O exíguo espaço da pessoa com deficiência na vivência da sexualidade na Sociedade Capacitista

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O normal ou anormal é encarado, portanto, como uma variação do modelo médico, colocando a deficiência como um desvio de normalidade, ao qual se faz necessária correção, para ser considerado humano, havendo assim a aproximação do padrão […] Compreende-se, na necessidade de se fazer uma sociedade para os deficientes para além da responsabilidade do modelo médico, e focar nas formas de conceber o incabível na vivência capitalista.

No dia 14/11/2020, houve o encontro com a Psicóloga Clínica Laureane Marília, abarcando sobre o tema “Sexualidade da pessoa com Deficiência”, como parte da disciplina de Psicologia da Sexualidade Humana, do curso de Psicologia do CEULP/ULBRA de Palmas-TO, mediada pela professora da instituição de ensino, Ruth Cabral, ao qual a convidada, trouxe através da narrativa de sua experiência clinicando sobre a importância de se criar contextos de proteção ao suicídio, refletindo sobre a sociedade homofóbia e transfóbica como fomentadora do sofrimento emocional; trouxe em suma, a importância de ater-se para questões sociais, que atravessam a atuação clínica, com enfoque sobre as vivências da pessoa com deficiência na sexualidade, e seus entraves. A conversa abriu espaço para a reflexão dos alunos presentes, assim como abertura para dúvidas e considerações. Laureane pôde trazer através da sua vivência enquanto pessoa com deficiência, e psicóloga um diálogo engrandecedor para os estudantes, com seu lugar de fala, e com sua bagagem enquanto profissional.

Arquivo Pessoal

Problematizando a vivência da pessoa deficiente, Laureane na presente aula revisou sobre “O termo “Capacitismo”, que está para as pessoas com deficiência assim como o machismo está para a mulheres, o racismo para pessoas negras, a homofobia para as pessoas homossexuais, e a transfobia para a pessoa trans […] É um conjunto de regras que estabelecem qual é o corpo típico da espécie […] qual é anatomia, qual a fisiologia para ser, humano” então, aquelas pessoas que fogem dessa aliciação dos corpos, é dispensável, hierarquizando-as em níveis de capacidade, enquanto socialmente, estabelece-se possibilidades para o desenvolvimento de habilidade de algumas pessoas enquanto que para outras não, marginalizando a pessoa com deficiência, a mercê da sociedade capacitista.

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Durante a trajetória nazista, existiram os assassinatos em massa das pessoas com deficiência, nos campos de concentração, por serem desperdício de investimento, em uma tentativa de um futuro próspero, e sem deficiência, além disso, existiu em paralelo a esterilização involuntária, principalmente nas mulheres cuja as causas da deficiência é genética. Hoje tal prática é proibida, entretanto, ainda existem casos em que mulheres com deficiência foram esterilizadas via SUS, ao qual, tais profissionais violaram um direito humano; profissionais de psicologia também aturam em incentivo de tais ações, por exemplo, em uma mulher com deficiência intelectual. Então, qual seria o papel de psicologia nestes recortes?

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É necessária a compreensão dos motivadores que fazem os familiares acreditarem que a esterilização é mais viável. Enquanto compromisso ético, cabe agir de forma a auxiliar o diálogo da mulher com deficiência e sua família, ajudando em conjunto na quebra dos estigmas relacionados as pessoas com deficiência intelectual, enquanto irresponsáveis em relação ao casamento e constituição familiar, sendo esta uma inverdade, pois, através de uma educação sexual, e explicação dos papéis dos pais, a compreensão desta pessoa se assemelha a de um outro, sem deficiência de mesma idade. É importante compreender também os recortes de classe, e as diferentes dificuldades de enfrentamento, dá-se devida importância a um governo que priorize as necessidades desse indivíduo para ter uma vida digna, dando assistências suficientes para tais fins; o que difere de um modelo neoliberal, que não dá meios para a conquista emancipatória de direitos, como única alternativa a competitividade, e meritocracia.

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Cabe ao psicólogo, orientações, mapeamento das possibilidades com a pessoa com deficiência e sua família quando inseridos em um recorte de linha da pobreza, como a procura da defensoria pública, investigação dos mecanismos legais na convenção da ONU, quais as leis brasileiras de inclusão, e se apesar de tudo, não houver respaldo, abrir liminar na justiça de recursos que não foram disponibilizados voluntariamente. Pontuando a necessidade de fazer psicologia não elitista, voltado ao sujeito de acordo com a realidade social vivenciada. Lembrando que: Deficiência não deve ser sinônimo de doença, principalmente quando saúde é entendido como questão biopsicossocial.

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Pontuou-se sobre a diferença das vivências da mulher com deficiência e do homem com deficiência, ao qual os estereótipos do gênero feminino se entrelaçam com os entendimentos de pessoas frágeis, passíveis, enquanto os homens, são vistos como fortes proativos, colocando então essa mulher no lugar de passividade/submissão ainda maior, dificultando sua autonomia, enquanto o homem deficiente, é posto em um lugar de incompatibilidade de gênero, ao qual se encontra em desajuste ao entendimento do homem, viril e forte. Mostrando o quão essas relações de gênero também afetam o sujeito, produzindo sofrimento, desajustamentos, e mais vulnerabilidades.

Entende-se, dessa forma, a importância das universidades enquanto espaços de reflexão sobre os aspectos culturais que nos atravessam e constituem nossa subjetividade, a fim de conhecer intimamente as limitações pessoais, assim como nos pondo a disposição de sermos passíveis a mudança. Lembrando sobre a falácia da neutralidade, pois uma vez inseridos no mundo, somos influenciados e influenciadores, então é cabível o entendimento das coisas que atravessam, e nos constitui enquanto sujeito.

Foi discutido sobre as questões de normalidade e anormalidade, a problematização das parafilias, e dos conceitos gerados no DSM como uma cartilha de construção do que se inscreve como “normal”, em uma realidade que está em constante desdobramento e mudanças. Nesta perspectiva foi mencionado a questão do prazer ou desejos voltados aos corpos com deficiência, pessoas denominadas – devotee – que por vezes sofrem retaliações à mercê deste desejo, socialmente falando.

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Por conta dos estigmas para esse recorte da fantasia, os devottes por vezes aproximam-se de pessoas deficientes pela internet, causando prejuízo pois pode haver um envolvimento sentimental por parte desse homem/mulher, entretanto, essa relação não será assumida. Então percebe-se uma vivência de retaliação do que deveria ser naturalizado, pois assim como os homossexuais, transexuais, já estiveram nesse lugar de patologização do desejo, o mesmo têm ocorrido com os devottes, que extravasam de forma nociva, em decorrência de uma supressão, medo do julgamento social. Apesar de tudo, são nesses contextos, em que muitas mulheres com deficiência, descobrem que seu corpo é feito para prazer sexual próprio, e que ela é desejável por outro.

Mulheres devotees, por sua vez, são mais facilmente aceitas, uma vez que existe a naturalização da mulher como cuidadora, então se torna mais passível de uma vivência que não a rotule, enquanto existe a concretude desse prazer específico pelas pessoas com deficiência. Enquanto a mulher com deficiência é colocada por vezes como um ser puro, assexual, na perspectiva de que o desejo sexual seria o desvio, o pecado, então o homem devotee é visto como alguém perverso, pois não considera essa mulher deficiente como portadora de desejos.

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O normal ou anormal é encarado, portanto, como uma variação do modelo médico, colocando a deficiência como um desvio de normalidade, ao qual se faz necessária correção, para ser considerado humano, havendo assim a aproximação do padrão. Em contrapartida, existem pessoas que tem desejo de ter deficiência, o que se torna inconcebível um procedimento cirúrgico de transdeficiencia, e uma vez que se recebe essa recusa esse sujeito por vezes se lesiona, a fim de ter prejuízo em alguma parte do corpo, em que por fim possa ser concedido a amputação, ou outro procedimento de supressão. O que pode ser encarado como inadmissível pois se perde força de trabalho, dando a essa pessoa alguma deficiência. Em contrapartida, procedimentos que colocam em risco a vida de mulheres em cirurgias estéticas são facilmente acolhidos, por se aproximar dos padrões normativos, enquanto transdeficiencia, seria compreendido como “loucura”, por parte de quem têm tal desejo.

Durante a participação com a psicóloga, também foi apontado como as pessoas idosas impreterivelmente terão algum tipo de deficiência, portanto um futuro sem deficiência é uma grande ilusão. A aposentaria por invalidez, mostra um pouco sobre como se vê a pessoa com deficiência, ela é inválida, improdutiva, inoperante. Se a mesma comercializar algo, por exemplo, estaria cometendo um crime, tirando dela o direito da aposentadoria por invalidez. Então esse ato, sugere total desvinculação do ser com alguma incapacidade, por conseguir fazer algo. Sendo mais fácil também, estabelecer menos políticas públicas, pois interditar e rotular uma pessoa enquanto inválida é mais fácil e causa menos gastos que investir para que ela supra suas necessidades de forma plena.

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A contraposição do modelo médico vem com ascensão do modelo social (a partir da década de 60) com a luta por direitos civis, abertura política, e no final dos anos 70 veio o movimento pelo fim da ditadura. E a luta pelo direito das pessoas com deficiência esteve neste meio. No Reino Unido homens com deficiência denunciaram situação de vulnerabilidade e condições desumanas, um pontapé para o início de uma trajetória de conscientização e lutas.

Compreende-se, portanto, na necessidade de se fazer uma sociedade para os deficientes para além da responsabilidade do modelo médico, e focar nas formas de conceber o incabível na vivência capitalista, onde essa pessoa com deficiência poderia trabalhar menos de 08 horas por dia, onde houvesse respeito pelas limitações e exaltação de potencialidades, na existência de políticas públicas suficientes e eficazes. E construir a subjetividade de maneira menos evasiva, ao qual você é um sujeito dotado, fugindo do contexto da produtividade, onde há necessidade de uma constância para provar valor, que por vezes não respeita as limitações de pessoas não deficientes, muito menos, dá espaço para novas formas de se inserir como sujeito no mundo.

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A deficiência, assim como tudo existente, é uma construção histórica. E é nítido que o mundo foi construído para privilegiar alguns tipos de corpos em específico. Uma escada é uma construção histórica, e no lugar dela poderiam existir rampas, assim como os assentos são produções culturais, pois poderiam ser maiores para caber pessoas gordas. Nos fazendo refletir na necessidade de ser fazer um mundo onde a diversidade possa existir de forma integra e natural.

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A Lista de Schindler: um olhar humanitário

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Os judeus usavam artifícios que iam desde esconder-se nos esgotos, até mesmo na fossapara não ser transportados do gueto aos campos de concentração. 

A Lista de Schindler (1993), dirigido por Steven Spielberg, é um filme de romance protagonizado por Oskar Schindler. O enredo se passa durante a Segunda Guerra Mundial na cidade de Cracóvia, Polônia, então ocupada pelas forças militares alemãs. O filme narra a história real de um empresário alemão que salvou da morte mais de mil e cem judeus, empregando-os em sua fábrica, e, por fim, livrando-os do Holocausto.

Todo o arcabouço ideológico do Nazismo foi construído em período que permeia a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Tal construção se deu através da  utilização de ferramentas de comunicação social, pensada e executada por Joseph Goebbels, então ministro da Propaganda do governo alemão que ocupou também o posto de Chanceler da Alemanha pelo período de um dia: de 30 de abril a 1º de maio de 1945, substituindo Adolf Hitler. Entrou para a história como um revolucionário na comunicação e psicologia de massa pela aplicação de dispositivos psicológicos de manipulação.

Os alemães se tornaram máquinas de matar em nome da pureza, da superioridade e da beleza, muitas vezes apresentando sintomas de perversão e mesmo de loucura. No filme, percebe-se a violência contra os judeus, como se estes fossem os responsáveis pela dicotomia e sofrimento interno ocasionado pela lavagem cerebral sofrida pelo opressor da época, num movimento que elegeu os semitas como os bodes expiatórios daquele momento.

A persuasão empregada contra os judeus revela o abuso psicológico, moral e físico em um primeiro momento, quando as vítimas são obrigadas a superpovoar um bairro recluso, murado. Nota-se claramente a evolução do processo, quando um dos personagens declara “o gueto é liberdade” em uma clara inversão de valores: o que era prisão, se torna espaço de liberdade. A tortura é notável e se instala a partir do momento em que os judeus são enviados para campos de concentração. Ali, eles já  estão apartados da sociedade ampla, de seus familiares, contidos no gueto; ali estão sob o controle direto dos opressores, que exercem sobre eles o direito de vida ou morte.

O clima entre os judeus é de sentimento de medo. Os alemães não economizam nas demonstrações de desprezo, mesmo quando toda a lógica aponta como correta a ação do prisioneiro. É notória essa situação quando a engenheira judaica se manifesta, demonstrando os erros cometidos em uma construção e indicando a ação adequada à resolução do problema e é condenada, sumariamente executada, ainda que fosse de grande necessidade para o desenvolvimento da obra.

As doenças decorrentes da péssima alimentação, das condições nocivas de higiene, da superpopulação nos alojamentos, roupas de agasalho insuficientes nas condições de inverno rigoroso (neve) e o excesso de trabalho favoreciam os surtos de doenças e pragas transmissíveis como o piolho, o que tornava ainda mais torturante a vivência dos judeus no campo de concentração.

Nessa irrealidade ou realidade invertida, a visitação de médicos alemães no dia do “exame de saúde” não tinha por finalidade curar os judeus de possíveis males, e sim retirar os que não tinham mais condições de produzir. Os improdutivos e “imprestáveis” – para a lógica da produção – eram simplesmente eliminados. Nos dias de exames de saúde as tentativas de blindagem contra a tortura eram frágeis. Os judeus usavam artifícios que iam desde esconder-se nos esgotos, até mesmo na fossa – para não ser transportados do gueto aos campos de concentração – a fingir ter piolhos para evitar a proximidade dos alemães. Eram muitas as estratégias com o fim de livrar-se da perseguição e do sofrimento gratuito.

Nesse cenário de horror extremo, sobressai o alemão e filiado ao Partido Nazista, Oskar Schindler. Inicialmente interessado em enriquecer com a guerra, Schindler explora os judeus ricos a fim de reunir capital e comprar uma fábrica de panelas, prometendo pagar os empréstimos em produtos da própria fábrica, pois são bens passíveis de troca, único modo de negociar entre os judeus. Schindler  consegue o capital, compra a fábrica e inicia a produção de panelas, tendo como operários os prisioneiros judeus (em verdade, trabalho escravo), onde sobressai o contador e real gerente da fábrica Itzhak Stern, que  tudo organiza e faz produzir. Com o passar do tempo, Schindler se afeiçoa a “seus trabalhadores”, que dizia serem especializados e, ao término da guerra, consegue salvar mais de 1.100 desses empregados, entre homens, mulheres e crianças. São eles que perfazem A Lista de Schindler.

Oskar Schindler comprova que, apesar da intensa propaganda de pureza racial, de culto ao arianismo, conseguiu manter o sentimento de humanidade acima de todo o horror que presenciou e viveu, mesmo que inicialmente a intenção era tirar proveito do caos para fazer fortuna. E com com toda a crueldade se sensibilizou. Entrou para a história como benfeitor dos judeus na Segunda Guerra Mundial. Ademais, com um olhar humanitário, Oskar Schindler ressignifica e se importava com aquelas pessoas ao ponto de salvá-las, mesmo que isso colocasse a sua própria vida em risco.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

A LISTA DE SCHINDLER

Diretor: Steven Spielberg
Elenco: Liam Neeson, Ben Kingsley, Ralph Fiennes;
Gênero :Histórico; Guerra.
País: EUA
Ano:1993

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