De pernas pro ar 3 sob a perspectiva da Psicologia Feminista

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O filme traz a reflexão sobre como o papel de cuidar dos filhos ainda é visto pela sociedade como único, exclusivo e obrigatório da mulher

De pernas pro ar 3 é um filme brasileiro lançado em 2019, com direção de Julia Rezende, estrelado por Ingrid Guimarães e Bruno Garcia. O longa retrata a continuação da história da dona de sexy shop Alice, no ramo da indústria do prazer, abordando novas temáticas como: conflitos entre diferentes gerações, feminismo e trabalho.

Alice é uma empresária de sucesso, dona de uma das maiores empresas de produtos sexuais, a “Sexy Delícia”. Devido a essa influência de mercado, ela tem viajado o mundo todo levando seus produtos para os mais diferentes públicos, o que acaba por consumir todo o seu tempo, fazendo com que a convivência com seu marido João (Bruno Garcia) e seus filhos Paulinho (Eduardo Mello) e Clarinha (Duda Batista) seja mínima ou porque não dizer nula.

Ao chegar na casa dos 40 anos Alice decide se aposentar para poder passar mais tempo com sua família, e entrega o comando da empresa à sua mãe Marion. A partir desse dia a protagonista decide que será uma nova mulher e que exercerá apenas os papéis de mãe e esposa, iniciando sua saga de reclusão ao lar.

Fonte: encurtador.com.br/tHLZ6

Contudo essa nova jornada não se mostra nada fácil para a rainha do sexy shop, que se sente inapta em diversos momentos no que se refere a educação dos filhos e ao próprio conhecimento sobre os gostos de cada um. Além disso, a tarefa de ficar quieta em casa, sem um ofício para exercer, faz com que ela experimente um sentimento de extrema inutilidade e inquietação.

Nesse cenário de dificuldade surge mais um “contratempo”, Leona. Leona é uma jovem que trabalha com Tecnologia da Informação (T.I) e desenvolve um aplicativo de realidade virtual para que as pessoas possam fazer sexo a distância. Tal invenção concede a essa menina o status de mais nova sensação da indústria do prazer, despertando em Alice muita inveja e uma intensa vontade de voltar a trabalhar para não perder seu posto de rainha do sexy shop.

Ao observar as formas de trabalhar e perceber o mundo de Leona e Alice é possível identificar a diferença marcante em suas posturas. A primeira se enquadra no grupo da geração Y, que nas palavras de Fantini e Souza (2015, pág. 128) “é formada por jovens acostumados com as tecnologias de entretenimento e comunicação, são desestruturados, contestadores, imediatistas, inovadores e não gostam de hierarquia.”

Fonte: encurtador.com.br/pHRU6

Já Alice faz parte da geração X (OLIVEIRA, 2012), se apresentando bem menos antenada as tecnologias, dando mais valor na estabilidade de mercado personificada na crença de trabalhar por muitos anos na mesma empresa, além de ser viciada em trabalho.

De pernas pro ar 3 seria mais um filme clichê se tivesse investido na rivalidade entre as duas personagens e reproduzido a disputa entre o sexo feminino reforçada pela sociedade machista (SILVEIRA; ALDA, 2018). No entanto isso não acontece, já que o ápice da produção se dá quando ambas percebem que podem unir suas diferentes formas de trabalhar para atingirem mais sucesso juntas.

Além dessa demonstração de sororidade feminina, o filme traz a reflexão sobre como o papel de cuidar dos filhos ainda é visto pela sociedade como único, exclusivo e obrigatório da mulher. Ao retratar a indignação de João (esposo) quando este reclama que a esposa nunca esteve em casa para cuidar dos filhos cabendo a ele essa atividade, numa postura de culpabilização de Alice.

Fonte: encurtador.com.br/jlqz6

Contudo esse fato não anula o vício por trabalho da rainha do prazer. Alice pode ser considerada uma workaholic, postura de trabalhadores muito comum na sociedade pós moderna. Serva e Ferreira (2006, p. 181) definem workaholic como o indivíduo que está “absorvido de forma intensa com o trabalho, com longas jornadas diárias, excesso de carga de trabalho, ritmo acelerado de trabalhar e busca desenfreada por resultados.”

Estes indivíduos comumente não conseguem administrar as outras áreas de suas vidas, sendo de costume que tenham suas relações interpessoais (família, amigos, relacionamentos afetivos) prejudicadas. Além disso, é normal que não deem tanta atenção a atividades de lazer, negligenciando até mesmo os cuidados com a saúde física e mental. Goldberg (1980) cita alguns tipos de doenças que normalmente acometem os workaholics, sendo elas: distúrbios do sistema imunológico, úlcera, gastrite, ataque cardíaco, hipertensão, diabetes e doenças cardiovasculares.

No filme, o vício por trabalho é tratado de forma cômica, no entanto, é preciso se atentar a esse fenômeno. Em 2016, a revista Forbes realizou uma pesquisa que constatou uma maior incidência de transtornos psiquiátricos nesse grupo, identificando 33% com déficit de atenção, 26% com distúrbio compulsivo, 34% com ansiedade e 9% com depressão.

Diante disso, é válido o questionamento de como as pessoas estão vendo o mundo do trabalho e a sua inserção nele. Lembrando sempre que a instância do trabalho, para que seja saudável e satisfatória, precisa ter sentido e não ser fonte de sofrimento e adoecimento.

FICHA TÉCNICA DO FILME

Fonte: encurtador.com.br/ckHMR

DE PERNAS PRO AR 3

Título original: De pernas pro ar 3
Direção:  Julia Rezende
Elenco: Ingrid Guimarães,Maria Paula,Bruno Garcia
País: Brasil
Ano:2019
Gênero:  Comédia

REFERÊNCIAS:

FANTINI, Carolina Aude; SOUZA, Naiara Célida dos Santos de. Análise dos fatores motivacionais das gerações baby boomers, X, Y e Z e as suas expectativas sobre carreira profissional. Revista Ipecege, [s.l.], v. 1, n. 3/4, p.126-145, 28 mar. 2016. I-PECEGE. http://dx.doi.org/10.22167/r.ipecege.2015.3-4.126.

MORIM, Estelle M.. OS SENTIDOS DO TRABALHO. Recursos Humanos, São Paulo, v. 41, n. 3, p.8-19, out. 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rae/v41n3/v41n3a02.pdf>. Acesso em: 04 maio 2019.

REDAÇÃO. Estudo mostra que workaholics têm mais problemas psiquiátricos. 2016. Disponível em: <https://forbes.uol.com.br/carreira/2016/06/estudo-mostra-que-workaholics-tem-mais-problemas-psiquiatricos/#foto4>. Acesso em: 04 maio 2019.

SEMINÁRIO CORPO, GêNERO E SEXUALIDADE, 7., 2018, Rio Grande. NÓS, MULHERES: A IMPORTÂNCIA DA SORORIDADE E DO EMPODERAMENTO FEMININO. Rio Grande: Furg, 2018. 5 p. Disponível em: <https://7seminario.furg.br/images/arquivo/160.pdf>. Acesso em: 04 maio 2019.

SERVA, Maurício; FERREIRA, Joel Lincoln Oliveira. O fenômeno workaholic na gestão de empresas. Revista de Administração Pública, Salvador, v. 40, n. 2, p.179-200, out. 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rap/v40n2/v40n2a02.pdf>. Acesso em: 04 maio 2019.

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Conflito de gerações na organização

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Cada estágio de desenvolvimento de Erikson é marcado por um dilema social e uma tarefa a ser desenvolvida.

O artigo de Chiuzi, Peixoto e Fusari (2011) propõe um estudo comparativo entre as gerações ativas no mercado de trabalho, mais especificamente entre os 18 e 60 anos, sendo assim abrange baby boomers, geração X e Y (p.583). Frente à teoria do desenvolvimento psicossocial de Erick Erikson, os autores traçam um paralelo com as fases que cada geração está vivenciando e a realidade no mercado de trabalho, onde sua fase vai determinar o que é esperado em seu comportamento. As diferenças estão ligadas a visão de mundo, de autoridade, limites de comportamentos e valores entre outros que afetam os indivíduos diretamente e indiretamente.

“para compreender como uma geração difere da outra, é preciso que se perceba como cada uma delas forma um conjunto de crenças, valores e prioridades, ou seja, paradigmas, consequências diretas da época em que cresceram e se desenvolveram e entendê-las de um ponto de vista sociocognitivo-cultural” (CHIUZI; PEIXOTO; FUSARI, 2011, p.580)

geração Baby Boomers se caracteriza com valores de respeito e lealdade aos direitos civis, autoridades, moralidades e pela família, pois vivenciaram contextos militares e de guerra. Estas características são carregadas para dentro do ambiente de trabalho, são trabalhadores com fortes princípios éticos, com melhores trabalhos em equipe e com respeito aos comandos e autoridades. (ABRAMS, 1970 apud CHIUZI; PEIXOTO; FUSARI, 2011, p.582) Estes buscam estabilidade financeira e segurança dentro de um emprego, optando assim por trabalhar, em sua maioria, nas empresas governamentais, não tem costume de ficar mudando de emprego.

 

Fonte: encurtador.com.br/adlHV

Já a geração X vivenciou crises econômicas onde seus pais se dedicaram a trabalhar mais em detrimento da subsistência da família, vivenciaram muitos divórcios devido às longas jornadas de trabalho de seus pais, por isso buscam equilibrar o trabalho e a família. Por não querer viver o mesmo tipo de vida que seus pais tiveram, buscam uma carreira de sucesso que respeite os limites de tempo, para que assim possam desfrutar de família, filhos e amigos. Logo esta geração demanda que as organizações sejam mais flexíveis com tempo e nível de exigência no trabalho. Há recorrência de troca de emprego por mais de três vezes, sendo assim as carreiras são usadas como fonte de desenvolvimento pessoal e não de compromisso com a empresa. (CONGER, 1998 apud CHIUZI; PEIXOTO; FUSARI, 2011, p.582)

Quanto aos trabalhadores da geração Y fica a característica do imediatismo aonde querem tudo no “aqui e agora”, são impacientes por promoções, não são fiéis aos projetos da empresa, preferem trabalhar de forma informal e ter contatos de trabalho mais íntimos do que hierárquicos. (SANTANA, 2008 apud CHIUZI; PEIXOTO; FUSARI, 2011, p.582).

Cada estágio de desenvolvimento de Erikson é marcado por um dilema social e uma tarefa a ser desenvolvida. Com base no que fora discorrido no artigo, sintetizei as informações no quadro abaixo onde são demonstradas as diferenças das gerações nos contextos de trabalho.

 

BABY

BOOMERS

 

X

Y

Necessidade em passar diante seus conhecimentos, tendem a reforçar a generatividade visando à sucessão de seus trabalhadores.

Anseiam por maior comedimento entre trabalho e vida familiar.

 

Boa autoestima e apresenta dificuldades de relacionamento com as figuras de autoridade.

Buscam gerir pessoas por consenso e são preocupados com o bem-estar, com a participação e a justiça para com sua equipe.

 

Institui um compromisso de trabalho e começa efetivamente a constituição de sua família, passando a dedicar seu tempo e energia ao estabelecimento de um projeto de vida mais

produtiva, centralizando a tarefa de cuidar da próxima geração.

Tendem a ser muito curiosos, o que os faz pesquisar e buscar, por conta própria, novidades.

 

possibilidade do movimento contrário por parte de alguns em função de sentirem-se ameaçados pelos subordinados mais jovens e, muitas vezes de outra geração, e com isso optam por não dividir seus conhecimentos com receio da perda hierárquica.

Em um cenário onde o sistema capitalista praticamente força os mais velhos a serem retirados do sistema produtivo e reforça a entrada de jovens a fim de manter a própria lógica.

Os jovens precisam conhecer e vivenciar situações e informações para poderem formar opiniões e conjunto de valores ao invés de simplesmente aceitar o que seus pais ou outros membros da sociedade acreditam e pregam.

Erikson (1976) atribui uma falha na expansão de interesses do ego onde o indivíduo torna-se excessivamente preocupado consigo mesmo, ou ainda, sofre uma regressão e gera um sentimento de estagnação, tédio e invalidez.

Lógica capitalista também influencia o fenômeno do conflito geracional, não somente em sua essência (da diferença psicossocial), mas também em questões periféricas tais como as motivações dos mais jovens em conflito com as motivações dos mais velhos em questões de segurança, empregabilidade e questões financeiras.

Encontram-se no estágio de Identidade vs. Confusão.

 

Fundamental que haja uma estimulação presente, com desafios a serem encarados, através de trabalhos criativos, atividade política ou até mesmo o simples convívio com filhos e netos, mantendo-se assim envolvidos vitalmente na sociedade.

Almejam uma carreira de sucesso, mas confiam que o empenho ao trabalho deve acatar um perímetro, demarcado pelo fato de poderem desfrutar e vivenciar o relacionamento íntimo com sua família e filhos.

Geração impaciente e pouco leal à empresa para a qual trabalha.

 

Quadro elaborado a partir das informações contidas nas páginas de 584 a 589 do artigo.

REFERÊNCIA

CHIUZI, Rafael Marcus; PEIXOTO, Bruna Ribeiro Gonçalves; FUSARI, Giovanna Lorenzini. Conflito de gerações nas organizações: um fenômeno social interpretado a partir da teoria de Erik Erikson. Temas em Psicologia, São Bernardo do Campo, v. 19, n. 2, p.579-590, 2011. Cuatrimestral. Disponível em: <http://www.redalyc.org/html/5137/513751438018/>. Acesso em: 28 abr. 2018.

 

 

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