Medos e surpresas: presenciei um parto no SUS

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Umas das experiências que marcou minha vida no SUS, foi presenciar o nascimento de um sobrinho no Hospital e Maternidade Dona Regina Siqueira Campos , localizado em Palmas, no dia 14 de abril de 2015.

Cheguei ao ambiente com uma mistura de medo e entusiasmos, por ser o primeiro parto que iria assistir e por saber que era meu sobrinho que eu iria ver chegar ao mundo, então começou  surgir no meu organismo aquele sentimento de felicidade e medo ao mesmo tempo, comecei a pensar na possibilidade acontecer alguma complicação, durante o parto.

Chegamos por volta das 13:15h, ela passou pela triagem, onde foi feito o exame de toque, em seguida informam que tinha dilatado 2 centímetros (cm). Os profissionais orientaram a ela que andasse, pois ajudaria no processo de dilatação, eles pediram para que voltasse de meia em meia hora para acompanhar esse processo. Nesse primeiro momento, os profissionais foram ativos, passaram as orientações necessárias. Por volta das 16:40 da tarde a Rosa, passou pelo processo final de triagem, pois a dilatação já se encontrava á 4 cm.

Fonte: https://bit.ly/2tl99Ib

Ao chegar à sala de internação, Rosa foi atendida por um residente (estagiário de medicina) que mediu as contrações. O estagiário foi muito acolhedor, ainda brincou que não estaria ali para presenciar o parto, pois não seria no seu plantão, já que ia sair as 19:00. A Rosa afirmou que ele não estaria ali, pois  não iria ganhar antes das 22:00. Durante essa conversa ele colocou o soro para aumentar as contrações. Em meio os intervalos de contração o estagiário comentou que o esperado para ela entrar em trabalho de parto seria após as 20:00 horas.

Mas para a surpresa de todos, logo que o residente saiu da sala a Rosa começou a sentir contrações imediatas. Ver ela com dor me assustava muito, falava em chamar o estagiário ela não deixava por medo de ser alarme falso. Nesse momento eu fingia que tudo estava normal, para não deixar transparecer minha insegurança, pois o único sentimento que tinha naquele momento era sair daquela sala. Me vinha uma série de pensamentos/questionamento negativos, do tipo: e se der errado? E se ela tiver início de eclampse? Porque minutos antes de entrar em trabalho de parto, presenciei uma família angustiada pois a esposa de um deles havia passado por essa situação.

No meio desses meu pensamentos dolorosos, ela começou a ter contrações cada vez mais frequentes, e em um curto período de tempo. Foi perante as dores que ela me permitiu que chamasse o estagiário, fui até ele, falei que ela estava com muitas dores, ele sorriu, e ainda comentou, “não será agora”, mas já estou indo lá, aparentemente assim como ele, toda a equipe achou que era exagero.

 Ao chegar à sala ele fez todo o processo de medir a contração, foi nesse momento em que ele se assustou e me pediu para chamar a médica, porque ela já se encontrava em trabalho de parto, porém, antes mesmo que eu saísse da sala ele gritou: TRABALHO DE PARTO! A médica que estava acompanhada de outra residente chegou e iniciou todo o processo, em menos de 7 minutos o Henrique se encontrava no braço da mãe. A médica que fez o parto foi bastante dedicada, passou todas as orientações possíveis, manteve a calma durante todo o tempo e sempre que podia orientava. No final do procedimento, ela foi muito elogiada pela equipe, e a sala já se encontrava cheia, alguns faziam parte da equipe, outros estavam ali apenas para ver o parto e tumultuar a sala.

Fonte: https://bit.ly/2lhR2zh

Sobre o processo do parto em si, acredito que minha irmã recebeu todas as recomendações possíveis, a equipe fez um excelente trabalho, onde demonstraram se dedicarem o máximo no que estavam fazendo, o que me incomodou durante o procedimento foi a quantidade de pessoas na sala que não faziam parte da equipe. Logo após o parto, a paciente estava cheia de dor, então surge uma profissional com série de perguntas.

Acredito que esse seja um momento da mãe com a criança, não deveria ser interferido. A mãe ainda estava em processo de limpeza interna, nesse momento o cordão umbilical não havia  sido cortado, e ela estava sendo obrigada a responder um questionário. No mesmo momento surgiram uma série de profissionais daquele ambiente que não faziam parte da equipe daquele procedimento,  com comentário do tipo, “não acredito que alguém ganhou um menino aqui e eu não vi”,  ou “tive que vim conhecer essa pessoa que ganhou uma criança e não fez escândalo”. Essas foram algumas das frases que ela foi obrigada a ouvir no momento em que ela ficou no ambiente de parto, sendo que esse momento é único, deveria ser respeitado.

Ao chegar à internação, minha irmã recebeu todo o cuidado possível, teve atendimento psicológico, nutricionista, odontologista que orientou a mãe em alguns cuidados com a criança, como ensinar na amamentação, a cuidar da limpeza bucal. Durante a internação o bebê fez alguns exames e os que não foram feitos enquanto se encontrava internado foram remarcados.

O hospital doou utensílios higiênicos, como, absorventes e fraldas descartáveis. Os profissionais sempre orientaram a mãe em alguns cuidados com a criança, davam banho no bebê, e a equipe se mostrou bem capacitada. Estavam sempre passando nos leitos, se disponibilizando a tirar qualquer dúvida. O Hospital e Maternidade Dona Regina Siqueira Campos, mostrou ter profissionais capacitados para a realização de partos e ao cuidado com a paciente no decorrer da internação.

Essa é uma das muitas experiências que tive com o SUS. Escolhi falar sobre ela  porque ouço muita crítica ao se tratar de partos no DONA REGINA, e a maioria com cargas de comentários negativas, e a experiência que presenciei no mesmo ambiente não tenho muito do que reclamar, por esse motivo parabenizo a equipe do SUS desse ambiente. Acredito que pode ser trabalhado com a equipe é a questão de deixar o momento pós-parto para a mãe e filho, pois é o primeiro contato entre os dois, e a questão de privacidade que os profissionais devem dar para o paciente que se encontra ali, pois é constrangedor para o paciente ouvir alguns comentários.

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A Gravidez e os Transtornos de Ansiedade

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Os Transtornos de Ansiedade são um interesse para muitas áreas da psicologia, em especial durante a gestação, que é um período crítico para a mulher no que tange aos aspectos biológicos, físicos e psicológicos, que passam por inúmeras mudanças. Aumentando ainda mais esse anseio, está o fato da gestação consistir na origem do desenvolvimento do ser humano. Apesar das várias condições sociais, econômicas e religiosas entre gestantes do mundo todo, bem como o papel da mulher no meio onde vive, a gestação deve transcorrer da melhor maneira possível, fato que pode ser prejudicado pelo adoecimento psicológico (FREGONESE, 2014).

Fonte: http://zip.net/bwtHC2

 

O conceito de ligação mãe-bebê como não sendo apenas biológico é relativamente recente. Com o surgimento da psicologia como ciência, e o concomitante desmembramento de suas áreas, inferiu-se a correlação entre a saúde psicológica e biológica do indivíduo, portanto, quando as doenças psicológicas acometem o indivíduo, sua saúde mental também influencia a saúde física. Essa contingência, continua durante a gravidez, sendo agravada pelo fato de haver um indivíduo ligado à gestante ansiosa, totalmente depende dela no aspecto desenvolvimental (FREGONESE, 2014).

A ansiedade patológica consiste em uma experiência que ocupa um papel funcional na interação humana com o meio ambiente, podendo ocorrer também como sintoma de várias doenças, como distúrbio psiquiátrico ou sob a forma de “stress”. O conceito de ansiedade patológica é, portanto, diferente do sentimento de ansiedade (CASTILLO et al., 2000). Segundo Cury (2013) a ansiedade causada pela Síndrome do Pensamento Acelerado deve ser considerada o mal do século, atribuindo à sociedade moderna a responsabilidade por uma alteração no ritmo de construção dos pensamentos, gerando consequências para a saúde psicológica.

Fonte: http://zip.net/brtH54

 

Ansiedade é um sentimento repulsivo de medo, angústia, que caracterizado por tensão ou inquietude proveniente de antecipação de perigo, de algo desconhecido ou estranho, passando a ser considerado patológico quando é desproporcional em relação a sua causa ou estímulo, ou qualitativamente divergente do que se espera como norma da faixa etária do indivíduo, passando a interferir na qualidade de vida, conforto emocional ou o desempenho diário (CASTILLO et al., 2000).

Todos os Transtornos de Ansiedade têm como principal manifestação um alto nível de ansiedade. O Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (1994), IV Revisão (DSM-IV), classifica como transtornos de ansiedade: Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), Transtorno do Pânico, Fobia Social (FS), Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOC), Fobias Específicas e Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT).

Vinculação biopsicológica entre o bebê e a mãe ansiosa

Desde a fase embrionária, a gestante se encontra ligada biologicamente ao pequeno ser sendo gestado dentro dela. A mulher defronta-se no processo de mudança para a parentalidade, com tarefas condicionantes para sua adaptação à situação, sendo a ligação com o feto uma delas. Na vinculação pré-natal, que ocorre a partir do início da gravidez, a gestante se imagina progressivamente no papel de mãe assim como idealiza uma imagem e representação cognitiva do bebê (SAMORINHA; FIGUEIREDO; MATOS, 2009).

Fonte: http://zip.net/bgtH6n

 

A gravidez representa um período de grande sensibilidade no ciclo vital feminino, envolvendo grandes transformações fisiológicas, psíquicas e do papel familiar e social da mulher, como apontam Correia e Linhares (2007), tais mudanças podem servir de catalisadoras para um quadro de instabilidade emocional da gestante, seja no desenvolvimento de uma desordem patológica ou com o agravamento ou manifestação de uma desordem que já pré-existe. A exposição do bebê à psicopatologia da mãe, em casos de transtorno de ansiedade, no período pré-natal pode causar efeitos nocivos à sua saúde e desenvolvimento (CORREIA; LINHARES, 2007).

Entende-se por gestação o desenvolvimento desde a concepção até o nascimento. A fecundação é a união de um espermatozóide com um óvulo, formando assim um ovo que inicia o processo de multiplicação celular. O ovo se dirige ao útero, em busca de um lugar para se fixar, com circulação sanguínea capaz de oferecer oxigenação e alimentação, sendo formado então um novo tecido, a placenta, que é responsável pela fixação do ovo à parede do útero (MALDONADO; DICKSTEIN; NAHOUM, 2000).

Fonte: http://zip.net/bytJx2

 

Durante a gravidez, o organismo feminino produz hormônios sexuais e não-sexuais pela placenta, o que pode trazer mudanças orgânicas e comportamentais significativas, não condizentes com os comportamentos habituais. Verificando os sintomas comuns no primeiro trimestre, muitas vezes, devido à delicadeza da situação a gestante poderá passar por mudanças de comportamento (BAPTISTA; BAPTISTA; TORRES, 2006).

Nesse sentido, Fregonese (2014, p. 18) afirma que “durante a gestação os níveis de estrógeno e progesterona são superiores àqueles vistos nas mulheres fora do período gestacional e esse fator pode estar envolvido nas alterações de humor que ocorrem nessa fase”, salientando a influência do aumento dos níveis hormonais na gestante, portanto aumentando a possibilidade de instabilidade psicológica.

A gestante está exposta a preocupações como: alterações corporais que podem ser permanentes, modificações permanentes de personalidade, com a aproximação do parto, cirurgia, dores, medo de morrer, e mudanças na sua rotina de vida diária após o nascimento do bebê (BAPTISTA; BAPTISTA; TORRES, 2006). Essas preocupações são esperadas e recorrentes, porém podem propiciar o início da ansiedade patológica.

Fonte: http://zip.net/bmtHZM

 

No contexto histórico, Fregonese (2014) afirma que nunca foi dada a atenção devida à saúde mental da gestante pelos profissionais da área, atribuindo o fato à crença popular de que a gravidez é um período de bem-estar e satisfação para a mulher, tendo baixa propensão para doenças psiquiátricas. “A prevalência de transtornos de humor e ansiosos são maiores no período gestacional em relação ao período pós-parto, com isso a gravidez não protege as mulheres do adoecimento mental” (FREGONESE, 2014, p. 16).

Complicações desenvolvimentais e obstétricas relacionadas à ansiedade e efeitos em indivíduos gestados por mulheres ansiosas

Perante o contexto de desequilíbrio psicológico, a mulher em período pré-natal apresenta com maior intensidade os sintomas ansiosos. Diversos estudos buscaram compreender as implicações da ansiedade no desenvolvimento pré-natal e nas complicações obstétricas. Conforme Fregonese (2014):

As mulheres diagnosticadas com desordem de ansiedade pré-natal apresentaram maior probabilidade de complicações obstétricas durante a gravidez. Por sua vez, as complicações atuaram como estressores crônicos durante a gestação. A ansiedade materna foi considerada como fator de risco ao desenvolvimento normal do feto. Fetos de mães com alto nível de ansiedade apresentaram altas taxas de batimentos cardíacos quando comparados aos fetos de mães com baixo nível de ansiedade. Desse modo, a ansiedade materna pré-natal contribui na predição de problemas comportamentais e emocionais em crianças avaliadas aos quatro anos de idade. (FREGONESE, 2014, p. 17)

Fonte: http://zip.net/bwtHC8

 

Mães que apresentaram ansiedade tiveram também, filhos com maior probabilidade para desenvolver depressão e transtornos de comportamento na adolescência (FREGONESE, 2014). Analisando apenas bebês nascidos a termo, entende-se que os níveis desenvolvimentais do bebê se apresentam inversamente proporcionais aos níveis de ansiedade materna.

Portanto, acredita-se que a situação psicológica da mãe, com a saúde mental fragilizada pelos efeitos de transtornos de ansiedade, influencie negativamente o bebê, que durante o período pré-natal encontra-se dependente da mãe para qualquer ação no sentido desenvolvimental, passando por vários momentos críticos nessas fases delicadas, que podem ser afetadas.

REFERÊNCIAS:

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and statistical manual of mental  disorders. 4. ed. Washington, 1994.

BAPTISTA, Makilim Nunes; BAPTISTA, Said Daher; TORRES, Erika Cristina Rodrigues. Associação entre suporte social, depressão e ansiedade em gestantes. Revista de Psicologia da Vetor Editora, v. 7, n. 1, p. 39-48, Jan.  2006. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psic/v7n1/v7n1a06.pdf>. Acesso em 31 de mai. 2016.

CASTILLO, Ana Regina G.L; RECONDO, Rogéria; ASBAHR, Fernando R; MANFRO, Gisele G. Transtornos de ansiedade. Revista Brasileira de Psiquiatria, Rio de Janeiro, v.22, n. 2, p. 20-23, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbp/v22s2/3791.pdf>. Acesso em 31 de mai. 2016.

CORREIA, Luciana Leonetti; LINHARES, Maria Beatriz Martins. Ansiedade materna nos períodos pré e pós-natal: Revisão da literatura. Revista Latino-Americana de Enfermagem, São Paulo, v. 15, jul. 2007. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rlae/v15n4/pt_v15n4a24.pdf>. Acesso em 27 de mai. 2016.

CURY, Augusto. Ansiedade– Como enfrentar o mal do século. São Paulo: Saraiva, 2013.

FREGONESE, Adriana Aparecida. Gestantes de Alto Risco com e sem histórico de óbito fetal ou neonatal: sintomas de ansiedade e depressão, capacidade para o relacionamento com o feto e estratégias de enfrentamento. São Paulo: Biblioteca Central da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, 2014.

MALDONADO, M. T; DICKSTEIN, J; NAHOUM, J.C. Nós estamos grávidos. São Paulo: Saraiva, 2000.

SAMORINHA, Catarina. FIGUEIREDO, Bárbara. MATOS, José Cruz. Vinculção pré-natal e ansiedade em mães e pais: Impacto da ecografia do 1º trimestre de gestação. Psicologia, Saúde & Doenças, Lisboa, v. 10, n. 1, p. 17-29, 2009. Disponível em: <http://www.redalyc.org/pdf/362/36219059002.pdf>. Acesso em 27 de mai. 2016.

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Educação de crianças em famílias e comunidades

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Os bebês humanos são totalmente dependentes na garantia da sua própria sobrevivência. É através da aprendizagem dentro do seu grupo que se tornam, com o tempo, pessoas independentes. O processo de desenvolvimento humano varia de acordo com a dinâmica de cada cultura a qual o sujeito esteja inserido. Sendo que, em relação à educação, em todo o mundo há participação da família, do bairro e de suas comunidades. E este processo é passado de geração para geração, porém com aplicações que serão renovadas de acordo com o tempo presente, onde estarão ligadas intrinsecamente com as políticas nacionais e internacionais.

As metas políticas e econômicas influenciam na escolha da composição familiar, como controle para queda de mortalidade, controle de natalidade e planejamento familiar, visando um melhor padrão de vida da população e melhor educação que ocorreram de forma bem explícita na China e México. E toda esta transformação está totalmente ligada às práticas culturais de cuidado e desenvolvimento humano. O alto controle de natalidade implantado na década de 70, na China e México, resultou em uma menor rede social familiar, com isso, diminuindo a possibilidade de cuidados às crianças e idosos da família.

O número de mortalidade infantil era muito alto nos séculos 18, 19 e 20, assolados principalmente por doenças. Com a implantação do saneamento básico e melhorias na nutrição esse número foi reduzindo. Mas, até então, o índice de mortalidade era até a idade de cinco anos e a garantia de sobrevivência do “clã” familiar era ter o maior número possível de filhos, para que estes cuidassem das outras crianças e posteriormente dos idosos da família. À partir de 1900, a grande preocupação estava em torno das comunidades menos favorecidas economicamente, os guetos, que se tornaram ambiente de risco para jovens até 21 anos.

Morro da Providência. Fonte: http://zip.net/bctHMw

Robert LeVine (1980) apud Rogoff, (2005) propôs algumas metas de prioridades na conduta parental de acordo com a necessidade existentes em cada grupo ou país: 1- Há locais onde a maior atenção deverá ser dirigida aos bebês, concentrando maior cuidado a sua saúde física; 2- As prioridades parentais visam a educação dos filhos envolvendo que eles sejam preparados para se manterem economicamente na maturidade; 3- Se as duas primeiras metas estão superadas, os pais podem gastar maior tempo em outros valores culturais (realizações culturais, compaixão religiosa, auto realização, etc.). Claro que estas estratégias serão usadas de forma hierárquica e diferente, dependo de cada país, pois envolve aspectos históricos culturais e locais. Como por exemplo, a prioridade de estratégia na África será completamente diferente a aplicada nos Estados Unidos.

Embora a literatura psicológica frequentemente relacione o vínculo afetivo mãe-bebê como algo natural – inerente em todas as relações –, ao verificar informações históricas de uma comunidade, percebe-se que a relação mãe-bebê reflete a realidade cultural onde ambos estão inseridos. Nesse sentido, questiona-se a ligação afetiva entre a mãe e sua prole como algo natural, enquanto um processo a-histórico.

Fonte: http://zip.net/bhtH4F

Na Grécia antiga, era permitido matar e abandonar crianças pequenas, uma vez que estas não eram saudáveis, ou mesmo em razão das dificuldades enfrentadas pela mãe na criação do filho. Na realidade brasileira, mães que vivem em extrema pobreza nas favelas distanciam-se afetivamente dos filhos quando estes dispõem de mínimas chances de sobrevivência, seja por falta de nutrientes ou assistência médica. Se o bebê consegue sobreviver, a mãe percebe-o com orgulho, pois sua sobrevivência é reflexo de uma força vital de lutar pela vida.

Nesta perspectiva, Sheper Hugles questiona a concepção biologicista da maternidade e propõe uma reflexão crítica acerca desse vínculo, considerando o ambiente socioeconômico em que a família está inscrita. Assim, ele critica a super-estimulação do vínculo afetivo entre mãe-bebê na maternidade concomitante a ausência de assistência social na realidade comunitária dessa família. Dessa forma, “as interpretações sobre o tratamento que as mães dão aos bebês exigem consideração das estratégias culturais de uma comunidade para tratar de desafios locais, e um exame das circunstâncias que se dá a paternidade/maternidade” (ROGOFF, 2005, p. 100).

O vínculo entre o bebê e seu cuidador divide-se em três tipos de padrão: a) seguro: o bebê sente-se confortável na ausência de seu cuidador e explora o ambiente de maneira tranquila e confortável; b) ansioso/resistente: o bebê sente-se desconfortável ante a ausência do cuidador e quando este retorna, ele não se acalma facilmente; c) ansioso/esquivo: o nível de desconforto do bebê ante a ausência de seu cuidador é baixo, e quando está na presença do cuidador, o bebê apresenta comportamento de evitação para com este. O tipo de vínculo estabelecido reflete os valores e práticas culturais de uma comunidade.

Fonte: http://zip.net/bgtHWP

Outra dimensão influenciada pelos aspectos culturais de uma comunidade refere-se à configuração da família e a dinâmica das relações entre os membros. As famílias norte-americanas, por exemplo, estimulam a individualidade e competitividade enquanto valores desde a tenra infância, o que reflete o jeito americano de viver. Paralelamente, nas famílias ampliadas, a criação dos filhos é compartilhada no sentido de que diferentes membros da família e até mesmo da comunidade, participam do cuidado e entretenimento das crianças, como acontece no Havaí.

Somado a essa realidade, Rogoff (2005) levanta a variação cultural da participação versus segregação das crianças no conjunto de atividades desenvolvidas pela comunidade adulta. Comunidades como Kokwet (África Oriental), áreas urbanas da cidade do Cairo, República Democrática do Congo, as crianças são incluídas em quase todos os eventos familiares e comunitários desde a primeira infância. Em contrapartidas, em algumas comunidades, as crianças observam e participam muito pouco das atividades comunitárias dos pais, como exemplo tem-se as famílias de classe média dos Estados Unidos.

Fonte: http://zip.net/bktHXr

Essa diferença cultural reflete na inserção da criança no mundo do trabalho, uma vez que, em função das observações laborais dos adultos elas adquirem algumas competências por meio da aprendizagem. Em algumas comunidades, crianças entre 3 e 5 anos já aprendem habilidades domésticas simples como juntar folhas, ir ao mercado fazer pequenas compras, aumentando suas atribuições com o acréscimo da idade (ROGOFF, 2005).

Na África Ocidental, as crianças já começam a realizar pequenas atividades perto de casa, desenvolvendo funções importantes no trabalho da região e um auxílio na renda familiar. Desse modo, Rogoff (2005) apresenta que as crianças conseguem aprender acerca dos papeis desenvolvidos pelos adultos com maior facilidade quando estão inseridas no cotidiano e no trabalho das suas famílias e comunidades, isso aumenta a probabilidade de trabalhar conjuntamente em grupo futuramente.

Atualmente, em alguns países, como os Estados Unidos, a participação das crianças encontra-se separadas das atividades dos adultos e cada vez menos habilidades têm sido desenvolvidas que possibilitem o preparo das crianças para a idade adulta. Desse modo, o autor destaca que as iniciativas para proteger as crianças das explorações econômicas, perigos físicos, ampliação da formação escolar e a concorrência econômicas com os adultos, restringiram as possibilidades de aprendizagem direta das crianças sobre o trabalho e demais atividades do adulto.

Fonte: http://zip.net/bjtHS2

Uma alternativa possível para a construção de habilidades adultas na infância consiste na inserção das crianças em ambientes especializados que preparam as crianças para assumirem os papeis dos adultos. Um exemplo desse ambiente especializado refere-se às escolas, locais em que são desenvolvidas brincadeiras e atividades que aproximam gradativamente das atividades posteriores na vida adulta. Em relação a inserção das crianças em grupos, Rogoff (2005) afirma que a relação mãe e filho, muitas vezes é menos importante do que a grupal, ou seja, o envolvimento delas com outras crianças possibilita a apreensão de novas posturas, e se compara ao envolvimento do adulto a sua comunidade.

Fazendo um paralelo, observa-se que mães euro-americanas, interagem mais diadicamente com seu filho, ou seja, relação olho no olho, diferentemente das mães japonesas de classe média. No entanto, há uma diferenciação das mães da Polinésia, que desde muito cedo, estimulam os recém-nascidos ao contato com o outro, isso pode ser observado até mesmo pelo modo com que elas os posicionam, de forma a perceber tudo que está ao seu redor.

Fonte: http://zip.net/bltHqx

Em se tratando dessas relações, observa-se influências culturais nos comportamentos, visto que na américa, as relações, mesmo que grupais baseavam-se em um parceiro por vez, em lugar de um “conjunto múltiplo integrado” (CHAVAJAY, 1993 apud ROGOFF, 2005). No entanto, na Guatemala é comum a organização envolver várias pessoas interagindo em um grupo, compartilhado e multidirecionado.

Na escola o cenário é o mesmo, onde mesmo dispostos de forma a interagirem, as crianças americanas preferem uma relação diádica, ou seja, conversar com o colega ao lado, além de falar com o professor um de cada vez, ou em um uníssono. Nesse sentido, a opção pelos recursos cooperativos em sala tem sido um desafio para os professores, pelo fato de as crianças estarem muito acostumadas ao estilo diádico, e com isso não se adaptarem ao trabalho em grupos. Os professores por vezes, necessitam utilizar-se de novos repertórios para ajudar as crianças a aprenderem modos de estudar em grupo.

Nota-se que os sistemas de convivência em comunidade possuem importância trivial para as crianças assimilarem hábitos e conhecimentos dos adultos, a partir da observação e interação com os mais velhos. Caso as crianças não possam participar das atividades que ocorrem dentro da comunidade, os adultos criam ambientes propícios para essa apreensão, como escola, e momentos de interação adulto-criança, mãe-filho, com a finalidade de prepará-los posteriormente, para os desafios da vida adulta.

REFERÊNCIA:

ROGOFF, Bárbara. Educação de crianças em famílias e comunidades. In: A Natureza Cultural do Desenvolvimento Humano. Porto Alegre: Artmed, 2005. cap. 4, p. 91-127.

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