Reinventando no Caminho… 3

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Ter uma profissão rentável e segura era o sonho de todos da geração Baby Boomers da qual faço parte. Ser médica, advogada, enfim, profissional liberal era a grande pedida da época. Saí da faculdade de Serviço Social com a impressão de que esta não era uma profissão com a qual eu poderia ter de fato esta liberdade sonhada…

Como me firmar num mercado de trabalho tão difícil naquele momento de ditadura militar onde pensar e questionar era extremamente proibido? O que fazer com minhas ideias revolucionárias do momento? Onde colocar toda a minha rebeldia juvenil sem ser presa pela milicia ditatorial da época?

Mais uma vez fui me reinventar nos princípios de Cristo, de amar ao próximo como a mim mesma, e por isso cuidar dele da forma como Cristo queria que eu cuidasse. Entrar para o trabalho missionário foi uma forma produtiva de reinvenção da vida e do cuidado e de me auto proteger das insanas ideologias do mundo capitalista e ditatorial do momento. Após um tempo no interior de Mato Grosso do Sul, me embrenhei pelos vales montanhosos do Pará, especificamente no local onde se deu a famosa “Guerrilha do Araguaia”.

Fonte: encurtador.com.br/kpyz6

Com 24 anos, lá estava eu me reinventando com os conceitos recebidos do curso emblemático e reconceituado de Serviço Social, para trabalhar numa comunidade como evangelista no meio de um povo marcado pela dor e sofrimento causado pelo poder do Estado.

Trabalhar com mulheres cujos maridos foram esquartejados e jogados ao rio, crianças cujos pais saíram para a mata colher castanhas para sobrevivência e nunca mais voltaram, isso trazia muita dor e desconforto. Homens que não sabiam ler nem escrever o próprio nome, direito que lhes fora negado pelo Estado que lhes oprimia e perseguia… como viver e conviver com toda esta tragédia humana sem se tocar pelos princípios da Palavra de Deus? Como agir de acordo com os ensinos de Cristo e com os valores cristãos verdadeiros? Como conviver com o fato de que naquela mesma região, dois religiosos estrangeiros tinham sido expulsos do país por professarem a fé e ajudarem aos ribeirinhos e pessoas de pouco conhecimento político, dando a eles um pouco de esperança?

Eu, uma evangelista, Assistente Social recém-formada, tinha que dar conta desta dor e conviver com esta dicotomia imposta na sociedade do município de São Geraldo do Araguaia. Fui morar na toca do lobo… Dentro do quartel do exercito (2º BEC – Batalhão de Engenharia e Construção), vigiada por todos os lados, tendo minhas correspondências todas abertas antes de chegar ao destino… como conviver com isso sem perder a fé e a esperança  e tendo que ofertar a mesma fé e esperança aos povos que ali sofriam?

Fonte: encurtador.com.br/aijGL

Reinventar-se é a palavra. Transformar momentos de luta em experiência de vida e de convivência pacífica (nem tanto) com o inimigo que mora ao lado… pude entender nesta fase da vida como é precioso seguir os ensinamentos e os passos de Cristo que foram até a cruz. Se possível eu iria também, pois o ato de me reinventar deu-me coragem para seguir em frente, mudar as situações e crescer como pessoa ajudando outras pessoas a viverem uma vida plena apesar da dor e do sofrimento.

O resultado disso tudo se transformou em alegria ao ver uma comunidade inteira se mobilizando na construção de uma escola feita de palha e na festa de vê-los com uma cartilha construída pelos próprios ribeirinhos a partir da realidade deles, segundo os princípios de Paulo Freire.

Isso é se reinventar, é transformar o luto em luta, a crise em criação.

Carpe Diem

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Reinventando no Caminho… 1

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As múltiplas definições do termo Reinventar-se nos conduz a um passeio pelo mundo da (re)criação, (re)produção, (re)composição, (re)instituição, dentre outros conceitos. Percebe-se então que reinventar-se faz parte do mundo dos seres vivos em qualquer dimensão. Nós os humanos temos o privilégio de nos reinventarmos a cada dia ou a cada situação em que seja necessário o desenvolvimento de novas habilidades, nos permitindo viver novas experiências, saindo de zonas de conforto que nem de longe nos ajudam a crescer. Logo, reinventar-se significa crescer na forma de pensar, agir e promover mudanças significativas para a vida.

A experiência de ter que me reinventar ou me reconstruir começou para mim num período muito cedo da vida. Aos 15 anos, tive que sair da casa paterna para um mundo novo e distante da minha realidade até aquele momento, com a finalidade de buscar conhecimento através do estudo. Nova cidade, novos amigos, nova família para conviver, tudo novo e assustador para uma adolescente do interior de Goiás, que nada sabia da vida e do que a aguardava no futuro.

Fonte: encurtador.com.br/zAJQ2

O primeiro choque adaptativo foi cultural. Fui morar com uma família de amigos americanos, com costumes diferentes, língua diferente, hábitos diversos dos meus, e para sobreviver a este primeiro momento, precisei adaptar os meus costumes e cultura familiar aos que estavam sendo apresentados a mim naquele instante. Meu primeiro desejo era voltar para o meu berço anterior. Correr novamente ao útero protetor da minha mãe. Não queria me expor a uma nova realidade. Com o tempo, fui percebendo que esta era a forma como a vida iria me ensinar a ser quem eu sou. Uma mulher forte, destemida e capaz de me adaptar às diversas situações que me fossem apresentadas. Era necessário crescer. Reinventar-me. Tornar-me outra pessoa sem me destituir dos valores, crenças e modos de pensar a vida e a fé.

Assim sendo, resolvi não sobreviver mas, viver a vida em toda a sua plenitude, aproveitando cada oportunidade que estavam me oferecendo naquele momento, para tornar-me alguém em quem eu mesma pudesse confiar.  Reinventar-se dói e cura a própria dor.

Carpe Diem

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