Relações amorosas: o luto afetivo após o rompimento de um vínculo significativo e uma análise social das relações atuais.

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O luto trata-se não apenas da morte, mas também da perda de um elo significativo, que sofre rupturas psíquicas e sociais.  

Podemos dizer que desde sempre somos pegos com a idealização do amor romântico, ou melhor, que é necessário a vivência de uma relação afetiva. Na literatura, música, cinema, televisão e, também, na internet existe a pregação de um amor ideal. Sabendo que as relações fazem parte do desenvolvimento humano, sejam elas de amizade, familiar, trabalho e amorosa/afetiva, entre outras, pode-se dizer que se trata de um ciclo, é possível dizer que as relações possuem um começo, meio e fim, na maioria das vezes. Então, falando de uma ruptura, dentro das relações amorosas, é possível dizer que vivemos um luto após o fim de um relacionamento? E como os aspectos sociais podem  influenciá-lo? 

Ferreira (2004) diz que, o amor é como um drama criado com a intenção de tentar preencher uma falta vivente no inconsciente, de tal modo, o mesmo seria tão idealizado que acaba levando o sujeito a acreditar que por meio da experimentação haverá uma sensação de completude. A fantasia e imaginação alteram as cobiças dos homens e mulheres em relação aos desejos de seus companheiros, visto que a fantasia ocupa um lugar indefinido (HAN, 2017). 

Quando ocorre de a liberação da libido no objeto amado seja perturbada ou interrompida, o sujeito conecta-se com a identificação interior sobre o objeto, então, no processo de perda, a pessoa precisa (re)analisar as vivências que passou entre ela e o outro, então dessa forma, mergulha dentro de si fazendo contato consigo mesma. Sendo assim, necessita-se que o luto seja vivido, para que se possa visualizar a perda do objeto e com isso iniciar a elaboração da perda (ROSA; DE CASTRO VALENTE; DE OLIVEIRA, 2013).

O rompimento de uma relação pode ser sentido de várias formas e que tem um cunho individual, cada ser vivencia tal evento de maneira particular. Pelo fato do processo ser   sentido como uma perda, o fim de um relacionamento caracteriza-se como luto, o luto após o término ou luto afetivo, já que, segundo Cavalcanti, Samczuk e Bonfim (2013) o luto é atribuído a perda de um vínculo significativo entre uma pessoa e seu objeto, sendo assim, um evento natural e frequente durante o desenvolvimento humano. O conceito do luto não é exclusivo apenas à morte, mas também da sequência de perdas reais e simbólicas no decorrer da vida, podendo ser sentido por perdas que percorrem entre a dimensão física e psíquica, como os vínculos importantes e de significados pessoais, profissionais, sociais e familiares.

Casal sáfico
Fonte: Imagem de Victoria_Watercolor por Pixabay

Com o passar do tempo, as estruturas conjugais e a forma de se relacionar sofre mudanças, atualmente as relações são firmadas pelo compromisso, mas compromisso esse que pode ser rompido sem muitas delongas caso a relação não caiba mais para algum dos sujeitos que estão nela, ou até mesmo para os dois. É possível visualizar que, hoje, o cansaço, o desinteresse, a incapacidade de sustentar os compromissos advindos de uma relação, entre outros, podem levar à ruptura de um casal (ROSA; DE CASTRO VALENTE; DE OLIVEIRA, 2013).

Bauman (2004) retrata as relações atuais como frágeis e de amores líquidos, então,  os sentimentos e relações para com o outro estão cada vez mais  morredouro, impertinente e superficiais, gerando um maior individualismo e desapego. Em razão dessas novas relações, é notório que os jovens e adultos sofrem com dificuldades em relação a términos, alguns acabam engatando relacionamentos, o que pode não ser caracterizado como luto à antiga relação, e outros entram em um processo profundo de sofrimento (ENÉAS, 2021). 

É comum que os indivíduos busquem em seus parceiros satisfação de seus desejos e prazer. Na atualidade, encontra-se frequentemente a lamentação por se estar sozinho interligada com queixa de superficialidade, visualizando que o amor romântico continua a ser uma idealização de uma possível completude (FERREIRA, 2010). 

Contudo, é importante destacar que tais fatos aqui tratados, que dizem respeito ao luto afetivo e a análise social perante as relações atuais, é cabível a quaisquer conjuntura de relação. Sendo assim, podemos compreender que um passo para melhor elaboração do luto e resiliência nas relações, é buscar sentido em si próprio, com intuito de humanizar-se e também o outro (BERALDO; ARANTES, 2018). 

Não existe uma bula ou descrição que ensina como vivenciar o fim de um relacionamento, o luto afetivo. Compreender que as relações podem ser cíclicas, com um início, meio e fim, possibilita uma melhoria no enfrentamento desse processo, também, desvincular da ideia de que o outro exerce um papel de completude e buscar em si o que tanto procura no outro.

Casal homoafetivo
Fonte: Imagem de Alessandro Alle por Pixabay

 

REFERÊNCIA

BAUMAN, Z. Amor líquido. Sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. 

BERALDO, Fabiana De Matos; ARANTES, Ana Claudia Yamashiro. Amor líquido: uma reflexão sobre amar na modernidade. 2018. Disponível em: <https://repositorio.faema.edu.br/handle/123456789/2328> Acesso em 17 de março, 2023.

CAVALCANTI, Andressa Katherine Santos; SAMCZUK, Milena Lieto; BONFIM, Tania Elena. O conceito psicanalítico do luto: uma perspectiva a partir de Freud e Klein. Psicólogo informação, v. 17, n. 17, p. 87-105, 2013. Disponível em: <https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/PINFOR/article/view/4552>. Acesso em 13 de março, 2023. 

ENÉAS, Clara Vittória Costa. O luto nas separações amorosas na perspectiva psicanalítica. 2021. Disponível em: <http://186.251.225.226:8080/handle/123456789/263> Acesso em 15 de março, 2023.

FERREIRA, N.P. A Teoria do Amor na Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 2004

FERREIRA, E. P. A Separação amorosa: uma abordagem psicanalítica. Psicanálise & Barroco em revista. 56-97. 2010. 

GIACHINI, Tradução de Enio Paulo; HABOWSKI, Adilson Cristiano; CONTE, Elaine. Byung-Chul Han (2017). Agonia do Eros. Petrópolis: Vozes. ISBN: 8532655181. 2020. Disponível em: <https://www.researchgate.net/profile/Adilson-Habowski/publication/344825912_Resenha_da_obra_Agonia_do_Eros_de_Byung-Chul_Han/links/5f9207b2299bf1b53e3d7ccc/Resenha-da-obra-Agonia-do-Eros-de-Byung-Chul-Han.pdf>  Acesso em 14 de março, 2023.

ROSA, Helena Rinaldi; DE CASTRO VALENTE, Maria Luísa Louro; DE OLIVEIRA, Mônica Martins. A vivência do luto em decorrência do término de relacionamentos amorosos. Revista Estudos, v. 17, n. 17, p. 173-194, 2013. Disponível em: <http://ojs.unimar.br/index.php/estudos/article/view/861> Acesso em 13 de março, 2023. 

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Amor Líquido – sobre a fragilidade dos laços humanos

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Zygmunt Bauman; sociólogo, filósofo, escritor e professor foi um grande pensador da sociedade moderna, bem reconhecido por suas diversas obras literárias, que por sua vez apresentam um caráter crítico reflexivo representando de forma significativa contextos vivenciados nos variados âmbitos da sociedade contemporânea. O autor teve como uma de suas conquistas os prêmios Amalfi por sua obra Modernidade e Holocausto e adorno pelo conjunto de sua obra e possui muitas de suas obras famosas e respeitadas pelo público leitor tais como modernidade líquida, tempos líquidos, modernidade e holocausto entre outros.

Na sua obra literária Amor Líquido – sobre as fragilidades dos laços humanos tem como ponto principal demonstrar como as relações humanas estão cada vez mais instáveis e curtas, ocasionando altos índices de incertezas que tende a gerar na mulher e no homem moderno sentimentos de angústia e insegurança.

Além disso nesse livro o autor apresenta as diversas perspectivas porque isso vem ocorrendo, evidenciando através de um olhar crítico reflexivo todos os contextos para essa fluidez das relações entre os indivíduos da sociedade moderna, pois é cada vez mais visto em nossos cotidianos vínculos menos duradouros.

Fonte: encurtador.com.br/wAIT6

Durante o enredo de seu livro Amor líquido sobre a fragilidade dos laços humanos Zygmunt Baumam faz diversas relações em torno da maneira como as pessoas se portam em suas relações humanas com o excesso de consumo capitalista. Ele faz uma ligação de como em grande parte os objetos de consumo são produzidos para que tenha pouca durabilidade, fazendo com que exista um anseio para ter um novo objeto, com tudo de última geração, com um design diferente e com uma nova utilidade, bem mais aperfeiçoado do que o anterior. E ao adquirir esse produto o sujeito sente que possui um novo status perante a sociedade capitalista.

E de acordo com Bauman, essa dinâmica com o consumismo acaba se transferindo para a esfera dos relacionamentos afetivos, pois os indivíduos contemporâneo tende a descartar tudo aquilo considerado por ele como insignificante, ultrapassado e trocar por algo novo e moderno, e essa forma acaba interferindo na vida amorosa das pessoas, pois com isso há uma tendência de querer trocar de parceiro (a) em todo momento que achar que aquela pessoa não lhe serve mais por não mais estar atingindo suas expectativas, demonstrando os seu aspectos negativos, considerando então como uma pessoa que não tem mais atributos, entrando na esfera de ser ultrapassado, e então é realizado uma troca por uma parceiro(a) novo que cause novos sentimentos, porém essa sensações costumam ser passageiras, pois quando se passa o período de excitação e novidades no relacionamento o indivíduo tendem a efetuar novamente essa troca, gerando então um ciclo vicioso interminável sendo então quase impossível manter relacionamentos duradouros, onde usufruímos aquilo que o próximo tem a nos oferecer, e logo depois descartamos o como lixo sem peso na consciência, essa lógica da descarta bíblica de tem grande destaque nas relações superficiais humanas, pois tudo tende a terminar tão rapidamente quanto começou.

Fonte: encurtador.com.br/crAN3

Outro aspecto abordado pelo autor sobre a relação social onde tem como ponto principal a responsabilidade entre ambas as partes que se relacionam, que é substituída por relacionamentos através das redes por meio da tecnologia tais como a internet que propicia o vínculo entre as pessoas através de sites de encontro onde se tem certa facilidade em desconectar ou deletar ou esquecer o outro da sua vida.

Sem uma imposição para se sustentar uma união entre as pessoas, o relacionamento se torna frágil, e a conexão por meio da internet é a nova maneira de se interagir com o outro na modernidade. Então todas as pessoas, sem nenhuma culpa fazem troca de parceiros, por outros que considerem ser a melhor opção. O autor enfatiza bem que quando as relações perdem a qualidade tem se a tendência de fazer uma reposição com uma quantidade cada vez maior de parceiros, um exemplo que demonstra essa tendência, são o número de amigos que as pessoas costumam ter nas redes sociais, número exagerado perpetuam essas redes de interação algo que seria quase impossível de acontecer no dia a dia das pessoas.

Com o intuito de explicar as relações amorosa em amor líquido, faz o uso de termos como afinidade e parentesco. O termo parentesco seria um vínculo que não teria como ser quebrado, é um laço de sangue, que não nos permite escolha, aquilo que é imposto desde quando nascemos, até mesmo se não gostamos dessas pessoas que estão vinculadas a nós pois como parente, vem as questões culturais.

Fonte: encurtador.com.br/jpvAU

Já a afinidade é algo oposto do parentesco, pois ela é selecionada, em todo um processo que se pode ter como resultado a afirmação nessa afinidade ou então a rejeição, na afinidade vem se tornando algo incomum na sociedade moderna, onde a descartabilidade impera. As pessoas não sentem a necessidade de fixar laços com outras pessoas que sejam semelhantes ao parentesco, não tem objetivos duradouros, as relações são desenvolvidas com base naquilo que o casal já tem, e não com aquilo que está à procura de conseguir, tendo certa tendência a não se arriscar em seus relacionamentos amorosos. O autor em sua obra ainda relata que quando uma pessoa é compreendida, ela acaba tendo por si o amor-próprio, pois quando o outro tem a capacidade de dizer que somos dignos do amor, nossas atitudes refletem nesse sentido.

Quando há uma identificação com o próximo que nos ama, entende-se que nela também há uma necessidade de amor. Há um amor quando nosso íntimo se identifica com o outro, e com isso amamos nós mesmo. E esse vínculo como Zygmunt Bauman diz, amar o próximo a ti mesmo, é um ponto crucial na moralidade, pois as relações humanas não podem ser apenas permeadas de instintos, tem que haver a instância moral. No entanto em uma sociedade que a incerteza impera nas relações o amor nos é negado, deixando perceptível que essa perspectiva foge em nosso cotidiano em que o amor ao próximo se torna quase impossível, visto como algo que vai contra o nosso instinto não sendo natural.

Em síntese, Zygmunt Bauman tem como principal objetivo neste livro nos alertar sobre necessidade inadiável de se buscar uma humanidade igualitária para que seja possível   unir planos individuais e ações coletivas, e para que se possa ter a consciência da angústia que gera recomeçar inúmeras vezes relacionamentos do âmbito afetivo e social.

FICHA TÉCNICA

Autor: Zygmunt Bauman
Páginas:
 192
Lançamento: 21/06/2004
ISBN: 9788571107953
Selo: Zahar

REFERÊNCIA

 BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Zorge Zahar Editor, 2004.

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Cuidadores de idosos redobram a precaução durante a pandemia de Coronavírus

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Especialista dá dicas para profissionais e alerta familiares sobre os cuidados na prevenção.

O Coronavírus tem mudado a rotina de todos os brasileiros. Além de cuidar de nós, devemos estar atentos ao próximo, principalmente ao grupo de risco que inclui idosos e portadores de doenças crônicas (Diabetes, Hipertensão, Asma). Mais do que nunca, a atuação de cuidadores se faz necessária para quem está isolado, mas não pode ficar sozinho, por causa de limitações físicas e outras necessidades especiais. No entanto, o momento exige prudência redobrada dos profissionais e atenção das famílias para o que deve ser seguido à risca. Izabelly Miranda, CEO da Cuidare Brasil, rede de cuidadores de idosos e pessoas com necessidades especiais, e enfermeira de formação, dá 12 importantes dicas de precauções que os cuidadores devem ter junto aos seus assistidos durante a pandemia. 

– Higiene pessoal: é muito importante se atentar para a higiene pessoal do cuidador, assim como à indispensável necessidade do banho, antes de iniciado o turno de serviço. O uniforme de trabalho deve ser utilizado após a primeira etapa. Essa medida é uma forma de minimizar a exposição dos assistidos aos agentes externos, como, por exemplo, com o deslocamento por meio do uso do transporte público;

– Acessórios: evite utilizar qualquer tipo de acessório;

– Lave as mãos frequentemente com água e sabão ou álcool em gel (respeitando os cinco momentos da higienização). O álcool em gel com concentração de 70% e a boa prática na higiene nas mãos são formas para evitar a contaminação;

Fonte: encurtador.com.br/tEGT6

– Cumprimentos: evite cumprimentos muito próximos, como apertos de mão e abraços;

– Nariz e boca: cobrir o nariz e a boca ao tossir e espirrar, usando a parte interna do antebraço ou lenços de papel sendo descartados após o uso; 

– Máscara: utilize máscara durante assistência direta; 

– Combinação para investir: máscaras são efetivas desde que combinadas à lavagem correta das mãos ou uso do álcool em gel. É importante reforçar que, antes de colocar a máscara, as mãos devem ser higienizadas; 

– Tempo de uso: substitua a máscara por uma nova assim que apresentarem sinais de desgaste, rasgos ou falha na utilização. Máscaras são descartáveis, ou seja, não devem ser reutilizadas;

– Descarte correto: para remover a máscara, retire-a por trás (não toque a parte frontal da máscara), descarte imediatamente em uma lixeira fechada e higienize as mãos em seguida;

Fonte: encurtador.com.br/zDEMU

– Uso de material compartilhado: equipamentos de uso compartilhado (por exemplo: estetoscópios, aparelho para aferição de pressão arterial e termômetros) devem ser limpos e desinfetados com álcool 70% após o uso, três vezes em movimento unidirecional por 20 segundos;

– Ambiente limpo: realize desinfecção de equipamentos e limpeza do ambiente com solução de hipoclorito de sódio a 1% em pisos e superfícies dos banheiros;

– Regra geral: oriente possíveis acompanhantes e/ou visitas quanto à importância da higienização das mãos ao adentrar no domicílio do assistido.

A Cuidare Brasil está presente em 20 estados com mais de 70 unidades franqueadas. Para mais informações sobre o profissional mais próximo da sua casa ou como adquirir uma franquia da marca, acesse o site. 

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Relatos Selvagens: a vingança no micro-ondas

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Concorre ao Oscar 2015 de Melhor Filme Estrangeiro

 

Pela falta de opção da grande tela, Relatos Selvagens (Relatos Salvajes, Argentina/Espanha, 2014) foi assistido em casa mesmo. Filme iniciado na TV do quarto, na primeira das seis partes no qual está dividido, mudo para a sala, aparelho de televisão maior, corpo espalhado entre sofá-pernas escorregadas-pés plantados na mesa de centro.

Relatos Selvagens é mais uma grata surpresa do cinema argentino. Observa-se com gosto, nos últimos anos, as pérolas que o cinema argentino vem produzindo. Quem possa considerar plenamente que as narrativas de Plata quemada (2000), El secreto de tus ojos (2009),Cuento chino (2011) são por demais regionalizadas, está com algum parafuso solto no tic-tac-teco-tico “ do cérebro. Relatos Selvagens como os três mencionados faz parte dessa vivencia de um contexto específico mas trazem situações e sentimentos nossos enquanto seres humanos latinos.

 

Conselhos para assistir a Relatos Selvagens:

1- Assista ao filme com o grupo de melhores amigos e amigas. Se for no cinema (espera-se que venha para estas paragens ou se já veio que retorne!) ou na sala de casa, depois do filme é preciso sentar para comer (de pizza requentada do fundo da geladeira até os pseudo-culinária chique cara dos restaurantes locais) e beber algo (se de teor alcóolico, jamais coloque as mãos no volante para dirigir de retorno a sua casa, se a sessão ocorreu em casa alheia distante do home sweet home).

2- O filme é convidativo ao riso entre os amigos. Portanto, ria bastante ao recordar dos seis episódios, em especial, aquele que melhor ficou sob sua pele. Embora o pôster oficial tenha um joguete de palavras pedindo a moderação, sacadas inteligentes do que ainda resta de genialidade na publicidade.

 

 

3 – Depois do riso, o papo mais “cabeça” começará, com certeza. O filme é inteligente com diretor – que foi roteirista de Almodóvar, Damián Szifron – trazendo para a tela influências das melhores fases de Pedro. Uma hipótese: embora o Oscar não seja a referência de cinema CINEMA, “Relatos Selvagens” traz seu lado blockbuster bem ao gosto do mainstream, mas não impressionou as cabezotas duras dos gringos… o filme é inteligente, faz pensar, não é melodrama ou docudrama ufanista de fácil “deglutição” para um publico fast food difícil de contemplar pérolas.

4 – Do “papo cabeça”, opiniões do senso comum vão surgir, recordações de situações doloridas, de vergonha alheira, de gritos parados na garganta, de não ditos ou até ditos demais que se pensava estarem resolvidos aparecem como cristais encrustados em nosso subconsciente. Na escolha de seu episódio ou do filme como um todo, muito do que se traz por dentro vem à tona.

5- Szifron convida a visitarmos os nossos desejos mais profundos de vingança melodramática, da necessidade de explosão das raivas, do descontrole e saída dos limites quando o desejo é extrapolado. Preste atenção no prazer ocasionado pelas explosões em todos os seus significados. Qual é a sua mais latente?

O filme vai apresentando narrativas que nos mostram aquela raiva – porque tudo que poderia se resolver se apresenta como utópico – com a burocracia e a corrupção dos órgãos públicos; evidencia o estado de medo, impotência e até mesmo de punição para quem não deseja se encaixar na relação aquele que corrompe-o ato de corrupção- aquele que se deixa corromper.

Quantas vezes, a vontade de lavar a roupa suja em público, mas quantas vezes mesmo, os desejos de “fazer barraco”, “descer do salto”, “rodar a saia da Pomba-Gira” não vêm em todo nosso ser quando se sabe das traições, infidelidade, do descaramento do funcionário público que pode lhe agredir, menosprezar, in-visibilizar ao cidadão que demanda informações… quem não tem raiva do indefectível artigo 331 do Código Penal (o desacato ao funcionário público etc., etc., etc. e + etc.) enquanto a igualdade de deveres e direitos na Constituição Federal se esvai ralo abaixo?

 

 

“Relatos Selvagens” traz situações que escapam do contexto argentino e se tornam questões compartilhadas na América Latina, não dá para dizer que também na África – porque pouco se conhece das várias Áfricas embutidas naquele continente –. Num restaurante de beira de estrada, em um dos episódios, está embutida uma questão dos Montecchios e Capuletos, sem é claro, do romanesco de Julieta e Romeu. O inimigo de meu inimigo é meu amigo, diz a máxima proverbial, mas será que o filho de meu inimigo é meu inimigo? O fruto não pode cair um pouco mais distante das árvores?

 

A vingança antes de “Relatos Selvagens” era um prato de comida que se comia frio, dando tempo ao tempo para se dar o bote no momento certo; agora, é um prato de comida que se coloca no micro-ondas, na mais alta potência e, se deixar rodar até tudo queimar.

O primeiro episódio traz pelo absurdo do humor negro (ainda é permitido utilizar a última palavra nesse sentido… no mundo de pelejas entre “cis” e “trans” – enquanto cabeças são literalmente cortadas por extremistas?) é o avião como um grande micro-ondas… Quem nunca teve vontade de juntar os desafetos ao longo de sua história de vida (infelizmente, das professoras de matemática aos ex-amores que teimam em arrastar suas correntes fantasmagóricas em nossa memória), sinto muito, é quase um spoiler, mas me contenho, de… não vou dizer o que ocorre.

 

O filme explora a fragilidade humana e os labirintos que nós mesmos criamos e nos impomos. De maneira alguma é apologia à vingança, basta de revanchismos, vinganças de sangue-crenças religiosas- ideologias-etnias-política-minoria-maioria!

“Relatos Selvagens” possibilita o momento do riso e da reflexão, abre essa porta para discutirmos, sem pudor ou culpabilidade não resolvida em algum divã, sobre as relações que o mundo nos impõe e nós impomos. E o principal, ganhos e prejuízos caminham juntos. Sem falso moralismo, cuidado com os efeitos reversos… Com a voracidade de tudo colocar no micro-ondas na potência máxima podemos nos colocar no meio…

Trailer:

Mais filmes indicados ao OSCAR 2015: http://ulbra-to.br/encena/categorias/oscar-2015


 

FICHA TÉCNICA DO FILME

RELATOS SELVAGENS

Direção: Damián Szifron
Produção: Pedro Almodóvar e Axel Kuschevatzky
Roteiro: Damián Szifron
Música: Gustavo Santaolalla
Ano: 2015

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Manhã de sol e lembranças

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São exatamente 7h22 de 10 de junho de 2014, quando me sento à mesa, na minha sala de escritório residencial, a minha baguncinha privada.  O sol de verão chega muito bonito, a salpicar de um dourado bem característico as árvores, janelas, paredes e tudo mais. O céu marabaense está lindo, muito lindo, e, desde as 6 horas, as rolinhas fogo-pagou e os bem-te-vis cantam e esvoaçam nas árvores do meu quintal e dos quintais vizinhos. As rolinhas parecem chorosas; os bem-te-vis, arrogantes e atrevidos.

Puxa vida, bateu no peito agora aquela lembrança agradável das manhãs da minha infância na zona rural de São Domingos do Araguaia! Lembrança agradável, mas, paradoxalmente, muito doída sempre, pois – bem o sabemos – tudo fica, a cada dia, mais distante no tempo. Sou um quase eterno inconformado com a fragilidade da vida e a rapidez com que ela, dia a dia, se esvai! Oh, como a vida é frágil e curta!

Tirei fotos e fiz pequenos filmes, como gosto de fazer, no meu natural instinto de querer guardar as coisas e, conquanto impossível, perpetuar esses momentos. São coisas simples: para muitos, por certo, até sem valor, besteira mesmo. Para mim, contudo, assim como para muitos outrostambém, têm valor inestimável. É a situações como esta que a Ana Miranda, bela escritora cearense, chama, linda e poeticamente, de pequenos assuntos da alma.

Claro que isso tudo nada tem de pequeno, senão o tempo que fica conosco, este, sim, muito pequeno. A vida se esvai inexoravelmente dia a dia, momento a momento. Foi por isso, é certo, que, com sabedoria e muita razão, Davi, um poeta divinamente inspirado lá do Oriente, faz muitos anos, deixou para a posteridade, escrita na Bíblia Sagrada, a comparação do homem com a flor da erva, a qual floresce pela manhã e ao entardecer já está seca e sem vida. Disse ele que a vida passa e nós voamos.

É verdade. A vida passa e a fila anda, em todos os sentidos. A perecibilidade assusta, confunde e amedronta. É terrível isso!… A Bíblia registra, contudo – e o faz de forma muito bonita –, que a vida não se acabará e chegará o dia em que haverá novo céu e nova terra, nos quais já não haverá morte, nem luto, nem pranto, nem dor.

Está escrito no Apocalipse, capítulo 21, versículo 4, que “a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram”. E o profeta Isaías, muitos anos antes, também dissera, no capítulo 65, versículo 25, que “o lobo e o cordeiro pastarão juntos, e o leão comerá palha como o boi”. Que belas promessas! Quanta esperança! Eu creio nisso e, crendo, me alegro. Muito!

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