Pesquisa do Instituto TIM mostra impacto da pandemia na saúde mental de professores brasileiros

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Levantamento ouviu docentes de todo o país e revelou dificuldades na adaptação ao ensino remoto, mas sentimento de otimismo em relação à carreira ainda é destaque

Rio de Janeiro, 9 de fevereiro de 2021 – A pandemia acarretou uma revisão geral de modelos e conceitos de trabalho. Na educação não foi diferente. Professores e alunos precisaram se reinventar para dar conta das tão comentadas aulas online. Uma pesquisa promovida pelo Instituto TIM, por meio do projeto “O Círculo da Matemática no Brasil”, buscou identificar como anda a saúde mental dos docentes e quais foram os impactos da Covid-19 no bem-estar desses profissionais. Quase 70% dos professores ouvidos relataram dificuldades em se adaptar às aulas remotas, porém a pandemia trouxe à tona um sentimento de mais eficiência e otimismo em relação à carreira.

“Já estávamos desenvolvendo esse estudo sobre a saúde mental dos professores quando fomos, literalmente, atropelados pela Covid-19. Decidimos, então, avaliar os resultados que havíamos coletado e fazer uma nova rodada de questionários meses depois, para entender os efeitos da crise sanitária no bem-estar dos docentes brasileiros. O ensino remoto trouxe, sim, dificuldades, mas a principal conclusão do estudo é que os professores do país, em geral, já estavam psicologicamente esgotados muito antes da pandemia. O novo modelo de trabalho, inclusive, reduziu o nível de estresse e cansaço em alguns casos. É um alerta importante para a sociedade, os profissionais da educação precisam ser olhados com atenção, inclusive, com avaliações psicológicas periódicas”, explica o economista Flavio Comim, professor da IQS School of Management (Barcelona) e da Universidade de Cambridge, responsável pela pesquisa e um dos idealizadores do projeto “O Círculo da Matemática no Brasil”.

Fonte: Instituto TIM

Apesar das condições para o trabalho remoto serem adversas – com 66,4% dos entrevistados relatando dificuldades de adaptação, 58% contando que não conseguem ministrar as aulas em casa sem barulho ou interrupções e 78% apresentando problemas de insônia ou excesso de sono – ficou constatado que o ambiente em sala de aula é muito mais prejudicial à saúde mental dos professores. Conflitos nas turmas e violência nas localidades onde as escolas estão inseridas foram apontados como os principais fatores negativos do trabalho presencial. Na pesquisa, 64% dos docentes responderam que já presenciaram agressão física ou verbal contra professores ou funcionários, feitas por alunos. Outros 72% relataram já ter presenciado brigas entre estudantes.

Por isso, mesmo com as dificuldades de adaptação ao novo formato de aulas digitais, uma das conclusões do levantamento é que a pandemia trouxe um respiro ao bem-estar mental de quem leciona. O índice foi verificado pela escala WEMWBS (Warwick-Edinburgh Mental Well-Being Scale). De acordo com o estudo, a pandemia também reduziu o índice de Burnout entre os professores. A síndrome se manifesta quando há um esgotamento físico e emocional em relação ao trabalho.

Como consequência, houve aumento do sentimento de autoeficácia dos professores durante a pandemia e o otimismo em relação à carreira. Cerca de 45% dos entrevistados viam possibilidades de desenvolvimento e de promoções, indicador que aumentou 15 pontos percentuais nos questionários feitos mais recentemente. Mais de 80% dos docentes acreditam que suas qualificações continuarão válidas no futuro.

A avaliação, por outro lado, destacou ainda mais as desigualdades da sociedade brasileira: professores pardos e negros foram mais impactados pela pandemia. Entre as pessoas negras, 76% mencionaram dificuldades de adaptação às aulas online, 64% não conseguiram trabalhar bem de casa e 83% tiveram problemas de sono durante a pandemia. O contexto familiar também retrata as diferenças: 79% dos professores negros contaram que suas famílias perderam parte da renda durante a crise sanitária, contra 61% dos profissionais brancos.

Fonte: Instituto TIM

A pesquisa e o Círculo da Matemática
A pesquisa ouviu professores do ensino fundamental em diferentes Estados do Brasil, da rede pública e privada, entre janeiro e novembro de 2020. A amostra foi calculada com um nível de confiança de 95%. Quase 80% trabalham em bairros economicamente mais vulneráveis, dando uma média de 30 horas de aulas por semana, para cerca de 28 alunos por turma. Um quarto dos entrevistados trabalha em duas ou mais escolas e 24% exercem outra atividade para complementar sua renda.

O estudo é um dos desdobramentos do projeto “O Círculo da Matemática do Brasil”, realizado pelo Instituto TIM por sete anos com o objetivo estimular o gosto por essa disciplina. O programa utiliza a abordagem The Math Circle – criada pelos professores Bob e Ellen Kaplan, da Universidade de Harvard – que, dentre outros conceitos, utiliza os erros como ingredientes-chaves na reflexão e fundamentação do pensamento matemático.

A iniciativa beneficiou 27 mil alunos de escolas públicas do ensino fundamental em 33 cidades brasileiras, envolvendo mais de 4 mil educadores. Os detalhes da metodologia, além de materiais didáticos e videoaulas, estão disponíveis no site do Instituto TIM para que mais professores possam aplicar a abordagem com suas turmas. Em 2016, a UNESCO reconheceu a importância do Círculo para o estímulo à educação científica por meio da formação de qualidade de professores em matemática e, em breve, publicará um livro com história dos educadores do projeto e mais informações sobre o programa.

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Matemática é aliada para entreter crianças em tempos de coronavírus

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Portal Saber oferece quebra-cabeças dirigido ao público infantil

Por Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

A matemática pode ser um grande aliado de pais e responsáveis para entreter os filhos durante o período de isolamento imposto pela pandemia de coronavírus. Um bom exemplo é o Portal do Saber, disponível na internet, que cobre todo o material curricular, desde o ensino fundamental até o fim do ensino médio. Ele oferece quebra-cabeças matemáticos dirigidos às crianças menores, sobretudo do ensino fundamental 1, que aprendem matemática em tom de brincadeira.

A informação foi dada hoje à Agência Brasil pelo diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), Marcelo Viana. O Impa promove, anualmente, a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep). “As questões disponíveis no Portal do Saber, ao mesmo tempo em que ocupam as crianças em casa, contribuem com a formação deles”, afirmou Viana.

Para os jovens e adolescentes do ensino médio, as provas de anos anteriores da Obmep podem constituir grande aliado neste momento de quarentena para prevenção do coronavírus, indicou Viana. O Portal oferece toda a matemática dirigida à Obmep que inclui desde o 6º ano do ensino fundamental até o 3º do ensino médio.

 As provas estão disponíveis também no site da olimpíada . Dessa maneira, crianças e jovens podem aproveitar o ensino lúdico da matemática para aumentar o conhecimento, enquanto se divertem. “Desperta a criança e, ao mesmo tempo, contribui para sua formação”, diz o diretor-geral do Impa.

A Obmep já descobriu talentos em todo o Brasil. O certame é feito todo ano por mais de 18 milhões de alunos de 99,7% dos municípios brasileiros.

Plataforma

Exercícios criativos do programa Mentalidades Matemáticas, desenvolvido em inglês por professoras de educação matemática da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, podem também ser grandes aliados dos pais para distrair os filhos no atual momento de quarentena imposto pelo vírus. O programa foi criado com base em pesquisas recentes da neurociência, que mostra como ensinar matemática de maneira criativa.

O Instituto Sidarta traduziu o site para o português e disponibiliza gratuitamente o conteúdo do Youcubed para o Brasil e outros países de língua portuguesa. A plataforma contabiliza mais de 38 milhões de visualizações, envolvendo pela internet 230 milhões de pessoas em 140 países.

A presidente do Instituto Sidarta, Ya Jen Chang, disse que na plataforma são encontrados desde artigos científicos, para ajudar no desenvolvimento de professores, até atividades específicas para as crianças fazerem em sala de aula ou em suas residências. “Esse aprendizado da matemática é, na verdade, uma nova abordagem diferenciada da matéria, onde ela traz uma perspectiva de uma matemática aberta, criativa e visual”, afirmou Ya Jen.

“Ela parte do pressuposto de que matemática não é o que a gente está acostumado a ver hoje em dia, que é a questão dos procedimentos, das fórmulas e dos cálculos, é muito mais ampla e muito mais aberta”, garantiu a presidente do Instituto Sidarta. Segundo Ya Jen, nessa nova matemática, a pessoa pode explorar ideias, brincar com os conceitos matemáticos e desenvolver raciocínios lógicos.

Educação de qualidade

Ya Jen destacou que a missão do Instituto Sidarta, criado há 20 anos e sem fins lucrativos, sempre foi o de promover educação de qualidade para todos. Ao ter contato pela primeira vez com o material do programa “Mentalidades Matemáticas”, a presidente do instituto viu ali uma oportunidade de ampliar o conhecimento da matéria, especialmente entre os adolescentes brasileiros, que apresentam deficiência crônica para aprender essa matéria.

De acordo com dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) referentes a 2017, sete em cada dez brasileiros com mais de 15 anos de idade não têm o domínio da matemática, comparado com outros países que mostram a mesma situação socioeconômica, entre os quais a Índia, por exemplo. “Realmente, a gente tem uma sensação crítica de não aprendizagem”.

Ya Jen Chang disse ainda ue parte dessa deficiência se deve ao jeito como a matemática é ensinada, em geral, no Brasil, que “causa traumas” e deixa em muitas crianças a sensação de que a matéria não foi feita para elas. “Esse é um dos primeiros mitos da matemática”. Assegurou que a matemática é inerente ao ser humano. Um conceito equivocado, segundo ela, é que a pessoa que faz contas rápido é melhor do que aquela que não faz. “A rapidez não tem nada a ver com a capacidade matemática. O que se busca é a profundidade”.

A dimensão que temos de volume, de geometria, explica porque sabemos que um carro não pode ser colocado na vaga de uma moto. Isso é matemática. O sentido da matemática é mais amplo e não se restringe a números e cálculos.

Jogos

Na plataforma Youcubed são encontrados vídeos, artigos, atividades e jogos sobre a abordagem inovadora baseada em pesquisas de neurociência, abertos a uma ampla faixa etária que abrange desde os quatro anos de idade até a fase adulta do ser humano.

Uma das atividades é intitulada Léo, o coelho, voltada para crianças menores, que aprendem matemática baseada nos pulos que o coelho tem de dar para subir uma escada de dez degraus. Para estudantes do 5º ao 8º ano do ensino fundamental, há o Labirinto das Operações, tabuleiro onde as peças são movidas para baixo ou para os lados, mas nunca para cima. A criança não pode passar duas vezes pelo mesmo lugar. O objetivo é escolher um caminho que resulte no maior valor quando a pessoa chegar ao fim.

No Quatro Quatros, em que uma folha é dividida em 20 quadrados, preenchidos de 1 a 20, o desafio é encontrar todos os números entre 1 e 20 usando apenas quatro quatros e qualquer operação. A atividade demonstra a flexibilidade dos números e como há diferentes maneiras de chegar ao mesmo resultado. Como trabalha com as quatro operações, o jogo é indicado para crianças a partir do 3º ano do ensino fundamental.

Nas Cartas Matemáticas, em vez de trabalhar com rapidez de raciocínio e memorização, a atividade usa o jogo de cartas para trabalhar com o senso numérico e multiplicação sem nenhuma limitação de tempo. O objetivo é casar as cartas com a mesma resposta numérica, mostrada em diferentes representações. O jogo é indicado para alunos do 3º ao 8º ano do ensino fundamental.

Fonte: encurtador.com.br/owKU8

Entretenimento

O empresário Raphael Campos usou jogos do Youcubed e a prova da Obmep com a filha Ana Beatriz e sua amiga Yasmin Cândido, ambas de 11 anos. Segundo ele, as meninas adoraram e ficaram entretidas por mais de uma hora.

“Brincamos do exercício ’4 quatros’, que precisa usar as operações com o 4 para se chegar a todos os números até 20. E elas também adoraram fazer a prova da Olimpíada de Matemática. São questões de raciocínio, não de fórmula, desafiadoras e interessantes. Assim as crianças ficam ocupadas de forma lúdica e aprendem”, assegurou Raphael Campos.

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Seu filho tem dificuldades com operações matemáticas? Ele pode ter discalculia!

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Você sabe o que é discalculia? No vocabulário de muitos pais, essa palavra pode ser nova ou nem existir. Mas saiba que ela pode ser indício de que seu filho precisa de ajuda? Muitas crianças, adolescentes e até adultos enfrentam obstáculos na vida acadêmica por conta dela.

A psicopedagoga do Instituto NeuroSaber Luciana Brites explica que a discalculia é um distúrbio de aprendizagem caracterizado pela dificuldade em desempenhar tarefas ligadas a toda e qualquer operação matemática. Ela ressalta que essas barreiras incluem também a compreensão de conceitos numéricos e a utilização de fórmulas, símbolos ou qualquer outro ícone que faça alusão ao saber matemático.

– É bem provável, por exemplo, que um aluno não consiga associar a palavra quatro ao algarismo correspondente. No entanto, o distúrbio de aprendizagem não é o mesmo que a dificuldade que todos nós podemos ter na compreensão de uma disciplina específica. Não se trata de algo que pode ser resolvido com aulas particulares – comenta.

Fonte: encurtador.com.br/aGKQS

Segundo a psicopedagoga, cada pessoa pode manifestar uma característica em relação à ocorrência da discalculia, desde a escolinha até mesmo na universidade. Por exemplo, no período da pré-escola, o aluno pode não conseguir discernir os diferentes algarismos. “O estudante não segue a ordem correta dos números (1 a 5, por exemplo), a criança demonstra dificuldades para aprender a contar os dedinhos da mão. Seu progresso é aquém dos demais coleguinhas.”

– No ensino fundamental, é comum esse estudante ter problemas na aprendizagem de operações básicas, como adição e subtração. Usa os dedos para contagem simples por não ter facilidade para raciocinar. No ensino médio, apresenta dificuldades para compreender valores e lidar com medidas, não consegue olhar as horas em relógio de ponteiro. Já na universidade, pode ter problemas para ler gráficos e infográficos e dificuldade de obter sucesso em provas de vestibular que envolva números e fórmulas – esclarece.

Fonte: encurtador.com.br/jpZ49

Luciana explica que a discalculia é causada pelo mau desenvolvimento do cérebro, lesão cerebral, genética e pelo ambiente. Porém, o diagnóstico deve ser feito por psicopedagogo, psicólogo escolar e neuropediatras.

– O tratamento deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar e também deve ser desempenhado por professores em educação especial para a utilização estratégica da matemática. Tudo isso para impulsionar o percurso pedagógico do aluno – conclui.

Luciana Brites

Uma das fundadoras do Instituto NeuroSaber, Luciana Brites é Pedagoga especializada em Educação Especial na área de Deficiência Mental e Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Unifil Londrina. Também é especialista em Psicomotricidade pelo Instituto Superior de Educação Ispe – Gae São Paulo, além de coordenadora do Núcleo Abenepi em Londrina.

Fonte: Divulgação

NeuroSaber 

O projeto nasceu da necessidade de auxiliar familiares, professores, psicólogos, fonoaudiólogos, psicopedagogos, terapeutas ocupacionais, médicos e demais interessados na compreensão sobre transtornos de aprendizagem e comportamento. A iniciativa tem como objetivo compartilhar informações valiosas para impactar as áreas da saúde e educação, além de unir especialistas do Brasil e do exterior.

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Experiências Culturais: os instrumentos e instituições da cultura

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Em relação ao texto “Pensando com os instrumentos e com as instituições da cultura” de Barbara Rogoff (2005), reflete-se a respeito da constituição do pensamento, ressaltando que o pensar é um processo interpessoal no qual envolve muito mais do que ações privadas e individuais, pois de acordo com a pesquisa voltada para o desenvolvimento cognitivo, as pessoas constroem seus pensamentos e entende seu mundo a partir da interação com o meio participando de atividades socioculturais (ROGOFF, 2005, p.196).

Pesquisadores debruçaram-se em aportes teóricos, para compreender a relação existente entre a formação do pensamento das pessoas decorrentes das suas experiências culturais. Assim, muitos deles consideraram os estudos de Vygotsky, pois este considera que as habilidades cognitivas individuais são constituídas diante do auxílio de outras pessoas, ou seja, “o desenvolvimento cognitivo ocorre à medida que as pessoas aprendem a usar instrumentos culturais do pensamento (como alfabetização e a matemática) com a ajuda de outras, mais experientes com tais instrumentos e instituições” (ROGOFF, 2005, p.196).

Fonte: http://zip.net/bvtHDX

O ponto de vista sócio histórico contribui para um novo entendimento da cognição, sendo visto agora como processo ativo das pessoas e não mais individual e passivo. Jean Piaget, na sua teoria, também estudou aspectos cognitivos, porém ele analisava o processo de desenvolvimento intelectual da criança a partir dos estágios, desconsiderando as variâncias culturais. Pesquisadores, então, realizaram estudos aplicando as técnicas de Piaget em diferentes contextos culturais, e com isso, observaram que de acordo com a comunidade e cultura em que se vivem as pessoas apresentaram desempenho diferente na realização da atividade.

Diante desta situação, estudiosos começaram a perceber algumas questões, como a conceituação do objetivo e a familiaridade com o mesmo, conforme a localidade pode influenciar no resultado do teste, assim, os pesquisadores estudavam os tipos de atividades realizadas na comunidade e com isso adaptava-se as atividades para que avaliassem o desempenho da pessoa. Rogoff (2005) traz um exemplo de estudos realizado com crianças que demonstra essa experiência:

As crianças zambienses tiveram bom desempenho quando modelaram com pedaços de arame, uma atividade conhecida em sua comunidade, mas um desempenho ruim com os desconhecidos lápis e papel. Em comparação, crianças inglesas se saíam bem com lápis e papel, um meio conhecido para reproduzir padrões em sua comunidade, mas não com pedaços de arame (p.197).

A partir desses estudos, Piaget revisou seus conceitos, percebendo que os estágios de desenvolvimento cognitivo (principalmente o operatório-formal) dependiam da experiência pessoal de cada sujeito, conforme o seu contexto, e domínio.

Fonte: http://zip.net/bstHv0

Outro aspecto observado pelos pesquisadores em relação ao processo do pensamento era os testes cognitivos em similaridade com a formação escolar, percebendo a influência dos valores culturais na definição de inteligência considerando a situação em que este era analisado. Antigamente os testes eram usados para medir a cognição de forma muito crua, não havia um olhar humano que levasse em conta a experiência de vida da pessoa. Os pesquisadores então começaram a ver por outro ângulo e afirmaram que a testagem poderia ser vinculada aos valores e a experiência cotidiana. Os valores que se vinculam com os relacionamentos sociais, têm grandes influências nas respostas das pessoas quando submetidas a perguntas cognitivas (ROGOFF, 2005).

É importante ressaltar a relação entre o testador e a pessoa que será testada, “os modelos culturais de relações sociais, que fornecem, implícita ou explicitamente, a base para os comportamentos apropriados e formas de se relacionar de adultos e crianças não são suspensos em testes cognitivos” (SUPER e HARKNESS, 1977, apud ROGOFF, 2005, p.205). Isso está totalmente relacionado com o significado de maturidade e inteligência de cada cultura/comunidade. Cada cultura tem uma definição diferente do que seja inteligência e maturidade, enquanto que, para uma cultura inteligência seja definida como lento, cuidadoso e ativo, para outra cultura tem outro sentido e valor.

Fonte: http://zip.net/bytHD2

Em se tratando de generalização, a autora Rogoff (2005) retrata que nem sempre será uma coisa boa, e que executar no automático a mesma ação pode ou não ser apropriado a uma nova situação, o objetivo seria uma generalização adequada e para que este conhecimento (desenvolvido em uma situação quando se enfrenta uma nova) seja adequado Hatano (1988) apud Rogoff (2005) diz que tem de haver o entendimento conceitual, e, para que as pessoas e grupos façam uma generalização adequada entre as experiências/situações é importante o que foi chamado por alguns autores de capacidade adaptativa.

O desenvolvimento da capacidade adaptativa é apoiado pelo grau no qual as pessoas entendem os princípios e objetivos das atividades relevantes e ganham experiência ao variar os meios para atingi-los. As práticas culturais e a interação social sustentam a aprendizagem de quais circunstâncias estão relacionadas entre si e quais posturas são adequadas a diferentes circunstâncias. (ROGOFF, 2005, p.209).

No que diz respeito à visão da cognição, “vai muito além da ideia de que o desenvolvimento consiste em adquirir conhecimento e habilidades” (Rogoff, 2005, p.208), a pessoa cresce por intermédio da participação em uma atividade que traz transformação para assim ele se envolver em outras mais. Rogoff (2005) argumenta que o desenvolvimento cognitivo dos indivíduos acontece no espaço de comunidades com o interesse de que as pessoas trabalhem em determinados lugares, como seres civilizados. Nós não somos donos do nosso próprio pensamento a respeito do mundo, mas é assim que acontece o início das habilidades nas parcerias desses diálogos. A partir disso percebe-se a importância dos aspectos históricos e culturais dessa conversação para cada pensador, influenciando outras pessoas a começarem novas linhas de pensamentos.

Fonte: http://zip.net/bwtGJ6

Em seus estudos com marinheiros, Ed Hutchins (1991) apud Rogoff (2005), o autor percebeu que eles trabalham em conjunto nos cálculos e nos planejamentos necessários para orientar a navegação de grandes navios. Diante disso é importante ressaltar que a cognição é distribuída na medida em que as pessoas colaboram e ajudam umas as outras, não apenas pensando em si próprio, mas, no que o outro pode está acrescentando com os instrumentos projetados para auxiliar no trabalho cognitivo. O processo coletivo mostra para o indivíduo que produzir em conjunto proporciona uma qualidade na produção tornando as informações claras e trazendo um conhecimento mais rico.

Arievitch (1995) et al. apud Rogoff (2005) enfatiza que o foco está na transformação ativa do conhecimento por parte das pessoas e em seu relacionamento com atividades que dinamizam. Levando-se em consideração esses aspectos, aprender e adequar com flexibilidade as posturas às circunstâncias é um fator importante para o desenvolvimento cognitivo que é imprescindível para tomada de decisão em várias áreas da inteligência. Muitas famílias ensinam suas crianças formas mais abertas de agirem e falarem, formas essas que se adequam a papéis e diversas situações. Percebe se em outras culturas que os adultos dão maior ênfase neste aspecto. Se as crianças souberem distinguir as posturas adequadas para cada ambiente evitarão problemas de comunicação.

Aprender a diferenciar as formas adequadas de agir em diferentes situações é uma conquista importante em todas as comunidades, seja para crianças, seja para adultos. Saber qual postura adotar na escola e em casa, junto com a determinação de qual estratégia usar em testes cognitivos e em outras situações de solução de problemas, equivale a aprender a fazer generalizações adequadas de uma situação para outra (ROGOFF, 2005, p. 211).

De acordo com Rogoff (2005), a teoria de Vygotsky redirecionou os estudos científicos sobre a cognição, visto que as funções mentais estão associadas à maneira como utilizam os instrumentos cognitivos na própria comunidade. Diante disso, percebe-se a extrema importância da empregabilidade de certas ferramentas culturais para o pensamento, tais como, a alfabetização, a matemática e a linguagem. A alfabetização está interligada às competências cognitivas por intermédio de aplicações peculiares comprometidas em seu uso. O aprendizado da leitura oferece várias habilidades dos processos mentais distintos de tal forma que, essas diversidades nos objetivos e nas aplicações da alfabetização parecem estar intrinsecamente interligadas as habilidades que as pessoas utilizam (ROGOFF, 2005).

Fonte: http://zip.net/bgtG9R

Ainda em concordância com a autora Rogoff (2005), no que consiste à alfabetização utilizada como instrumento, esta colabora com certos tipos de pensamentos, seja no contexto social, local, seja no contexto histórico. Como exemplo, no século XVIII nos Estados Unidos, a alfabetização era entendida como a habilidade de escrever o seu próprio nome em documentos legais. Já, no século XIX, a alfabetização estava relacionada com a capacidade de ler; mas sem a compreensão de leitura. Já, durante o século XX, a leitura estava associada com a funcionalidade dela, ou seja, a importância dela para eficiência da indústria.

Diante deste contexto, é notório que a utilização de instrumentos culturais como a matemática está profundamente associada às diversas características e aos princípios das comunidades. O manuseamento dessas ferramentas na matemática está interligado nas especificidades dos próprios utensílios, às atitudes das comunidades referentes à utilização desse instrumento e como este pode ser compreendido nas interações sociais. Esse instrumento também serve para o fortalecimento das relações sociais.

No que diz respeito à linguagem, este serve como instrumento cultural para o pensamento, uma vez que a língua conduz o modo de atuar e de pensar da comunidade, como por exemplo: ideias que são manifestadas no campo da linguagem de uma comunidade, de maneira que o sistema linguístico contribui com os pensamentos, como também, a utilização desses instrumentos pelos indivíduos e pelas gerações. Enfim colaboram com a organização narrativa, estruturas de cálculos matemáticos, isso de tal forma que os pensamentos interagem com os processos interpessoais e de comunidade.

Fonte: http://zip.net/bftG7Y

A alfabetização e a matemática são importantes instrumentos culturais do pensamento, logo, estudos sobre a matemática identificam como estas ferramentas são essenciais, como exemplo, o ábaco, as formas de cálculo ensinadas na escola, à formação dos preços de vendas dos utensílios. Os indivíduos utilizam esses dispositivos para facilitar o trabalho e a diminuição do esforço mental como uma maneira de se adequarem no contexto cotidiano.

Perante o exposto, foi possível perceber que as teorias socioculturais crescem constantemente por terem a compreensão de que o pensar está diretamente entrelaçada a situações específicas, essa relação não é automática, bem como a autora demonstrou, “em lugar disso, os indivíduos determinam suas posturas diante de certas situações com referência nas práticas culturais de que participaram anteriormente”. (ROGOFF, 2005. p.211). Cada ser humano tem uma visão diferente das coisas, esse processo faz com que tenhamos atividades socioculturais. Em concordância com o raciocínio de Rogoff (2005), entende se que, no momento que existem limites obrigatórios entre o indivíduo e o todo, se faz surgir complicações para melhor compreender, tanto os processos individuais, interpessoais e da comunidade.

REFERÊNCIAS:

ROGOFF, Barbara. A natureza cultural do desenvolvimento humano. Ed.1.Tradução de Roberto Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed, 2005.

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Tudo é número?

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“Tudo é número, logo tudo é razão. Falso. Nem tudo é razão. De onde vem? Das relações matemáticas?”

 

Eles estão aqui, ali, e bem aí. Na senha, nos códigos de barras, na hora de acordar, no dia da semana, nos dados da produção, no valor da bolsa, no número de mortos, no número que visto, que calço, que peso, que invisto. Quer você os ame ou odeie.

Há quem não tenha afinidade alguma com eles; quem tenha certa aproximação e quem opere bem, seja no campo dos reais ou complexos. E, em meio a isso, temos ainda aqueles que vão além do ódio ou amor a esses objetos matemáticos: os que acreditam na intervenção direta dos números em suas vidas.

A numerologia, pseudociência que se dedica ao estudo do significado e da influência dos números no caráter e no destino das pessoas, a partir da interpretação de expressões matemáticas relacionadas ao nome que se possui, é, muitas vezes, consultada por alguns na tomada de decisões empresariais e, inclusive, pessoais. Atitude essa que estabelece certa relação de dependência do indivíduo em relação aos números.

Embalados por essa crença, acreditamos que tais indivíduos, assim como Pitágoras, corroboram a ideia de que ‘tudo é número’. E, embora não concordemos com a totalidade da afirmação (até mesmo porque tudo tenderia ao exato, à razão), necessitamos considerar engraçada a relação de afinidade ou desapego que temos com dados algarismos.

E, de fato. No Japão, por exemplo, os números 4 e 9 são considerados como números de azar por lembrarem morte e sofrimento. Em alguns hospitais do país não se usam esses números nos apartamentos e nas enfermarias, pois vários hospitalizados se recusam a se internarem em dependências hospitalares por eles identificadas. Já no Brasil, o número 13 é o de má sorte, pois é tido como incompleto na numerologia se posto em comparação ao número 12 dos 12 meses do ano, dos 12 signos do Zodíaco, das 12 tribos de Israel e dos 12 apóstolos. Outra possível justificativa para essa superstição pauta-se em explicações advindas da mitologia nórdica (conjunto de religiões e crenças pré-cristãs) que cita a lenda de Loki, um espírito ruim que apareceu para um banquete de 12 pessoas sem ser convidado provocando a morte do deus Balder, o mais quisto dos deuses (http://pt.wikipedia.org/wiki/Sexta-Feira_13). Dentre essas comparações místicas, há ainda o fato de que na cultura brasileira este número (13) se associado a uma sexta-feira também pode representar um dia mau agouro. A explicação para essa associação ser pouco sortuda dá-se em decorrência da morte de Cristo ter ocorrido em uma sexta-feira; dia em que, segundo as Sagradas Escrituras, supostamente também ocorreu o grande dilúvio.

No meu caso, por exemplo, embora a numerologia diga que meu número de sorte seja o 8, algo de peculiar há nos números 20 e 10. Não que eles expliquem ou ajudem a compreender a origem do universo, ou estabeleçam uma estrutura lógica para equacionar enigmas como o conjunto dos números primos. Eles simplesmente representam, para mim, uma data singular registrada no RG n° 612.990.

Aos religiosos, por sua vez, como citação, há certo distanciamento do número 666, já que essa sequência lembra o que ficou registrado em Apocalipse 13-18: “[…]Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem. Ora, esse número é seiscentos e sessenta e seis”. A besta, o dragão e o falso profeta representam, para os cristãos, figuras apocalípticas que os reportam a profecias acerca do sofrimento do fim dos tempos. Logo, para esses, não é de bom tom ter esse número ligado à sua imagem ou a pertences seus.

Loucura? Coisa da cabeça?

Aos jogadores da Megassena, o uso de combinações de números pares, ímpares, perfeitos ou múltiplos pode desencadear na sorte de se receber vários zeros à direita do saldo bancário, se eles acertarem 6 dos 60 números disponíveis na cartela. Já aos matemáticos, essa sorte fica mais à mercê dela própria do que da probabilidade real de um fato desses ocorrer, uma vez que existem 50.063.860 formas diferentes de combinações dos 6 números.

Enfim, sortudos ou azarados, não temos como comprovar essas adjetivações, o que nos leva a concluir que, fomentados ou não pelo pensamento de sorte ou azar advindo de um dado número, somos apenas capazes de afirmar que vivemos em meio a um verdadeiro sistema numérico. Situação essa que nos conduz à escolha de sermos simplesmente uma variável que acompanha os coeficientes numéricos ou um fator determinante no jogo da própria vida.

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A razão da Loucura e a desrazão da Matemática

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A simples vontade de tomar um sorvete já me faz parar em uma encruzilhada; mesmo assim entro na sorveteria e peço uma bola de sorvete de chocolate, numa casquinha daquelas em forma de taça.  A agonia começa quando eu me sento em uma cadeira de uma mesa e, sozinho, começo a pensar o que fazer com o sorvete antes que ele derreta.  O correto, o razoável seria pegá-lo e acertá-lo na testa, não existe coisa melhor do que bater com um sorvete de casquinha na testa e sentir aquele frio dos Alpes escorrer pelo seu rosto e, ao chegar na boca os primeiros pingos escorridos, sentir o gosto do chocolate como se estivesse passeando na Suíça; se uma brisa viesse bater no rosto daria pra fechar os olhos e se deliciar com o ambiente tão europeu. Imagino até a idéia dos transeuntes me observando e tendo a vontade de estar ali com um sorvete na testa sentindo todo aquele prazer, a maioria entrando na sorveteria e pedindo um sorvete e fazendo o mesmo.

Como é bom raciocinar e agir dentro de uma normalidade e ver as pessoas assim também procedendo e formando aquela lógica do “se então” que move o mundo da inteligência e das tomadas de decisões.

“Se sorvete, então testa”; “Se frio então Alpes”; “Se chocolate então Suíça” e com um simples sorvete eu me desloco de Sacramento (MG) a Berna, em um segundo, ou seja, viajo com a velocidade de aproximadamente 11000 km/seg (1/27 da velocidade da luz).

O problema da encruzilhada começa aí.  Não bato o sorvete na testa, pelo contrário, agindo completamente fora de uma lógica, começo a passar uma pequena pá na esfera que é o sorvete e tomá-lo devagar; como não posso fazer outra coisa começo a ficar agoniado e a imaginar.

O raio da esfera de sorvete é aproximadamente 2cm, então o seu volume, de acordo com a fórmula da geometria espacial (V=4/3πR ³), considerando π= 3,14, é de 33,50 cm³. Poderia voltar à normalidade a partir desse ponto e viajar para os Alpes, mas não o faço.

A profundidade do copinho cônico do sorvete é aproximadamente 12 cm e o raio da boca 2 cm então o volume do copinho de acordo com a fórmula (V=4/3πR ³) sendo h a profundidade do copinho, é igual a 50,24 cm³.  Assim, se eu deixar todo o sorvete derreter dentro do copinho ele não encherá o mesmo.  A agonia aumenta e já quero saber até onde subirá o sorvete após passar para o estado líquido.  A razão entre os volumes é a mesma razão dos cubos das alturas ou dos cubos dos raios e ao fazer as contas encontro a altura atingida pelo líquido: 10,5cm e o raio do círculo do sorvete igual a 1,75 cm.

O cérebro fervilha; chamo a mocinha atendente, após todo o sorvete ter derretido e digo pra ela “faltou sorvete para encher o copinho”.  Ela me olha como se quisesse dizer: “Porque o cara não toma atitudes lógicas e viaja para Suíça?” mas, educadamente, pergunta:  “Como assim Senhor?” e conclui “O Senhor mesmo pediu uma bola de sorvete de chocolate. Quer que eu complemente o que falta?”

Calmamente explico a ela. “Não, não é isso. Como o copinho abriga um volume de 50,24 cm³ e a bola de sorvete tem apenas 33,50 cm³ vocês podem fabricar copinhos com 10,5 cm de profundidade e 1,75 cm de raio. A menina somente me pergunta “O Senhor deseja mais alguma coisa? e eu respondo “Não! Quanto lhe devo?” “3,00 reais, Senhor”. E eu “Separadamente qual é o preço do copinho e qual é o preço do sorvete?” Ela “?????”.  Calmamente ela vai para trás do balcão e volta com outra bola de sorvete e me acerta com ele na testa, dizendo.  “Este é um prêmio da casa, Senhor.”

Sinto-me feliz, agora sim poderei tomar o meu sorvete da forma mais lógica possível.  Quando o primeiro pingo escorrido chega à minha boca eu sinto o gosto de caju, levanto-me, vou até a mocinha e pergunto “Essa viagem prêmio tinha que ser para o Piauí?” E ela responde: “O senhor pode escolher Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte ou Bahia.  O Senhor queria o quê, Suíça?”

Saí da sorveteria pensando: “Essa menina conhece a vontade do ser humano e permite que ele aja dentro da normalidade, o meu único receio é que ela não aprenda Matemática e passe a vida toda servindo 33,50 cm³ em copinho de 50,24 cm³, isso poderá causar uma mudança de inclinação do eixo da terra e expor a Suíça a um calor sufocante e eu acabarei perdendo o meu gosto pelo sorvete de chocolate na testa.

Será que eu me acostumo com o Piauí?

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Mote – a normalidade e a sensatez do meio-termo? Freud teria descoberto a psicanálise caso fosse sensato?

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Certa feita fui convidado para ir a casa de um general da reserva… remunerada.  De chofre, e intrigado, e comunista, perguntei-lhe: – E há general da reserva… não remunerada? Fosse no tempo da ditadura militar teria sido preso.

É que Sua Excelência queria (queria, sim, general remunerado não deseja, QUER!), sua excelência desejava ouvir minha opinião sobre o seu som musical de muitos dólares: um conjunto Marantz valvulado – pré-amplificador, amplificadores e divisor de frequência – cujos  “knobs” e painéis frontais tinham sido mandados banhar a ouro! E o três estrelas do exército nacional salve! salve! usava um par de luvas brancas para acionar os controles…

Freud classificaria esse caráter como exibicionista maníaco-depressivo psicálgico. Porque nós substitutivos musicistas, qualificávamo-lo de “audiota”, ou seja, aquele que adora, acima de tudo, o equipamento de som.

É verdade que a música é sobretudo uma forma de descarga afetiva; ela não existe senão nas nossas cabeças, sejam cabeças que sabem ler os gráficos das partituras, sejam cabeças que decodificam as ondas sonoras em forma de eufonia musical. Porque um trompete, uma flauta doce etc .não são música senão a partir dos nossos neurônios; e nem tanto de nossos ouvidos. Porque cada ouvido ouve o que suas emoções necessitam ouvir; ou sua curva audiométrica permite…

E o gosto é isto: necessidades emocionais. Eu, por exemplo, não tolero a voz nasalada e melosa do Roberto Carlos associadas com sua pantomima repetitiva de “grandes emoções”. Mas conheço pessoas que têm todas as paredes de sua casa “adornadas” com retratos tipográficos de seus do Roberto shows e apresentações públicas. Embora meu afeto negativo não chegue ao ponto de pintar minhas paredes de preto, que é a ausência da cor…

Não considero Beethoven um músico inovador senão subversivo, subverteu a vida da nobreza preguiçosa e fútil com barulho ensurdecedor musicado; são assim as suas Sonatas para piano e suas Sinfonias que mais traduzem um espírito conturbado e raivoso do que um músico consciente. Diferente de Bach para quem a música era um problema matemático a resolver – e resolveu-os todos com extrema competência sem utilizar da enganação da melodia. Compôs Bach música pura sem se importar com os leitmotiv, ou seja, com os temas, com os dramas, com uma personagem em particular, uma situação, um sentimento, um objeto. Compôs Matemática.

Igual e ao mesmo tempo diametralmente oposto a Mozart, que compôs sonatas, concertos e sinfonias, comédias bufas, dramas densos e missas insossas, tudo isso independente de seu estado de espírito, suas desgraças pessoais, suas dúvidas filosóficas, suas alegrias fugazes e suas tristezas constantes. Compôs Música.

Beethoveen criou o barulho musical para incomodar o dolce far niente da nobreza ociosa. Seus tímpanos na Terceira Sinfonia mais parecem o troar dos tambores de pau oco dos índios a ecoar mata a dentro para anunciar aos inimigos a guerra.

Ora, enquanto Bach era um “homem sério”, um cientista sereno a pesquisar a natureza e os mistérios dos sons cujos laboratórios foram as igrejas em as quais trabalhara, mas a mais-valia do que produzia não estava a serviço da catequese das almas ímpias mas a favor da correta solução das equações matemáticas; enquanto Mozart, garroteado pela tirania do pai, pressionado pelas exigência da mulher, sofrido e endividado e às vezes embebedado, isso nada obstante compôs música pura em que a beleza não está ligada à situações externas ou internas mas ao bom encadeamento e a eufonia dos sons e fraseados musicais; enquanto Beethoven bombardeava com acordes fortes e tempestuosos seus inimigos que eram todos que lhe cercavam, apostrofava contra a Natureza que lhe houvera sido mesquinha ao roubar-lhe o prazer de ouvir, e por isso rugia contra a burguesia bem-sucedida que se banqueteava em convescote enquanto ele, a um canto, solitário e desprezado, tocava sua música para sobreviver.

Ora, o que ouvimos hoje em nossos sistemas de reprodução do som não são as músicas desses gênios e sim o gosto exibicionista dos maestros. Veja, ainda ontem ouvi a Sinfonia nº 38 de Mozart, conhecida com “Praga”, ouvia-a em três gravações diferentes e em cada uma o maestro se exibia diferente. A interpretação do KV 504 (sinfonia nº 38) que mais apreciei foi do maestro Christopher Hogwood, com a “The Acatemy of Ancient Music”; seguida da interpretação do condutor Jaap Ter Linbden, com a orquestra “Mozart Akademie Amsterdam”, da coleção das Obras Complestas” editadas pela Brilliant Classic. A pior das interpretações inda que a mais “espetacular” foi a do DVD “A Mozart Gala”, com a Filarmônia de Viena conduzida pelo impetuoso e jovem maestro Daniel Harding.

É, gente, foi sensato o grande regente Bruno Walter que, quando completou quarenta anos de regência,  exclamou, satisfeito: “Agora já posso tocar Mozart”!

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