O que se quer dizer com desigualdades sociais em saúde?

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A redução das desigualdades sociais em saúde não é uma tarefa fácil, nem sempre as boas intenções resultam em intervenções com o impacto esperado. A relação existente entre a divisão social e a desigualdade em saúde foi analisada considerando as consequências da distribuição e controle desigual dos recursos socioeconômicos dos grupos na população, sem reduzir essa compreensão apenas no processo de produção da saúde.

Quando falamos em igualdade ou desigualdade, estamos comparando situações sociais que vem sendo documentadas há muito tempo, a partir do século XIX. No Brasil, a saúde é um direito de todos e que deve ser garantido mediante ações de política pública, quando os diferenciais em mortalidade geral ou específica são apresentados, é que o acesso aos serviços de saúde é diferenciado para vários grupos, os efeitos são decorrentes de problemas na utilização dos recursos disponíveis por incapacidade do indivíduo ou por características de organizações dos próprios serviços, onde afetam mais os pobres, marginalizados e muitos deles são incapacitantes.

Fonte encurtador.com.br/pCIMO

Podemos identificar teorias que fornecem elementos para a compreensão do processo de produção da saúde e seus reflexos sobre a distribuição do estado de saúde na população. A estruturalista, com maior importância à estrutura econômica da sociedade, capaz de explicar grande parte das desigualdades. A psicossocial que dá mais importância à percepção da desvantagem social como fonte de estresse e desencadeadora de doenças predomina a privação relativa, uma vez ultrapassado o limiar de atendimento das necessidades básicas.

A versão brasileira da determinação social do processo saúde dá maior ênfase explicativa ao modo de vida, características sociais de produção, distribuição e consumo. A teoria ecossocial representa o esforço de articular, no sentido forte do tempo, pelos organismos humanos aspectos sociais e psíquicos nos quais os indivíduos vivem e trabalham. Há diferentes eixos de análise possíveis no estudo das desigualdades sociais, essa discussão dá maior destaque a posição de classe social, a renda, o gênero e a etnia.

A posição social e seus reflexos sobre a saúde

A saúde de uma sociedade é resultado de um processo histórico de organização e reprodução social, que pode ser analisado partindo de diferentes domínios da vida. Características da espécie biológica, das relações ecológicas do grupo e sua cultura delinearão ao longo do tempo, sistemas de reprodução social que perpetuaram processos mantenedores ou deletérios à saúde.  Segundo Barata (2009) “tal conceito torna falha a tentativa de estabelecer relações lineares de causa-efeito entre indicadores sociais e problemas de saúde”.

O conceito Marxista de classe social é definido por posições no processo de produção. Visto na relação de dominação e exploração por parte da burguesia (donos dos meios de produção) com o proletariado, (operários) que vendem sua força de trabalho. Esse conceito inclui as dimensões sociais, jurídicas, ideológicas e demais aspectos. Tal desigualdade só seria desfeita através do que Marx chamou de ditadura do proletariado ou sociedade comunista que acabaria com o sistema de classes.

Nesta perspectiva, o status de saúde do indivíduo está diretamente ligado à classe social a que pertence. Segundo o que busca explicar o levantamento do departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, em 1992, que demonstrou que a prevalência de baixo peso em filhos de mães não fumantes do proletariado era maior que a prevalência de baixo peso em filhos de mães fumantes da burguesia. Este estudo demonstrou que a determinação da classe social é mais significativa do que o tabagismo, já conhecido fator de risco para tal condição.

Fonte: encurtador.com.br/muGWZ

Já na conceituação de Weber a classificação social ocorre nas esferas econômica (ocupação), prestígio social, (ligada à escolaridade) e poder político (poder ou riqueza renda). Ficando assim a sociedade dividida em camadas de acordo com as condições socioeconômicas correlacionando novamente a qualidade de saúde e as desigualdades sociais à classe social de cada indivíduo, sendo a ocupação a variável mais utilizada nos países europeus como medida de classe social, os Ingleses assim a fazem em cinco classes: profissionais (formação universitária) técnicos (form. Técnica) trabalhadores qualificados manuais e não manuais, trabalhadores semiqualificados e não qualificados.

Outra variável bastante usada é o nível de escolaridade, associada ou não a ocupação. A escolaridade materna, por exemplo, interfere diretamente na maioria dos problemas de saúde infantil, sendo um indicador do nível de compreensão para colocar em prática as orientações de cuidados com a criança. As desigualdades sociais refletem não apenas no estado de saúde, mas também em relação ao acesso e uso do serviço de saúde.

No Brasil, a Pesquisa Mundial de Saúde, constatou que a autoavaliação de saúde, a prevalência de doenças crônicas e o uso de serviços de saúde, sobretudo preventivos, possuem forte relação com a escolaridade. Exemplificando, Novas e Braga em 2003 demonstram que uma parcela de 75% das mulheres brasileiras com mais de 25 anos fez exame Papanicolau, a maioria possuía melhor grau de escolaridade.

Fonte: encurtador.com.br/apyZ5

Diversos estudos comparativos tais como indicadores socioeconômicos e impactos sobre a saúde em países selecionados- 2006, PIB per capta e mortalidade infantil em cinco capitais brasileiras mostram que quanto maior o IDH, investimento em tecnologia e saúde, melhores os níveis de saúde e de expectativa de vida, menor a taxa de mortalidade infantil e melhores as condições de vida.

Conforme Barata (2009, p. 39):

A posição social dos indivíduos e grupos sociais, medida por indicadores de classe social, variáveis isoladas como escolaridade e classes ocupacionais, ou a partir das condições de vida em determinados espaços geográficos, é um poderoso determinante do estado de saúde das populações. Atuando sobre os perfis de morbidade e mortalidade bem como sobre o acesso e utilização dos serviços de saúde.

 

Ser rico faz bem à saúde?

O conceito de riqueza é relativo e não varia apenas entre as pessoas de diferentes países, mas entre pessoas de um mesmo país, a riqueza é algo completamente relativo e insatisfatório, tem uma definição particular de cada um, o que pensamos ou sentimos sobre riqueza, vem permeado pela nossa cultura, o que aprendemos socialmente e psiquicamente através de nossas relações.

O indivíduo de países mais ricos consegue garantir atendimento das necessidades básicas essenciais para saúde, moradia, alimentação, trabalho, educação. Não se observa uma relação do tipo quanto mais rico um país mais saudável sua população, a partir de certo limiar os aumentos na riqueza não se traduzem em mais saúde. Estudos que buscam explorar a relação entre nível de riqueza, distribuição de renda e satisfação com a vida, embora o nível geral de satisfação e bem-estar aumente com o crescimento de riqueza, o mesmo são maiores nos países que apresentam menor desigualdade na distribuição da renda.

Fonte: encurtador.com.br/bglBI

A esperança de vida com qualquer uma das medidas de concentração de renda, os impostos das desigualdades na qualidade de vida são diretos sobre os países mais pobres, mas afetam as demais camadas da sociedade porque provocam deterioração da vida pública, perda do senso de comunidade, aumento da criminalidade e da violência. A vida em sociedade com grandes desigualdades sociais parece menos civilizada, o combate à essa desigualdade pode vir a melhorar na distribuição desigual de poder e propriedade nas sociedades modernas.

As desigualdades étnicas necessariamente significam racismo?

A desigualdade racial é o resultado de distinções sociais hierárquica entre grupos étnicos. Parte desses tipos de práticas discriminatórias resultam de estereótipos como xenofobia e outras formas de discriminação. Isso continua a ocorrer nas sociedades com o aumento da globalização. Para Karl Marx existem duas classes sociais com desigualdades significativas (proletariado e burguesia). Nas ciências biológicas raças e sinônimo de uma divisão dentro de uma mesma espécie. Já entre nós os humanos a noção de raça aparece como construção ideológica de certos grupos. A desigualdade social e a pobreza são problemas sociais que afetam a maioria dos países na atualidade.

O termo racismo refere-se a uma ideologia social de inferioridade, que é usado para justificar o tratamento dado a membro de grupos raciais ou étnicos, acompanhado de atitudes negativas e depreciação. Uma sociedade racista acaba produzindo a discriminação em toda a estrutura social. Alguns problemas de saúde, comportamento apresentam maior associação com a exposição a situação de discriminação e racismo, os efeitos do racismo e da discriminação a saúde podem ser agudos ou crônicos, agindo provavelmente através dos mecanismos fisiopatológicos do estresse, baixa autoestima, doenças físicas, doença do sono e tentativas suicidas.

Fonte: encurtador.com.br/svwAH

Para que haja uma melhora nas desigualdades sociais em relação a saúde, dependem de políticas-públicas capazes de modificar os determinantes sociais entre outros motivos, pela má distribuição de renda em uma população, onde se concentra a maioria dos recursos nas mãos de uma minoria. A desigualdade social e a pobreza são problemas que afetam uma grande parte da população. É verdade que as desigualdades sociais são em grande parte gerados pelos jogos do mercado e do capital. De acordo com a sociologia, a saúde perdeu seu status de direito tornando-se um investimento na qualificação dos indivíduos.

Embora comecem a haver estudos de desigualdades sociais em saúde, enfocando especificamente os efeitos deletérios das situações em que a distribuição de poder é assimétrica entre diferentes grupos sociais, seja por questões relacionadas à idade, gênero, etnia, religião, seja por questões relacionadas à classe social ou às condições materiais de vida, ainda há um longo caminho a percorrer na compreensão de fenômenos com essa complexidade (BARATA, 2009, p. 71).

Relações de gêneros e saúde: desigualdade ou discriminação

Gênero possui inúmeros sentidos. Na biologia, refere-se à categoria taxonômica que agrupa espécies relacionadas filogeneticamente. Na gramatica, estabelece dentro da classe de palavras o contraste entre masculino e feminino. E na saúde esse conceito mescla algumas das características dos anteriores, ou seja, o termo gênero aqui é utilizado para marcar características próprias aos comportamentos de grupos de sujeitos sociais e assim diferenciar o masculino do feminino, porém com o enfoque aos serviços de saúde. Contudo, segundo Barata (2009, p. 73) “gênero significa o conjunto de seres ou objetos que possuem mesma origem ou que se acham ligados pela similitude de uma ou mais particularidades”.

Há uma grande confusão entre os termos sexo e gênero, como ao utilizar gênero como sinônimo de sexo ou utilizar o conceito para relacionar aos problemas referentes as mulheres, principalmente ligados a reprodução. Mas, antes de tudo, confusão no grave erro conceitual, principalmente na área da saúde. Pois o termo gênero só passou a ser utilizado no ressurgimento do movimento feminista para clarear esse pensamento e romper com as desigualdades em saúde.

Portanto, para esclarecer esses termos Krieger (2009, p. 74) afirma que: “Temos um sexo, biologicamente determinado, que influencia algumas das nossas condições de saúde, mas também somos gênero, isto é, produto do processo sociocultural que molda na sociedade os papeis femininos e masculinos e defini as pautas de relação entre homens e mulheres”.

É na segunda metade do século XX que surge a emergência de movimentos sociais diversos. E é nesse novo contexto que o movimento feminista ressurge e com ele manifesta-se as questões de gênero. Onde parte dos integrantes desse movimento considera que as determinações de gênero são mais importantes do que a posição do indivíduo na estrutura social. Alguns argumentam então que, ao nascer o indivíduo já passa a ter toda sua existência determinada pelas relações de gênero que moldam o seu perfil epidemiológico. Outros, dão maior peso aos determinantes de inserção social dos indivíduos, às classes sociais.

Fonte: encurtador.com.br/hrDJU

Contudo, as relações de gênero são independentes de outros processos sociais e são marcados pelo antagonismo na relação de dominação das mulheres pelos homens. Barata diz que, é muito difícil desembaraçar as diferentes dimensões de determinação e mediação presentes nos processos sociais, como as relações sociais na divisão sexual do trabalho, a divisão sexual do poder na sociedade, e a construção do feminino e do masculino na organização social e na divisão de papeis.

Todavia, a estrutura social tem sua importância, pois se esta for ignorada gera um enfraquecimento do poder explicativo da categoria gênero e impede a compreensão dos seus diversos fenômenos. Não há como estabelecer uma hierarquia rígida entre as diferentes categorias de determinação desse processo saúde-doença, pois a categoria gênero pode tanto ocupar a posição de determinação como de mediação dentro dos diferentes aspectos da organização social. Assim, “gênero é uma construção social baseada nas diferenças de sexo, mas cujo alcance ultrapassa largamente os aspectos exclusivamente biológicos” (BARATA, 2009, p. 78).

A mortalidade, para boa parte da população, é maior entre homens, desde o seu nascimento. Isso devido a sua exposição a fatores e situações de risco ao longo da vida, como a exposição a situações insalubres de trabalho, o consumo exagerado do álcool, cigarro e outras drogas, e a frequente situação de risco para acidentes e violências. Assim, para chegar nessa conclusão foi feita uma classificação por sexo dos indivíduos afetados, mas podem ser indicadas diferenças de gênero, ou seja, esses “homens” podem ser biologicamente do sexo masculino, mas não ter o mesmo gênero.

Em contrapartida, a maior parte das mulheres têm a pior avaliação de estado de saúde e maior frequência de morbidade. Isso partindo do ponto de vista biológico e parte sendo relacionado com as características do trabalho feminino, uma vez que as condições de trabalho atribuídas a elas são relevantes para seu estado de saúde. Segundo Barata (2009, p. 86), “As mulheres apresentam maior proporção de saúde regular ou ruim, em todos os grupos de idade, estratos de renda e níveis de escolaridade”.

Fonte: encurtador.com.br/oIX05

A violência é um problema de saúde com importância crescente e no qual a determinação das relações de gênero ocupa uma posição central. E dentre os diversos tipos de violência, destaca-se a violência urbana que têm os homens como alvo, onde a mortalidade por homicídio representa uma das facetas do crescimento dessa violência e que se compara aos acidentes de transito em seus números alarmante de mortos; e a violência doméstica que afeta as mulheres. E ainda tem os comportamentos violentos das camadas da população vivendo em condições de exclusão social, comportamentos esses que servem para reafirmar sua identidade, e é nessas áreas que os homicídios ocorrem majoritariamente no espaço público.

A utilização dos serviços de saúde se dá pela necessidade de cuidado com a saúde ou com a existência de um problema de saúde. Segundo Barata, os serviços de saúde são mais utilizados pelas mulheres, em consultas medicas; as consultas médicas aumentam proporcionalmente de acordo com a renda familiar, nos dois sexos; e nos últimos anos essas consultas aumentaram com a idade e o nível de escolaridade. Mas percebeu, desigualdade de gênero entre pessoas com bom estado de saúde, na utilização preferencial de consultas preventivas; pouca desigualdade entre gêneros, em pessoas com estado de saúde regular ou ruim; e nenhuma desigualdade nos grupos de maior renda.

Através de dados do inquérito nacional de saúde do Canadá, Barata reforçou a concepção de gênero como uma construção social. Pois diferentes sociedades produzem diferentes graus de desigualdade entre homens e mulheres. Não se pode generalizar essas evidências. Contudo, Barata (2009, p. 94), diz: “Gênero, como construção social, consiste em um sistema multinível, incluindo arranjos econômicos e políticos e crenças culturais na dimensão macrossocial, padrões de comportamento na dimensão intermediária e aspectos ligados a identidade individual na dimensão microssocial”.

Políticas para o enfrentamento das desigualdades

De acordo com Rita, a abordagem coletiva ou populacional do processo saúde-doença na perspectiva da epidemiologia social resulta em fazer perguntas, tais como as doenças se produzem, como chegam a diversas populações, por que somente uns adoecem e não todos, e quais medidas as políticas públicas podem interferir diante disso.

Para compreender de que forma as doenças são determinadas e como intervir, BARATA (2009, p. 95) diz que “é necessário inicialmente tratar dos modelos de causalidade em uso pela epidemiologia”. Com a abordagem convencional dos modelos multicausais, a variável ou fator de risco é analisado de início associado com a doença ou problema de saúde estudada. Rita cita exemplos de fatores de risco para baixo peso ao nascer, a idade materna, hábito de fumar das mães e a classe social ao qual pertencem. Levando em consideração os exemplos citados, Barata (2009, p. 96) conclui:

Consequentemente, se a idade materna é um fator de risco, as políticas para redução do baixo peso ao nascer devem incluir ações visando a diminuir a gravidez na adolescência. Do mesmo modo, se o hábito de fumar é um fator de risco, será necessário que as mães deixem de fumar para reduzir a incidência de baixo peso e, finalmente, se a pobreza também está relacionada, será preciso usar políticas compensatórias que possibilitem melhor alimentação durante a gestação para evitar o baixo peso. Teríamos assim um conjunto de intervenções educativas, de controle da gravidez na adolescência, redução do hábito de fumar e de suplementação alimentar para enfrentar o problema.

Rita cita que de acordo com Leonard Syme, existe três problemas na prática da saúde pública. A primeira seria que se perde bastante tempo ao tentar identificar quais são os fatores de risco. Em segundo, não se imagina que seja possível a promoção da saúde quando a atenção estiver totalmente no fator de risco e na doença. E por último, o mais importante é a identificação das determinantes de saúde, e o principal é a classe social.

Fonte: encurtador.com.br/knAMZ

Segundo Barata, há duas formulações que se destacam devido a abordagem complexa dos diferentes níveis da organização da vida social, são eles: o modelo do modo de vida elaborado por Naomar de Almeida Filho e o da comissão de Determinantes Sociais em saúde da Organização Mundial da Saúde.

O primeiro modelo reúne as esferas de produção e da reprodução material e simbólica da sociedade, o modo de vida dos grupos sociais, o processo de trabalho, a estrutura de classes, as práticas cotidianas e a construção cultural como determinantes das configurações de risco que se acoplam ao perfil de saúde-doença-cuidado no âmbito populacional. O segundo modelo destaca cada um dos aspectos mais relevantes das dimensões apontadas no modelo do modo de vida, visando a facilitar a identificação de possíveis áreas de intervenção para as políticas sociais que busquem a redução das desigualdades (BARATA, 2009, p. 99).

Rita diz que o contexto social é o que determina a cada sujeito sua posição e esta, determina as oportunidades de saúde. Segundo Rita, há pelo menos três níveis distintos de ação política com finalidade na redução das desigualdades. “Tais como políticas econômicas e sociais que modifiquem a estratificação social; políticas que modifiquem as condições de exposição e vulnerabilidade dos grupos sociais; ou políticas de saúde que atuem sobre as consequências negativas das desigualdades, buscando minimizar o impacto de seus efeitos” (BARATA, 2009, p. 99 e 100).

Além do sistema nacional de saúde com acesso universal, é preciso que exista distribuição adequada de serviços e de equipamentos no território, para que os mesmos possam ser utilizados pelos indivíduos que deles necessitam independentemente das condições socioeconômicas, gênero, etnia e outras particularidades. Os profissionais de saúde precisam estar adequadamente habilitados para garantir a qualidade técnica e humana do atendimento, e os serviços precisam estar organizados para responder às necessidades de saúde (BARATA, 2009, p. 107).

Por mais que haja boas intenções em tentar resolver as desigualdades, não há resultados com o impacto esperado. É necessário que haja o reconhecimento dessas desigualdades sociais em relação a saúde, para que possa achar meios de bani-las. É preciso buscar a compreensão dos processos que a produzem e identificar os diferentes grupos sociais. São vários desafios enfrentados sobre a desigualdade social em saúde, isso requer um conjunto de políticas públicas, exemplo é o SUS, que tem como finalidade amparar aqueles que não possuem renda, trazendo consigo uma equidade na sociedade, embora na grande maioria seja um sistema falho.

REFERÊNCIAS:

BARATA, Rita Barradas. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde. 2ª. Reimpressão. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2016.

* Trabalho elaborado na disciplina de Antropologia, ministrada pelo prof. Sonielson Luciano de Sousa.

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A Sociedade Individualizada: a dinâmica pós-moderna no trabalho

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O livro “A Sociedade Individualizada: Vidas contadas e histórias vividas” de Zygmunt Bauman começa abordando o significado da palavra “trabalho” em seu primeiro uso e primeiros significados. Assim, de acordo com Oxford English Dictionary, a palavra trabalho se referia a um tipo de trabalho físico para suprir as necessidades de uma comunidade. Porém, séculos depois, já adquire um significado mais complexo de plural de trabalhadores que participam da produção.

Com isso, formaram-se sindicatos e associações que vincularam os dois significados e tornaram isso, uma questão política. O texto traz a ideia do economista Daniel Cohen que fala sobre a desigualdade entre as nações, que é de origem recente e que é um produto dos dois últimos séculos, época em que surgiu a concepção de que o trabalho era a fonte de riqueza e assim, surgiram também as políticas guiadas por essa suposição.

Fonte: http://zip.net/bqtJmr

A nova desigualdade global adquiriu novas noções fornecidas pela nova ciência da economia, a qual substituíra as ideias fisiocráticas e mercantilistas que estava acompanhando a Europa no caminho de sua fase moderna até o limiar da Revolução Industrial. Tais noções foram cunhadas na Escócia, país no qual estava totalmente preparado para ser o epicentro da ordem industrial emergente, mas que estava afastado do impacto cultural e econômico do vizinho. Assim, a Escócia afirma que, o trabalho é talvez, a única fonte de riqueza porque, concordando com o autor, a predisposição de formas de ação no “centro”, são sempre percebidas mais rapidamente e trabalhadas, articuladas, objetivadas e moldadas pelas “periferias” (subúrbio dos centros civilizacionais).

A criação da nova ordem industrial foi a “grande transformação” que se deu a partir da separação dos trabalhadores de seus meios de sustento, como sugeriu Karl Polanyi muitos anos mais tarde ao atualizar a visão de Marx. A partir desse ponto, o trabalho pode ser considerado uma simples mercadoria, pois a produção e a troca passaram a ser deixados do modo de vida mais amplo. Além de que o trabalho passou a ser tratado como tal mercadoria, como a terra e o dinheiro. Essa desconexão deixou a capacidade de trabalhar livre, por conseguinte, ela pode ser colocada, recombinada, de diferentes formas, bem melhores, sendo assim, o exercício mental e físico se tornou um fenômeno de direito próprio.

“Sem que essa desconexão acontecesse, haveria pouca chance de que o trabalho pudesse ser mentalmente separado da totalidade a que ele por natureza pertencia e se condensasse em um objeto autocontido.” (BAUMAN, 2008, p.29). Onde, na visão pré-industrial da riqueza, a terra era a “totalidade”. Porém, já na nova era industrial, que foi proclamado o advento de uma sociedade distinta (Inglaterra), o que dentre fatores, destruiu o campesinato e o vínculo natural entre terra e trabalhador. Como consequência, parecia aos contemporâneos da Revolução Industrial, a emancipação do trabalho.

Fonte: http://zip.net/bbtHg8

Essa emancipação do trabalho, não se estendeu livremente por muito tempo para estabelecer seus próprios caminhos. A forma de vida não tradicional, que já não era mais viável, a qual tinha o trabalho antes de sua emancipação, seria substituído por outra ordem, desta vez, já projetada e construída, produto de uma racionalização e pensamento, já que tinham descoberto que o trabalho levava a riqueza, agora explorara essa fonte de forma eficiente e planejada.

Para um novo começo era necessárias mudanças, de forma com que os antigos hábitos de convívio fossem exorbitados e deixados de lado, dando lugar a um sensacional e visível início de uma mudança que levara a diversas indagações. O real valor para o que havia acontecido estava sendo encarado de forma séria e com entusiasmo sabendo que a mudança só ocorreu mediante a auto avaliação de como seria o futuro em questão a partir da li, naquele momento a capacidade de pensar, sonhar, projetar estava sendo encarado com seriedade, pois a liberdade descoberta era motivo de grande especulação, levando assim a busca daquilo que era novo e por mais que fosse desconhecida teria que ser passada adiante para que fosse introduzida a rotina diária.

Henry Ford faz uma indagação para que possamos refletir a respeito da real forma no qual queremos viver se e com a famosa tradição imposta por muitos que outrora passada de geração a geração leva especulação, mas que de outra forma percebe que o ser humano vive bastante o hoje, porém alguns atos feitos por Ford para ganhar dinheiro fazem com que refletimos sobre a real forma de ser e estar imposta a seus funcionários, porém teve iniciativa e disse o que os outros queriam dizer a tempos.

Linha de montagem de Henry Ford. Fonte: http://zip.net/bntHn2

O tempo da modernidade pesada fez com que houvesse uma necessidade que o trabalho e o capital teriam que andar juntos um dando segmento ao outro claro que isso não viria se não fosse o fato de que os trabalhadores necessitavam sustentar suas famílias e seguir suas vidas e o capital necessitavam deles para crescerem e expandirem-se, ou seja, um depende do outro. “Para que ambos – capital e trabalho – pudessem se manter vivos, cada um precisava ser mantido como mercadoria: os donos do capital tinham de ser capazes de continuar comprando trabalho, e os donos deste precisavam estar alertas, saudáveis, fortes e de certo modo atraentes para não afastar os possíveis compradores” (BAUMAN, 2008, p.33).

Os desempregados começaram a ser vistos como substitutos ou sucessores daqueles que já trabalhavam, ou seja, o trabalho não poderia parar o capital que estava em jogo. Pensar no bem-estar social nessa situação se tornava meio ambíguo, mesmo nessas circunstâncias o bem-estar era de certa forma visto como algo que iria passar. Na Ford, mesmo com a carga horária um pouco exorbitante, ainda havia um pouco de cuidado com os jovens aprendizes que conseguiam emprego fixo na mesma, visando e uma em um pensamento duradouro sobre o futuro não só do jovem empregado como também da empresa.

A medida que se assumia que ficar na companhia do outro iria durar, as regras desse estar juntos eram de foco de intensas negociações. Os sindicatos refundaram a importância dos trabalhadores e resultou em restrições à liberdade de manobra dos empregadores. Essa situação mudou-se e o motivo é a nova mentalidade de curto prazo que substitui a de longo prazo.  Flexibilidade quando aplicado ao mercado de trabalho significa fim de emprego, trabalha com contratos de curto prazo. É também preciso acrescentar, porque o modo como o trabalho é conduzido do pouco, cada vez menos espaço para as suas habilidades. De maneira distinta dos tempos de dependência mútua de longo prazo, dificilmente existe qualquer estímulo para se ter um interesse sério.

Robert Reich sugere que as pessoas hoje empenhadas em atividades econômicas podem ser grosseiramente divididas em quatro grandes categorias.  “Manipuladores de símbolos”, pessoas que inventam ideias e formas de fazê-las desejáveis e vendáveis, formam a primeira categoria. Aqueles empenhados na reprodução do trabalho, educadores ou vários funcionários do Estado de bem-estar social, pertencem à segunda categoria. A terceira cobre pessoas empregadas em “serviços pessoais”. E por fim a quarta, à qual pertencem as pessoas que durante os últimos 150 anos formaram o “substrato social” do movimento trabalhista.

Fonte: http://zip.net/bmtHf2

Peyrefitte distingue a empresa que oferece empregos como o lugar mais importante para semear e cultivar a confiança. Se os empregados lutaram por seus direitos, foi porque eles estavam confiantes no “poder de controle” da estrutura na qual, como eles esperavam e desejavam, seus direitos seriam inscritos; confiavam na empresa. A procrastinação é o ato de adiar uma ação, neste sentido ela tem uma tendência a romper qualquer limite de tempo e a estender-se indefinidamente. A satisfação por sua vez fica relegada ao adiamento como uma provação simples e pura, uma problemática que sinaliza certo desarranjo social e ou inadequação pessoal.

No fundo o trabalho na modernidade leve, condensa as incertezas quanto ao futuro e ao planejamento em longo prazo, a insegurança estabelecida nas relações e a falta de garantias entre as partes. No mundo do desemprego estrutural ninguém se sente suficientemente seguro ou amparado, ou seja, a flexibilidade é o termo que rege os novos tempos. Assim a satisfação instantânea é perseguida, ao contrário do adiamento da mesma, uma oportunidade não aproveitada é uma oportunidade perdida. Não obstante, a satisfação instantânea é a única maneira de sufocar o sentimento de insegurança, recolocada aqui, não a única, mas sim uma das formas para dominar o sentimento de insegurança, haja vista, que existem outros subterfúgios a serem aplicados no campo da psicologia com esse intuito.

FICHA TÉCNICA:

A SOCIEDADE INDIVIDUALIZADA: VIDAS CONTADAS E HISTÓRIAS VIVIDAS

Autor: Zigmunt Bauman
Tradução: José Mauricio Gradel
Editora: Zahar
Páginas: 324
Ano: 2008

REFERÊNCIAS:

BAUMAN, Zigmunt. A sociedade individualizada: Vidas contadas e histórias vividas. 1. ed. Editora Zahar. Rio de Janeiro, 2008.

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A Bela e a Fera: um conto sobre as irmãs invejosas

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A Bela e a Fera é um tradicional conto de fadas francês. Originalmente escrito por Gabrielle-Suzanne Barbot, A Dama de Villeneuve, em La Jeune Ameriquaine et les Contes Marins em 1740, tornou-se mais conhecido em sua versão de 1756, por Jeanne-Marie LePrince de Beaumont, que resumiu e modificou a obra de Villeneuve. Adaptada, filmada e encenada inúmeras vezes, o conto apresenta diversas versões que diferem do original e se adaptam a diferentes culturas e momentos sociais (WIKIPÉDIA, 2014).

A versão original de Villeneuve inclui alguns elementos omitidos por Beaumont. Segundo essa versão, a Fera foi um príncipe que ainda jovem perdeu o pai, e sua mãe partiu para uma guerra em defesa do reino. A rainha deixou-o aos cuidados de uma fada malvada, que tentou seduzi-lo enquanto ele crescia; quando ele recusou, ela o transformou em fera.

De forma resumida, o conto “A Bela e a Fera” relata a história da filha mais nova de um rico mercador, que tinha três filhas e três filhos, porém, enquanto as filhas mais velhas gostavam de ostentar luxo, de festas e lindos vestidos, a mais nova, que todos chamavam Bela, era humilde, gentil, e generosa, gostava de leitura e tratava bem as pessoas.

Um dia, o mercador perdeu toda a sua fortuna, com exceção de uma pequena casa distante da cidade. Bela aceitou a situação com dignidade, mas as duas filhas mais velhas não se conformavam em perder a fortuna e os admiradores, e descontavam suas frustrações sobre Bela, que humildemente não reclamava e ajudava seu pai como podia.

Um dia, o mercador recebeu notícias de bons negócios na cidade, e resolveu partir. As filhas mais velhas, esperançosas em enriquecer novamente, encomendaram-lhe vestidos e futilidades, mas Bela, preocupada com o pai, pediu apenas que ele lhe trouxesse uma rosa.

Quando o mercador voltava para casa, foi surpreendido por uma tempestade, e se abrigou em um castelo que avistou no caminho. O castelo era mágico, e o mercador pôde se alimentar e dormir confortavelmente, pois tudo o que precisava lhe era servido como por encanto. Ao partir, pela manhã, avistou um jardim de rosas e, lembrando do pedido de Bela, colheu uma delas para levar consigo. Foi surpreendido, porém, pelo dono, uma Fera pavorosa, que lhe impôs uma condição para viver: deveria trazer uma de suas filhas para se oferecer em seu lugar.

Ao chegar em casa, Bela, mediante a situação se ofereceu para a Fera, imaginando que ela a devoraria. Mas ao invés de devorar a moça, a Fera foi se mostrando aos poucos como um ser sensível e amável, fazendo todas as suas vontades e tratando-a como uma princesa. Apesar de achá-lo feio e pouco inteligente, Bela se apegou ao monstro que, sensibilizado a pedia constantemente em casamento, pedido que Bela gentilmente recusava.

 

 

Um dia, Bela pediu que Fera a deixasse visitar sua família, pedido que a Fera, muito a contragosto, concedeu, com a promessa de Bela retornar em uma semana. O monstro combinou com Bela que, para voltar, bastaria colocar seu anel sobre a mesa, e magicamente retornaria.

Bela visitou alegremente sua família, mas as irmãs, ao vê-la feliz, rica e bem vestida, sentiram inveja, e a envolveram para que sua visita fosse se prolongando, na intenção de Fera ficar aborrecida com sua irmã e devorá-la. Bela foi prorrogando sua volta até ter um sonho em que via Fera morrendo. Arrependida, colocou o anel sobre a mesa e voltou imediatamente, mas encontrou Fera morrendo no jardim, pois ela não se alimentara mais, temendo que Bela não retornasse.

Bela compreendeu que amava a Fera, que não podia mais viver sem ela, e confessou ao monstro sua resolução de aceitar o pedido de casamento. Mal pronunciou essas palavras, a Fera se transformou num lindo príncipe, pois seu amor colocara fim ao encanto que o condenará a viver sob a forma de uma fera até que uma donzela aceitasse se casar com ele. O príncipe casou com Bela e foram felizes para sempre.

O conto A Bela e a Fera traz muitos paralelos com o mito grego Eros e Psique. No mito, Psique era uma bela moça que competia em beleza com Afrodite e que também possuía duas irmãs invejosas. Por rivalizar com a Deusa da beleza, Afrodite lhe lança uma maldição, a de não se casar. As irmãs mais velhas de Psique já haviam se casado, e a menina a despeito de sua beleza e da quantidade de adoradores não havia sido pedida em casamento. Seu pai preocupado procura um oráculo que diz que ela desposará um monstro. Ele então a leva ao alto de um rochedo e a deixa à própria sorte. Ela é conduzida pelo vento Zéfiro a um palácio magnífico, onde todos os seus pedidos são atendidos. Mas na verdade, o palácio pertence a Eros, filho de Afrodite, que sem querer se apaixona pela moça.

No mito e no conto, há o tema do pai que entrega a filha a um monstro e também, temos o tema da menina que não tem mãe. Podemos supor então, que se trata de um embate com o animus, pois o animus na mulher se desenvolve a partir da experiência com o pai pessoal (VON FRANZ, 2010). Além disso, o fato de não ter mãe mostra uma fraqueza e incerteza sobre a feminilidade da heroína, o que a deixa suscetível a dominação pelo animus.

No amadurecimento do amor feminino há o encontro com o animus, mas também com a anima doanimus, representada pela sogra: “A mãe, que não quer nora, mas o filho apenas para si, a mãe que o beija “com lábios entreabertos“” (BRANDÃO, 1986). Alguns contos mostram o embate do herói com o animus de sua anima, como no conto O velho Rinkrank, mas aqui o embate é com o feminino por trás do animus.

No conto esse embate é mais sutil, e se encontrar no original na figura da bruxa que tenta seduzir o rapaz e sendo mal sucedida o transforma em fera. Aqui há um caráter regressivo do animus, que está preso a mãe. O fato de ambos serem monstros no mito e no conto (mesmo um sendo príncipe e o outro um deus) denota que essa simbiose com a mãe é destrutiva e animalesca, pois transforma o homem em menino mimado e intragável.

 

 

Outro símbolo da mãe e do feminino por trás do homem está na roseira, que a fera tanto preza. A rosa esta associada justamente a Afrodite. Além, disso conforme Jung (2008), a rosa é em geral disposta em quatro raios, o que indica a quadratura do círculo, isto é, a união dos opostos. Ou seja, o amor, é um grande aliado no processo de individuação, pois é a partir do seu roubo que ocorre a transformação de Bela e da consciência coletiva.

O roubo nos atenta a um importante aspecto, conforme Von Franz (2010), uma das atividades doanimus negativo é furtar, pois ele precisa tomar a vida onde ele se encontra, matando todo o aspecto feminino da vida. Além disso, para uma mulher conseguir tirar o homem dos braços regressivos da mãe deve cultivar sua feminilidade. Usar a força bruta e a verborragia do animusnão adiantará. Por isso é comum nos mitos e contos a heroína seguir o caminho da individuação sofrendo e fugindo, enquanto que os heróis lutam e vencem monstros.

Ao conviver com a fera, Bela percebe que ele é sensível e realizava todas as suas vontades a despeito de sua aparência. Ela se afeiçoa a ele, que a pede em casamento várias vezes, sendo recusado em todas elas. Assim como Coré se afeiçoa a Hades no mito, e passa a enxergar o masculino de forma menos hostil.

Sobre o tema do casamento nos mitos, Brandão (1986), diz:

 

“Para o mundo matriarcal, argumenta o psiquiatra israelense, “todo casamento é um rapto de Core, a flor virginal, consumado por Hades, o violador, ou seja, um simbolismo terreno do macho hostil. Desse modo, todo casamento é como uma exposição no cume de um monte em mortal solidão e uma espera pelo monstro masculino a quem a noiva é entregue.”

“Na mais profunda experiência do feminino os temas das núpcias de morte, da virgem sacrificada a um monstro, feiticeiro, dragão ou espírito do mal, recontados em inúmeros mitos e lendas, são igualmente um hieròs gámos. O caráter de rapto, que o evento assume, expressa, relativamente ao feminino, a projeção — típica da fase matriarcal — do elemento hostil sobre o homem.”

 

O homem no conto é indiferenciado, ou é um ladrão como o pai e furta a feminilidade a matando, ou é uma fera assustadora. E com o pedido de casamento ela terá de enfrentar essa projeção de hostilidade em relação ao masculino, por isso Bela reluta em aceitar. Mesmo a contragosto a Fera permite que Bela visite sua família, a qual ela sente saudades. Esse retorno ao lar de Bela pode representar uma regressão do ego ao inconsciente original, ao feminino, a mãe. Nessa regressão, Bela confronta projeções reprimidas matriarcais e sombrias suas inconscientes, representadas pelas irmãs.

As irmãs de Bela representam atitudes matriarcais sombrias onde o homem é visto como hostil e violador, e a mulher como esposa-vítima do monstro. A despeito da inveja que elas sentem de Bela, elas trazem um desenvolvimento para a personalidade dela e um amadurecimento muito grande Mesmo sendo bem tratada Bela vive então em um estado de servidão inconsciente, e é justamente contra isso que a consciência feminina deve protestar. Ela entra em conflito contra a fera, fica em duvida se volta ou não, pois a hostilidade e protesto das irmãs correspondem exatamente ao que se passa no interior da própria Bela.

Contudo é através dessa sombra feminina que Bela alcança autonomia em seu relacionamento, quebrando a simbiose com seu animus. E ao quebrar a sua simbiose e identificação a heroína sente falta do homem, e sincronicamente a Fera morre. O aspecto animal, hostil e assustador se vão e ela pode ver realmente quem é seu marido, e seu lado humano pode se manifestar.

Esse conto então, nos fala que a mulher, em termos coletivos, deve passar pela experiência de ficar presa ao seu animus fera (ou demônio), pois somente essa experiência o transforma em positivo. A partir dessa vivência, o animus animalesco, se liberta dos braços regressivos da mãe e o feitiço que condenou o príncipe a viver como Fera é quebrado. E com isso então Bela pode realizara coniunctio, ou seja, o casamento sagrado com seu lado masculino, uma vez que sua feminilidade foi fortalecida.

 

 

REFERÊNCIAS:

BRANDÃO, J. S. Mitologia Grega – Vol I. Petrópolis: Vozes 1986.

JUNG, C. G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

VON FRANZ, M. L. O feminino nos contos de fada. Vozes. São Paulo: 2010.

WIKIPEDIA. A Bela e a Fera. Acesso em: 02 de setembro de 2014.

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