É preciso refletir sobre a desigualdade racial no Brasil, não somente, no mês da Consciência Negra

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Comemorado no dia 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra celebra o orgulho da população negra, que ainda sofre racismo cotidianamente, no Brasil. A data foi escolhida por ser o dia da morte do líder quilombola, Zumbi dos Palmares, conhecido por liderar movimentos contrários a escravidão, no período colonial. Atualmente, artistas como Emicida e Mano Brow, Thais de Araújo são vozes da valorização do povo negro, que ainda é vítima de violência.

  Conforme o Atlas da Violência 2020, os casos de homicídios contra a pessoa preta aumentaram 11,5%, nos últimos anos, sendo que os Estados com maior taxa de violência com morte, encontram-se nas regiões Norte e Nordeste. Roraima lidera a estatística, de 87,5 mortos para cada 100 mil habitantes, seguida do Rio Grande do Norte com 71,6 vítimas negras.  Sobre esses números assustadores, Ribeiro (2006) explica que a violência contra a população negra pobre brasileira, é parte de um processo histórico sustentado e manifestado permanentemente “por uma sociedade que já nasceu capitalista e que hierarquiza e institucionaliza as relações sociais em diversidades de classes, raça.”

Uma conquista recente para a população negra, foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que equipara o crime de injúria racial ao de racismo, isto é, passível de punição a qualquer momento. De acordo com o artigo 140, do Código Penal Brasileiro, injúria racial consiste na conduta de ofender à dignidade de uma pessoa, por meio de palavras depreciativas referentes a raça e a cor. Agora com a resolução, o crime de injúria passa ser imprescritível e inafiançável, como o crime de racismo prevista no artigo 5º da Constituição Federal (CF), de 1988.

 

Fonte: Freepick

 

Infelizmente, os casos de racismo no Brasil são divulgados diariamente pelos veículos de comunicação.  No ano passado, um homem negro foi espancando até morte, por seguranças de uma empresa terceirizada que atuava no grupo Carrefour, em Porto Alegre. O caso teve uma intensa repercussão nacional. À época o hipermercado enviou uma nota de indignação sobre o ocorrido, bem como os envolvidos foram presos em flagrante e respondem por homicídio qualificado.  Devido a esses casos que é preciso ter leis mais duros contra crimes de cunho racista, no Brasil.

Para contribuir com o fim da desigualdade racial é preciso que o ensino público passe por uma reformulação, sendo imprescindível que os professores conversem com os alunos sobre as inúmeras desigualdades sociais, econômicas e raciais contra a pessoa da cor negra, no país.  Nessa perspectiva, Lima (2006) atenta que um currículo para a formação humana é aquele orientado para a inclusão de todos no acesso os bens culturais e ao conhecimento. Já Onofre (2007) afirma que “a diversidade é característica da espécie humana nos saberes, modos de vida, culturas, personalidades, meios de perceber o mundo, o currículo precisa priorizar essa universalidade.”

No mês da Consciência Negra uma dica de leitura para entender o racismo no Brasil é a obra “Pequeno Manual Antirracista”, da filósofa e escritora Djamila Ribeiro. O objetivo do livro é construir caminhos de reflexão antirracistas para a transformação da sociedade, no intuito de gerar um espaço para o negro.

Fonte: Freepick

 

 

Referências

Atlas da Violência 2020. Disponível em < https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/download/24/atlas-da-violencia-2020> Acesso: 04, de nov, de 2021.

G1 Notícias, Rio Grande do Sull. Homem negro é espancado até a morte em supermercado do grupo Carrefour em Porto Alegre. Disponível em < https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2020/11/20/homem-negro-e-espancado-ate-a-morte-em-supermercado-do-grupo-carrefour-em-porto-alegre.ghtml>  Acesso: 04, de nov, de 2021.

Planalto, Constituição Federal da República de 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso: 04, de nov, de 2021.

Onofre(2007) REPENSANDO A questão curricular: caminho para uma educação antirracista. Disponível em < https://core.ac.uk/download/pdf/236650248.pdf> Acesso: 04, de nov, de 2021.

LIMA, Elvira Souza. Currículo e desenvolvimento humano. Indagações sobre currículo. Brasília (2006)

RIBEIRO, C. A. C. Classe, raça e mobilidade social no Brasil. Dados: Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro. (2006)

Ribeiro, Djamila. Pequeno Manual Antirracista(2019). Disponível em < https://books.google.com.br/books?id=zJm2DwAAQBAJ&hl=pt-PT&source=gbs_navlinks_s>  Acesso: 04, de nov, de 2021.

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Crimes de racismo devem ser denunciados para a igualdade racial acontecer

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“Nossos corpos negros sentem essa dor! Nossas vidas também importam! Campanhas elucidativas já não são suficientes, precisamos que a estrutura governamental se movimente para proteger o povo que construiu esse País e abolir de vez o racismo estrutural”, enfatiza a presidente do CEPIR

A igualdade racial ainda é um desafio em diversas esferas da sociedade e mesmo sendo um direito básico, diversos tipos e formas de discriminações, exclusivamente, por conta da raça acontecem, o que configuram crimes graves contra a liberdade, contra a vida e que cerceiam direitos. Diante de tantas situações criminosas de racismo, mesmo passados 133 anos da Abolição da Escravatura no Brasil, 13 de maio de 1888, a Secretaria de Estado da Cidadania e Justiça (Seciju) vem evidenciar a necessidade de denunciar esses crimes como forma de repúdio e de enfrentamento a essa prática.

A presidente do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (CEPIR), Edilma Barros da Silva, fala que a data em que se comemora a abolição da escravatura no Brasil, também é o dia que nos leva a reflexão acerca do quão é importante a denúncia desse crime que é maléfico a toda a sociedade. “Os reflexos advindos do racismo impede o caminhar e fecha portas importantes para uma parcela expressiva da população, causa o adoecimento emocional e segrega toda uma geração. O racismo estrutural, precisa de fato libertar. Estamos muito atrasados com a efetiva libertação, já não é mais suficiente não sermos racistas, faz-se necessário sermos antirracistas e caminhar juntos no combate ao racismo é dever de cada um de nós”, conclamou.

Edilma reforça que é preciso dialogar com todos que compõem a estrutura pública, conscientizando cada um sobre a importância do fim do racismo. “Nossos corpos negros sentem essa dor! Nossas vidas também importam! Campanhas elucidativas já não são suficientes, precisamos que a estrutura governamental se movimente para proteger o povo que construiu esse país e abolir de vez o racismo estrutural”.

Crimes raciais

A abolição tardia da escravatura no Brasil em 1888, não encerrou ali a discriminação, o preconceito e a segregação por raça, etnia ou cor, considerados crimes previstos na Lei nº 7.716/89, a chamada Lei Caó. A legislação tipifica racismo como preconceito e discriminação racial ou crime de ódio racial por meio de manifestações físicas ou verbais violentas contra indivíduos ou grupos por conta da etnia, raça ou cor, bem como nega acesso a serviços básicos (ou não) e a locais pelos mesmos motivos; o chamado racismo institucional que promove tratamento diferenciado entre raças no interior de organizações, empresas, grupos, associações e instituições congêneres.

Ainda em reforço ao combate aos crimes de racismo, o Estatuto da Igualdade Racial, Lei nº 12.288, sancionada em 2010, veio para assegurar à população negra, a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

Diferenças entre Racismo e Injúria Racial

Segundo o Estatuto da Igualdade Racial, o racismo é toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada;

Já a injúria racial, conforme a Lei nº 10.741/ 2003, ofende a dignidade ou o decoro de alguém com a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

Punição

O crime de racismo é inafiançável e imprescritível, ou seja, pode ser denunciado a qualquer tempo e pode culminar na reclusão de um a cinco anos e multa. Já na injúria racial, o prazo máximo para oferecer denúncia é de até seis meses, e as penas são mais brandas, com reclusão de um a três anos e multa, conforme parágrafo 3º do art. 140 do Código Penal.

Como denunciar crimes raciais

  • Disque 100 (Disque Direitos Humanos)

O Disque 100 é um serviço telefônico gratuito do Governo Federal vinculado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), disponível 24 horas, sete dias por semana. Desde 2015 recebe denúncias de violações contra direitos humanos da população negra e de violações contra comunidades quilombolas, de terreiros, ciganas e religiões de matriz africana.

As denúncias ocorridas por meio de material escrito, imagens ou qualquer outro tipo de representação de idéias ou teorias racistas disseminadas pela internet também podem ser feitas de forma on-line pelo Site do Ministério dos Direitos Humanos.

  • Delegacias

As denúncias contra crime de racismo e injúria racial podem ser feitas também em delegacias comuns e/ou nas especializadas em crimes raciais e delitos de intolerância, quando houver. Em caso de emergência, se o crime está acontecendo, o ideal é ligar para a Polícia Militar (Disque 190) e se possível, permanecer no local do fato e identificar possíveis testemunhas. Caso o crime já tenha ocorrido, é necessário se dirigir a uma Delegacia para registrar Boletim de Ocorrência.

  • Defensoria Pública do Estado (DPE/TO)

Casos de racismo e preconceitos podem ser apresentados também no Núcleo Especializado de Defesa dos Direitos Humanos (NDDH) da Defensoria Pública (DPE/TO), órgão que assiste ás vítimas a prestarem denúncias, dá orientação jurídica e ingressa com ações judiciais, quando necessário,

Fonte: encurtador.com.br/oEGNO

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Tocantinenses são destaque no 2º Festival de Cinema Negro Zélia Amador de Deus

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Evento on-line começa nesta quarta-feira (25) e busca valorizar a produção audiovisual amazônica

Discutir o racismo através do audiovisual e valorizar a produção de cinema realizada por afro-brasileiros, sobretudo da Região Amazônica, são os objetivos do II Festival de Cinema Negro Zélia Amador de Deus. O evento ocorre entre os dias 25 de novembro e 10 de dezembro de 2020 de forma virtual por meio da plataforma www.todesplay.com.br e redes sociais do Cine Diáspora.

Esta edição homenageia a diretora de cinema e atriz Rosilene Cordeiro, que também é professora, produtora e colaborou com o curso de Licenciatura em Teatro da Universidade Federal do Pará (UFPA). A programação inclui debates, premiação e exibição de filmes. A abertura será feita através de live nas redes sociais, com a exibição do filme Princesa do Meu Lugar, de Pablo Monteiro (São Luís/MA).

Nesta edição, 135 produções foram recebidas, sendo 56 (41,48%) da Região Amazônica e 79 (58,52%) de outras regiões do país. Desses, 21 projetos de cineastas amazônicos foram selecionados e concorrem ao prêmio Zélia Amador de Deus nas categorias: Clipe da Região Amazônica; Projeto para Web da Região Amazônica; e Curta-Metragem da Região Amazônica. Dentre eles, destacam-se as obras A Sússia, de Lucrécia Dias (Arraias/TO), e Romana, de Helen Lopes (Natividade/TO).

Cena de “Romana” por: Helen Lopes

Acessibilidade – Visando a ampliação do entretenimento, o Festival de Cinema Negro também terá uma sessão especial com ferramentas de acessibilidade para pessoas com deficiência auditiva e surdas. Com interpretação na Linguagem Brasileira de Sinais (Libras) e dirigidas por negras, Blackout, de Rossandra Leone (RJ), e Seremos Ouvidas, de Larissa Nepomuceno (PR), são duas das obras selecionadas.

Confira as sinopses: Seremos Ouvidas – “Como existir em uma estrutura sexista e ouvinte? Gabriela, Celma e Klicia, 3 mulheres surdas com realidades distintas, compartilham suas lutas e trajetórias no movimento feminista surdo”.

Blackout – “Em um Rio de Janeiro futurista nada parece ter mudado. Abuso de autoridade, violações de direitos, racismo e machismo ainda dão o tom da relação do poder público com a favela. Dessa vez, entretanto, algo parece estar para mudar”.

O projeto – A primeira edição do festival ocorreu em novembro de 2019, e recebeu 107 filmes de todo o Brasil – a maioria da Região Amazônica, e teve 14 pontos de exibição nas periferias da Grande Belém. A iniciativa, batizada com o nome da professora emérita da UFPA, ativista e atriz Zélia Amador de Deus, é uma realização da produtora audiovisual Cine Diáspora e tem o apoio do Prêmio Preamar de Cultura e Arte da Secretaria de Estado de Cultura do Pará (Secult).

“O II Festival Zélia Amador de Deus parte de uma construção coletiva feita a partir de uma reunião de amigos artistas, cineastas e produtores culturais negros, que sentem em suas vidas a importância do cinema, o percebem como instrumento de mudança de mentalidades, incentivando práticas antirracistas e de valorização da produção artística afrodiáspórica e africana”, conta Fernanda Vera Cruz, da curadoria e produção da iniciativa, que contribui na renda de 24 profissionais negros e periféricos da periferia de Belém.

Serviço – II Festival de Cinema Negro Zélia Amador de Deus ocorrerá entre os dias 25 de novembro e 10 de dezembro via www.todesplay.com.br e Instagram (@cinediaspora) e Facebook (/cinediasporapa).

Indicados por categoria:

Clipe da Região Amazônica
– Estorvo – Mc Super Shock por Saturação (Macapá/AP)
– Batidão – Enme por Jessica Lauane (São Luís/MA)
– Pretinha – Taslim por Nádia D’Cassia (São Luís/MA)
– Eu sou Tambor – Vanessa Mendonça (Belém/PA)
– Retomada Ancestral – Vanessa Mendonça (Belém/PA)
– Pesadelos – Bruna BG por Anna Suav (Belém/PA)

Projeto para Web da Região Amazônica
– Enme No Corre – Enme Paixão (São Luís/MA)
– AfricAmazônia – Amérika Bonifácio (Icoaraci-Belém/PA)
– Teia de Aranha – Emily Cassandra Bonifácio (Belém/PA)
– Medo de Travesty – Attews Shamaxy (Ananindeua/PA)
– Turva Preamar Marejante – Samily Maria (Belém/PA)

Curta-Metragem da Região Amazônica
– Brilhos Apagados – Nilce Braga (São Luís/MA e Buenos Aires/ARG)
– Quedaria – Brenna Maria (São Luís/MA)
– Sobre Aquilo que Fica – Thais Sombra (Belém/PA)
– Mametu Muagile Rainha de Angola – Elizabeth Leite Pantoja (Belém/PA)
– Que Liberdade é Essa? – Sol Oliver (Belém/PA)
– A Sússia – Lucrécia Dias (Arraias/TO)
– Romana – Helen Lopes (Natividade/TO)
– Minguante – Maurício Moraes (Belém/PA)
– Traçados – Rudyeri Ribeiro (Belém/PA)
– São Geraldo – Homem de Música e Planta – Keila dos Santos (Manaus/AM)

Curta-Metragem Nacional
– Blackout – Rossandra Leone (RJ)
– Alfazema – Sabrina Fidalgo (RJ)
– 111+ – Ivaldo Correa (RJ)
– Um Grito Parado no Ar – Leonardo Souza (RJ)
– Joãosinho da Goméa – O Rei do Candomblé – Janaina Oliveira Refem e Rodrigo Dutra (RJ)
– A Cama, o Carma e o Querer – Daniel Fagundes (SP)
– Alforria Social Beat – Rodjéli Salvi (SP)
– Minha Deusa e Eu – Gabrela Vieira (SP)
– Barco de Papel – Thais Scabio (SP)
– Dádiva – Evelyn Santos (SP)
– Aurora – Everlane Moraes (SP)
– Corre – Carolen Meneses e Sidjonathas Araújo (SE)
– Filhas de Lavadeira – Edileuza Penha de Souza (DF)
– Pernambués – Quilombo Urbano de Lúcio Lima (BA)
– Adventício – Abdiel Anselmo (CE)
– Live – Adriano Monteiro (ES)
– Rio das Almas e Negras Memórias – Taize Inácia Thaynara Rezende (GO)
– Nove Águas – Gabriel Martins e Quilombo dos Marques (MG)
– Reflexo Reverso: O Outro em Branco – Fernanda Thomaz (MG)
– Banho de Flor – Hiura F. (PB)
– Seremos Ouvidas – Larissa Nepomuceno (PR)
– 2704 km – Letícia Batista (PE)
– Notícias de São Paulo – Priscila Nascimento (PE)
– Os Verdadeiros Lugares Não Estão no Mapa – João Araió (PI)
– Por Gerações – Leila Xavier (RJ)
– Encruza – Bruna Andrade, Gleyser Ferreira, Maíra Oliveira e Uilton Oliveira (RJ)
– Por Trás das Tintas –  Alek Lean (RJ)

Filmes Convidados

– Princesa do Meu Lugar – Pablo Monteiro (São Luís/MA)
– O Nikse é Que Nos Socorre – Weverton Ruan Vieira Rodrigues (Belém/PA)

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Desafios de uma estudante negra no curso de psicologia: (En)Cena entrevista Gabriela Fernandes

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Pensando na importância de discutir as pautas antirracistas e seus impactos no contexto acadêmico, em adesão à campanha #SaudeMentaldaPopulaçaoNegraImporta!, da Associação Nacional de Psicólogos Negros e Pesquisadores (ANPSINEP), o curso de Psicologia, do período de 15 de agosto a 15 de setembro, tem se dedicado à divulgação e produção de conteúdos voltados às questões raciais.

Dessa forma, entre os materiais produzidos, três entrevistas foram organizadas com mulheres negras que, de alguma forma, são vinculadas à psicologia. Levando em consideração a implicação do curso no tema, e pensando na importância de voltar a atenção para a situação da própria instituição no que tange às práticas antirracistas, a presente entrevista convidou a acadêmica Gabriela Fernandes Pereira Filha, de 23 anos, do oitavo período do curso de Psicologia do CEULP/ULBRA, para expor suas percepções e vivências como estudante negra:

(En)Cena: Qual a sua percepção, como acadêmica de psicologia, a respeito da pauta racial no corpo teórico e científico da profissão? Acredita que essa problemática é contemplada nos estudos, pesquisas e artigos desenvolvidos pela ciência psicológica?

Gabriela: É fato que a pauta racial não é contemplada na academia. As teorias são brancas, ou seja, construídas para contemplar as pessoas brancas. As pessoas que estudam, publicam artigos e projetos voltados pras questões raciais são de fato estudantes e profissionais de psicologia negros. A academia não vê como relevante abordar esse assunto nas disciplinas. Geralmente pegam todos esses conteúdos voltados para questões sociais e jogam em uma ou duas matérias. Uma ou outra ação é feita e em épocas bem específicas, mas não com o intuito de promover algo que saia do discurso, mas para acalmar os animos de quem reivindica, método esse que na verdade é bem antigo, métodos de controle.

(En)Cena: Como você avalia, no atual contexto, a presença das pessoas negras na academia? Acredita que essas pessoas compõem uma parcela significativa na docência e corpo discente?

Gabriela: A presença das pessoas negras na academia não é nem de longe uma parcela significativa. Extremamente desproporcional em relação a presença de pessoas brancas. No nosso curso, por exemplo, a quantidade de docentes negros já diz muita coisa, são 2 professores negros para 11 brancos. Nossa presença na academia é muito importante, é uma marcação politica, mas o acesso a esse lugar é marcado por obstáculos estruturais muito fortes.

Fonte: encurtador.com.br/qyIRZ

(En)Cena: Quais dificuldades e impasses você, como mulher negra, vivenciou e ainda vivencia no percurso como estudante de psicologia? Quais são seus sentimentos a respeito disso?

Gabriela: Desde o começo, tenho um sentimento de não pertencimento. É um incômodo muito grande estar em um ambiente onde há poucos negros. Uma das minhas maiores dificuldades dentro disso é perceber que há uma neutralidade muito grande nesse ambiente acadêmico de psicologia e que é pensado de forma muito consciente com o intuito de uma manutenção dessas estratégias de poder para que nós de fato não nos sintamos bem nesse lugar.

(En)Cena: Na sua opinião, o debate racial recebe a devida atenção no espaço de ensino universitário, como um todo?

Gabriela: Não. Como eu havia citado antes, eventos muito pontuais sobre temáticas raciais e cartazes na semana da consciência negra pelos corredores da universidade, não constroem academicamente profissionais com compromisso social.

(En)Cena: No que tange à representatividade negra nos diversos espaços da profissão, como você avalia a situação da Psicologia, atualmente? As pessoas negras estão recebendo as posições de destaque que merecem como pesquisadoras e autoras da prática psicológica?

Gabriela: Nós temos já há algum tempo uma articulação desses profissionais e estudantes de psicologia para ocupar mais espaços dentro dessa profissão. Apesar disso, pessoas negras brilhantes não recebem o destaque que de fato merecem, apenas são chamadas quando o assunto é relacionado à temática racial. Há uma tendência em reduzir os conhecimentos desses profissionais apenas a esse ponto.

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Tijolo por tijolo: como o racismo me enterrou viva

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Ano passado e esse ano tem sido de extremas desconstruções para mim. Começou quando eu decidi entrar em transição capilar e não imaginei o que estava por vir. Recebi e ainda recebo críticas de familiares do tipo: “Nossa, por que você fez isso com seu cabelo?”, “Ele estava melhor liso”, “Tá na moda, né?!”, “Tá tão bagunçado. Liso ficava mais arrumado”. Uma pessoa que já tinha problemas de autoestima ouvir esse tipo de coisa não ajuda em nada no emocional e na segurança.

Eu tenho tendência depressiva, tendência ao isolamento e nessa época, foi o que mais fiz. Não saia muito de casa. E quando saía, molhava o cabelo pra ele ficar mais baixo e não ter que ficar ouvindo comentários que sabia que iam me fazer mal. Diminui a interação com minha família e tinha contato com poucos amigos. Nesse período, ainda estava de luto por causa da minha avó que havia falecido e buscava contato com minha outra avó que mora na Itália. Ela também é negra e tenho muito carinho por ela.

Minha mãe não gosta que eu tenha contato com essa minha avó por diversos motivos e usava meu cabelo para me atacar quando ficava com raiva por eu não ter feito algo em casa. Ela dizia que meu cabelo era duro, bagunçado e vários outros comentários que me atingiam de uma forma que me faziam questionar se ela realmente gostava de mim do jeito que eu era. Descobri mais tarde que minha mãe era racista e que eu fui criada a partir de padrões que já não me encaixava mais.

Nessa mesma época, eu estava começando a consumir mais conteúdo de pessoas negras, seguindo pessoas que se pareciam mais comigo nas redes sociais, entendendo mais sobre o racismo, até que decidi que o tema do meu TCC seria sobre racismo. O problema era, qual professor vai me representar, vai me orientar? Todos os meus amigos já haviam escolhido seus orientadores, tinham uma conexão com eles e eu achava isso lindo. Queria isso para mim também. E foi aí que reparei que não havia ninguém para me representar na faculdade. Que não havia um único professor ou professora negros.

Fonte: https://url.gratis/LX4Ei

Depois disso, foi só por água abaixo. Não lembrava de ter estudado um único teórico negro durante toda a faculdade. Esses fatos juntaram com ataques racistas vindos da minha mãe. Um “relacionamento” fracassado com um cara de outro estado que não queria me assumir. Violência policial passando na TV. A angústia de estar indo para um último ano de faculdade e começar a perceber o quanto eu vivia numa realidade ilusória. Eu sabia sim que o racismo existia, mas simplesmente escolhia não vê-lo. Não enxergá-lo. E esse fato doeu tanto, mais tanto que comecei a ter ideação suicida. Algo que já era comum no meu histórico, mas dessa vez veio com a força de mil sóis.

Falava dessas coisas para meu melhor amigo e ele ficava preocupado, tentava me ajudar, perguntava se eu precisava mesmo ser representada por alguém. Só que essas falas me deixavam ainda mais pra baixo. Ele não entendia o que eu estava passando. Ele é branco. Não tem como entender. E o pior de tudo é que não consigo explicar. Não queria. Não dava mais pra mim. Uma noite eu estava sozinha em casa e já havia planejado tudo o que iria fazer. Como ia tirar minha vida. Até que resolvi falar com meu amigo. Ele, obviamente ficou muito preocupado e ficou horas no telefone comigo. Me convenceu a procurar uma psicóloga, já que eu estava trabalhando e podia pagar por uma. Encontrei uma profissional que trabalhava com o antirracismo, dei meu relato e a aliança terapêutica foi linda. Uma das primeiras coisas que me lembro dela me dizer foi que eu ia sofrer muito. Mas acredito que se ela não estivesse comigo durante esse processo de descoberta de mim mesma, não sei se ainda estaria por aqui. Não tenho palavras pra descrever o quanto ela me ajudou.

Fonte: encurtador.com.br/ehq69

Em uma sessão, comecei a perguntar pra mim mesma o por que que eu queria que minha mãe me aceitasse tanto. Por que eu sentia essa necessidade. Minha psicóloga respondeu: Porque ela é sua mãe. Isso me deixou bem abalada. Tive uma conversa com minha mãe depois disso e como qualquer pessoa comum, ela não entendeu o motivo de eu estar chateada com ela e ainda ficou ofendida quando disse que ela dirigia comentários racistas para mim. Depois de um tempo, ela foi entendendo o que eu queria dizer. Viu também os protestos e ficou extremamente sensibilizada. Foi quando ela me chamou pra conversar sobre isso. Que não fazia ideia da dimensão do sofrimento que o racismo causa nas pessoas negras. Hoje, ela ainda fala alguns comentários do tipo, mas já está mais consciente. Eu fico feliz por isso, por essa consciência, por mais que ainda seja mínima.

Na faculdade a história já é outra. Pouquíssimos professores negros. Quase nenhuma instrução sobre o racismo ser fator de sofrimento mental para pessoas negras. Me sinto atingida como estudante e como mulher negra. Vou ter que buscar sozinha como ajudar essas pessoas. Espero que futuramente, contratem professores e professoras que sejam negros para que os alunos como eu não se sintam perdidos como me senti no final do curso. É uma sensação de não pertencimento. Quando você percebe que não tem ninguém no ambiente que seja parecido com você. Exclusão total. Fico feliz por ter tido uma rede de apoio forte o bastante para me manter sã e uma ótima psicóloga do meu lado. Me desconstruí e me construí de novo, “Tijolo por tijolo”, e ainda estou em constante aprendizado das situações que vivi durante toda a minha vida e que hoje, já consigo perceber padrões que não me cabem mais.

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A polêmica da Ariel negra

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A representatividade da população negra no cinema se faz importante, pois fica claro que uma minoria atua em papeis de destaque

O racismo é algo presente no mundo todo, e dessa forma o cinema acaba reproduzindo essas estruturas da sociedade e isso se apresenta nos papeis que muitas atrizes/atores desempenham. Com pouca pesquisa na internet é possível encontrar diversos depoimentos de quem sofreu esse tipo de preconceito, dentre outros. Pessoas que por seu tom de pele são desqualificadas para determinados papeis, onde o personagem deve seguir uma determinada aparência. Onde algumas vezes não existe a real necessidade como no caso da Ariel e assim um racismo mascarado acaba se apresentando.

Da mesma forma, existe uma polêmica por trás da escolha da atriz Halle Bailey que viverá o papel da pequena sereia em um live-action da Disney. A história original do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen, não possui descrição de como é a aparência da Ariel, dentre outros detalhes que são adaptações para a animação.

Fonte: encurtador.com.br/howLN

O termo whitewashing é utilizado quando substitui (especialmente na indústria cinematográfica) personagens fictícios ou históricos, de etnia estrangeira, por atores de cor branca. O que pode ser visto em vários filmes como, por exemplo: Deuses do Egito, A grande muralha, Death Note, Príncipe da Pérsia, Aladdin e podemos citar as versões da população egípcia nas novelas da Record, dentre muitos outros casos.

Assim, a escolha de uma atriz negra para desempenhar um papel que originalmente foi adaptado na animação como uma branca e ruiva foi colocado em questão. Porém o que nos aproxima da história é o seu conteúdo e não a aparência dos personagens. O diretor Rob Marshall em um comunicado para a revista Variety disse: “Após uma longa busca, está abundantemente claro que Halle possui a rara combinação de espírito, coração, juventude, inocência e substância – além de uma gloriosa voz para canto – todas qualidades intrínsecas necessárias para interpretar este papel icônico”.

Fonte: encurtador.com.br/gwBFI

Neste sentido, a Disney já vem inovando na forma como apresenta suas princesas, que já não são aquelas donzelas em perigo em que o herói aparece para salvá-las. Podemos ver essas mudanças em Frozen e Moana que foi um sucesso de bilheteria, onde os obstáculos que aparecem nos filmes são resolvidos com elas como protagonistas. Então se percebe que a ideia de mulher de hoje em dia é outra, além de fortes e suficientes elas podem pertencer a uma variedade de etnias.

Dessa forma, a representatividade da população negra no cinema se faz importante, pois poucos ainda atuam em papeis de destaque. Assim como em 2018 com o filme Pantera Negra onde a Marvel buscou valorizar os negros e que teve uma grande repercussão. No Brasil, quando o filme estreou, líderes de comunidades negras levaram para os cinemas crianças que se sentiram representadas pelos personagens.

Portanto a representatividade no cinema tem um papel importante, pois se cria uma forma de identificação entre a pessoa que assiste fazendo com que ela se sinta representada. Além de ter relevância para a conscientização sobre o contexto em que pessoas negras estão inseridas, seja no cinema ou na vida real, podendo levar a um pensamento de uma sociedade mais justa e que possa existir uma maior tolerância com as diferenças.

Referências

KROLL, Justin. Disney’s Live-Action ‘Little Mermaid’ Casts Halle Bailey as Ariel. Disponível em: <https://variety.com/2019/film/news/little-mermaid-halle-bailey-chloe-x-halle-1203234294/>. Acesso em: 15 jun. 2019.

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