Outros jeitos de usar a boca: a(s) voz(es) de uma mulher

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É um livro de poemas sobre a sobrevivência. Sobre a experiência de violência, o abuso, o amor, a perda e a feminilidade. Obra poética de Rupi Kaur que leva os leitores numa jornada pelos momentos mais amargos da vida e encontra uma maneira de retirar doçura deles.

“Outros jeitos de usar a boca” (título original: “Milk and honey”) é uma obra poética que aborda o tema da sobrevivência, explorando experiências de violência, abuso, amor, perda e feminilidade. Dividido em quatro partes distintas, cada uma desempenha um papel único ao lidar com diferentes formas de dor e curar mágoas. O livro leva o leitor por uma jornada pelos momentos mais amargos da vida, transformando-os em delicadas expressões. Inicialmente publicado de maneira independente pela poeta, artista plástica e performer canadense de origem indiana, Rupi Kaur, que também é responsável pelas ilustrações presentes na obra, o livro emergiu como um fenômeno notável no gênero nos Estados Unidos, ultrapassando a marca de 1 milhão de cópias vendidas.

Assim, a escolha do título em português, nada parecido com o original, relaciona-se ao conteúdo dos versos, numa escrita feminista, que questiona o sistema patriarcal, os recortes de gênero e, assim, a urgência da voz feminina.

A obra é dividida em: “a dor”, “o amor”, “a ruptura” e “a cura”. Através de suas vivências e descobertas, Kaur transmite uma mensagem clara e objetiva sobre as diferentes formas de abusos sexuais que muitas mulheres continuam vivenciando no cotidiano. E, para além disso, seus poemas pensam em alternativas de enfrentamento desses abusos, uma ressignificação da narrativa e da construção de uma posição social fortalecida para a mulher. Essa divisão do livro apresenta etapas que o corpo sofre como se fosse algo necessário para se alcançar um nível de consciência sobre si, possibilitando formas libertadoras de expressar-se.

Outros jeitos de usar a boca é um livro que nasce na dor:

“toda vez que você

diz pra sua filha

que grita com ela

por amor

você a ensina a confundir

raiva com carinho

o que parece uma boa ideia

até que ela cresce

confiando em homens violentos

porque eles são tão parecidos

com você

– aos pais que têm filhas”

 

                                               Fonte: pinterest.com

Além da escrita propriamente dita, muitos dos poemas são acompanhados de ilustrações da própria autora, o que amplifica a experiência de leitura.

 

Como as poesias de Outros Jeitos de Usar a Boca são estruturadas em versos livres, há, mesmo numa temática dura, uma fluidez que os percorre. Ademais, como se pode observar no segmento acima, a autora raramente usa pontuações ou letras maiúsculas, o que ela explica:

Quando comecei a escrever poesia, eu conseguia ler e entender minha língua materna (punjabi), mas ainda não tinha desenvolvido as habilidades necessárias para escrever poesia nela. Punjabi é escrito na escrita Shahmukhi ou Gurmukhi. Na escrita Gurmukhi, não há letras maiúsculas ou minúsculas. As letras são tratadas da mesma forma. Gosto dessa simplicidade. É simétrico e direto. Também sinto que há um nível de igualdade que essa visualidade traz ao trabalho. Uma representação visual do que quero ver mais no mundo: igualdade. A única pontuação que existe na escrita Gurmukhi é um ponto final – representado pelo seguinte símbolo: | Então, para simbolizar e preservar esses pequenos detalhes da minha língua materna, eu os inscrevo no meu trabalho. Sem distinção de casos e apenas períodos. Uma manifestação visual e uma ode à minha identidade como mulher diaspórica Punjabi Sikh. Trata-se menos de quebrar as regras do inglês (embora isso seja muito divertido), mas mais de vincular minha própria história e herança ao meu trabalho.” (Kaur, Rupi)

A autora destaca a figura feminina questionando as disparidades de gênero não apenas no âmbito emocional, mas também no tratamento dispensado a homens e mulheres. A violência contra a mulher é abordada de maneira franca, enquanto muitos poemas exploram abertamente a sexualidade feminina, reivindicando o direito da mulher à sua sensualidade que não deve jamais existir para nos subjugar ou diminuir. Em essência, o livro é uma ode à resistência, realçando a força das mulheres. Como se pode contemplar no seguinte poema retirado da parte “O amor”:

“quando minha mãe estava grávida

do segundo filho eu tinha quatro anos

apontei para sua barriga inchada sem saber como

minha mãe tinha ficado tão grande em tão pouco tempo

meu pai me ergueu com braços de tronco de árvore e

disse que nesta terra a coisa mais próxima de deus

é o corpo de uma mulher é de onde a vida vem

e ouvir um homem adulto dizer algo

tão poderoso com tão pouca idade

fez com que eu visse o universo inteiro

repousando aos pés da minha mãe”

                                                                      Fonte: pinterest.com

Os traços de Kaur são leves e, muitas vezes, bastante simples, mas extremamente expressivos.

Já na terceira e penúltima parte do livro, Rupi habilmente passa ao leitor a sensação de ruptura: os altos e baixos, o ódio e amargura intrínsecos a um amor que ainda não se esvaiu. Expõe o que fica depois que o outro vai embora, assim como pode-se observar no trecho a seguir.

“eu não sei o que é viver uma vida equilibrada

quando fico triste

eu não choro eu derramo

quando eu fico feliz

eu não sorrio eu brilho

quando eu fico com raiva

eu não grito eu ardo

a vantagem de sentir os extremos é que

quando eu amo eu dou asas

mas isso talvez não seja

uma coisa tão boa porque

eles sempre vão embora

e você precisa ver

quando quebram meu coração

eu não sofro

eu estilhaço”

                                              Fonte: pinterest.com

 

Uma leitura em que se têm acesso ao íntimo da autora, e, por meio deste, aproxima quem lê de suas próprias emoções.

Por fim, em sua última parte, sendo muito bem intitulada “A cura”, traz um ar de fôlego para o leitor, com poemas voltados para busca pelo amor-próprio.

“se você vê beleza aqui

não significa

que há beleza em mim

significa que há beleza enraizada

tão fundo em você

que é impossível

não ver

beleza em tudo”

FICHA TÉCNICA

  • Título: Outros jeitos de usar a boca
  • Título Original: Milk and Honey
  • Autor(a): Rupi Kaur
  • Tradução: Ana Guadalupe
  • Editora: Planeta
  • Número de páginas: 208
  • Ano de publicação: 2017
  • Gênero: Poema;

Referências

 

KAUR, Rupi. Outros jeitos de usar a boca. São Paulo: Plane

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I LOVE PSICANÁLISE

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Eu não preciso recordar e nem repetir por que já foi elaborado

Não é um conteúdo reprimido e nem uma recordação do passado,

 O sintoma que se opera em mim não é inconsciente e foi confessado

É um amor sem mecanismos de defesa, que aos poucos foi plantado.

A elaboração deste sentimento repetido e não esquecido é puro e ardente

Foi em forma de transferência, sem conflito psíquico e foram latentes

Eu interpretei que seriam meus passos, e nem ofertei resistência

Eu elaborei minha escolha, com  facilidade sem a menor prudência 

Foi uma livre associação, um assim, preenchimento de lacunas

Um conteúdo manifesto que floresceu em hora oportuna

Agora se torna objeto de desejo nos meus impulsos instintuais

Não houve energia presa no sintoma, é energia solta, nas questões emocionais

Este sintoma me dá prazer, o compreendo, dele não abro mão, nem ensejo

Sou o próprio desejo do analista, intenso, e genuíno, carece de manejo

Mas se compraz em se manter desejante do outro, sentindo-se por ele atraído

Ele é puro, não faz valer o meu desejo é apenas  por ele totalmente  impelido.

Aceito meus processos inconscientes, reconheço a resistência do recalcamento

Considero a sexualidade e o complexo de Édipo, me analiso, tenho embasamento 

Ao voltar meu olhar para dentro de mim, contemplei minhas profundezas

Guiada pelo princípio do prazer, sem regras, dei vazão ao desejo e vi nisso riquezas.

Guiada pelos princípios de realidade meu ego não quis limitar minhas grandes pulsões

Viu razão no ID… Cedeu às suas exigências, porém de forma positiva não fez mediações

O superego não disse a mim que houvesse limite ele viu coerência no arrebatamento

Não houve conflito entre as estruturas, se entenderam  sem nenhum estranhamento.

Nesses versos expressando a linguagem do querer me construo enquanto indivíduo

Neste querer não sou ansioso, não sinto culpa, não sou neurótico. Sou assíduo

Neste querer não existe falha que afeta a percepção do meu pensamento

Logo, tão pouco sou psicótico, pode ser que nesse incremento

Seria eu um pervertido, derrubando a ordem natural, para assim me expressar

Fazendo um rebuliço nas estruturas e disso me valendo sem nenhum pesar.

O amor á Psicanálise é minha rota, me pego sempre pensando em amar

Agarrei-me a esta essência, a este amor, esta pulsão difícil de educar

Neste caminho já não me sinto doente, pois o amor me curou

 Minhas emoções falo sem medo, para a psicanálise meu coração eu dou.

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Soneto dos tempos líquidos

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Fonte: Google Imagens

 

O celular vibra 

A notificação nova chega 

O coração dispara 

E inicia então mais uma entrega

 

Conversa vai, conversa vem 

Dia após dia cresce a curiosidade

De se conhecer, de se degustar e desenvolvem

O medo domina! Será se sou atraente o suficiente?

 

Enfim cara a cara, enfim pele com pele

Troca de calor, de suor, de pudor

O tempo passa, e tudo é novo

 

Depois, perde o encanto, cadê a novidade?

E descarta, deixa de lado, 

Já conheci, já sei como é, próximo! 

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Livro de poemas traz reflexão sobre conflitos do ser humano

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Reflexivo, imaginário e libertador. Esses são os sentimentos que a escritora Alexandra Vieira de Almeida deseja instigar nos leitores com o livro de poemas Oferta. Lançado em segunda edição, pela Editora Penalux, a obra reúne temas que podem ser considerados conflitantes, como, por exemplo, o amor, o erotismo, a poesia reflexiva e filosófica e a prosa poética de temática social, beirando o limite entre poesia e prosa.

Para a autora, o livro solta as vozes sábias do fazer poético e cria um espaço em que literatura e leitura se conjugam em toda sua essência. Alexandra classifica sua obra como presente da escrita do poeta para o mundo, como um voo imaginativo, salientando o aspecto libertário neste jogo que leva os leitores a refletirem sobre as questões do mundo.

Fonte: Arquivo Pessoal

– Caso pudesse extrair uma essência do livro, ou do título, e fosse representá-la com formas ou símbolos, pensaria na imagem do livro, onde estão as palavras que saem do seu interior e a figura de um pássaro com suas asas a nos levar aos voos da imaginação – comenta.

O prefácio é assinado pelo poeta, contista e crítico literário Luiz Otávio Oliani. Para ele, Alexandra “percorre três linhas básicas”. A primeira delas é a união entre poesia e prosa. Depois, cita a verve pictórica da poeta, lembrando o cinema. Por fim, o viés filosófico que se encontra no livro de poemas singular.

Fonte: Arquivo Pessoal

A contista Maria Joana Rodrigues Colin, responsável pelas orelhas do livro, diz que a poesia da autora faz com que a pessoa reflita de maneira profunda nos sentimentos. “Quando se vai a um poço não é o entorno, e sim o que existe no seu interior. É desse modo que o leitor vai se sentir ao ler o livro”.

Sobre a autora

Alexandra Vieira de Almeida é professora, poeta, contista, cronista, resenhista e ensaísta, além de ser Doutora em Literatura Comparada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Publicou seis livros de poesia adulta, sendo o primeiro 40 poemas e o mais recente A negra cor das palavras. Também tem um livro ensaístico, Literatura, mito e identidade nacional (2008), e um infantil, para crianças de 6 a 10 anos, Xandrinha em: o jardim aberto (Penalux, 2017).

 

Livro: Oferta 

Autora: Alexandra Vieira de Almeida 

Formato: 14X21  

Páginas: 62 

Ano: 2020 

Preço: R$ R$38,00 

Gênero: Poesia 

Link para comprar

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Eu e as palavras

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O que são as palavras?

De fato elas não são nada diante de tudo que somos e de tudo que nos cerca.

O que as palavras podem de fato fazer?

Nada, se não formos capazes de senti-las com todo ardor de nosso coração e de nossa alma.

No entanto, Rubem Alves diz: “as palavras fazem de mim, do meu corpo, tudo aquilo que o universo inteiro jamais conseguiria fazer”.

Elas fazem de mim alguém de verdade.

Alguém que busca e encontra.

Que bate e apanha.

Elas me fazem um ser humano, assim como o mistério que me criou me fez: Límpida! Cristalina! Sem máscaras e sem meias verdades.

O que de fato é um poema? Algo tão frágil e inconsequente. Assim como eu: pequena, frágil, inconsequente…

As palavras são como eu. Elas precisam de alguém para ler, recitar, compreender, sentir. Assim sou eu, ser humano, preciso de alguém que me leia, que me sinta, que me ame…

E no silêncio de uma palavra também eu me encontro, pois nesse silêncio entendo a grandeza do que eu desejo e sonho ser. No silêncio da palavra entendo que nada mais sou que algo real.

E assim, como as palavras vão se transformando, quando passada de uma boca para outra sou eu: vão me moldando a cada dia, a cada encontro, a cada desencontro. E quando penso que existo, sou uma palavra perdida no meio de tantas outras…

Assim Deus nos criou, cheios de contradições. Cheios de desejos e sonhos. Seres capazes de entender e amar e, na maioria das vezes, o que somos? Apenas seres mal entendidos, como se tivéssemos sido mal escritos no livro da vida.

Faço das palavras o que eu não faço da minha vida. E em meio a tanta contradição e confusão que sou, quero apenas encontrar a rima certa e não ser uma palavra perdida na imensidão das letras.

Ser algo diferente. Ser alguém que caminha com as próprias pernas e que segue em direção de tudo aquilo que sonha e busca.

O sentido da vida é algo que não se explica, se sente. E assim sendo, não podemos jamais querer que outro ser seja capaz de sentir o que sentimos e muitas vezes não se pode nem mesmo compreender.

Queria mesmo ter o dom de compor o poema da minha vida. Queria poder sentir assim, como sinto, quando escrevo a hora certa de mudar o rumo de tudo o que está perdido e escondido nas palavras não escritas no livro de minha vida. Porque saber quais palavras escrever, no fundo nós sabemos. O que nos impede de escrever é o medo das críticas de quem vai ler.

Acho que eu vejo a vida ao contrário e, por tantas vezes, não me sinto parte deste mundo… São nesses momentos que as palavras, mais uma vez, me fazem sentir melhor. Elas me traduzem como a nota traduz a música.

As palavras me fascinam, mas acima de tudo elas me ensinam e me fazem viver. Me fazem ir de encontro ao lugar que me aceitam como sou.

Quero que as palavras continuem me levando a sentir e a pensar e assim não serei mais uma louca, mas alguém que sempre passa de um mundo para o outro e assim um ser capaz de encontrar algo que vai além do que nossos olhos conseguem enxergar. Quero que as palavras continuem me fazendo sentir do jeito como um dia eu nasci.

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