Mulher Maravilha: um novo paradigma para a mulher moderna

Compartilhe este conteúdo:

O filme Mulher Maravilha se inicia mostrando o mundo das Amazonas, na ilha de Themyscira, e como são criadas para serem guerreiras imbatíveis. Conhecemos a rainha Hipólita e sua pequena filha Diana, que se tornará a heroína da história. A Rainha narra a filha – que deseja se tornar uma guerreira – que as Amazonas foram criadas por Zeus para proteger os humanos contra a ira de Ares (deus da Guerra).

Na Mitologia Grega, as Amazonas eram integrantes de uma sociedade de mulheres guerreiras, que não permitiam a entrada dos homens e nem se casavam. Eram independente e lutavam com os homens que tentavam domina-las. Em algumas versões, elas eram proibidas de ter relações sexuais com os homens e esses eram proibidos de viver na comunidade amazona. Mas em outras versões- para preservar a raça–elas tinham relações sexuais com estrangeiros. Os meninos que nasciam destas relações eram, ou mortos, ou enviados ao pai; as meninas eram criadas pelas mães e treinadas em práticas agrícolas, e nas artes da guerra.

As amazonas aparecem em diversos mitos. Um dos mais famosos é um dos 12 trabalhos de Hércules, onde ele precisa roubar o cinturão da Rainha Hipólita. Nessa jornada, seu amigo Teseu sequestrou a irmã de Hipólita, Antíope, e essa morre em batalha contra suas compatriotas. Em vingança, por tentarem roubar o cinturão de Hipólita e por terem levado Antíope como refém, as Amazonas entram em guerra contra os gregos.

Na Mitologia, Hipólita e Antíope são filhas de Ares com a rainha Amazona Otrera. No filme, as irmãs, estão em guerra contra Ares, ou seja, elas estão em guerra com o Pai, por haverem sido reprimidas e esquecidas em uma ilha (no filme escondida por Zeus). O filme apresenta uma visão diferente da cultura patriarcal em relação ao mal. O mal entrou no mundo pelo masculino, em contraste com a cultura judaico – cristã, onde o mal entrou pela mulher. Essa talvez seja uma reação contrária a unilateralidade do patriarcado.

Contudo, no filme o mal também está presente na humanidade. O ser humano é um mosaico de opostos. Luz e sombra convivem em cada alma, e essa guerra interna é a marca do homem ocidental. A princesa Diana nasceu nessa ilha e foi treinada para ser uma guerreira desde criança. Diana é a grande heroína da história e traz uma imagem de feminino bastante valorizada nos dias atuais: o da mulher guerreira e independente.

As mulheres modernas se identificam com esse papel de guerreira e são treinadas desde novinhas a assumi-lo. Hoje a mulher tem sua carreira, cuida da casa, dos filhos e de si própria e cada vez mais desconfia do amor e do relacionamento. Mas ela também é a heroína, ou seja, ela irá restaurar a situação saudável da Psique (Von Franz, 2005).

O filme apresenta dois mundos bem distintos: o das Amazonas, escondido, matriarcal e com um ódio terrível dos homens e o dos humanos, em guerra e estritamente patriarcal. Diana tem como missão unir esses mundos. As Amazonas eram estritamente matriarcais, adoravam a deusa Ártemis – senhora da natureza e vida selvagem -, cultuavam a terra e eram agrícolas.

Como afirma Neumann (1995), o desenvolvimento da psicologia feminina no patriarcado está em oposição a Grande Mãe. Mas ele não deve levar a violentação da natureza feminina através do masculino, nem o feminino deve perder o contato com o Self feminino. O “aprisionamento no patriarcado” representa uma derrota diante da estabilidade matriarcal feminina, por isso a oposição das forças matriarcais forma uma oposição ao aprisionamento do feminino no patriarcado. Podemos ver a ação dessas forças de oposição nas Amazonas e seu ódio aos homens.

Essa força opositora pode parecer regressiva, mas existe nela um elemento positivo no desenvolvimento feminino. Diana é impulsionada por essa “regressão”. O ódio impulsionado pela sombra feminina leva a heroína a uma ampliação da personalidade. Seu nome vem da deusa romana equivalente a Ártemis. Deusa da Lua e da caça, Diana era uma caçadora vigorosa e indiferente ao amor. Portanto, vemos o desenvolvimento provindo do aspecto feminino do Self em uma ação “regressiva”.

Diana observa um avião das forças armadas caindo na ilha e resgata o capitão Steve Trevor. A ilha logo é invadida pelo grupo de alemães que o perseguia. Conhecendo Steve, Diana coloca em movimento as forças masculinas de sua natureza. Ela sai armada de uma espada com ele e passa a percorrer um caminho que se opõe a Grande Mãe. Com ele, Diana vai colocar em movimento as forças masculinas positivas, para então se apaixonar e abandonar toda a inflação que essas forças provocaram em si.

Diana como um ego ideal, mostra como o ego feminino empresta a força masculina positiva para então sucumbir (do ponto de vista do patriarcado) ao amor, assim como Psiquê no mito “fracassa” movida por amor a Eros. A heroína parte rumo ao encontro com Ares para mata-lo e acabar com a guerra, que está destruindo a humanidade. Nesse embate Diana irá se confrontar com o aspecto paterno terrível.

No processo de desenvolvimento psíquico, o confronto com os aspectos terríveis da uroboros materna e paterna são decisivos para a estruturação da personalidade. Diana usa a espada nesse confronto, ou seja, ela ainda se apropria dos aspectos masculinos da personalidade nesse embate. Mas ela realmente se descobre e atinge a realização ao abrir mão da espada.

Steve se sacrifica pilotando um bombardeiro. Ao presenciar a morte do amado – que se sacrifica pela humanidade – Diana acessa o amor e a compaixão, todos aspectos da coniuctio superior, que na alquimia é o objetivo máximo da opus e do processo de individuação (Edinger, 2006). Com esse confronto e com esse amor ela se descobre deusa e imortal, bem como descobre sua missão. Edinger (2006) comenta que a coniuctio superior, o Si – mesmo une e reconcilia os opostos, com isso o ego humano faz com que o Si – mesmo se manifeste. Mas esse sustentar os opostos equivale a uma paralisia que chega às raias de uma verdadeira crucificação.

Jung (1997) sobre a coniuctio diz:“(…) E uma imagem daquele que ama alguém e seu coração é ferido de amor. Assim Cristo foi ferido na Cruz pelo amor à Igreja. ” Ele cita Santo Agostinho: “Cristo caminha em frente como o esposo ao deixar seu aposento; como o presságio das núpcias, sai para o campo do mundo…chega ao leito nupcial da cruz e lá estabeleceu a união conjugal…e entregou-se em castigo no lugar da esposa…e uniu a si sua mulher por direito eterno. ”

Portanto, em Mulher Maravilha, vemos retratado simbolicamente o desenvolvimento feminino rumo a realização máxima do processo de individuação, que ocorre por meio do amor. Diana suporta o sofrimento em si própria e integra os aspectos positivos e negativos de forças arquetípicas. Ela une Logos e Eros em si e se torna um símbolo que pode espelhar o desenvolvimento da mulher moderna em seu processo de individuação.

REFERÊNCIAS: 

EDINGER, E.F. Anatomia da psique:O simbolismo alquímico na psicoterapia. São Paulo, Cultrix: 2006.

JUNG, C. G. O Desenvolvimento da Personalidade. Ed Vozes. Petrópolis, 1988.

JUNG, C.G. MysteriumConiuctionis. ed.Vozes. Petrópolis: 1997.

NEUMANN, E. Amor e Psique – Uma interpretação psicológica do conto de Apuléio. São Paulo, Cultrix: 1995.

VON FRANZ, M. L. A interpretação dos contos de fada. 5 ed.Paulus. São Paulo: 2005.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

MULHER MARAVILHA

Diretor: Patty Jenkins
Elenco: Gal Gadot, Chris Pine, Connie Nielsen, Robin Wright;
País: EUA
Ano: 2017
Classificação: 12

Compartilhe este conteúdo:

Manhã de setembro de uma Mulher Moderna

Compartilhe este conteúdo:

Alair acordou mais cedo do que o habitual naquela manhã de setembro. O escuro da noite adentrava sem cerimônia a pequena sala daquele apartamento suburbano. Abriu a janela, olhou para o céu e encontrou, atrás de uma nuvem perdida como um pensamento distante, um raio de sol que timidamente iniciava a pintura da manhã com seus tons vermelhos cor de aurora.

Seus olhos se acomodaram no infinito como se quisessem aspergir a essência da gênese no nascimento daquele dia. Voltou o olhar para o apartamento tão pequeno, no 10º andar. E, nessa imersão nas veredas do mundo, fizeram-lhe companhia todas as reminiscências do passado. Rememorou a antiga e imensa casa com os empregados aptos a servir sempre, dos carros na garagem, das viagens aprazíveis com a família, do conforto, bens materiais e prazeres ilimitados e algozes que o dinheiro podia comprar.

Abruptamente, ouviu o abrir da porta da sala anunciando a chegada da Tristeza, da Derrota e da Impotência. Fitou-as dentro dos olhos com tamanha intensidade de rejeição que somente conseguiu ouvir o elevador que descia com as companhias indesejadas. Não havia espaço na sua vida para elas.

O despertador do relógio de pulso foi quem lhe devolveu ao mundo real. Passou a dedilhar, como nas notas do violão, todos os tópicos da reunião de trabalho que lhe aguardava.Lembrou-se da frase que alguém lhe dissera, um dia, “O tempo consolida seu destino”. Alair se permitiu uma releitura mental e acrescentou “O tempo modifica o seu destino. Mas tão importante como lutar para mudar, é adaptar”. Esse pensamento lhe devolveu o sorriso.

Sentiu um cansaço aliviado como se tivesse lembrado da vida inteira. Essa Leveza acalmou seu coração. Então, começou o ritual, tomou o banho rápido de todos os dias, vestiu-se da forma rápida de todos os dias, organizou as pastas com os documentos de todos os dias. Porém, tudo mais rápido que o habitual. Afinal, dedicara muito tempo com os pensamentos naquele olhar pela janela.

Quando entrou no quarto, mergulhou na imensidão do negrume daqueles olhos, ainda sonolentos, que lhe receberam com um sorriso e um abraço. E perguntou com a docilidade que lhe era habitual.

– Tudo certo para a reunião, amor?

– Sim. Precisamos convencê-los a comprar. Tenho quase certeza de que o negócio será fechado – Alair respondeu com a sagacidade e competência tão peculiares.

– Acha que virá para o almoço? Estou pensando em fazer aquele escondidinho de carne que você tanto gosta – perguntou os olhos negros com ar de expectativa.

– Só se você prometer não salgar como da outra vez – Alair respondeu não contendo o sorriso que logo se transformou em uma sutil gargalhada.

Gargalharam juntos e, novamente, abraçaram-se como se quisessem fundir duas almas em um só corpo.

– Psiu! Cuidado para não acordar as crianças. Ainda é muito cedo para elas irem para a escola. Deixemos que elas durmam um pouco mais – sentenciou aqueles olhos que se tornavam mais negros quando se falava dos dois filhos.

–  Mal tive tempo de conversar com eles ontem à noite, o cansaço dilacerava meu corpo. Mas verifiquei os cadernos e as lições. Acho que a Duda está com dificuldade em interpretação de textos. Vou tomar a lição com ela hoje. Já fizemos um acordo – informou Alair com a determinação e cuidado que sempre tivera com sua prole.

–  Mas estão com boas notas. Quando vou deixá-los na escola sempre pergunto à professora sobre o rendimento deles nas aulas. Temos filhos inteligentes como você – disse os olhos negros com tom agradável, mas com ar de tristeza e culpa.

Alair, diante desta observação, tratou de enfatizar:

– São inteligentes como nós dois, seus pais. Já lhe disse que você não deve se menosprezar – e levantou para sair.

Mas antes de ir embora, Alair contemplou, novamente, com tanto carinho aqueles olhos tão negros e profundos que haviam aprisionado sua alma. Estava, indubitavelmente, diante do amor da sua vida. Aqueles cabelos emaranhados lhe atribuíam mais graça e beleza. E, nesse instante de encantamento, sentiu segurança para perguntar:

– Tem entrevista de emprego hoje? – com semblante de fingimento de que não se importava com a resposta.

– Tenho duas entrevistas. Marquei no horário em que as crianças estão na escola. Mas não se preocupe. Chego a Tempo de fazer o almoço – finalizou com um sorriso forçado.

Alair apressou-se com as palavras de conforto e incentivo:

– Vai dar certo. Confio em você. Tudo tem seu tempo. Com seu currículo as portas se abrirão, com certeza. Só não desanime. Isso jamais. Estamos juntos, lembra?

– Preciso ajudar nas despesas. O fato de só você trabalhar me incomoda tanto – disse os olhos negros com um pesar na voz.

Alair interrompeu essas palavras com um beijo deliciosamente inesperado. Era sua forma de dizer que estava tudo bem.

–  Agora preciso ir. O trânsito estará um caos daqui a uns minutos – afirmou Alair enquanto pegava sua pasta executiva.

–  Vai sair sem passar batom? – perguntou os olhos negros com ar de inquisição.

Foi quando Alair percebeu que o beijo dado no marido havia deixado seus lábios sem cor.

–  Você me desconcentra – disse Alair em meio a um novo e rápido beijo dado naqueles olhos negros a quem ela dedicara sua vida.

–  Você é linda de qualquer jeito, o batom é só um detalhe – disse o marido com os olhos mais negros e apaixonados.

Alair passou o batom vermelho e avassalador, não sabendo se era para combinar com a echarpe escarlate que usava ou se para dar mais vigor e coragem à sua luta diária de Mulher Moderna que trabalha fora, provém o sustento da família e não se intimida ou se sente desmerecida pelo fato do marido ficar cuidando dos filhos e da casa. Afinal, como disse nossa protagonista “O tempo modifica nossos destinos, é preciso adaptação à nova realidade”.

A Modernidade exige mudanças de posturas e comportamentos, mas sobretudo, aceitação do “novo”. Na vida das MULHERES MODERNAS não há espaço para o preconceito, nem para limitações. Como já enfatizei, em outra crônica, Mulheres Modernas não nascem de contos de fadas. Somos Guerreiras do Cotidiano. Mas nem por isso, perdemos nossa beleza, sensibilidade e essência de ser MULHER.

Compartilhe este conteúdo:

Franz Anton Mesmer – a Hipnose e a Psicologia

Compartilhe este conteúdo:

As histórias e estórias sobre a hipnose e sua relação com a “terapêutica pela fala”, e portanto com a Psicologia, são controversas. Giram em torno do incômodo da Psicologia, no uso da hipnose, de ficar a meio caminho das ciências duras, aquelas que supostamente possuem confiabilidade. (NEUBERN, 2006)

A hipnose surgiu no mesmo contexto do surgimento da ciência positivista e foi já de início considerada como um método menos científico uma vez que se constituía pela influência, que dependia (em seu início) das características do hipnotizador, o que se contrapunha e que se contrapõe ao pilar da neutralidade que sustenta a ciência dura e pressupõe (por vezes prega) aassepsia na relação entre quem aplica a ciência e quem a recebe, na posição de paciente e-ou sujeito experimental. (NEUBERN, 2006)

Raymond E. Fancher (1996) faz um apurado estudo histórico acerca da história da hipnose sobre o qual faço um pequeno resumo, apontando os fatos mais importantes com a tentativa de reconstruir, mesmo que en passant, a trajetória temporal entre os primórdios da hipnose e o seu uso na psicanálise por Freud e na Psicologia, por variados atores. Apenas como nota de esclarecimento, reconhece-se a importância da psicanálise como movimento instituinte da Psicologia Moderna, não legando-a, contudo, papel central em tal instituição.

Para Fancher, a hipnose, no mundo moderno, inicia-se juntamente à figura de Franz  Anton Mesmer. No ano de 1775, o príncipe da Bavaria constitui uma comissão para investigar as ações de exorcismo do padre Johann Joseph Grassner (1727 – 1779). Grassner fazia rituais de exorcismo para curar pessoas e, quando suas ações não surtiam efeitos, ele encaminhava o moribundo a um médico. Em seu tempo, o padre gerou polêmicas, tanto dentro quanto fora da Igreja. Franz Anton Mesmer fez parte da referida comissão e tentou convencê-la de que as ações de Grassner tinham validade, explicando-as com base em sua teoria acerca do magnetismo animal. Sua tentativa não salvou o padre da condenação.

 

Johann Joseph Gassner. Fonte: https://goo.gl/YmCEYz

Franz Anton Mesmer. Fonte: https://goo.gl/yFJo9R

Mesmer havia defendido o seu doutorado em 1766, na Universidade de Viena, com 32 anos, sob o título “Da influência dos planetas sobre o corpo humano”. Em sua tese, nomeava de “magnetismo animal” à força existente no relacionar-se da matéria com o cosmos sendo, tal força, sujeita à manipulação humana por meio, dentre outros, de imãs.

Em 1773, Mesmer começou a tratar Francisca Oesterlin a qual sofria convulsões, espasmos de vômitos, inflamações intestinais, dificuldades para beber água, dores de dente e ouvido, alucinações, cegueira temporária, sensações de sufocamento e paralisias, conjunto de sintomas que foi chamado por Mesmer de “febre histérica”. Ele iniciou um tratamento à base do uso de imãs no corpo de Francisca a qual entrava em um estado de crise convulsiva para, depois, aliviar-se de seus sintomas, temporariamente. A repetição do tratamento por diversas vezes parece ter curado a mulher.

Mesmer fez o mesmo com a garota Maria-Theresia Paradis, pianista cega desde os três anos. A verdade sobre esse caso parece não existir, mas pesquisadores indicam que, pelo menos temporariamente, Mesmer conseguiu curar a cegueira da menina e que, certamente, foi o caso que o estimulou a sair de Viena para Paris, pois, em seu desenvolvimento, foi acusado de charlatão.

Na França, Mesmer fez diversos tratamentos. Aprimorou sua técnica, fazendo tratamento coletivos em torno de um tubo onde supostamente havia fluido magnético com capacidade de curar. Mesmer tocava sua “glass harmônica” (instrumento inventado por Benjamin Franklin) numa outra sala, enquanto seus pacientes ficavam de mãos dadas em torno do tubo. Após criar uma mística, ele entrava com seu roupão lilás e tocava no corpo dos pacientes com o dedo. Alguns entravam em estados convulsivos e um deles, normalmente o que apresentava a “maior” crise, era levado a um quarto reservado, o “quarto da crise”, recebendo tratamento especial de Mesmer. Pelo menos é assim como nos conta Fancher (1996).

O tubo e as sessões de Mesmer. Fonte: https://goo.gl/PYSz4R

 

Desenho da Glass Harmônica. Fonte: https://goo.gl/pbo35K

 

O relato acima parece mais uma caricatura. Se caricaturizado ou não, de qualquer maneira, o rei da França, em 1784, criou uma comissão para investigar os trabalhos de Mesmer. A comissão foi composta por, dentre outros, Benjamin Franklin (o criador da harmônica que Mesmer tocava com maestria), Joseph Guillotin (que sugeriu, no período da Revolução Francesa, o uso da guilhotina como forma de execução para as penas de morte) e Antoine Lavoisier (que perdeu a cabeça na guilhotina). (Notem como os destinos desses personagens selaram-se de maneira curiosa! – magnetismo?)

Benjamin Franklin
http://www.explicatorium.com/Benjamin-Franklin.php

 

Antoine Laurent Lavoisier. Fonte: https://goo.gl/T9U8QW

 

Joseph-Ignace Guillotin. Fonte: https://goo.gl/scZ4QM

Os membros da comissão participaram das sessões de Mesmer e concluíram que, de fato, os pacientes sofriam efeitos (de cura inclusive), mas que tais efeitos eram decorrentes do poder de sugestionabilidade criado pelo contexto e por Mesmer, ao invés do suposto magnetismo animal, como apregoado pelo médico vienense. A comissão desacreditou, portanto, Franz Anton, mas seus discípulos continuaram a exercer a “curas pelo magnetismo”.

Um de seus discípulos, Amand Marie Jacques de Chastenet, conseguiu levar um de seus pacientes a um estado de “crise” que, diferente das convulsões precipitadas nas sessões mesmerianas, caracterizava-se por uma paz, um transe em que a pessoa dormia, mas continuava a responder aos comandos do magnetizador. Chastenet chamou o estado de “sonambulismo artificial”.

John Elliotsen (1791-1868), médico no Hospital da Universidade de Londres, tentou trabalhar com o mesmerismo como meio anestésico (não como discípulo, mas resgatando o quase esquecido legado de Mesmer). John não recebeu apoio da Universidade e demitiu-se como maneira de protestar. Em 1843, fundou o jornal Zoist sobre o tema “fisiologia cerebral, mesmerismo e suas aplicações ao bem-estar humano”. Foi chamado de profissional “pária” pelos conselhos médicos da época.

Em 1842, W. S. Ward, médico inglês, afirmou ter feito uma cirurgia de amputação de perna usando o mesmerismo. A Sociedade Real de Medicina posicionou-se incrédula diante da afirmação de Ward.

O escocês James Esdaile foi o primeiro a usar o mesmerismo em larga escala e de maneira experimental, tabulando os dados. Operou mais de 300 pacientes no final da década de 1840. A maior parte dessas cirurgias foi de retirada de tumores no escroto, cirurgia considerada de risco para época, com um índice de mortalidade de 50%. De acordo com os dados de Esdaile, ele conseguiu diminuir o índice para 5% com o uso do mesmerismo. Também foi desacreditado.

Somente após os estudos do escocês James Braid foi que o mesmerismo conseguiu, novamente, um lugar dentro do meio científico. Braid estudou a insensibilidade à dor induzidas pelo mesmerismo e deu créditos à técnica após perceber que a pupila dos pacientes, em estado de transe, continuavam dilatadas, mesmo após forçar a abertura dos olhos do paciente. Braid, em seus estudos, associou os estados de transe à sugestionabilidade do paciente e não a um suposto fluido manipulado pelo magnetizador. Isso permitiu dar mais créditos à técnica uma vez que resolvia o problema da influência do magnetizador, fator importante numa ciência que se construía sobre o pilar da imparcialidade. Além disso, o que antes chamavam de mesmerismo, Braid chamou de neurohipnologia: hypnos, palavra grega que significa “dormir” e neûron, palavra grega que significa nervos. Hoje, a técnica é conhecida por “hipnose”.

 

 

De Braid a Freud, a hipnose desenvolveu-se em meio às divergências entre o que foi chamado de a “Escola de Nancy” (referente ao conjunto dos trabalhos e escritos de Auguste Ambroise Lièbeault [1823 – 1904] em torno da hipnose e de seus sucessores, como Hyppolite Bernheim) e a “Escola de Sapetrière”.

Hyppolite de Bernheim, de acordo com os estudos de Neubern (2006), buscou a junção da comunicação humana com os mecanismos cerebrais que fossem capazes de transformar a sugestão em processo de cura, de melhora, de soluções e etc. Dessa forma, colocava como ponto central da terapêutica psicológica a relação estabelecida entre o “cuidador” e seu paciente e o papel ativo do paciente em seu processo de cura. Sobre o projeto de Bernhein, Neubern afirma: “Natureza e espírito estavam novamente sendo conciliados dentro de um projeto científico” (NEUBERN, 2006, p.349).

Por outro lado, na Escola de Salpetrière, destacou-se os trabalhos de Jean Baptiste Charcot que, contrariando a concepção da escola de Nancy, encarava a hipnose como um sintoma da histeria e não como uma característica humana a ser usada no processo terapêutico.

Foi com Charcot que Freud, nos anos de 1885 e 1886, desenvolveu estudos e concepçoes acerca do que no meio acadêmico chamava-se de histeria e sobre o uso do método hipnótico em seu tratamento. Fulgêncio (2002) apresenta um relato sobre a passagem de Freud em Paris. Ressalta-se que Freud recebeu influência tanto de Charcot quanto de autores da Escola de Nancy, como Hippolyte Bernheim (foi professor de Freud) e, assim, pôde, pelo menos de início, usar e desenvolver o método hipnótico, mesmo considerando que sua eficácia estava aquém de uma clínica resolutiva.

Neubern (2006) mostra que a hipnose foi abandonada por Freud e que sobre ela pairou uma espécie de maldição, de silenciamento. Aliás, a história da hipnose, como se vê, é polêmica desde seu início, desde os trabalhos do padre Grassner e da comissão da qual Mesmer participou. O distanciamento da psicanálise com relação à hipnose, deveu-se ao fato de Freud e demais criadores da psicanálise buscarem maior credibilidade uma vez que a hipnose possuía e ainda possui relações com o mesmerismo, descreditada cientificamente. Contudo, Neubern conclui que a hipnose, no desenvolvimento da psicanálise, e portanto da Psicologia (mesmo que diferentes, modificantes uma à outra), não foi apenas abandonada, mas foi também censurada. O que nos leva a questões que vão além da validação ou não do conhecimento, pois abrangem uma Ética do pensar.

Levando em consideração o percurso histórico da hipnose e sua estreita relação com o nascimento e o desenvolvimento da Psicologia chamada Moderna, torna-se importante aprofundar os estudos acerca da história dessa relação, recontá-la nas muitas maneiras possíveis. O questionamento acerca da história é um dos motores do desenvolvimento da Psicologia. Neubern (2006) nos deixa uma questão que considero fundante e, por isso, a deixo aqui como encerramento desse texto: como uma ciência, como a Psicologia pode se desenvolver sem poder voltar às suas origens?

Referências:

FANCHER, Raymond E. Early hipnotists and the Psuchology of social influence. In: Pioneers of Psychology, Third Edition, W.W.Norton & Company, Inc. NY – London. 1996.

FULGÊNCIO, Leopoldo. A compreensão freudiana da histeria como um reformulação especulativa das psicopatologias. In: Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, ano V, n. 4, dez/2002.

NEUBERN, Maurício da Silva. Hipnose e Psicologia Clínica – retomando a história não contada. In:Psicologia: Reflexão e Crítica 19(3) – p.346-354, 2006.

Compartilhe este conteúdo:

“O Pulo da Gata” no Relacionamento de uma Mulher Moderna

Compartilhe este conteúdo:

Inicio este texto rememorando a época romântica retratada na literatura brasileira. Período em que as moças, donzelas, senhoritas e senhoras eram cortejadas nos saraus, tão à moda europeia. Época em que as mulheres esperavam ser lisonjeadas pelos homens.  E se, acaso, quisessem saber alguma informação a mais sobre seu futuro pretendente, a sutileza, a discrição e a timidez da maioria das mulheres, daquela época, impediam-nas de tomar qualquer atitude de aproximação. Afinal, a tradição ratifica que cabe ao homem tomar a iniciativa nos relacionamentos. E as Mulheres?  Resta esperar.

O difícil é fazer as Mulheres Modernas aceitarem essa passividade tradicional no que se refere aos relacionamentos.

 

 

Esta crônica retrata, exatamente, esse “pulo da gata” nos relacionamentos dessas adoráveis Mulheres Modernas. Vamos aos fatos!

Duas amigas supermodernas estão ouvindo uma boa música, tomando um bom vinho e conversando sobre as delicadezas e imprevistos da vida. De repente, senta-se, à mesa ao lado, um homem grisalho de um charme envolventemente encantador (Interessante! Homens com cabelos grisalhos simbolizam charme, maturidade e desafio).

As amigas se entreolharam discretamente e se inicia o que Vasco da Gama não fez no caminho para as Índias, o reconhecimento do território. Primeiro, olha-se para as mãos da conquista iminente. Mão esquerda, primeiro, nenhuma aliança à vista (Posso ouvir ainda o suspiro de alívio das duas amigas) Segundo passo, observa-se a mão direita, nenhuma aliança, nem de compromisso. Ufaaa! (Agora osuspiro foi tão longo como o que daremos antes da passagem para eternidade)

E o homem grisalho parecia muito disposto a fazer novas amizades. Mas… a amiga morena reflete de súbito “E se ele estiver esperando alguém?”. A outra amiga analisa a situação com frieza “Não está esperando ninguém, porque homens com essa elegância e educação buscam a mulher em casa. Jamais a deixam chegar ao local do encontro sozinhas”. (Convenhamos que há razão nesse pensamento.)

Se essa história continuasse no cenário romântico do século XIX, as mulheres ficariam esperando uma iniciativa do sexo oposto. Se bem que, naquela época, essa história seria quase inverossímil, pois duas mulheres decentes nunca estariam sozinhas ouvindo música e tomando vinho em uma noite de céu cinza. Contudo, estamos no século XXI, retratando a vida de Mulheres Modernas. Logo, esse fato, na contemporaneidade, é perfeitamente possível.

Mulher Moderna não espera. Quando quer saber algo sobre alguém ou alguma coisa, simplesmente, ela descobre. Afinal, sua inteligência e senso de percepção são impressionantes. Então, quando o garçom se aproxima e pergunta “Boa noite, Dr. Eduardo! O de sempre?” e o homem grisalho responde com um sorriso discreto nos lábios “Sim e com bastante gelo”, as amigas iniciam o processo de dossiê informativo acerca daquele homem que já não é tão desconhecido.

Primeiro, se ele falou com o garçom, teoricamente, deve ser uma pessoa que mora na cidade ou que a visita com muita frequência. Segunda constatação, se ele pediu gelo, realmente é um homem sofisticado, pela preferência por um possível destilado.

Antigamente, para se saber mais sobre a vida de qualquer pessoa, era preciso recorrer a páginas e páginas de documentos, às vezes, secretos. Hoje, tudo mudou. Se possuímos o primeiro nome da pessoa, não é preciso mais percorrer os corredores soturnos do desconhecido, basta pegar o celular e acessar o fabuloso FACEBOOK.

Foi exatamente o que as amigas fizeram. Acessaram o face, digitaram EDUARDO PALMAS e se iniciou a busca. Acontece que, simplesmente, foram localizados infinitos “Eduardos de Palmas”. Contudo, mulher moderna é persistente e organizada. Por isso, a amiga morena determinou “Eu procuro os trinta primeiros e você, os outros trinta. E assim sucessivamente.”

Calma, leitor! Mulher Moderna sabe o que faz. Então, no décimo “Eduardo de Palmas”, lá estava o grisalho sedutor. Foi inevitável o sorriso de conquista e o brinde da vitória. (Acredito que as amigas se sentiram como Vasco da Gama chegando às Índias) O navegador português e sua esquadra navegaram oceanos desconhecidos. Elas, as mulheres modernas precisaram também navegar, só que NAVEGARAM NA INTERNET para alcançar seu objetivo.

Acesso ilimitado ao facebook da conquista permitiram significativas descobertas. No facebook dele não constava a informação RELACIONAMENTO SÉRIO, logo se torna bem mais provável que ele, realmente, não seja casado. Por isso, descartou-se a ideia de ele estar escondendo a aliança no bolso.

Os amigos dele deixavam postagem, no face, do tipo “Boa pescaria, amigão”. Logo, deduz-se que ele é bem relacionado e tem amigos de longa data. Observou-se, também, que ele curte páginas de rock (A amiga morena quase morreu de felicidade com esta constatação) E, o mais importante, várias mulheres curtem as publicações dele, mas ele curte muito pouco as publicações das outras mulheres. O que isso significa? Que ele não é empolgado e, sim, discreto. Encontrou-se até o face de seu último relacionamento. Como? Pela quantidade de curtidas que os dois trocavam em suas postagens. E, com o tempo, as curtidas foram ficando escassas, até desaparecerem.

E, lá em cima no seu perfil estava estampado o seu sobrenome. E agora? Continuar navegando, só que em um mar chamado Google. Pesquisando nome e sobrenome descobre-se que o Eduardo é engenheiro civil, mora na cidade, lote, alameda e…. até o número do telefone. Santa internet!

E tudo isso descoberto, assim, na frente dele, em minutos e com a maior discrição. Mulheres Modernas e Tecnologia – associação perfeita.

Agora, deixa-se a internet de lado e se recorre à tradicional conquista “Olhos nos olhos”. Ah! Qual das amigas? A morena, é claro!

Previsivelmente, alguns olhares depois, Eduardo se levanta e se dirige até á mesa das amigas e pergunta “Posso lhes fazer companhia”. Ouviu-se um discreto “SIM”.

A amiga morena iniciou a conversa falando sobre o PAC- Plano de Aceleração do Crescimento e o desenvolvimento da área de engenharia.

Quando ele perguntou qualo seu esporte preferido, ela respondeu “Não tenho nenhum específico, mas adoraria saber um pouco mais sobre PESCARIA”.

Eduardo sorriu diante de tanta “coincidência”…..

E o final? Sabedoria, segurança e discrição Mulher Moderna tem em excesso. Logo, o final dessa crônica é tão previsível que deixo para vocês, leitores, a finalização desta narrativa.

 

 

Afinal, crônica sobre MULHER MODERNA surpreende, inclusive, na finalização do texto. Mulheres Modernas e seus encantos, enigmas e surpresas, realmente, dignas desse “Pulo da Gata” Porque ter iniciativa inteligente é sinônimo de Mulher Moderna.

Compartilhe este conteúdo:

Mulheres Modernas – O preço da modernidade

Compartilhe este conteúdo:

O sonho de ser uma mulher moderna e independente remete à minha infância. Naquele tempo, a ingenuidade me fazia acreditar que a vida de mulher moderna e independente seria como naquelas típicas cenas de filme. Lembram? A mulher chegando à sua bela casa branca com janelas azuis, descendo do seu lindo carro, usando um vestido vermelho com echarpee botas azul turquesa, carregando nas mãos um buquê de rosas vermelhas que ela acabara de comprar na floricultura. Então, ela adentraria na casa, toda mobiliada com tons verde piscina que contrastavam com o vermelho das almofadas de seda, daria comida para o peixe encarnado de cauda azul que nadava tranquilamente no aquário, arrumaria o buquê de rosas no vaso da sala. E iria para o quarto arrumar suas malas, pois, como era final de semana, ela iria viajar, como de costume, para um lugar bem exótico e encantador. Desta vez, iria fazer a trilha Embu das Artes.

Que sonho! Mas…PARE TUDO, caro leitor!

Para iniciar esta crônica, aproprio-me da letra da música do Kid Abelha que diz

A vida que me ensinaram como uma vida normal
Tinha trabalho, dinheiro, família, filhos e tal
Era tudo tão perfeito, se tudo fosse só isso
Mas isso é menos do que tudo
É menos do que eu preciso
Agora, você vai embora
E eu não sei o que fazer
Ninguém me ensinou na escola
Ninguém vai me responder

O fato é que a vida real difere um pouco da idealização dos filmes e contos de fadas. Afinal, como diz a letra da música “Ninguém me ensinou na escola” que a vida de Mulher Moderna e Independente não se resume ao enredo previsível com finais felizes. Essa é a temática deste texto, refletir acerca do preço que se paga pela liberdade e independência na Modernidade.

Primeiramente, fomos educadas a “brincar de casinha”, fazer “comidinha”, ser “comportadinha” e, leitores, acrescentem os outros “inhas” que julgarem necessários. Então, crescemos pensando em “cozinha”, “modinha” para andar “arrumadinha” , ser “prendadinha” para morrer “casadinha” na vida “lindinha” com a sua “prolinha” e ser “amadinha”. Como diz a letra da música “família , filhos e tal”. Mas, e se “tudo que nos ensinaram como uma vida normal” não acontecer? Vou perguntar com rima clichê “O que fazer”?

Por exemplo, imaginem que, abruptamente, você precisa aprender a dirigir e cuidar sozinha do seu carro. Para algumas mulheres, entende-se que para o pleno funcionamento do carro se precisa cumprir uma regra única e básica: SOMENTE ABASTECER O CARRO.

 

 

Então, um belo dia, você chega feliz ao posto de gasolina para ABASTECER o carro, quando é interpelada pelo gentil frentista:

– Seu carro precisa trocar o óleo – pronuncia com ar preocupado.

– Como você sabe disso? – retruco com ar de desconfiança.

– Porque estou vendo nesse papelzinho colado aqui no seu vidro- responde com tom de afirmação.

–  Como assim trocar o óleo?  Comprei esse carro há pouco mais de um ano. Já precisa trocar o óleo? – pergunto com ar de surpresa. (Para ser bem sincera, nem sabia de que óleo ele estava falando. Só conseguia lembrar do óleo da cozinha)

– Sim, seu carro já rodou mais de 3.000 km com óleo vencido. Há quanto tempo fez a última revisão? – perguntou com interesse sincero.

Lembrei que nunca me preocupei com isso, até porque nem sabia que tinha que fazer revisão, mas fiquei com vergonha de dizer, por isso preferi mentir:

–  Faz tempo- respondi desviando o olhar.

Então, senti meus ouvidos serem metralhados por palavras que “não aprendi na escola” como seu carro precisa“trocar o filtro de ar, filtro de óleo, olhar o bico da bateria, a pastilha de freio, balancear e alinhar os pneus, verificar ser tem água no tanque”( Meu Deus! Sempre achei que no tanque só cabia gasolina) e fazer “o rodízio dos pneus” do carro ( até então, o único rodízio que eu conhecia era o da churrascaria)

Então, fui convidada a responder uma das perguntas mais difíceis de toda a minha vida:

– O estepe do carro está em boas condições?- perguntou o frentista que me olhava com ar de quase súplica.

– Misericórdia! Como ele pode me perguntar isso?- pensei. E o pior, como eu poderia responder se eu nem sabia onde ficava o estepe! Calma, leitor! O motor do carro eu sabia onde ficava. Espero que essa informação melhore sua avaliação sobre minha pessoa.

Saí do posto de gasolina imaginando que meu carro estava depredado, arruinado, acabado, inutilizado. Por isso, entrei no primeiro lugar que vi escrito “Troca de óleo e balanceamento de carro”.

Quando o funcionário perguntou:

– Pra trocar tudo moça? – com ar de pontualidade.

– Tudo o que for preciso – respondi com ar de desespero.

Quando ele me devolveu o carro com o orçamento exorbitante, imaginei que ele deveria ter trocado até o motor do carro. Pensei em contestar, mas reivindicar o que você desconhece é missão impossível. Por isso, paguei o exigido e voltei para casa com a sensação de que eu deveria ter frequentado junto com as aulas de arte culinária, aulas de mecânica para carros.

Cheguei à minha casa (que não tem janelas azuis e nem peixe no aquário) e lembrei que mulher moderna precisa lavar roupa ( Engraçado! Nos filmes, as mulheres modernas nunca lavavam roupas. Será que lavavam sempre na lavanderia?)

Quando fui colocar as roupas na máquina, a mangueira estoura e, simplesmente, o apartamento é inundado. Não sei você, caro leitor, mas comigo as coisas ruins nunca vem sozinhas, elas sempre acontecem acompanhadas.

Então, ligo para a assistência técnica, ninguém atende. Mas como poderiam atender se o relógio já marcava18h30min. Imediatamente, optei pelo plano B, liguei para uma amiga e ouvi o que faltava para completar essa cena desoladora “Ligue para o Disk- Marido. Essas coisas, só homem resolve”.

Desliguei o telefone, permaneci em silêncio durante uns minutos com tempo de eternidade. Questionei-me do porquê de, no término do meu último relacionamento, eu não haver determinado como obrigação para a separação, que ele deixasse um MANUAL DE INSTRUÇÕES de sobrevivência na selva. Mas nem tive tempo de pensar mais comprido, pois lembrei que posso ser uma mulher que não entende muito de mecânica de carros e encanação. Mas, ainda assim,sou uma mulher  inteligente.

Por isso, olhei para aquela máquina de lavar e proferi com voz de guerreira da modernidade “Se Joana D’arc, uma mulher, conduziu todo um exército francês, eu, uma MULHER MODERNA e INTELIGENTE, também consertarei essa máquina.”

Dito isto, ordenei a meus neurônios que fizessem fila para que eu pensasse com mais organização e precisão, fiz uma acoplação à mangueira e….. a máquina voltou a funcionar, desta vez sem inundar o apartamento.

Descansei o sorriso no Olimpo dos VENCEDORES. Constatei que, realmente, a vida de Mulher Independente precisa ser aprendida no cotidiano. Cada dia nos ensina algo novo que “não aprendemos na escola”, fatos que fogem do ”padrão normal”. Mas, nem por isso, deixamos de nos encantar com os aprendizados e desafios dessa VIDA DE MULHER MODERNA!

Afinal, quem disse que é preciso ser fácil para ser feliz e se viver? Por isso, continuamos dispostas e seduzidas a pagar o preço da Modernidade.

Compartilhe este conteúdo:

Mulheres Modernas: Relacionamento Virtual, por que não?

Compartilhe este conteúdo:

Sempre afirmei que Mulheres Modernas não se limitam a estereótipos. Elas são vanguardistas na sua essência, pois quebram regras, possuem atitude e adoram desafios, principalmente no âmbito do desconhecido.  Encantam-se pelo  mistério.

Por isso, o fascínio pelo virtual seja  um tempero a mais na vida dessas mulheres. Não porque sejam carentes ou irresponsáveis, contudo a  sedução pelo enigmático mundo in ausência representa convite desafiador. E convenhamos que, na contemporaneidade, não acontecem  mais  os saraus românticos retratados nas obras de José de Alencar. Ocasiões em que havia o cortejo às damas e as sutis investidas românticas, na maioria das vezes, arranjadas pelas famílias dos enamorados.

Mulheres Modernas adoram ser cortejadas, mas não se privam de ir à luta da conquista, independente do ambiente ser real ou virtual. Diante desta afirmativa, os relacionamentos virtuais são temática obrigatória nesta série MULHERES MODERNAS. Vamos à narrativa.

Laura sentia-se como um cometa em rota de colisão com o desconhecido. Seus passos se faziam errantes no caminhar da vida que se transfigurava em um túnel escuro e sombrio. Buscava uma saída, uma luz que dissipasse aquele  odor obscuro que exalava dos sentimentos que sufocavam sua alma. As lembranças do seu passado ainda sangravam com o pulsar de um coração destroçado.

Buscava alguém que lhe fizesse sorrir, não queria amar alucinadamente como outrora, bastava voltar a sorrir. Então, a lembrança da existência das  redes de relacionamento virtual surgiu como uma esperançosa possibilidade. E pensou  “ Por que não?

Caminhou lentamente  para o computador como quem dirige em uma rua escura a procura de um endereço de alguém interessante, porém sem saber  nem o nome da rua e nem o número da casa do procurado. A única certeza que tinha era que estava ali sua possibilidade de voltar a ver graça na vida. Por isso considerou que  importante era não desistir.

Então, viu abrir, diante dos seus olhos cansados, uma janela inusitada que dava entrada para uma sala habitada por pessoas desconhecidas. Eram vários nomes, várias falas. Surgiu o medo “ E se alguém a conhecesse?”.  Por isso, ficou algum tempo parada em frente à janela aberta do computador, somente ouvindo as conversas tão entusiasticamente proferidas pelos presentes. Ouvia, também, o clamor de sua alma suscitando a necessidade de voltar a viver. Sentiu que a vida pulsava naquela sala de bate-papo. Foi quando, em um ímpeto de coragem, pulou a janela e entrou na sala. Ficou, a princípio, no cantinho, sentada timidamente, sem conversar com ninguém.

De repente, sentiu uma aproximação que lhe causou espanto. Leu uma mensagem que dizia em tom que lhe pareceu tão agradável “Olá! Boa noite!” Tc de Palmas?”. Lendo isso, seu coração disparou. Hesitou se daria a resposta . Mas, decidiu que a Contenção e o Medo do novo tinham ficado do lado de fora da sala. Ali, ela estava livre e segura.

 As primeiras palavras proferidas suscitaram uma imensa curiosidade em conhecer aquela pessoa tão conflituosamente tentadora com quem ela passara a conversar virtualmente. Suas primeiras impressões foram tão antagônicas. Ela falava de sentimentos e ele, da razão. Ela discorria sobre sonhos, ele, sobre a concretude da vida. Ela sentia o sangue voltar a correr na direção do seu coração; enquanto ele se mostrava impassível como uma rocha imperiosa que desafiava o mar em noite de fúria. Acredito que, definitivamente, foi essa representação de majestosa fortaleza alicerçada na razão que lhe seduziu e a aprisionou. Afinal, eram o Côncavo e Convexo. Um desafio para a previsibilidade da sua rotina existencial. Não sabia ao certo o porquê, mas tinha a certeza de que precisava vê-lo pessoalmente.

Por isso, quando leu escrito em um cantinho da janela “Vou a Palmas amanhã. Podemos conversar um pouco mais?”, Laura nem percebeu quando suas mãos, involuntariamente, escreveram “Quando chegar, ligue-me para esse número”. Nesse momento, olhou para trás e sentiu que a janela estava se fechando, despediu-se e saiu correndo para pular de volta ao túnel da sua vida que, por uma incrível manobra do destino, pareceu menos escuro e sombrio naquela noite.

Previsivelmente, no outro dia, quando Laura o viu pessoalmente, sua timidez a abraçava tão forte que ela mal conseguia respirar. Isso impulsionava seu coração a bater tão forte, como há muito tempo ela não sentia. Porém, sua instabilidade emocional era contrastada com o equilíbrio que emanava daquele homem tão centrado e racional.  A insegurança de Laura desviava seus olhos somente para o prato com as panquecas bolonhesas cuidadosamente arrumadas sobre a mesa e ela passou a concentrar suas observações sobre aquela delícia da culinária. Observando seu interesse, ele lhe esclareceu que ele era de descendência italiana; as panquecas, não. Essa informação tão descontraída  incitou nossa protagonista a esboçar um sorriso. Foi nesse momento que Laura olhou atentamente  para o rosto daquele homem que saia do mundo virtual e se fazia tão real diante dela com sua presença.

E como ela ficou encantada com o seu estilo de mocinho dos filmes hollywoodianos. Aqueles cabelos para o lado lembraram-lhe dos desenhos do PETER PAN. Como ele era graciosamente encantador.

Como estavam próximos à praia, ele a convidou para um passeio no lago. Sua expressão era toda tão convidativa que Laura só conseguiu dizer “Sim”. Na praia, teve a visão impressionante de uma gôndola azul turquesa que lhes esperava ancorada em plena Praia da Graciosa. Só podia ser um sonho porque ela parecia voar, não sentia a areia debaixo dos meus pés. Só, então, percebeu que ele a carregava nos braços. Sentiu a proximidade do  corpo dele como uma descida em uma montanha russa, uma sensação perigosamente alucinante. Ele direcionava a gôndola como um maestro conduz a sinfonia de desejos das noites das paixões mais avassaladoras. Tocou sua mão e lhe convidou para dançar, ali, no limite entre a mansidão do rio e a infinitude do céu. Seus braços  enlaçaram levemente sua cintura, permitindo com que, em determinado momento, tornassem-se um só corpo, em um êxtase de loucura que lhe fez delirar, pois Laura sentiu que tocava as estrelas. Descansou seu corpo nos braços sedutores dos prazeres proibidos.

Percebeu, nesse momento, que a gôndola ancorava novamente na praia. Um olhar com tempo de eternidade foi a sua despedida. Não houve promessas, planos para o futuro ou confissões de amantes. Contudo, Laura descobriu que há relações que são indizíveis por palavras. Vivenciadas somente pelos mistérios do coração. Talvez seja por isso que todas as vezes que ela lhe envia  mensagens por meio de janelas tão distantes, ela sente que está em Vênus e ele, em MARTE. Contudo se orbitam no mesmo espaço, seus futuros encontros são inevitáveis Embora vivam a anos luz de distância.

Para quem está triste com o final dessa história, finalizo com os versos de Vinícius de Moraes “que seja eterno enquanto dure”. A mulher moderna importa-se com o tempo, porém mais relevante é a intensidade dos momentos vividos. Frieza? Não! MODERNIDADE!

Compartilhe este conteúdo:

Páginas da vida de uma Mulher Moderna – O Jantar

Compartilhe este conteúdo:

O jantar estava marcado para as19h30min, mas é incrível como nunca consigo chegar no horário definido. A razão vem do fato de eu trabalhar manhã, tarde e noite. Para quem está escandalizado com essa informação, informo que amo o que faço e não sou a única no planeta nessa situação. Embora eu considere que, para algumas pessoas, às vezes pareço um ser de outra galáxia.

A respeito dessa afirmativa, para quem julga que sou exagerada, tirem suas próprias conclusões com a narrativa acerca desse jantar.

Recebi a mensagem no celular “Amiga, vc não vem?”. Então, constatei que já eram 21 horas. Respondi à mensagem, imediatamente, com o clichê “Estou chegando”. Quando uma mulher envia uma mensagem com essa informação, imagine que ela chegará daqui a uma hora, no mínimo. No nosso dicionário, os significados das expressões são um pouco diferentes do convencional.

Assim, cheguei,ao apartamento de minha amiga, 65 minutos depois. E ela me recebeu com aquele sorriso de compreensão pela “minha pontualidade”.

Então, imaginem que o jantar já ocorrera há séculos, que todo mundo já conversou e se enturmou. Ou seja, você chega exatamente nesse momento de plena harmonia entre os presentes. Ah! Eu falei que nesse jantar havia só mulheres? Não?! Acrescentem essa informação, por gentileza. Ela é primordial para o entendimento desta narrativa.

Seguiram-se as apresentações de praxe, sorrisos, apertos de mãos, abraços, elogios. Tudo tipicamente e maravilhosamente habitual nas relações gentilmente femininas.

Sentei à mesa, e passei a observar o assunto em questão. Percebi logo que todas falavam sobre filhos. Filhos na escola, filhos e o plano de saúde, filhos e os problemas do dia a dia, filhos, filhos, filhos… Enfim, o prazer de ter filhos. Foi o veredicto final.

Enquanto ouvia a tudo com uma atenção distante, permaneci em silêncio, sorrindo de vez em quando. Senti-me como alguém lendo um livro em japonês. Eu sabia que o assunto era interessante, mas, por não saber japonês, não entedia muita coisa do que estava escrito naquele livro. Por isso, eu sorria quando todas sorriam e ficava pensativa e preocupada quando todas assim se comportavam. É como seguir um trio elétrico fazendo as coreografias, sem entender, algumas vezes, o porquê de você estar fazendo aquilo.

Na realidade, eu torcia para que virassem logo a página daquele livro para falarmos de outro assunto. Quando a página do livro ia sendo virada. Eis a pergunta inevitável a mim direcionada:

– Você tem filhos?

Todas se voltam para mim abruptamente.

– Não! Respondo com um sorriso tranquilo nos lábios.

Sempre admiro as pessoas corajosas e foi a mais corajosa delas que me questionou:

– É casada?

– Também não! Respondi como o mesmo sorriso tranquilo.

– Mas já foi casada? Perguntaram com um certo desespero.

– Tive um relacionamento de 8 anos. E outros também bem longos – respondi com ar de justificativa.

– Ah! – responderam todas aliviadas.

Entendi esse “Ah!” como uma aceitação. Eu tive um relacionamento, logo eu era uma mulher solteira, sem filhos, mas que teve um relacionamento. Esse é um critério obrigatório a ser cumprido. Como um silogismo vital impregnado nas mentes femininas.Confesso que, diante desta constatação,tive vontade de ligar para o meu ex-namorado e agradecer: “Obrigada por termos tido um relacionamento. Sou aceita na sociedade por sua causa”. Mas foi uma ideia passageira, admito.

– Você não pensa em ter filhos? Insistiram com olhar de desafio.

– Estou tentando. Comecei criando uma planta. Depois crio um peixe. Em seguida, o cachorro. Se todos sobreviverem, começo a pensar na criança– respondi sem poder me conter. Foi automático. Mereço felicitações pela minha sinceridade.

– Nossa! Que diferente pensar assim– comentou-se com um ar de sutil descaso.

– Mas, a planta está viva ainda?- perguntaram com um ar de sincera curiosidade.

– Não, infelizmente! Morreu há dez dias. Viajei e a esqueci na sacada. Foram 15 dias de férias. Acho que ela morreu de saudades.

Espero que acreditem que, realmente, considero que a causa mortis da planta foi SAUDADES.

– Hum! Que triste! Suspiraram todas.

Minha amigaresolveu fazer uma intervenção naquele diálogo que caminhava para as lágrimas e sugeriu mudarmos de assunto. Então, começamos a falar sobre carros.

– Vamos trocar de carro. Meu marido está pensando em comprar um sedã com um mega porta-malas para acomodar melhor nossa bagagem quando formos viajar, principalmente agora que as crianças cresceram. Mas, estamos em dúvida entre tantos modelos de carro–informou uma das mulheres mais simpáticas, dentre todas as simpáticas que estavam no jantar.

– Também quero trocar de carro e confesso que é uma tarefa muito estressante mesmo–contribui com a conversa.

– Por qual modelo você quer trocar? –perguntaram com ar agradável.

– Estou em dúvida entre um Troller, Pajero ou um Jipe– respondi com entusiasmo.

– Nossa! Que exótico! – comentaram meio assustadas.

– Quero conhecer o Jalapão. Fazer trilhas. Conhecer o Brasil estilo OFF ROAD. Carpe Diem!!!! – sentenciei a máxima da minha vida.

Fez-se o silêncio das horas tardias, como citou Stanislaw Ponte Preta. Parecia que não falávamos a mesma língua. Porém, quem disse que a diversidade não tem seus encantos?

Despedimo-nos com alegria. Eu desejei a elas que seus filhos fossem muito felizes na escola, em casa, para toda a vida. Até dei dicas de bons colégios e excelentes cursos (disso, eu entendo!). Ah! E trocamos telefone para nos ajudarmos a escolher o melhor carro.

Em troca, todas desejaram que eu me saia melhor na segunda etapa da preparação para os filhos. Disseram que o melhor é criar um beta por conviverem melhor com a solidão. Fiquei pensativa com essa palavra “Solidão”.

Cada uma entrou no seu carro e fomos continuar vivendo nossas vidas. Elas com seus maridos, filhos, escola e carros sedã. Eu, com meus planos de conhecer a Europa como mochileira e pensando se realmente quero criar um peixe. Ou seja, cada qual feliz a sua maneira, vivendo seu Carpe Diem de forma particular.

Nós somos adoráveis por sermos assim, diversas na unidade múltipla enigmática e fascinante de ser MULHER.

Compartilhe este conteúdo:

Vida de Mulher Moderna – A descoberta

Compartilhe este conteúdo:

Tudo na vida tem um começo que se transforma em mistério caso alguém não se disponha a elucidar. Por exemplo, quais as causas fundamentais que condicionaram o comportamento das mulheres modernas? Diante desta interrogativa, e pela ausência de explicação convincente, surgem as perguntas inférteis do tipo “Mulher moderna ou mulher frustrada?”, “Mulher Moderna e Feliz? Impossível!”, “Mulher Moderna, Feliz e Realizada? Só acompanhada!”

Então, diante destes arroubos de dúvidas e mitos populares, apropriar-me-ei das teorias positivistas de Auguste Comte para dilucidar o início, ou melhor, ESSA DESCOBERTA explicável e comprovável!

Como adoro metáforas, faço um convite às palavras enigmáticas e desafiadoras para iniciar este texto.

Solicito aos leitores a assimilação desta máxima “Toda mulher moderna caminha pela estrada existencial da contemporaneidade, obrigatoriamente, observando a duas placas de sinalização constantes que exigem CUIDADO e ESCLARECIMENTO.”

Solicita-se CUIDADO com as interpretações, rotineiras e sem aparente comprovação científica, de que mulher moderna e independente representa sinônimo de mulher sozinha e mal amada.  Quem nunca pensou, dessa forma, pare de ler esse texto!

Leitor, você também pensa assim? Calma! Não fique constrangido e continue a leitura. Esse será o nosso primeiro segredo.

Retomando às sinalizações citadas, requer-se ESCLARECIMENTO continuado porque sempre temos que explicar porque somos modernas e independentes. Afinal, a sociedade nos aceita, desde que sempre estejamos acompanhadas para que não sejamos consideradas “peças com problema de fábrica”.

Então, vamos aos esclarecimentos pertinentes e necessários. Afinal, “Como nos tornamos mulheres modernas e independentes?”

Enfatizo que não é preciso ser  Édipo Rei que decifrou o enigma da Esfinge de Tebas, como na famosa obra clássica de Sófocles, para desvendar esse mistério. O segredo é bem simples. Mas metaforicamente escrito, torna-se mais interessante.  Por isso, exemplifico que se tornar independente e moderna ou moderna e independente acontece de formas diferenciadas, mas semelhantes na essência. Paradoxalmente inquisidor.

Imagine que você está viajando na estrada da sua vida. O carro está sendo dirigido por alguém que, algum dia, você julgou ser o seu grande amor. E grandes amores sempre estão acompanhados de grandes idealizações. Assim, você acredita ser a missão desse amor personificado dirigir o veículo da sua existência, ou em outras palavras, você confia a direção da sua vida a essa pessoa. A Felicidade parece construir um prédio com fortes alicerces bem no seu quintal. Então, seu amor-cara-metade funciona como uma espécie de cinto de segurança e motorista confiável. A verdadeira perfeição. Do que mais você precisaria?

Mas a estrada de nossas vidas possui curvas perigosamente sinuosas. Por isso, quando menos se espera, a tranquilidade dessa viagem tão costumeira e segura é invadida por um ronco enlouquecedor que parece dilacerar seus sentidos. O silêncio da sua alma foi rompido. A rotina causa sufoco mortal. Não há mais o que fazer. Somente uma saída: desatar o cinto de segurança que lhe prende àquela vida tão sonhada, mas agora tão previsível, despedir-se do motorista e reassumir a direção.

Para os leitores que estão pensativos e tristes por causa dos motoristas que foram dispensados, acalento suas indignações afirmando que eles sempre ficam bem. Não se surpreendam caso, ao final desta narrativa, eles já estarem em outro carro, com outra mulher que lhe confiará suas eternidades. E isso é errado? De forma alguma. Afinal, a pluralidade de ações e comportamentos humanos torna a vida tão mais diversa e interessante.

Diante dessa mudança, percebemos que a FELICIDADE só estava fazendo acampamento no nosso quintal. Precisamos segui-la. Então, optamos em pilotar carros velozes. Queremos viver tudo com a velocidade da luz. Mudamos o visual, adotamos mais firmeza com os exercícios da academia, começamos a querer viajar do Oiapoque ao Chuí, lemos muito livros, começamos a dialogar conosco em um processo de autoconhecimento enriquecedor, desfrutamos os prazeres e segredos da noite de forma intensa. Tudo para sentirmos o sabor dessa nova vida e permitir com que a loucura da velocidade dos nossos sentimentos faça pulsar nosso coração para compreendermos a linguagem da LIBERDADE.

Entendam que a mulher moderna não é coitada, descartada, desestruturada, muito menos desesperada. Parem de fantasiar que somos como a Eugênia de Machado de Assis:  “Por que bonita se coxa, por que coxa se bonita?”. Esta personagem esperou ansiosamente, um livro inteiro, para que acontecesse seu primeiro beijo casto que foi roubado por Brás Cubas. Leitores, não somos tão ingênuas!Esqueçam isso! Conhecemos o AMOR, porque amamos e somos amadas.

Mas, nosso caminhar nos permitiu vivenciarmos um amor tão nosso, por isso indestrutível. Como ele se chama? Amor próprio. Sentir-se bem consigo mesma, sem descartar a possibilidade de encontrar alguém que mereça caminhar conosco. Mas, dessa vez, com a direção de nossas vidas em nossas mãos.

Alguém deve estar sorrindo e pensando “Só isso?”. Aos frustrados com a revelação do nosso segredo, enfatizo: “Só isso!”. Mulher moderna e independente tem atitude. Não nascemos de contos de fadas, somos personagens protagonistas de histórias reais de superação, trabalho, dor, amor e, acreditem, sonhos. Nossa motivação não está na frustração, mas na DECISÃO. Destarte, somos mulheres dignas de todo RESPEITO E ADMIRAÇÃO!

Para conhecer os melindres e encantos de nossas vidas, convidamos a sentarem no sofá da sala, ouvirem uma boa música, tomarem uma boa bebida e nos acompanhar folheando cada página virtual desta série MULHERES MODERNAS.

Você se deliciará com cenas do nosso cotidiano que conduzirão à reflexão, ao riso frouxo, à imprevisibilidade, à esperança no amor e, sobretudo, ao encantamento com essa MODERNIDADE que inunda nossas vidas.

Para os amantes de crônicas do cotidiano de plantão, não fiquem espreitando às escondidas. Entrem! As janelas virtuais do (En)Cena estão abertas para apresentar a série MULHERES MODERNAS.

Boa leitura!

Compartilhe este conteúdo:

Max Wertheimer

Compartilhe este conteúdo:

 

Max Wertheimer nasceu em Praga, no dia 15 de abril de 1880.Iniciou direito em Praga, aos 20 anos. Sem finalizar o curso de direito, transferiu-se para o estudo da filosofia e da psicologia, passando pelas universidades de Berlin e de Würsburg, onde doutorou-se em 1904 com o estudo sobre a associação de palavras na detecção de padrões no raciocínio. (Goodwin, 2010).

 

Centro de História da PsicologiaAdolf Würth da Universidade de Wüsburg
Disponível em: http://www.awz.uni-wuerzburg.de/en/archive/film_photo_and_tone_archives/video_documents/max_wertheimer_and_schumanns_tachistoscope/

 

Em 1910, viajando de Viena para Renânia, Wertheimer observou que percebia o acender e o apagar alternados de duas lâmpadas (duas luzes) como um movimento de uma luz apenas que atravessava o espaço de uma lâmpada à outra. Em sua parada em Frankfurt, experimentou a mesma percepção com um estroboscópio e cartolinas.

Estroboscópio: instrumento utilizado para alternar a entrada de luz em estímulos parados que, na interação com as modificações da luz, parecem promover um movimento – os primórdios do cinema. Disponível em: http://www.nxtorm.es/Proyectos/pr-h-efectos-opticos-NXT.html

Ao acender uma luz num ponto A e, depois, num ponto B, criando variações nos intervalos de tempo entre uma piscada e outra, Mazdescobriu que se a alternância entre o piscar das luzes fosse de 200 milissegundos, a percepção era de duas luzes alternadas sucessivamente; se o tempo fosse de 30 milissegundos (ou seja, mais rápido), a percepção era de duas luzes acendidas simultaneamente; e se o tempo fosse de 60 milissegundos, a percepção era de uma luz apenas, que se movimentava do ponto A ao ponto B. Ou seja, o percepto, que é o produto da percepção, não corresponde ao que se prevê na relação entre estímulo e sensação: há a percepção de um movimento em estímulos parados como ocorre no filme cinematográfico, o movimento se dá pelo passar consecutivo de fotos. Tal movimento foi chamado de movimento fi.

A percepção de movimento a partir de dois focos de luz que acendem rapidamente já havia sido descrita pelo físico Plateau na primeira metade do século XIX e reproduzida por Exner, professor de Wertheimer, em 1875. Em 1895, os irmãos Auguste e Louis Lumière apresentavam publicamente, pela primeira vez, o cinematógrafo, uma máquina que fazia e reproduzia filmes. E em 1890, o psicólogo Christian vonEhrenfels publicou seu artigo sobre as qualidades gestálticasno qual também questiona a relação direta entre sensação e percepção, usando como exemplo a melodia: observou que a melodia de uma música continua a mesma, mesmo que se alterem todas as suas notas nas múltiplas tonalidades permitidas pela experiência musical. Ou seja, um todo, como no caso da melodia, não se caracteriza somente pela soma de seus elementos, as notas, mas também pela relação que tais elementos estabelecem entre si e com o todo, o que caracteriza as “qualidades estruturais”. As “qualidades estruturais”, para Ehrenfels são formadas por sensações, ou seja, mesmo que Ehrenfels relativiza a importância das sensações na formação das percepções, ele ainda encara aquelas como os átomos destas. (Moraes, 2010).

Max Wertheirmer, em parceria com Wolfgang Köhler, transferiu o seu experimento de garagem para o laboratório do Instituto de Psicologia da Academia Comercial. Köhler juntamente com Koffka e sua esposa foram sujeitos dos experimentos de Wertheimer. Contratado pelo chefe do laboratório, Friedrich Schumann, a parceria entre Wertheirmer, Köhler e Koffka daria origem à “escola de Berlim” ou o “gestaltismo”. A Psicologia da Gestalt (ou Psicologia da Forma) traz, como fundamento, a seguinte questão: a sensação é o átomo da percepção? E a idéia seria o átomo do pensamento como afirmava quase toda a Psicologia do início do século XX, pautada na concepção associacionista inglesa? De maneira bem resumida e sintética, inicial e vacilante, diria que essas três reconhecidas figuras questionaram o (pseudo?) paradigma fisiológico que sustentava a Psicologia em seu nascimento moderno uma vez que questionavam a posição fundante da sensação na composição das funções mentais superiores.

A psicologia da Gestalt é diferente daqueles que falam em soma de elementos. Pelo contrário, a Gestalt, de início, vai ser dividida em partes. A Gestalt é anterior à existência das partes.A determinação é de cima ou descendente e não de baixo ou ascendente. (Engelmann, 2002, p.2)

Em 1912, Wertheimer publica o artigo “Estudos experimentais sobre percepção de movimento” considerado como fundante do movimento gestáltico. O artigo tratava dos resultados da percepção aparente de movimento na relação entre luzes que são apresentadas em relação com tempos diferentes. De acordo com Wertheimer citado por Goodwin (2010) “os processos das partes são determinados pela natureza intrínseca do todo” (p. 305). Desse modo, o movimento fi não poderia ser considerado nem uma falha no julgamento tão pouco traços de personalidade, mas antes um processo total, contínuo, chamado de Gestalt. A Gestalt, portanto, refere-se ao relacionamento entre os objetos individuais percebidos, composta pelos perceptos de tais objetos (as Gestalten), mas não a eles resumida. (Engelmann, 2002).

Max Wertheimer
http://psychology.about.com/od/profilesmz/p/max-wertheimer.htm

 

Wolfgang Köhler
http://diglib.amphilsoc.org/fedora/repository/graphics:3508

 

Kurt Koffka
http://www.intropsych.com/ch04_senses/whole_is_other_than_the_sum_of_the_parts.html

 

Desse modo, Wertheimer e os outrosgestaltistasestudavam a interação entre estímulos e perceptos para a compreensão do todos chamada Gestalt que é a experiência como ela é por nós vivida. Pode-se observar, nessas conceituações, a estreita ligação entre os gestaltistas e a fenomenologia de Brentano e Edmund Husserl. Todos eles reafirmavam uma maneira diferente de conceber os estudos sobre o homem e suas culturas o que, certamente, influenciou em seus métodos realizados no âmbito da ciência.

Usando novamente nossa linguagem atual, ocorre, em tais circunstâncias, uma interação que faz, por exemplo, com que um segundo objeto apareça demasiado próximo ou em coincidência com um primeiro, que está desaparecendo, de sorte que, somente quando se apaga realmente o primeiro objeto e, portanto, a interação, pode o outro mover-se para a sua posição normal. Se isso é interação, ela não ocorre, como tal, no cenário de percepção. Nesse cenário, nós apenas observamos um movimento. (Köhler traduzido por Slomp, s/d, p2 –ftp://www.cefetes.br/Especificos/design/A_PSICOLOGIA_DA_GESTALT_NOS_DIAS_atuais.pdf)

Desse modo, chegava-se à conclusão de que a análise dos elementos sensoriais não leva ao entendimento da percepção, da maneira como percebemos o mundo à nossa volta. Essa concepção coloca questões metodológicas e éticas no próprio pesquisar em psicologia. Como pode-se ler na citação abaixo, a ablação (o corte de nervos para se estudar as funções que lhes são correspondentes – método comum nos psicólogos fisiólogos) não era o método dos gestaltistas. Pelo contrário, usavam de métodos de privação, da imitação e da instrumentalização, para colocar macacos em frente a problemas que os separavam de suas fontes de alimento, como mostra o trecho de Köller citado por Slomp:

Como os comportamentos obtidos eram sempre admiravelmente corretos, resolvi aumentar o tempo entre a percepção do alimento e a oportunidade de obtê-lo. Assim, um dia, enterrei alimento num lugar qualquer do grande terreno que os antropóides usavam para recreação. Os animais assistiram a operação, mas não tiveram oportunidade de obter a comida desejada, porque eu os levei imediatamente para o dormitório. Só os trouxe de volta no dia seguinte, cerca de dezessete horas depois, mais de metade das quais eles passaram dormindo. Pois bem. Assim mesmo, um dos chimpanzés não hesitou um momento: assim que voltou ao pátio de recreio, encaminhou-se diretamente para o local em que as frutas foram enterradas, e descobriu-as após algumas tentativas. Poder-se-ia dizer que o local onde estava enterrado o alimento não atraiu o antropóide pelo fato de este saber que havia comida ali, mas por causa do aspecto incomum que o terreno apresentava, dada as escavações feitas por mim. Aos meus olhos nada havia de incomum ali, porque tomei a precaução de cobrir toda a área com areia seca. Todavia, para rebater melhor essa crítica, devo acrescentar que, depois de os animais terem sido recolhidos, cavei vários buracos e enchi todos da mesma forma. No entanto, como disse, o animal dirigiu-se ao local certo. (Köhler traduzido por Slomp, s/d, p.1 –http://chasqueweb.ufrgs.br/~slomp/edu01011/gestalt-kohler-antropoides.pdf)

Wertheimer continuou seus estudos sobre a percepção. Ficou em Frankfurt até 1916, quando mudou-se para Berlin, atuando no Instituto de Psicologia de Berlim até 1929, quando voltou a Frankfurt para a chefia do departamento de Schumann. Em 1933 foi demitido pelo regime nazista; juntamente com sua esposa e três filhos, mudou-se para os Estados Unidos onde estudou a percepção na faculdade de resolução de problemas cujas conclusões encontram-se no livro “Pensamento Produtivo”, publicado em 1945, dois anos após sua morte por ataque cardíaco.

Referências:

BROZEK, Josef e MASSIMI, Marina. Historiografia da Psicologia Moderna – A versão brasileira. São Paulo: Edições Loyola, 1998.

KÖHLER, Wolfgang. A Inteligência dos Antropóides, trechos traduzidos pelo Professor Paulo Francisco Slomp – Universidade Federal do Rio Grande Do Sulfaculdade de Educação Departamento de Estudos Básicos (Debas)Edu01011 Psicologia da Educação I – slomp@ufrgs.br -http://www.ufrgs.br/faced/slomp

___. A Psicologia da Gestalt nos dias atuais, trechos traduzidos pelo Professor Paulo Francisco Slomp- Universidade Federal do Rio Grande Do Sulfaculdade de Educação Departamento de Estudos Básicos (Debas)Edu01011 Psicologia da Educação I – slomp@ufrgs.br -http://www.ufrgs.br/faced/slomp

GOODWIN, C. James. História da Psicologia Moderna; tradução Marta Ross; – 4° ed. – São Paulo: Cultrix, 2010.

ENGELMANN, Arno. A Psicologia da Gestalt e a Ciência Empírica Contemporânea. In: Psicologia:Teoria e Pesquisa, Jan-Abr 2002, Vol. 18 n. 1, pp. 001-016, Universidade de São Paulo.

Compartilhe este conteúdo: