Novas Abordagens em Saúde Mental: relato de experiência

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Com início no primeiro dia do mês de junho do ano 2017, na cidade do Rio de Janeiro, o III Fórum Internacional Novas Abordagens em Saúde Mental foi realizado com a participação de profissionais e usuários na área em questão. Tendo seu término no dia 03, rendeu muitos trabalhos, novas ideias e aprendizado para os participantes.

A minha participação se deu juntamente com a equipe do (En)Cena, cuja se envolveu no trabalho de cobrir o evento, realizando entrevistas, notícias e relatos com os profissionais e usuários do serviço em saúde mental. No último dia houveram apresentações de trabalhos, e o (En)Cena foi responsável por quatro dessas, em que alguns membros da equipe apresentaram aleatoriamente no IPUB/UFRJ (Instituto Psiquiátrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Os dois primeiros dias consistiram em debates, palestras e mesas redondas que traziam em seu cerne algumas propostas sobre mudanças no modo de se trabalhar em saúde mental, sendo enfatizada a necessidade em se dar voz aos usuários do serviço. O próprio evento foi um espaço para tal. Particularmente, o que mais chamou minha atenção foram as propostas trazidas pelo psicólogo norte americano Oryx Cohen e pela usuária Elizabeth Sabino dos Santos, que são a CPR emocional e os projetos Comunidade da Fala e Voz dos Usuários, respectivamente.

O primeiro é um programa com o objetivo de ensinar pessoas a ajudarem outras pessoas em crises emocionais, a partir dos passos Conectar, Empoderar e Revitalizar. O segundo e terceiro são projetos idealizados no Rio de Janeiro que buscam dar autonomia para os usuários em saúde mental, empoderando-os e permitindo que suas ideias e necessidades sejam ouvidas.

Somando-se tudo, foi uma grande experiência participar desse evento, pois aprendi muito, consegui enxergar um pouco mais sobre o que se trata a saúde mental, o contato com os profissionais da área e com os usuários (principalmente no IPUB) foi enriquecedor e participar cobrindo esse evento com a equipe do (En)Cena foi duplamente bom.

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Vozes para além do previsível: um relato de experiência

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Eu sinceramente me surpreendi de forma positiva com o conjunto da obra do III Fórum Internacional de Novas Abordagens em Saúde Mental, evento que ocorreu neste começo de junho, em parceria com a UFRJ, na capital carioca. Em que pese eventuais problemas, de longe a programação e, sobretudo, o carisma dos conferencistas internacionais – com destaque para o psicólogo norte-americano Oryx Cohen – foram de uma enorme riqueza.

Pois bem, minha jornada pelo Fórum começou com o contato com uma nova – e instigante – maneira de intervenção usada com alguma frequência nos Estados Unidos no que concerne ao tratamento/lida com pessoas que ouvem vozes. Normalmente trata-se de pessoas que são diagnosticadas como sendo psicóticas ou, em casos mais extremos, como esquizofrênicas. Para mim foi surpresa conhecer tão de perto grupos que nos Estados Unidos e em alguns países da Europa – como a Holanda, por exemplo – já se utilizam de estruturas de intervenção onde o profissional de saúde deve se despir de tratamentos concebidos a priori e, como foco principal, ater-se á escuta ativa. Aliás, mais do que uma escuta ativa, o profissional de saúde e/ou psicólogo deve compreender que há uma dimensão da existência para além da normalidade ou da patologização. Esta perspectiva favorece a criação de vínculos de confiança entre os coordenadores de grupos – que são conhecidos como Grupos de Ouvidores de Vozes – e os usuários.

Não se trata – pelo que percebi – de uma tentativa de desqualificar os saberes técnico/acadêmicos ou profissionais, mas, antes, de inverter a lógica do processo terapêutico, onde de fato a centralidade se encontra em cada sujeito, e não no conjunto de técnicas interventivas. É algo radical, num primeiro momento, mas que vem demonstrando resultados surpreendentes, de acordo com os dados apresentados por Oryx. Um destes dados se refere a um estudo longitudinal realizado nos EUA onde se observou dois grupos de pessoas reconhecidas como necessitadas de tratamento psiquiátrico. Um dos grupos recebeu a intervenção num hospital psiquiátrico e o segundo grupo, no mesmo período de tempo, foi cuidado por estudantes universitários – ainda sem discursos que presumem um suposto saber – em casas privadas. Ao final da pesquisa, observou-se uma significativa melhora do segundo grupo em relação ao primeiro.

Chamou-me a atenção o fato de Oryx destacar que, com isso, não quer dizer que todo o saber acumulado e a própria medicalização devem ser rechaçados. No entanto, no mínimo é importante repensar as práticas de intervenção que vem sendo executadas nestes últimos 30 anos. Haveria, portanto, uma tendência a despatologizar os fenômenos – no caso em específico, tornar normal o fato de alguém ouvir vozes – e, com isso, adentrar-se ao universo das pessoas. Literalmente, é preciso ouvir mais para só então o profissional de psicologia ter condições de ser eficaz em sua relação com o outro.

Oryx citou as teses de Carl Jung em uma de suas intervenções, notadamente dentro do conceito do arquétipo do ‘curador ferido’. Parte do pressuposto de que, por um lado, o curador é também um igual ao sujeito adoecido, na medida em que todos compartilham um mal-estar existencial comum á espécie; por outro lado, este curador precisa entender os seus próprios processos internos para, então, com menos resistências, colaborar com os outros. Pareceu-me um exemplo clássico de alteridade, algo preconizado insistentemente na Psicologia e que, dada a sua importância, deve ocupar lugar central na prática.

No mais, para além das palestras proferidas por professores e profissionais do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, me chamou a atenção o perfil dos psiquiatras presentes ao evento. Todos foram unanimes em dizer que uma das formas de se estabelecer uma saúde mental pública de qualidade é optando pela não horizontalização dos saberes, evitando assim que o saber médico funcione como gestor, subjugando as demais especialidades.

Juventude e saúde mental

Senti-me extremamente gratificado em ter apresentado um trabalho como parte de meu mestrado interdisciplinar – na UFT – e em consonância com os temas abordados no portal (En)Cena. Com o tema ‘Impacto da Pós-Modernidade na Saúde Mental de Jovens’, pude contribuir com um olhar filosófico, sociológico e psicanalista sobre as eventuais causas de adoecimento dos jovens na atualidade.

Para tanto, me utilizei de autores como Birman, Freire Costa, Bauman, Lipovetsky, Hall, Han, dentre outros tantos. A minha apresentação ocorreu nas dependências do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro e foi acompanhada predominantemente por psicólogos do Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul.

Ao final da apresentação abrimos o espaço para uma rodada de conversa, onde puder perceber o interesse dos profissionais da psicologia em se envolver cada vez mais na interdisciplinaridade, sobretudo no que se refere á ampliação do olhar sobre o fenômeno humano, que comporta uma explicação cada vez mais ampla e desafiadora.

Por fim, gostaria de registrar que esta é a segunda vez que viajo com a equipe do (En)Cena e, como já era de se esperar, tudo ocorreu numa enorme harmonia. O portal conseguiu apresentar de forma significativa os serviços que são produzidos pela comunidade acadêmica do Ceulp/Ulbra, foi alvo de muitos elogios e iniciou futuras parcerias, sobretudo com associações de apoiadores e/ou amigos dos usuários do sistema de saúde mental.

Em súmula, a viagem rendeu um enorme crescimento pessoal e profissional. Além da expectativa de, no futuro, montarmos um grupo de Apoio aos Ouvidores de Vozes em Palmas. Um desafio e tanto, mas a altura de qualquer profissional que queira, ao se espelhar na vida de Jung, ser um curador ferido de almas.

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A imersão no hospital-dia do IPUB/UFRJ

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Nos três primeiros dias do mês de junho de 2017 ocorreu o III Fórum Internacional: Novas Abordagens em Saúde Mental, na capital carioca do Brasil. O terceiro dia foi destinado às apresentações de trabalhos, provenientes de diversos estados brasileiros e até internacionais, no hospital-dia do IPUB/UFRJ.

Parte da equipe na porta do IPUB

Muito além do conhecimento que adquiri ao decorrer do evento, tive experiências transformadoras dentro deste local. Logo de início, ao procurar no IPUB o auditório que eu apresentaria meu trabalho, fui tomada por uma ansiedade tamanha. Ao cumprimentar uma senhora com um simples “bom dia”, recebi dessa desconhecida um abraço e um beijo no rosto, ato este que me fez acalmar instantaneamente. QUANTA AUTENTICIDADE!!! Ela era uma das pacientes internadas naquele local e acredito que não fez isso por apenas uma convenção social, mas porque essa demonstração de afeto era parte dela mesma e o que a receptora dos atos necessitava, no caso, eu.

Até então eu nunca havia tido contato com um hospital psiquiátrico, o ambiente por mais que tinha aspectos de construção antiga, ainda era perceptível os alguns traços físicos que lembravam a um ambiente hospitalar. Porém, o que me chamou a atenção neste ambiente foram as obras produzidas pelos pacientes que estavam em todos os cômodos. Que magníficas! E que excelente trabalho deixar aquele ambiente com a cara de quem usa os serviços. Sinceramente, pude me sentir imersa na realidade deles.

Uma das obras feitas pelos usuários do hospital-dia

Quantos ouvidores de vozes tinha ao meu redor, cada um com suas peculiaridades. Cumprimentavam, falavam, ouviam e viviam. E assim, eu percebi que a frase que Oryx Cohen tanto dizia durante o evento “precisamos aprender a ouvir” se aplicava perfeitamente naquele recinto. Não menos importante, no primeiro dia do evento, também foram citados e apresentados por alguns usuários os grupos: Comunidade da fala e Voz dos usuários. Tais grupos são destinado

Ainda nesse contexto, fui solicitada por outra desconhecida para fotografá-la numa das frondosas arvores do hospital-dia. Consegui capturar uma imagem simplesmente fantástica: um frecho de luz apareceu em sua direção, enquanto pousava juntamente com um dos membros da equipe do (En)Cena, o professor Sonielson Luciano Sousa. Após este momento, conseguimos conversar um pouco com ela, ou melhor, ouvi-la com atenção, ter uma escuta ativa sobre o quão significativo era, para ela, tirar a fotografia com a árvore e sobre a surpresa em relação à luz que apareceu em seu rosto.

“Um mergulho no inconsciente”

Só houve uma coisa que me desagradou naquele mar de experiências, foi o fato de que os pacientes internados estavam uniformizados, fato este também foi bastante enfatizado e desaprovado pelo holandês Martjin Kole. Entretanto, após ouvir a explicação disso acontecer fiquei mais aliviada. De acordo com uma das organizadoras do evento em virtude de o hospital-dia ser aberto, com entrada e saída livres, às vezes, os pacientes internados saiam do hospital, sem terem recebido “alta”. Desse modo, para facilitar a identificação destes optaram pelo uso de uniformes. Ainda acredito que encontro outro modo de identificação, mais discreto com uma pulseira ou cordão, diminuiria os aspectos estigmatizantes que esses pacientes podem enfrentar ou já enfrentam.

Além disso, tive ainda a oportunidade de apresentar o trabalho “Promoção de Saúde Mental Online – Experiências do Portal (En)Cena”, elaborado por Rísia LimaLaryssa Araújo (eu) e Irenides Teixeira. Como havia dito anteriormente, passei por momentos ansiolíticos, mas consegui apresenta-lo com muita empolgação e mais tranquilidade. Posso afirmar que foi uma conquista de grande relevância na minha vida acadêmica.

Apresentação de trabalho que realizei

Nesse contexto, este dia me proporcionou novas perspectivas de olhar, ouvir e sentir no se tange à saúde mental e ao cuidado com outro, com os usuários. Essas experiências me causaram anseios por buscar mais a vivência nessa área, além do que o próprio portal (En)Cena me possibilita. Para concluir só posso reconhecer uma coisa: que experimento extraordinário! Estou pronta para os próximos!

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Intervenção em situações de crise a partir do CPR Emocional: entrevista com o psicólogo Oryx Cohen

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Durante o último dia do III Fórum Internacional Novas Abordagens em Saúde Mental Rio de Janeiro/RJ, o (En)Cena teve a oportunidade de entrevistar o psicólogo norte americano Oryx Cohen, chefe de operações da NEC (National Empowerment Center) e coprodutor do documentário Healing Voices.

Cohen é líder expoente da abordagem CPR Emocional, um programa desenvolvido com o objetivo de que pessoas ajudem umas as outras em situações de crise, de maneira mais humanizada e atenciosa, a partir de três passos: conectar, empoderar, revitalizar.

Abaixo, confira os principais temas abordados por Oryx:

(En)Cena – O que você acha da promoção de Saúde Mental no meio virtual? 

Oryx – Eu acho que pode ser um modo muito poderoso de fazer isso, mas eu acho que também precisa de interação cara a cara, porque muita gente não tem conexões sociais. Existem estudos que mostram que como mídias sociais aumentam isolamento, por que as pessoas não falam mais umas com as outras. Há também maneiras de como as mídias sociais podem ajudar, não é só “preto no branco”. É um método muito poderoso, mas se nós acharmos que vai ser o único método estaremos enganados.

(En)Cena – Como você acha que o psicólogo deve atuar em situações de vulnerabilidade social a partir do CPR Emocional? 

Oryx – Eu acho que os psicólogos devem ser encorajados a ser eles mesmos. As pessoas que me ajudaram eram só pessoas reais. Você pode usar seu conhecimento pra ajudar outras pessoas, mas se você estiver só pensando no que deveria dizer e no que a teoria te diz, então vai ter dificuldade pra ajudar as pessoas.

(En)Cena – Você acha que os processos de individuação e liquidez das realizações  dos quais Zigmunt Bauman fala são um dos empecilhos para o processo de conexão entre as pessoas? 

Oryx – Sim, é uma teoria interessante. Eu acho que as pessoas têm problemas com confiança, então os relacionamentos devem ser mais sólidos que fluidos. Muitas vezes as pessoas não têm nenhuma relação, são muito sozinhas, então toda a água correu pelos dedos. Nós precisamos reencher essa água e esses relacionamentos devem ser congelados no tempo, precisamos de bons amigos.

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Psicólogo diz que profissional tem que ouvir mais para conseguir empoderar os sujeitos

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No segundo dia de conferências do III Fórum Internacional: Novas abordagens em saúde mental – Rio de Janeiro, a temática do psicólogo norte-americano Oryx Cohen sobre “Grupos e Redes de Ouvidores de Vozes” dominou os debates.

O The Hearing Voices Approach (Abordagem Ouvir as Vozes) consiste numa dinâmica de ouvir uma voz ou vozes que são inaudíveis para outros, num contexto em que até então estas vozes (comparadas à psicose ou, em casos mais graves, com a esquizofrenia) eram rotuladas como sintomas de psicopatologias. De acordo com Oryx, no entanto, não significa que alguém esteja mentalmente doente. Mas, então, como é possível ouvir vozes e ser saudável? Como é possível sair da tentativa de “enquadramento” por diagnóstico e, em seguida, intervir a partir dos saberes estabelecidos pela Psicologia?

Primeiro, para o psicólogo Oryx é necessário que o Grupo de Ouvidores de Vozes (que só pode ser composto por pessoas que ouvem vozes) e/ou as Redes de Ouvidores de Vozes (que aceitam pessoas que não ouvem vozes, mas entendem o processo) deve manter uma espécie de núcleo ético que seja impermeável a alguns aspectos, como a não interferência ou intervenção dos chamados saberes das abordagens clássicas – “afinal, quem melhor do que a própria pessoa para falar de suas demandas?”, questiona Oryx – além de primar por uma conexão estreita entre os integrantes e, por fim, tornar os grupos ou redes como uma dinâmica de comunidade, para evitar serem enquadrados como serviços de saúde mental (o que por si só já implicaria na sobreposição de um saber sobre a vivência de cada integrante do grupo).

De acordo com Oryx, estudos de longo prazo concluídos há alguns anos nos Estados Unidos apontaram para uma eficácia muito maior em abordagens que procuram mergulhar nos universos particulares de cada integrante eventualmente estigmatizado com transtorno mental. “É preciso evitar linguajar técnico, além de que os facilitadores de tais grupos deve se colocar como igual, deixando os seus títulos acadêmicos na entrada do local”, alerta. O pressuposto, então, é enfatizar a experiência de ouvir vozes como um terreno rico de significados e de originalidade. “Perceber o ouvidor de vozes por este prisma amplia a empatia do facilitador e possibilita o desenvolvimento dos integrantes dos grupos”, diz Oryx, ao afirmar que Pesquisa e prática desenvolvidas em parceria com ouvidores de vozes pelos últimos vinte e cinco anos indicam que é este o melhor caminho até este momento.

O III Fórum Internacional: Novas abordagens em saúde mental – Rio de Janeiro é promovido pelo Centro Educacional Novas Abordagens Terapêuticas – CENAT – e conta com o apoio do IPUB/UFRJ (Instituto de Psiquiatria ligado a UFRJ).

Grupos e Redes de Ouvidores de Vozes

Há Redes de Ouvidores de Vozes em 35 países do mundo, incluindo o Brasil. Há mais de 170 grupos de Ouvidores de Vozes só na Inglaterra.

Esta abordagem empoderadora de ajudar pessoas (tanto adultos como crianças) que ouvem vozes está sendo desenvolvida hoje no Brasil. Ela também já tem encontrado impacto significante no modo como ouvidores de vozes e serviços de saúde mental tratam a experiência de ouvir vozes. Esta mudança de perspectiva tem levado a transformações importantes na prática de provedores de serviço em respeito a intervenções com pessoas que ouvem vozes, assim como o desenvolvimento de uma vigorosa rede de suporte de grupo.

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Introdução a eCPR: um relato de experiência

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No dia 01 de junho de 2017 deu-se início ao III Fórum Internacional: novas abordagens de saúde mental, no Rio de Janeiro – RJ. O evento que tem como linha teórica “práticas alternativas em Saúde Mental” e “boas práticas no Brasil em Saúde Mental”, objetiva debates e trocas com usuários do serviço de Saúde Mental, seus familiares e profissionais da área. No presente relato, discorrerei sobre a apresentação do norte americano Oryx Cohen.

Psicólogo, diretor do Centro de Assistência Técnica do Centro Nacional de Empoderamento (NEC) e ex-paciente psiquiátrico, Oryx Cohen fez uma introdução à abordagem CPR Emocional (eCPR), em que “o processo de conexão do eCPR envolve o aprofundamento das habilidades de escuta, a prática da presença e a criação de uma sensação de segurança para a pessoa que enfrenta uma crise” (eCRP, 2015). Para contextualizar tal abordagem, ele citou Carl Gustav Jung como o criador do arquétipo do curador ferido, e que assim como o autor, ele também se considera curador ferido, isto é, durante sua colaboração no processo de cura do outro desenvolve-se a cura de si mesmo, tudo isto através de uma conexão mútua.

O apresentador comentou o primeiro diagnóstico de doença mental foi o de drapetomania, na época da escravidão. Esta é, segundo o seu criador Dr. Cartwright (1851), “a causa na maioria dos casos, que induz o negro a fugir do serviço, é tanto uma doença da mente como qualquer outra espécie de alienação mental, e muito mais curável, como uma regra geral”. Uma das sugestões de tratamento era a amputação dos dedos hálux, de forma que impedisse equilíbrio e a fuga destes escravos.

Fonte: http://migre.me/wKO3Z

Do mesmo modo que tal diagnóstico de 1851 é considerado um absurdo atualmente, daqui a alguns anos futuros iremos considerar um despautério a grande quantidade de diagnósticos que são criados diariamente, principalmente nos Estados Unidos, afirmou o palestrante. Nesse sentido, vale ressaltar que “Pesquisadores e psiquiatras norte-americanos, argentinos, franceses e brasileiros têm denunciado o papel mercadológico da indústria farmacêutica em função das campanhas que têm desenvolvido para comercialização em massa de remédios voltados para a área de transtornos mentais e de comportamento” (CFP, 2012).

Para um modo de atuação mais sensato, onde deixa-se de enxergar estas pessoas como doentes mentais e foca-se na suposição de que elas estão apenas reagindo a problemas (sociais ou na comunidade), o apresentador propõe que precisamos aprender a ouvi-las. Isto caracteriza-se como uma forma de empoderamento, que é o que a própria sigla eCPR significa seus principais componentes: E – emocional, C – conexão, P – empoderamento; R – revitalização. Portanto, é através destes três passos que se torna possível amparar o outro através de uma crise emocional, de maneira que o ajude a recuperar sensação de segurança e propósito de vida (NEC, 2014,).

Nisso, o Emotional CPR mostra-se eficaz em seu método, pois possibilita uma conexão emocional com estes indivíduos, ao modo que a atenção ultrapassa o nível intelectual e utiliza-se da linguagem informal (do dia-a-dia).

Fonte: http://migre.me/wJmlF

“O eCPR baseia-se nos princípios encontrados para ser compartilhado por uma série de abordagens de suporte: cuidados informados por trauma, aconselhamento após desastres, apoio aos pares para evitar o contínuo desespero emocional, inteligência emocional, prevenção de suicídios e sintonização cultural. Foi desenvolvido com a contribuição de um grupo diversificado de líderes reconhecidos de todo os EUA, que eles mesmos aprenderam a se recuperar e crescer a partir de crises emocionais. Eles têm sabedoria pela graça da experiência de primeira mão” (eCPR, 2015).

REFERÊNCIAS:

CARTWRIGHT, S.A. Doenças e Peculiaridades da Raça Negra. Bow’s Review. Southern and Western States, Volume XI, Nova Orleans, 1851 AMS Press, Inc. Nova York, 1967. Disponível em: <http://www.pbs.org/wgbh/aia/part4/4h3106t.html>. Acesso em 01 jun. 2017.

Conselho Federal de Psicologia (CFP). (2012). Subsídios para a campanha Não à medicalização da vida: medicalização da educação. Brasília, DF: Conselho Federal de Psicologia. Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas – CREPOP. (2007). Referência técnica para atuação do(a) psicólogo(a) no CRAS/SUAS. Brasília, DF: Conselho Federal de Psicologia.

eCRP. O que é eCPR? Disponível em: <https://www.emotional-cpr.org/about-ecpr.htm>. Acesso em 01 jun. 2017.

National Empowerment Center, Inc (2014). PR emocional: Salvando Vidas, Comunidades de Cura. Disponível em: <http://www.power2u.org/emotional-cpr.html>. Acesso em 01 jun. 2017.

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III Fórum Internacional de Saúde Mental conta com conferencista norte-americano

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No primeiro dia de junho de 2017, no South American Copacabana Hotel, Rio de Janeiro, deu-se início ao III Fórum Internacional de Saúde Mental. Com uma programação cheia durante todo o dia, destacou-se a participação do psicólogo norte americano Oryx Cohen, chefe de operações da NEC (National Empowerment Center) e coprodutor do documentário Healing Voices.

Ele iniciou sua fala abordando sobre o arquétipo do curador ferido, que segundo Jung (1919, apud NATEL, 2012) que indica que “a capacidade de curar o outro exige de cada curador o ato de curar a si mesmo”. Nesse sentido, Cohen disse que esse curar a si mesmo está relacionado com o aprender a ouvir melhor e que esse aprender a ouvir melhor pode aprimorar o ambiente para aqueles que convivem com vozes na cabeça (psicose) e que, em muitos casos, são discriminados por isso.

Sobre esta questão foi desenvolvido, nos Estados Unidos, com liderança de Oryx, o programa eCPR, com o intuito de ensinar pessoas a ajudar outras pessoas em momentos de crises emocionais, a partir de três passos: conectar, empoderar, revitalizar.

Cohen explanou sobre o significado de cada letra, em que o “C” leva a pessoa a se conectar emocionalmente com a outra, de coração para coração, apenas ouvindo, demonstrando que está junto dela. O “E” se refere ao ato de, junto da pessoa em crise, criar um ambiente favorável para que ela se empodere, com a premissa de que o poder está dentro de cada um. E finalmente, mas não menos importante, o “R” que induz a pessoa a revitalizar a outra, vendo essa “voltar a vida, voltar com o brilho nos olhos” (sentido figurado).

Esse programa propõe a mudança de pensamento e de discurso daqueles que julgam quem passa por esses momentos de crise, em que as vozes na cabeça surgem com intensidade. Essas pessoas são estigmatizadas como “loucas, doidas, doentes mentais” e afins. Cohen colocou que a pergunta é: “Essas pessoas estão doentes ou estão reagindo a algum problema? O problema está na pessoa ou na sociedade em que ela vive?”. Sociedade essa “que tapa os ouvidos” e todos os outros sentidos, geralmente procurando internação ou intervenção medicamentosa para quem está na crise.

Desse modo, agem de forma analógica a drapetomania, processo no qual, segundo Cohen, os escravos eram diagnosticados como “loucos” quando tentavam fugir e o “tratamento” era receber chibatadas e terem os dois dedões dos pés cortados.

Para finalizar, Cohen deixou duas frases que considera descritivas do programa: “Seja a mudança que você deseja ver no mundo”, de Mahatma Gandhi, e “a salvação do mundo está nas mãos daqueles que são criativamente desajustados”, de Martin Luther King.

O III Fórum Internacional de Saúde Mental continua nesta sexta, dia 2, com uma vasta programação. A equipe do (En)Cena está participando ativamente de todas as atividades e, neste sábado, dia 3, irá apresentar quatro trabalhos durante o evento.

REFERÊNCIA:

NATEL, R. M. G. L. O curador ferido: Xamã e Psicoterapeuta Junguiano, Aproximações do Mito na Formação Junguiana. Associação Junguiana no Brasil, Monografias, SP, 2012. Disponível em: <http://www.ajb.org.br/monografias.php?monografia=63>. Acesso em 01 mai. 17.

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Abordagem CPR Emocional: o empoderamento do indivíduo em crise

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Como parte da programação do III Fórum Internacional: Novas Abordagens em Saúde Mental Rio de Janeiro/RJ, a partir das 14h pôde-se acompanhar a apresentação do estadunidense Oryx Cohen, líder expoente da abordagem CPR Emocional, um programa desenvolvido com o objetivo de que pessoas ajudem umas as outras em situações de crise, de maneira mais humanizada e atenciosa.

Oryx definiu os peritos na abordagem através da perspectiva Junguiana do arquétipo do Curador Ferido, onde pessoas que se curaram das próprias feridas e desenvolvem a capacidade de ajudar outras pessoas passando por crises. Cohen, que se considera um Curador Ferido, aponta o problema de não se ouvir as pessoas que ouvem vozes e estão em situação de crise, sendo a aprendizagem da escuta completa a mensagem da CPR.

Citando dados dos Estados Unidos, o palestrante apontou os crescentes números envolvendo diagnósticos e definições de doenças mentais, levantando a hipótese de que essas doenças podem ser na verdade, reações a um mundo traumatizante. Assim como se descobriu que ao longo da história vários diagnósticos psicológicos foram na verdade errôneos e em uma visão presentista, absurdos seriam os diagnósticos atuais também equivocados?

Perpassando a dinâmica pós-moderna, onde se constata cada vez mais insatisfação quanto a modelos escolares, de trabalho e nas relações interpessoais, Cohen aponta um problema comunitário, de modo que os indivíduos apresentam reações ao seu ambiente.

Segundo Góis (1993, apud CAMPOS, 1996, p.11) “a psicologia comunitária […] estuda a atividade do psiquismo decorrente do modo de vida do lugar/comunidade, sendo seu problema central a transformação do indivíduo em sujeito”. Desse modo a produção de subjetividade que se faz a partir da inserção de um sujeito a um dado contexto social, apresenta características históricas, culturais e ideológicas, sendo que a atuação deve estar voltada para a tomada de consciência acerca dessa realidade singular, diluindo o que é despotencializante.

A abordagem CPR apresenta-se, portanto, alinhada aos ideais da Psicologia Comunitária, buscando transformar o indivíduo em sujeito ativo em seu meio, sendo ele o motor de sua própria cura. Isso seria possível, segundo Cohen, com um tratamento mais humano e autêntico, focado na conexão (Conect) com o outro; no empoderamento (emPower) desse indivíduo em crise; e a revitalização (Revitalize) da esperança e senso de pertencimento a sua comunidade (CPR).

A apresentação de uma abordagem que contempla uma perspectiva empoderadora, questionadora, e que sugere uma escuta completa e envolvida com o Outro, certamente merece atenção e reconhecimento. As ideias apresentadas por Cohen contemplam aspectos fundamentais para se pensar Saúde Mental e Psicologia, e, portanto foram extremamente proveitosas para fomento de pensamento reflexivo e para formação profissional.

REFERÊNCIA:

CAMPOS, Regina H. de F. (org). Psicologia Social Comunitária. Petrópolis: Vozes, 1996.

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