“Malévola: Dona do Mal” em uma interpretação analítica 

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Concorre com 1 indicações ao OSCAR:

Melhor Maquiagem e Penteado

Percurso heroico faz protagonista sofrer grande mudanças internas em busca da integração dos opostos

Malévola é um filme de drama e fantasia dirigido por Robert Stromberg, que dá uma nova roupagem a Bela Adormecida, chamada Aurora; entretanto, tudo é contado através da vida e nuances psicológicas de Malévola, nos fazendo entender que, na verdade, ela não é tão má assim, e tem lá suas motivações para manter-se na defensiva. Sabendo disso, o filme Malévola 2: Dona do mal, reinicia sua trama pautado em questões ainda não superadas.  

Existem inúmeras maneiras de se interpretar a obra cinematográfica, e uma dessas, é sob inspiração da Psicologia Analítica. “A dona do mal”, Malévola, é assim conhecida pelos humanos, através de boatos e histórias passadas de geração em geração, cujo motivo de tanto medo, nem se quer se passa pela consciência destes indivíduos. Talvez estejam imbuídos de uma espécie de contágio psíquico, ou mesmo sob a influência de imagens arquetípicas presentes no inconsciente coletivo. No filme, também fica claro que a Rainha Ingrith é manipuladora e deseja destruir Malévola para obter mais poder, além de visar as terras dos seres mágicos. 

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Traída por Stefan (ainda no primeiro filme) em uma paixão juvenil, Malévola teve suas asas cortadas pela ganância. Por muito tempo teve de se afastar de um elemento tão crucial que é o ar, que trazia a ela as inúmeras tentativas de se afastar dos sentimentos que a aborreciam, por isso, a nova notícia de que Aurora se casaria com o príncipe do reino humano fez com que ela se deparasse com grande fúria. 

Ela de fato não havia superado suas más lembranças, e desejava proteger Aurora de qualquer mal. Entretanto, a jovem sempre foi a ponte para seu vaso alquímico, e desde o seu nascimento trás para perto as relações humanas que tanto evitava. Malévola então cede de sua vontade, para a felicidade de Aurora, e vai ao encontro do rei e da rainha, para o pedido oficial do casamento. 

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Mais uma vez, ela tinha motivos para manter distância, pois a rainha Ingrith colocou em ação seu plano de forjar um feitiço para o rei, e de acusar Malévola de ter o feito, para que assim, tivesse controle total das futuras ações, e pudesse por fim, matá-la. Enfurecida, Malévola sai do castelo e leva um tiro de metal (metal é seu ponto fraco), sendo este elemento do ponto de vista alquímico, referente à razão,  e que em muito está ligado à dimensão do masculino.

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Resgatada por Conall, ela é levada para um distante lugar, ao qual ainda muito machucada, percebe que ali estava acontecendo uma reunião de seres de sua mesma espécie. Naquele local, começa seu processo de busca por sua individuação, onde ela deixa para trás seu mundo ideal, o reino e o lar dos seres mágicos (numa jornada heroica) para se integrar às novas possibilidades daquele coletivo; mas, em grande medida, estava sempre recuando, voltando a si, para o encontro de um paraíso perdido metafórico, numa ação paradoxal, individuando-se sem sair do todo, na sua vivência em comunidade.

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Conall é a representação de sua contraparte psíquica, uma figura externa do sexo oposto, que a ajuda de forma participativa na obtenção do ouro alquímico, ao passo que, todos ali desejavam vingança dos humanos, assim como Malévola que muito sofreu durante sua vida; mas Conall persistia na ideia de que a violência não era a melhor saída. Dentro dessa aventura, Malévola pôde descobrir a origem de seus poderes, e seu destino de proteger a magia, sendo herdeira direta da Fênix.

Em uma das festas da comunidade em que Malévola se encontrava, ela teve súbita sensação de desconforto, que advinha do pressentimento de que sua terra o reino mágico estava em apuros. Conall, percebendo que ela iria até lá, a seguiu, e viu junto a ela, a destruição e a colheita violadora das flores de seu reino; tais flores, na verdade, eram a forma real das fadas depois de sua morte. Percebendo sua presença, os soldados a atacaram com balas de ferro, e Conall ao visualizar a situação, sacrificou sua vida em defesa de Malévola. Tal desfecho trouxe ainda mais revolta para mente da protagonista.

Decididos a iniciar a guerra contra o reino dos humanos, em busca do fim da extinção da sua espécie, Malévola se direciona para uma grande matança, ao passo que Aurora também está em apuros depois de descobrir a farsa da rainha Ingrith. 

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Houve muitas mortes, já que todo exército humano estava preparado para matar “A Dona do Mal”. Aurora, em perigo contra a rainha foi salva pelo amor de Malévola, que a protegeu contra seu ataque, causando sua triste morte. Pondo-se a chorar sobre suas cinzas, a água de Aurora simbolicamente trouxe à tona afetos e, através disso, a fez renascer. Malévola, descobriu ser a própria Fênix da profecia, voltando a vida, e conseguindo a quintessência. 

Pôde-se notar que a protagonista vivenciou uma alteração de consciência, em uma perspectiva da psicologia Analítica e, sobretudo, Transpessoal. A qual há uma inefabilidade no ocorrido, sendo esta, algo que passa das relações neuronais, transcendendo a relação física. Percebe-se que existe uma ausência do medo da morte, e finalmente ela encontra o Logus, o sentido, pois sua verdade transparece a partir da sua mudança de postura, podendo viver o fim da guerra através da ponte existente entre o mundo humano e mágico, com a dialética, situação simbolizada pela união da rainha Aurora e o príncipe Phillip. Ela pôde por fim, superar seu nigredo, na transposição do ódio e da resistência aos humanos.

FICHA TÉCNICA: 

MALÉVOLA: DONA DO MAL

Título Original: Maleficent: Mistress of Evil
Direção: Joachim Rønning
Elenco: Angelina Jolie, Elle Fanning, Sam Riley, Juno Temple;
Gênero: Drama, Aventura
País: EUA
Ano: 2019

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“Malévola” e a redenção do feminino ferido

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Indicado ao Oscar  2015 de Melhor Figurino

Podemos dividir o filme Malévola em duas partes. Na primeira o filme nos apresenta dois reinos distintos e em guerra: o reino de Moors, onde vivem criaturas míticas, incluindo a fada Malévola, e o reino dos humanos. Essa divisão representa uma clara divisão entre o inconsciente, onde habitam os arquétipos e a consciência, no reino dos humanos.

Na primeira parte do filme temos as seguintes figuras, o rei velho, Malévola e Stefan, o jovem pelo qual a protagonista se apaixona.

O rei ambicioso que está para morrer precisa escolher um sucessor digno para o trono. Nota-se que no reino dos humanos não há uma figura feminina expressiva. Não vemos rainha e o rei apenas cita a sua filha. Isto demonstra que a atitude da consciência encontra-se extremamente unilateral, desequilibrada.

O rei simbolicamente incorpora o princípio divino, do qual depende o bem-estar físico e psíquico de toda a nação. O rei pode ser considerado um símbolo do Self manifestado na consciência coletiva. E esse símbolo, conforme Von Franz (2005) tem necessidadede renovação constante, de compreensão e contato, pois, de outro modo, corre o perigo de se tornar uma fórmula morta — um sistema e uma doutrina esvaziados de seu significado e tornar-se uma fórmula puramente exterior.

A atitude unilateral, então, desse reino é a ênfase no Logos. Não há feminino, não há Eros, não há relacionamento com o irracional. E onde falta o amor o poder se instala, por isso, deve-se escolher um novo rei para a renovação.

Entre os pretendentes ao trono está Stephan, que foi o amor de Malévola na infância. A ele, a fada entregou seu coração. Entretanto, Stephan a trai. Movido pelo poder e ambição, ele corta suas asas e as entrega ao rei. Garantindo então seu lugar como novo regente. E assim, o elemento feminino ainda não pode ser resgatado, a atitude unilateral permanece.

Essa atitude é comum em muitos homens, que movidos pelo medo de seu inconsciente, “cortam as asas” de sua mulher. Cortando sua independência, seu progresso profissional e até suas amizades. Eles se apresentam de forma amorosa, prometendo amor verdadeiro, mas visam o poder sobre elas.

Dessa forma, assim como Stephan, eles traem sua anima, traem sua própria alma. Malévola que era a protetora de Moor pode ser considerada a protetora do reino do inconsciente. Uma representação da anima.

Conforme Carl Jung, a anima é responsável por fazer a ligação entre o consciente e o inconsciente do homem. Ela é o guia dele, seu psicopompo. É uma figura arquetípica que contém todas as experiências do homem com a mulher através de toda a história da humanidade, e por meio dela o homem pode compreender e a natureza da mulher.

Malévola transitava entre os dois mundos e executava esse papel. O fato de possuir asas é uma clara alusão ao deus grego Hermes, com suas sandálias aladas. Hermes era o deus mensageiro dos gregos. O único que podia transitar entre todos os mundos. Uma imagem arquetípica do psicopompo.

Então, quando Stephan corta suas asas, ela perde essa função de guia e ponte e fica renegada ao inconsciente. Outro símbolo digno de nota são seus chifres. O chifre representa virilidade, força, poder e fertilidade. Ou seja, ela é a responsável pela fecundidade do reino e da consciência.

O aspecto feminino do homem, quando rejeitado, e reprimido acaba se tornando não diferenciado. No inconsciente ela ganha mais força e se volta contra a consciência unilateral, se tornando primitiva, vingativa e amarga. Assim o feminino interior, a anima, que representa o aspecto da vida, agora se volta contra a atitude consciente, como aspecto da morte.

Agora chegamos à segunda parte do filme. E nela temos os seguintes personagens: Stephan como rei, que se casou e teve uma filha, Aurora, as três fadas, o corvo Diavale, e claro, Malévola. Nessa segunda parte agora temos o oposto da primeira. Na primeira, havia um desequilíbrio onde o masculino predominava. Agora o feminino é mais forte. Temos mais figuras femininas representadas pelas fadas, Aurora e Malévola.

A psique sempre busca o equilíbrio compensatório. Mas esse equilíbrio só ocorre por meio da enantiodromia. Esse é um ciclo natural da psique, pois tudo deve se reverter em seu oposto para que haja aprendizado e flexibilidade. E agora vemos uma consciência na fase matriarcal, em compensação a fase anterior patriarcal. E nessa fase o feminino ferido e traído busca sua vingança, mais que isso busca seu lugar de direito.

Mas a atitude consciente coletiva, representada pelo rei Stephan, ainda rejeita esse feminino. Vemos isso em seu comportamento, pois além de ainda querer eliminar Malévola, ele envia sua filha amaldiçoada para longe aos cuidados das três fadas, negando assim sua função paterna de proteção e simplesmente ignora sua esposa que está à beira da morte. Um homem quando rejeita seu feminino é frequentemente tomado por ele. Se tornando mal-humorado, pois ao invés de ajudá-lo a administrar suas emoções a anima o carrega de afetos primitivos e indiferenciados.

Assim como Stephan, o homem se afunda cada vez mais em um humor altamente opressivo, rejeitando seus relacionamentos mais próximos e não tendo consideração por ninguém. Malévola, então, traída e amargurada não é mais uma fada. Ela se tornou uma bruxa. Ela agora é a encarnação da Mãe terrível.

A Mãe Terrível liga-se à morte, ruína, aridez, penúria e esterilidade. Nota-se que ela cria uma barreira de espinho ao redor do reino de Moors. E dessa forma, ninguém mais tem acesso ao inconsciente. E por isso a terra se torna estéril, sem vida. Nos contos de fada, a bruxa, representante da Mãe Terrível, sempre está acompanhada por um animal. Esse que representa o animus terrível dela sempre a ajuda. No caso do filme, ela é auxiliada por um corvo, que se transforma em homem, Diaval.

O corvo é associado à bruxaria, magia, azar, mau presságio, mas também fertilidade, esperança e sabedoria. Ele representa as asas que ela perdeu, sendo uma alusão clara a sua função de animus. Porém, o fato de se transformar ocasionalmente em homem, demonstra uma semente de evolução em Malévola. Seu animus não é totalmente primitivo e por vezes a esclarece e serve de consciência para ela.

Malévola, como Mãe Terrível, então se volta contra a criação do rei (sua filha). E nesse momento a Mãe Terrível exige um sacrifício para aplacar sua ira. Aqui vemos um tema mitológico recorrente: o do sacrifício de uma virgem. O tema do sacrifício, em termos psicológicos, significa que para se alcançar um avanço na consciência, e para uma mudança de atitude, a velha forma deve morrer. Ou seja, para se chegar a um equilíbrio entre masculino e feminino alguém deve ser sacrificado e submetido aos domínios da bruxa.

A princesa Aurora é então a vítima escolhida. A bruxa lhe lança uma maldição do sono da morte. Seu pai a envia para longe como forma de proteção e ela não sabe quem ela é e nem que está sob uma maldição. Ela passa a viver com as três fadas escondida, porém essas são inábeis em seu cuidado e proteção. Logo, devido a sua curiosidade, ela passa a viver em Moor com Malévola.

Como nos contos de fada, a princesa perdeu sua mãe representante da Mãe Boa e agora passa a conviver com a Mãe Terrível. O fato de ir para Moors, o mundo do inconsciente, faz uma alusão ao mito deInanna, que empreende uma descida ao mundo subterrâneo de sua irmã sombria Ereshkigal. E é nesse instante, que Malévola começa a encontrar a redenção, uma vez que ela passa a conhecer o amor verdadeiro na forma da maternidade.

Sua redenção não poderia vir pelo masculino, visto que este a traiu, mas por uma menina que a faz relembrar seu lado amoroso, que a faz recordar de um tempo em que era feliz. É pela compaixão de Aurora que ela volta a ter esperanças e a amar. E assim Malévola consegue resgatar suas asas, voltando a ter a sua função de psicopompo. O rei Stephan encontra o destino de todo aquele que se encontra engessado em uma atitude unilateral enrijecida, a morte. E a consciência coletiva encontrou seu equilíbrio entre os opostos com um quarteto que passa a representar a Alteridade e Totalidade: Aurora e o Príncipe e Malévola e Diaval.

 

Referências:

JUNG, C. G. Símbolos da Transformação. Vozes. Petrópolis: 1986.

____ O eu e o inconsciente. 21 ed.Vozes. Petrópolis: 2008

NEUWMAN, E. A Grande Mãe.Cultrix. São Paulo: 2006.

VON FRANZ, M. L. Mitos de Criação. 2 ed.Paulus. São Paulo:2011.

____ A interpretação dos contos de fada. 5 ed.Paulus. São Paulo:2005.

____ A sombra e o mal nos contos de fada. 3 ed.Paulus. São Paulo:2002.

____ Animus e Anima nos contos de fada. Verus. Campinas: 2010.

 

Sobre contos de fadas, o (En)Cena apresenta uma análise das “Princesas Disney” em: http://ulbra-to.br/encena/categorias/princesas-disney

 

Mais filmes indicados ao OSCAR 2015: http://ulbra-to.br/encena/categorias/oscar-2015

 


FICHA TÉCNICA DO FILME

MALÉVOLA

Título Original: Maleficent (EUA)
Gênero: Fantasia
Direção: Robert Stromberg
Roteiro: Linda Woolverton, Paul Dini
Elenco: Angelina Jolie, Brenton Thwaites, Craig Izzard, Elle Fanning, Hannah New, Imelda Staunton, India Eisley, Juno Temple, Kenneth Cranham, Lesley Manville, Miranda Richardson, Sam Riley, Sharlto Copley
Produção: Don Hahn, Joe Roth, Richard D. Zanuck
Fotografia: Dean Semler
Duração: 97 min.
Ano: 2014

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