividades contemporâneas podem lidar com a enxurrada de informações, notadamente aquelas de teor explicitamente violentas?
Edvaldo Couto – Nossas subjetividades resultam da cultura das conecções. Os modos de ser voláteis são os que vivemos na era dos fluxos. Para quem está inserido nos nexos das redes tudo é fluxo, não tem excesso de informação. O discurso sobre o excesso de informação era próprio de uma época em que era possível viver online e também offline. Essa dualidade não existe mais. Aparentemente tudo está disponível e circula, mas não precisamos nem podemos acessar tudo. Cada um cria suas redes e audiências a partir de interesses específicos. Compartilhamos informações para esses grupos que formam as nossas redes de influências e subjetividades. E, ao mesmo, tempo, devemos combater crimes, discriminações e todo tipo de violência em rede. A cultura da violência na rede pode caminhar para uma cultura do compartilhamento e da solidariedade. Devemos educar as pessoas para o prazer da convivência em rede.
A subversão de conceitos aparentemente fechados é uma das marcas das mentes mais invejáveis de todos os tempos. E pensar de forma subversiva é também quebrar com a linearidade das considerações pré-concebidas. Assim, resignificar e despir as “verdades” são a tônica de toda a produção científica, de toda a produção de saberes. Caso contrário, não se estaria produzindo ciência, mas, antes, dogmas.
A palavra CAOS, neste contexto, ganha especial sentido, já que remete à possibilidade do princípio da impermanência e da criatividade. A Física diz que é do princípio do CAOS que surge parte dos fenômenos imprevisíveis, cuja beleza se materializa na vida que se desnuda a todo instante.
É neste sentido que, também, para a Psicologia, o CAOS possibilita pensar sobre uma maneira de enxergar o Ser para além de rótulos ou de concepções a priori. Este microcosmo humano que é objeto de escrutínio do profissional de Psicologia guarda uma gama de imprevisibilidade e de originalidade que representam a própria riqueza da existência. Afinal, pelo CAOS pode-se iniciar intensos processos de mudanças, autossuperações e singularidades. É pelo princípio do imprevisível e do radicalmente distinto que se vislumbra a beleza da diferença. Estas são, em súmula, as bandeiras da Psicologia, área da ciência calcada essencialmente no Humanismo, que busca elevar a condição humana em toda a sua excentricidade, sem amarras, sem julgamentos. Esse é o princípio do CAOS, o Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia do Ceulp/Ulbra.
Mais informações:
Coordenação de Psicologia: Irenides Teixeira (63) 99994.3446 Assessoria do Ceulp/Ulbra: 3219 8029/ 3219 8100
“O medo tem muitos olhos
E enxerga coisas no subterrâneo.” Miguel de Cervantes Saavedra
Dom Quixote
Para onde caminhamos? É uma boa pergunta quando compreendemos que estamos diante da fluidez humana. Tudo é líquido e se dissolve rapidamente para, então, começar tudo de novo que levará, por conseguinte, ao fluido. A pergunta se faz necessária quando percebemos que o indivíduo, a espécie e a sociedade estão ‘doentes’, alguns, demasiadamente, ‘doentes’. O pronome ‘onde’ passa a delimitar não o ‘lugar”, mas um ‘lugar’ para onde caminhamos, cada vez mais distante dos nossos sonhos, se é que continuamos a sonhar sonhos ‘sonháveis’. Quase sempre não sabemos onde estamos, muito menos para onde caminhamos. Eis o medo que assombra esse indivíduo/espécie/sociedade.
Antes de falar um pouco mais sobre a liquidez humana, recorro ao pensamento moderno que se apropria, a todo custo, da idéia de estabilidade. A hegemonia desse pensamento implica segurança. No entanto, diante da impossibilidade que a pluralidade e a complexidade do real permitem ser elucidadas por tal pensamento, o cordão se rompe – desprendendo-se -, o que gera uma crise intensa, quase inexplicável aos olhos de alguns.
A partir daí, abrem-se oportunidades para o surgimento de novos paradigmas. Novos medos. Penso, então, no paradigma emergente, um dos paradigmas que surge com a crise que estamos enfrentando. Ele é a própria instabilidade. Esse paradigma tende a ser um conhecimento não dualista, o qual se funda na superação das distinções tão familiares e óbvias, que até pouco considerávamos insubstituíveis, tais como natureza/cultura, natural/artificial, vivo/inanimado, mente/matéria, observador/observado, subjetivo/objetivo, coletivo/individual, animal/pessoa. É preciso lembrar que a insegurança, perplexidade diante do complexo, ainda é um aspecto relevante a se trabalhar nesse novo paradigma.
Essa nova sociedade que é pós-moderna para alguns, segunda modernidade para outros, Bauman (2001, p. 12) a conceitua como modernidade líquida. Afirma que o “derretimento dos sólidos”, traço permanente da modernidade, adquiriu um novo sentido e, portanto, foi redirecionado a um novo alvo.
Neste novo cenário, a modernidade é imediata, ‘leve’, ‘líquida’, ‘fluida’ e, infinitamente, mais dinâmica que a modernidade ‘sólida’. A passagem de uma a outra acarretou profundas mudanças em todos os aspectos da vida humana. Nesse contexto, nossa garantia de segurança é mínima. Por isso, adoecemos cada vez mais. Não temos tempo para dispor à saúde física e, muito menos, à saúde mental.
Temos medos: medo de fracassar/medo de vencer e não saber o que fazer; medo de ser feliz/infeliz, embora um dos propósitos para a grande maioria desta tríade – indivíduo/espécie/sociedade – está na busca da tal ‘felicidade’; medo de não alcançar o poder/medo de perder o poder e seus espaços; medo de desastres naturais, pelos quais somos arrematados sem a mínima a chance de sobreviver; e medo de tantos outros medos.
No rol desses medos, o meu mais novo medo é a dificuldade e os conflitos que me consomem no ato de educar minha filha. Como professora que sou, o ato de educar o outro estava longe do meu ambiente familiar. Educar tinha seu horário delimitado, 4 horas em média por dia. Depois retornava para minha zona de conforto. Hoje, essa zona não é mais de conforto, é turbulenta, agitada, dinâmica. Educar para o mundo e não para mim. ‘Eis a questão que me aflige’.
Inquieta e amedrontada, estou sempre a me questionar como devo educar com toda essa crise que surge com mais força a cada dia. Foucault já dizia que tudo é poder. Eu acrescento, sobretudo, no amor. As relações familiares, pai, mãe e filho/s estão em total crise. Os pais de hoje, filhos de pais que viveram a repressão de uma ditadura, de uma época de falta de liberdade, promovem um verdadeiro carnaval de troca de valores: o que antes era coerção, agora é suprido e abastecido por liberdade em demasia. Pais querem ser amigos de seus filhos com o desejo de substituir consciente ou inconscientemente seus papéis de pai e mãe. A escola, desnorteada e também em crise, não sabe qual é mais o seu papel: educar quem para quê. O que mais a escola recebe hoje é projeto de criança ‘tirana’. Esclareço, neste contexto, a semântica da palavra ‘tirano’: crianças mal educadas, falta de respeito pela imagem do professor, falta de disciplina, enfim, sem limites. Os ‘pais amigos’ repassam à escola a obrigação que lhes cabe: educar. Quando a escola se sente no direito de se apropriar dessa atribuição, ainda que perdida, os ‘pais’ tolhem qualquer decisão por parte desse ambiente. Então, dá-se início ao círculo novamente. Existe também o problema do conceito do que é família nesta modernidade líquida: O que é realmente uma família hoje em dia? Que núcleo familiar é esse que se constrói e desconstrói com a força dos ventos e dos divórcios? E o papel dos avôs, que se vêem bombardeados por tantas transformações? E os filhos desses ‘pais amigos e camaradas’ nesse novo cenário? Como os filhos, resultados de relações homo afetivas, vivem essas novas transformações no ambiente escolar? E mais: Como essas crianças se sentem diante das novas dinâmicas que são desencadeadas por diversas crises, sobretudo, no ambiente tecnológico, social e cultural? Enfim, que escola e família são essas de hoje?
Retomando Bauman, o que está acontecendo hoje é, por assim dizer, uma redistribuição e realocação dos “poderes do derretimento” da modernidade. E o que fazer quando tudo se tornar líquido, fluido, escorregando pelos dedos?
Não vejo outra alternativa: ou adoeço ou me apodero desse novo paradigma emergente, instável e sempre exigente com as relações de consumo, como uma chance de sobrevivência nessa crise que está apenas começando.
Assim, ‘caminha a humanidade’, construindo e desconstruindo os medos de meus medos, criados por mim ou não. Vale lembrar: o medo é um sentimento conhecido de toda criatura humana. Se existe o bem, existe o mal. Porém, o que mais me amedronta é o caráter de onipresença do medo: ele pode vazar, brotar, fluir de qualquer canto ou fissura de nossa casa, ambiente de trabalho, de toda e qualquer mídia, por fim, do planeta. Mas, continuemos a viver com nossos medos e os novos que virão.