A diferenciação é uma abordagem proativa para ajustes no conteúdo, processo ou produto de aprendizagem dos alunos.
Débora Gerbase – Professora e Autora de livros missgerbase@gmail.com – @deboragerbase
A diferenciação pedagógica, ainda que teoricamente simples, e que promove um ambiente inclusivo em uma sala de aula diversa, desafia educadores que, infelizmente, ainda não sabem como implementá-la de uma maneira eficaz suas práticas de ensino. Compreender e aplicar a diferenciação embora seja desafiador, é inegável que ela gera um impacto positivo na aprendizagem dos alunos. Apesar das barreiras enfrentadas, a prática constante e a dedicação são cruciais para superar os desafios e colher os frutos que a diferenciação produz na aprendizagem dos alunos.
Sabemos da importância, na sociedade contemporânea, da valorização das diferenças nas nossas práticas pedagógicas principalmente no contexto educacional atual. É de extrema importância atender às necessidades individuais dos alunos em uma sociedade em constante transformação. Ao nos depararmos com uma sala de aula diversa, com alunos com deficiências ou altas habilidades, a adaptação das aulas torna-se imperativa. Contudo, a implementação dessas adaptações, denominadas diferenciação, é frequentemente percebida como uma tarefa complexa e que causa muita angústia e confusão nos educadores.
O que é diferenciação?
Tomlinson (2015) nos ensina que a diferenciação é uma abordagem proativa para ajustes no conteúdo, processo ou produto de aprendizagem dos alunos. Tomlinson e Imbeau (2011) oferecem insights valiosos, esclarecendo que diferenciação não é um acréscimo ao planejamento regular, mas uma abordagem intrínseca à instrução. O planejamento diferenciado considera as diferenças de prontidão, interesse e perfil de aprendizado dos alunos, oferecendo caminhos diversos para atingir padrões compartilhados.
Quais estratégias de diferenciação podem ser utilizadas?
Conforme Tomlinson (2014), elas podem acontecer na:
Diferenciação no Conteúdo – Ajustando a complexidade das atividades para atender às necessidades individuais;
Diferenciação no Processo – Disponibilizando uma variedade de estratégias e materiais que contemplam diferentes estilos de aprendizagem;
Diferenciação no Produto – Permitindo diferentes formas de apresentação (oral, escrita, visual);
Diferenciação no Ambiente de Aprendizagem – Configurando e organizado visualmente o espaço para conforto e confiança.
Entretanto, apesar dos benefícios da implementação da diferenciação nas práticas pedagógicas, algumas barreiras ainda precisam ser superadas. Educadores frequentemente apontam algumas dificuldades que não permitem que a diferenciação aconteça adequadamente, como:
Ansiedade do Professor: A ansiedade em relação à implementação da diferenciação é uma barreira comum. Promover o conhecimento aos professores sobre a natureza flexível e adaptativa da diferenciação pode ajudar a reduzir esse receio.
Falta de Recursos Adequados: Muitos educadores se veem limitados por uma falta de recursos, sejam eles materiais ou tempo. Explorar opções criativas e integrar a diferenciação ao planejamento regular pode superar essa barreira.
Treinamento Insuficiente: A falta de treinamento específico em diferenciação é um desafio real. Investir em desenvolvimento profissional contínuo pode capacitar os professores a aplicarem estratégias diferenciadas com confiança.
Estratégias para superar desafios
Estimular a colaboração entre professores pode ser um catalisador poderoso para a implementação bem-sucedida da diferenciação. Compartilhar experiências, estratégias e recursos pode enriquecer a prática de todos. Reconhecendo que a diferenciação é uma jornada, os professores podem começar com adaptações simples e progredir gradualmente. Isso reduz a pressão inicial e permite uma transição mais suave.
Além do que já foi dito, implementar um ciclo contínuo de avaliação e ajuste é fundamental. Wormeli (2017) destaca a importância de ajustar as estratégias avaliativas para refletir a diversidade de estilos de aprendizagem, níveis de prontidão e interesses dos alunos. Ao diferenciar a avaliação, os professores podem verdadeiramente capturar o progresso individual, indo além de uma abordagem única para todos.
A complexidade da diferenciação pedagógica, apesar de sua simplicidade teórica, desafia muitos educadores que se deparam com a necessidade de promover um ambiente inclusivo. Ela não é apenas uma estratégia; é uma filosofia que reconhece e celebra a diversidade na sala de aula. No contexto educacional que está em constante transformação, compreender sua importância e implementá-la eficazmente requer um comprometimento contínuo por parte dos educadores. Ao desvendar os princípios e estratégias da diferenciação, os professores estarão mais bem equipados para criar ambientes de aprendizagem que atendam verdadeiramente às necessidades individuais de cada aluno.
Maiores informações sobre como implementar a diferenciação em sala de aula podem ser encontradas no livro “A realidade diversa na sala de aula: como lidar com a inclusão e a educação socioemocional na escola”, no primeiro capítulo intitulado: A diferenciação na sala de aula diversa, escrito por mim.
Biografia:
Débora Gerbase é uma professora e tradutora que atua nas áreas de inglês, português e português para estrangeiros. Atualmente, reside em São Paulo, onde concluiu sua formação em Letras – Tradução e Pedagogia e, posteriormente, obteve pós-graduação em Psicopedagogia e Formação de Docentes para o Ensino Superior.
Além de seu trabalho como educadora, Débora é autora dos livros “Sem pé nem cabeça – Expressões idiomáticas em português” e “Manual de Sobrevivência para o Professor Esgotado”, e coordenadora e coautora do livro “A realidade diversa na sala de aula: como lidar com a inclusão e a educação Socioemocional nas escolas” e coautora do livro “Alfabetização Bilíngue: benefícios e mitos na formação de crianças bilíngues”. Tem paixão pelo ensino e aprendizagem, bem como por seu compromisso com o sucesso de seus alunos.
Referências:
Tomlinson, C. A. The differentiated classroom: Responding to the needs of all learners. ASCD, 2014.
Tomlinson, C. A. “What Is Differentiated Instruction?” Reading Rockets, 2015. Disponível em: https://www.readingrockets.org/article/what-differentiated-instruction. Acesso em 03 de março de 2023.
Tomlinson, C. A. e Imbeau M. B. Managing a differentiated classroom: a practical guide. Scholastic, 2011.
Wormeli, R. “Fair Isn’t Always Equal: Assessing and Grading in the Differentiated Classroom.” ASCD, 2017.
Compartilhe este conteúdo:
Impactos da pandemia na educação e nos sujeitos inseridos nessa realidade
8 de dezembro de 2023 Ana Carla Olímpio Soares
Insight
Compartilhe este conteúdo:
O sistema educacional ao passo que se instaurou o período de pandemia devido ao COVID-19, passou por diversos conflitos, desafios e necessidade de adaptações que por vezes não eram suficientes para o enfrentamento da situação. Ao passo que o vírus se espelhava pelo país/mundo, foi necessário aderir estratégias como, fechamento de escola, universidade e templo religiosos; proibição de realização de eventos das mais variadas espécies, proibição de viagens interestaduais e até intermunicipais na tentativa de evitar aglomerações e assim a doença fosse disseminada de forma mais rápida e sem controle (Carvalho et al. 2020, p. 3).
Diante dessas medidas tomadas pelos governantes, cada sujeito experienciou de uma maneira diferente, enquanto para alguns não gerou muito impacto no modo de viver, para outros os impactos foram mais críticos, mas de acordo com os estudos de Ornell; Schuch; Sordi; Kessler (2020) levantados por Carvalho et al. (2020), situações como essas podem gerar ou ampliar aos sujeitos envolvidos sintomas ansiosos, estressantes e acentuação em casos de depressão e que situações como essas e suas consequências, perpassam pelos indivíduos independentemente de sua classe social, idade ou sexo.
Com a necessidade de adaptações, no período da pandemia, novas relações afetivas e profissionais foram criadas e ressignificadas, muitas pessoas passaram a trabalhar remotamente; famílias passaram a conviver cotidianamente com vários conflitos; pessoas ficaram afastadas de entes queridos para se proteger e proteger o outro; muitos continuaram nas suas atividades por serem essenciais, por não terem outra opção para se manter ou mesmo por não acreditarem que o vírus é real (Souza, 2020, p. 111).
Para além dessas mudanças, a pandemia também trouxe problemáticas e necessidade de adaptações no campo educacional, pois com a precisão dos estudantes permanecerem em suas casas, causou uma ruptura abrupta no modelo tradicional de ensino, aulas presenciais em sala de aula passando para um ensino digital, por meio de aulas online ou gravadas. Souza (2020) traz em seu estudo, dados importantes acerca dos indivíduos com acesso à internet e celular, esses dados foram retirados do IBGE de 2018 em que constava que por volta de 15 milhões de residências não possuíam acesso à internet, enquanto cerca de 79,1% tinham acesso à internet, sendo o aparelho celular o meio mais utilizado pelos indivíduos, mas que apesar disso, em algumas residências, era um único celular para todos os moradores.
Além dos dados levantados pelo IBGE, Souza (2020) evidencia o estudo do CETIC de 2019 em que constava que cerca de “11% das crianças e adolescentes de 9 a 17 anos não têm acesso a internet, correspondendo a 3 milhões de pessoas, sendo que 1,4 milhão nunca acessou a rede” (p. 111-112). Indo além do acesso à internet e posse de aparelhos celulares, a autora traz um ponto de grande importância, o local em que esses sujeitos residem são de grande importância, pois quanto mais confortável e possuir espaços adequados, melhor poderá ser o rendimento do estudante, enquanto sujeitos de baixa renda podem encontrar dificuldades de obter um bom desempenho nos estudos devido a falta de um ambiente amplo e adequado para estudar.
Referente às dificuldades durante a pandemia no contexto de ensino, Souza (2020) levantou pontos como por exemplo, dificuldades em manter o vínculo com os alunos mesmo distante, como ensinar por meio das tecnologias enquanto há alunos que não possuem acesso a mesma e principalmente, como superar o modelo tradicional da educação. Além dessas, a autora ainda complementa com preocupações em relação ao modelo em que a graduação preparou esses professores para darem aula diante do cenário sala de aula, quadro e alunos presentes e com a ocorrência da pandemia teve necessidade do ensino online, levando a sala de aula para a estrutura da residência dos professores e adiante disso, apresentavam impacto no momento de gravar ou dar as aulas.
Souza (2020) traz um adentro importante de se levar em consideração, onde ao passo que o ensino se tornou remoto, ele retira o aluno do lugar de sujeito ativo, deixando de lado as metodologias ativas que eram utilizadas no presencial, tornando assim, o que a autora traz como “educação instrucionista, conteudista” (p. 113), levando ao cansaço e dispersão dos alunos. Além disso, trouxe efeitos aos professores também, pois ao lidarem com o novo jeito de ensinar, pôde se observar o aumento de sintomas ansiosos e a sobrecarga profissional, pois além de professores se adaptando, também eram sujeitos com medo e dúvidas acerca do novo cenário que se instalava.
Senhoras (2020) traz que com a ocorrência da pandemia, foi perceptível também o crescimento no número de desistência de alunos e os problemas no processo de aprendizagem, podendo ser levado em conta que ao utilizar-se do ensino online, a figura de auxílio no ensino, se tornou os pais, em que dependendo da escolaridade e classe social deles, poderiam não saber o conteúdo e consequentemente, não conseguir acompanhar os filhos.
(…) surge a problematização da ausência do preparo de pais e responsáveis para assumirem o papel de tutores/mediadores. Ferreiro e Teberosky (1999, p.17), ao apoiarem-se na referência piagetiana quanto o processo de aquisição do conhecimento, propuseram interpretar a criança como “sujeito que produz seu próprio conhecimento”. Desta forma, faz-se necessário que lhes sejam apresentados meios de desenvolvimento. No entanto, para a grande maioria dos pais falta-lhes conhecimento pedagógico para propiciar e acompanhar este processo de aprendizagem (Queiroz et al. 2021, p. 6).
Senhoras (2020) complementa que, quanto melhor a condição financeira e maior for o grau de escolaridade, mais fácil é para que haja continuidade nos estudos independentemente se seja online ou presencial.
Fonte:https://encurtador.com.br/crxFU
Em seus estudos, os autores Queiroz et al. (2021) realizaram pesquisas direcionadas aos responsáveis de alunos que estudavam a primeira série do ensino fundamental, onde estavam em processo de aprender a ler. Diante das pesquisas, foi relatado pelos pais que as maiores dificuldades no processo de aprendizagem na pandemia se deram ao fato de não possuírem ou terem dificuldade em acessar à internet, a ausência de interações sociais que as crianças possuíam antes, levando-os a um baixo acompanhamento de maneira regular nos conteúdos que eram disponibilizados e como relatado tanto por Senhoras (2020) quanto por Queiroz et al. (2021), o despreparo dos responsáveis em prestar auxílio nas atividades.
No trabalho de Santos et al. (2021, p. 4) evidencia outros problemas ora enfrentados no processo do ensino online, como por exemplo, “a conexão instável e lenta à internet, excesso de trabalho e questionamentos acerca das melhores estratégias metodológicas para o ensino de Ciências e Biologia de maneira remota”, indo além desses, os autores trazem também dificuldades em decidir que recurso utilizar nas aulas, as maneiras de estabelecer a comunicação com os alunos, a idade dos alunos também se mostrou um fator importante e ao levar a sala de aula para dentro de casa, os professores tiveram um maior gasto financeiro para que pudessem dispor dos recursos necessários para prestar um bom ensinamento.
Dessa maneira, observa-se a “uberização” do trabalho realizado pelo professor na modalidade remota, pois como afirma Silva (2019) o trabalho na empresa Uber exige que o trabalhador seja responsável pela mercadoria que vai vender e pelo serviço que será prestado. Esse cenário reflete o aumento da carga horária de trabalho e a transferência de gastos e riscos para os docentes do país (Barbosa, Ferreira & Kato, 2020). A realidade torna-se ainda mais difícil para as mulheres docentes, pois sobre elas recaem maior carga de stress com os filhos e outros familiares na residência (Santos, 2020). Devido ao machismo ainda vigente, as tarefas domésticas não são divididas, e assim, as mulheres se desdobram para lidar com os afazeres de casa e as múltiplas atribuições do trabalho (Santos et al. 2021, p. 4).
Ao passo que a pandemia foi amenizando e com o surgimento das vacinas, as pessoas foram retornando às suas rotinas de trabalho, estudo e relações sociais. Com a volta para as escolas, foi possível perceber as dificuldades de socialização, estabelecer vínculos sociais/afetivos devido ao tempo em que passou em isolamento, dificuldade no processo de adaptação das atividades, por vezes até mesmo uma queda no ritmo de aprendizado e consequentemente, notas de trabalhos e provas, baixa concentração nas atividades, comportamentos hiperativos. Apesar disso, pode-se observar que a volta “ao normal”, os professores buscam mais ainda tornar os alunos sujeitos ativos e com autonomia para que consigam buscar o aprendizado, mas sempre promovendo meios e disponibilizando materiais e apoio quando buscado.
REFERÊNCIAS
CARVALHO, L. de S.; SILVA, M. V. de S. da; COSTA, T. dos S.; OLIVEIRA, T. E. L. de; OLIVEIRA, G. A. L. de. The impact of social isolation on people’s lives during the COVID-19 pandemic period. Research, Society and Development, [S. l.], v. 9, n. 7, p. e998975273, 2020. DOI: 10.33448/rsd-v9i7.5273. Disponível em: <https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/5273> Acesso em: 4 dez. 2023.
SANTOS, D. R. dos .; OLIVEIRA, K. F. .; SOARES, Z. C. B. . Challenges faced by teachers in the pandemic and post-pandemic scenario: teachers and the challenges encountered in time of a pandemic. Research, Society and Development, [S. l.], v. 10, n. 15, p. e02101523083, 2021. DOI: 10.33448/rsd-v10i15.23083. Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/23083. Acesso em: 5 dec. 2023.
SENHORAS, E. M. . CORONAVÍRUS E EDUCAÇÃO: ANÁLISE DOS IMPACTOS ASSIMÉTRICOS. Boletim de Conjuntura (BOCA), Boa Vista, v. 2, n. 5, p. 128–136, 2020. DOI: 10.5281/zenodo.3828085. Disponível em: https://revista.ioles.com.br/boca/index.php/revista/article/view/135. Acesso em: 4 dez. 2023.
SOUZA, E. P. de. Educação em tempos de pandemia: desafios e possibilidades. Cadernos de Ciências Sociais Aplicadas, [S. l.], v. 17, n. 30, p. p. 110-118, 2020. DOI: 10.22481/ccsa.v17i30.7127. Disponível em: <https://periodicos2.uesb.br/index.php/ccsa/article/view/7127> Acesso em: 4 dez. 2023.
QUEIROZ, M. de; SOUSA, F. G. A. de .; PAULA, G. Q. de. Educação e Pandemia: impactos na aprendizagem de alunos em alfabetização. Ensino em Perspectivas, [S. l.], v. 2, n. 4, p. 1–9, 2021. Disponível em: https://revistas.uece.br/index.php/ensinoemperspectivas/article/view/6057. Acesso em: 4 dez. 2023.
As tecnologias interativas na redução de distâncias em ensino e aprendizagem.
Com os avanços da tecnologia, a educação a distância vem ganhando muita força nos últimos anos, se estabelecendo como uma alternativa viável e importante ferramenta de aprendizado, uma vez que colaboraram também para o ensino tradicional. O livro “Educação sem distância: as tecnologias interativas na redução de distâncias em ensino e aprendizagem”, de Romero Tori (2010) oferece insights importantes em relação à evolução da tecnologia nas práticas pedagógicas.
O livro é divido em três partes centrais, “A distância que aproxima”, “Distância e presença na medida certa” e “A presença da tecnologia”, levando seus leitores a refletirem sobre o uso da tecnologia como prática pedagógica, considerando o importante papel para a democratização do acesso à educação e suas possíveis adaptações.
No início do livro, o autor aborda o tema da Educação a Distância (EaD), que historicamente foi tratada como uma abordagem educacional distinta e muitas vezes vista como oposta ao ensino presencial tradicional. O autor destaca como persiste um estigma em relação a essa modalidade de ensino, uma vez que ela teve suas raízes em um período em que a tecnologia era limitada. Até recentemente, era comum que a EaD fosse menosprezada, e os profissionais formados nessa modalidade eram frequentemente julgados em comparação com aqueles que obtiveram uma formação presencial. Tori observa, no entanto, que atualmente não é difícil encontrar graduados da Educação a Distância com desempenho superior a seus pares formados no sistema tradicional.
O livro proporciona uma reflexão importante sobre a educação que vai além das limitações físicas da sala de aula, enfatizando a necessidade de uma conexão entre o aluno e o conteúdo para que ocorra um aprendizado significativo. Também destaca que mesmo no ensino presencial convencional, elementos da educação a distância já estão presentes, sob a forma de “lição de casa” e “trabalho extraclasse”. É totalmente possível que um aluno esteja fisicamente presente em uma aula com um professor, mas, emocionalmente, desconectado do conteúdo apresentado, ao passo que, através da internet, esse mesmo estudante pode estar presente e engajado.
Para que a aprendizagem ocorra, o autor acredita que deve haver uma proximidade entre o aluno, o conteúdo e o professor. Para alcançar essa proximidade, é essencial superar barreiras e reduzir distâncias, e a tecnologia desempenha um papel fundamental nesse processo educacional. Apesar da importância dos métodos de ensino tradicionais, faz todo o sentido utilizar recursos avançados, ferramentas e métodos disponíveis para enriquecer a experiência educacional, independentemente do ambiente de ensino.
AbouYassin/Pixabay
A tecnologia como aliada do aprendizado
Ainda nessa parte do livro, o autor traz a discussão sobre como a tecnologia interativa pode beneficiar a aprendizagem virtual e convencional, trazendo a ideia de educação híbrida. As tecnologias interativas estão possibilitando um aumento na sensação de proximidade pelos aprendizes, que seja através de videoconferências e chats. Para Cortelazzo (2000, p. 43), “as novas tecnologias computacionais interativas […] permitem que homens e mulheres desenvolvam colaborações mútuas mesmo estando distantes espacialmente”.
No capítulo intitulado “Distância e Presença na Medida Certa”, o autor aborda o tema da distância e da presença sob uma perspectiva educacional, psicológica e cognitiva, relacionando-os à tecnologia. Tori argumenta que é totalmente viável que os alunos sintam proximidade com o professor e se envolvam no processo de aprendizado, mesmo que não estejam fisicamente próximos.
O autor enfatiza a importância da proximidade com os colegas, pois esse vínculo desempenha um papel crucial na motivação dos estudantes e fornece um suporte valioso para o aprendizado. Nesse capítulo, Tori apresenta uma variedade de conceitos e ilustrações que sustentam a ideia fundamental de “distância” e “proximidade” no contexto educacional, proporcionando uma visão abrangente sobre como esses fatores influenciam a eficácia do processo de ensino e aprendizado.
Seja online ou offline, precisamos compreender o complexo aspecto humano […]. Mais que sistemas, redes são pessoas que anseiam por conversar, se apresentar, compartilhar conhecimentos tácitos, pensamentos críticos, conhecimentos científicos ou se unir para alcançar maior influência. (PASSARELLI, 2009, p. 325).
No último capítulo “A presença da tecnologia” Tori fala sobre a educação baseada em tecnologias interativas, sobre suas características e sobre pontos que precisam de melhores adequação para que haja tecnologias que favorecem uma melhor padronização, armazenamentos de dados e recursos educacionais.
Neste capítulo o autor mostra como os softwares podem auxiliar no ambiente de aprendizagem, tecnologias que podem armazenar dados, criar estatísticas, gerar avaliações, enquetes, fóruns e diversas outras aplicações que podem aumentar a proximidade dos alunos com a instituição, os professores e os colegas, sem que eles precisem está geograficamente próximos.
Ainda nesse capítulo o autor trás a relevância da realidade virtual (RV) como ferramenta de interação e aprendizagem, atuando como um meio de reduzir a distância entre o aluno e o conteúdo, possibilitando uma maior imersão ao conteúdo proposto, logicamente essa experiência não desvalida a interação In loco, no entanto, oferece ao usuário um possibilidade de se aproximar da experiência real, e de resgatar coisas do passado, e cenários como o sistema solar, por exemplo.
YohoprashantPixabay
Realidade aumentada
Em um passado não muito distante, a utilização da realidade virtual era predominantemente viável apenas para grandes empresas devido aos custos envolvidos. No entanto, à medida que a tecnologia avançou, tornou-se possível, por meio de um smartphone e um dispositivo de visualização simples, mergulhar nessa experiência, tornando-a cada vez mais acessível e disponível para um público mais amplo. A experiência com a realidade virtual vai além de meras imersões superficiais; atualmente, existem tecnologias capazes de proporcionar aos usuários uma experiência que se assemelha muito à realidade.
Em seu livro, Tori (2016) oferece um exemplo relacionado ao treinamento odontológico. Antes de aplicarem seus conhecimentos em pacientes reais, os estudantes de odontologia costumavam praticar em manequins e objetos de treinamento. No entanto, com a realidade virtual, esses alunos agora podem vivenciar simulações que reproduzem com precisão pacientes, consultórios e diversos instrumentos, permitindo que eles se aproximem muito mais da realidade. A partir deste exemplo, é possível perceber a ampla gama de possibilidades que essa ferramenta oferece, não apenas no campo da odontologia, mas em diversas áreas do conhecimento e da prática profissional.
Consideramos ainda que as discussões trazidas por Tori são muito importantes para que possamos compreender o uso da tecnologia na educação e fazer melhor uso dela, para que possamos ter uma educação que se faz próxima ao aluno, desmistificando alguns conceitos, e estando aberto para as ferramentas de aprendizado que a tecnologia pode contribuir para a educação.
Referências
CORTELAZZO, I. B. C. Colaboração, trabalho em equipe e as tecnologias de comunicação: relações de proximidade em cursos de pós-graduação. 2000. Tese (Doutorado)—Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000.
PASSARELLI, B. A aprendizagem on-line por meio de comunidades virtuais de aprendizagem. In: LITTO, F. M.; FORMIGA, M. (Org.). Educação a distância: o estado da arte. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2009. V. 1. p. 325–331.
TORI, R. et al. Treinamento odontológico imersivo por meio de realidade virtual. In:
Anais do XXVII Simpósio Brasileiro de Informática na Educação, 2016
Compartilhe este conteúdo:
Efêmero e incerto: o futuro já chegou
27 de setembro de 2023 Ana Carla Olímpio Soares
Livro
Compartilhe este conteúdo:
José Lauro Martins (2022) traz em sua obra, “Efêmero e Incerto: o futuro já chegou”, sobre a necessidade de uma mudança no contexto educacional atual para que dessa forma, seja possível acompanhar as atualizações que ocorrem a todo momento advindo da tecnologia e o grande leque de informações e/ou conhecimentos que são expostos. O autor traz suas perspectivas sobre o ensino, aprendizagem, docência e demais assuntos pertinentes. Referente à docência, o mesmo descreve nos capítulos 2, 6 e 9 os quais serão discorridos neste texto.
José Lauro Martins (2022), inicia o capítulo 2, “O Tempo Presente”, trazendo reflexões acerca do tempo. Conforme o autor, o momento em que rege a maneira como vivenciar, é o momento do agora, ou seja, o momento presente, presente esse que no passado foi chamado de “futuro”, mas que apesar disso, o passado é apenas um meio de busca por informações e/ou conhecimentos. Apesar do presente ser o momento de importância, é necessário ampliar o olhar e o pensamento sobre ele, visto que, há um futuro a caminho e o que hoje é presente, se tornará parte do passado.
O autor, José Lauro Martins (2022, p. 18), traz a fala de Padre Antônio Vieira (1608-1697), “o tempo tem apenas dois pólos: de um lado está o passado e do outro está o futuro e o presente é o lapso entre o passado e futuro. O problema é que o que chamávamos de futuro chegou e não sabemos o que fazer com o futuro que há de vir”. Vive-se em constante mudanças em todos os âmbitos e que por vezes, não há tempo para “digerir” e compreender de fato as mudanças que estão acontecendo, gerando assim, instabilidade para quem vivencia. José Lauro relembra Bauman com a liquidez do tempo fazendo a reflexão de que
É tempo em que tudo muda e a mudança é mais importante que a estabilidade. A geração das pessoas com 50 anos ou mais é desafiada a compreender um tempo em que o passado não é mais passaporte sequer para o presente: somos de uma geração que não consegue preparar a seguinte (…) os saberes de uma geração não são suficientes para instrumentalizar a geração em formação (p. 19).
Para o autor, o presente é o momento de ampla reflexão para assim, proporcionar tentativas de promover um futuro propício dentro das possibilidades. O principal meio para conseguir isso, Martins (2022) enfatiza que é por meio do investimento no conhecimento, pois de acordo com ele, dessa maneira seria um preparo para lidar com os desafios futuros, sendo o tempo presente “o ponto de partida” para o futuro de cada sujeito. O autor enfatiza que ao passo que o presente é crucial para preparar-se para os desafios futuros, é preciso compreender que ainda sim, ocorrerão situações que fujam do controle do sujeito.
Conforme a obra demonstra existir um tempo de realização da vida, realização social e realização tecnológica. A primeira, de acordo com o livro, refere-se ao biológico do ser humano, mas Martins (2022) relembra que conforme as mudanças ocorridas no meio social e cultural, geraram e continuam gerando impactos na qualidade e longevidade da vida humana (mudanças essas que chegam por meio de estudos/pesquisas). Enquanto a realização social, para o autor, é uma etapa complexa, pois não possui “receita” para tal feito, cada pessoa experimentará de uma maneira e em tempos diferentes, além de que cada um terá uma concepção do que é estar realizado. Por fim, a realização tecnológica José Lauro coloca como um “caos” (2022, p. 23), pois este é um campo está em constante atualização, algo novo está sempre surgindo ou substituindo algo.
José Lauro Martins (2022) elucida que a tecnologia traz feitorias importantes ao homem, desde a questão para expandir conhecimento relacionados à saúde (biológico) quanto permite a ampliação dos contatos sociais dos sujeitos. Em contrapartida, o autor evidencia que
A vida social foi severamente alterada para as novas gerações, o tempo se transformou numa armadilha para muitos aspectos da vida. Na medida em que as tecnologias se tornaram muito complexas, trouxe também o desafio de que para viver atualizado em sociedade precisa dominá-la não só pelo uso, mas também pelos seus resultados. O tempo de vida biológico muda muito pouco, a estrutura psicológica acompanha melhor as transformações que as estruturas biológicas (MARTINS, 2022, p. 23).
O autor ainda enfatiza que, toda essa acelerada mudança e grande fluxo de informações, geram impactos no psicológico dos sujeitos, necessitando de cuidados ao usar os meios tecnológicos. José Lauro Martins (2022) expõe acreditar que cada sujeito possui modos e tempos diferentes para lidar com o que acontece e que esse processo de adaptação ocorre de maneira natural, mas que ainda sim é preciso cuidado nas consequências que podem ocasionar. Como maneira de exemplificar, o escritor traz sobre o tempo de aprendizagem, onde cada pessoa irá aprender no seu tempo, mas para ele, é importante criar estratégias pedagógicas para que esse tempo não seja muito longo, proporcionando formas do sujeito “filtrar” o que é importante e o que não é nesse processo. Como finalização, o autor evidencia que apesar do acesso ao grande número de informações, o excesso pode se apresentar maléfico no social, qualidade de vida e até mesmo no processo de aprendizagem.
É exposto no subcapítulo sobre “inteligência potencial” que segundo José Lauro Martins (2022), “Trata-se do que acontece nas conexões dos sujeitos nas redes virtuais, é o que cada um faz com as informações que circulam nas redes. Portanto é mais humana que digital, e é potencializada a cada sujeito que interage nas redes” (p. 25), acredita ainda que é possível com essas tecnologias fomentar a inteligência humana, pois de acordo com ele “É o que fazemos com as informações que possibilitam a potencialização da inteligência” (p. 25).
Após a exposição referente ao tempo e as implicações nos processos humanos, José Lauro Martins (2022) traz sobre as bases para a docência referentes ao capítulo 6, onde antes era de conhecimento que o ato de ensinar era apenas o professor o sujeito ativo e detentor do conhecimento, alunos possuíam um papel mais passivo. Ao contrário disso, o autor enfatiza sobre a necessidade de uma renovação no ato de ensinar, pois diferente do que se pensava, “Havia uma narrativa equivocada de que o professor levava conhecimento e o aluno “absorvia-os”. Isso não está correto porque, como sabemos, o conhecimento não é transmitido, é um processo em construção no sujeito aprendente” (MARTINS, 2022, p. 63).
O autor traz uma observação ao professor, de que é necessário atenção e cuidado ao ato de promover o ensino, pois de acordo com ele, o professor pode acabar atrapalhando na aprendizagem do aluno, pois cada sujeito possui seu tempo ou não oferece recursos necessários para ele concretizar a aprendizagem. José Lauro Martins (2022) dá ênfase nas novas tecnologias e na ampla possibilidade de expansão de conhecimento é possível com elas, pois o autor acredita que seria mais eficaz do que as aulas em sala de aula. Apesar de acreditar na maior eficácia no modo tecnológico para a aprendizagem, o autor relembra que esses recursos não possuem uma só forma de lidar ou seguir, pois encontram-se em constante mudança.
Diante das transformações no papel do professor e nas novas configurações de ensino, José Lauro Martins (2022), traz exemplos de novos arranjos dos docentes e as parcerias nessa área. O primeiro é o que ele denomina de “professor conteudista” que é
O conteudista é o profissional especializado capaz de produzir os conteúdos que os estudantes vão ter acesso para a construção do conhecimento. Em geral, são professores com boa formação, boa capacidade de pesquisa bibliográfica e boa habilidade com a redação científica. Portanto, não é necessariamente o professor que fala bem, mas é o que tem conhecimento técnico. Não basta ser um resenhista, mas um autor. Pode agregar conteúdo de terceiro, desde que este seja para complementar a produção autoral. (p. 65).
Após, o autor traz sobre o “designer de conteúdo para web”, “O designer de conteúdo para web é um profissional que transita entre educação (didática), comunicação digital e o designer gráfico. (…) é ele o responsável pela qualidade gráfica dos conteúdos no ambiente digital” (Martins, 2022, p. 65). Já o “criador de conteúdos educacionais” esses são os sujeitos que realizam a “filtragem” dos materiais que são utilizados, de acordo com o autor, este realiza trabalho em conjunto com professor conteudista e paralelamente com o designer de conteúdo, é responsável pela fidedignidade das informações apresentadas.
O penúltimo é o “gestor de redes de aprendizagem”, este realiza o papel de mediação no processo de aprendizagem, tem como responsabilidade prestar orientação ou apoio entre os alunos e os conteúdos disponíveis nas redes. Por último, José Lauro Martins (2022) descreve a função de tutoria, figura esta que é presente nos ensinos na modalidade online, tem como uma das funções prestar auxílio aos seus “tutorados”, como descreve o autor. Além disso, é orientador da aprendizagem, no processo avaliativo dessa aprendizagem, analista e “o tutor tem o papel de manter o vínculo acadêmico e emocional dos estudantes” (Martins, 2022, p. 67).
Além das mudanças no papel do professor e possíveis ferramentas para a docência, José Lauro Martins (2022) evidência no capítulo 9 intitulado de “Novos Rumos” a chegada de novas maneiras de ensinar, deixando de lado apenas as aulas expositivas em sala de aula, pois ele acredita que utilizar-se das tecnologias e as vantagens que ela possui, seria de maior aproveitamento no processo de aprendizagem. O autor traz em seus escritos sobre a metodologia ativa que consiste em retirar o aluno de um papel passivo e inseri-lo no processo e que apesar de ser algo utilizado há algum tempo, ainda é interesse. E em contrapartida,
A dificuldade é usar qualquer estratégia nas salas de aula tradicionais que exija movimentação dos estudantes e a flexibilidade no tempo porque as paredes definem o espaço e o tempo de aula é predefinido. Há uma falta de espaço nas salas superlotadas, o acúmulo de conteúdos abreviou o tempo disponível. O que é possível, na maioria das escolas, é o uso esporádico dessas estratégias metodológicas. Outro aspecto a ser considerado é que, ainda que houvesse competência de todos os professores para atuar com as metodologias em que coloca os estudantes no centro do processo de aprendizagem, tem a resistência de parte dos professores, dos pais e também dos alunos, quando percebem que essas metodologias exigem mais trabalho. (Martins, 2022, p. 95).
Para Martins (2022), o processo de aprendizagem ultrapassa a sala de aula, é possível proporcioná-lo indo além, como por exemplo, por meio de aulas online ou aulas gravadas, mas, ele enfatiza a importância de um preparo de materiais, roteiro para seguir, um tempo curto para que não ocorra a fadiga e como consequência, a dispersão de quem assiste, produzir conteúdos de maneira que chamem a atenção do sujeito, assim como explicar de maneira clara, entre outros pontos importantes. Apesar da defesa do autor em que o expandir olhar sobre as formas e locais de ensinar, ele não descredibiliza o ensinar na escola, mas acredita que seja necessária uma boa estruturação, como por exemplo, tornar os alunos sujeitos ativos, proporcionar a aprendizagem de maneira mais dinamizada, proporcionar um momento ou espaço de construção mútua entre docente e discentes. O autor finaliza lembrando mais uma vez que o professor está passando transformações com os avanços tecnológicos e que o mais importante, seja presencial ou online, é a qualidade de ensino ofertada no ambiente educacional.
Referências
MARTINS, José Lauro. Efêmero e incerto: o futuro já chegou / José Lauro Martins. – Ponta Grossa – PR: Atena, 2022.
Compartilhe este conteúdo:
TDAH ou TPAC? A necessidade do olhar singular sobre o indivíduo para um diagnóstico diferencial
Desafios em ensinar alunos com Transtorno do Processamento Auditivo Central
Débora Gerbase – Professora e Autora de livros missgerbase@gmail.com – @deboragerbase
Transtorno do Processamento Auditivo Central (TPAC) é uma condição que impacta a habilidade de processar e interpretar informações auditivas, mesmo em alunos com bastante potencial
Em um cenário educacional repleto de diversidade e complexidade, somos frequentemente confrontados com enigmas que desafiam nossa compreensão e habilidades de ensino. Em um capítulo memorável de minha jornada como educadora, deparei-me com uma intrigante questão: como auxiliar alunos notavelmente corteses, tranquilos e afetuosos, que, apesar de parecerem atentos, enfrentavam dificuldades em reter informações e compreender plenamente as lições apresentadas em sala?
Eles eram alunos calmos, carinhosos, que se esforçavam para prestar atenção em sala de aula. Seus olhares atentos transmitiam a impressão de que absorviam o conhecimento compartilhado. No entanto, algo desconcertante acontecia durante as nossas lições. Ainda que demonstrassem engajamento, quando indagados sobre o tópico discutido, suas vozes ecoavam: “Hã?”, “O quê?”. Era como se o entendimento de tudo que havia sido transmitido se dissipasse no ar.
Foi este momento de questionamento que me conduziu a uma jornada de descobertas acerca do Transtorno do Processamento Auditivo Central (TPAC), uma condição que impacta a habilidade de processar e interpretar informações auditivas, mesmo em alunos com bastante potencial.
Ao adentrar esse universo, tornou-se evidente que a dificuldade encontrada por esses alunos não era um reflexo de desinteresse, mas sim um desafio real. Após uma conversa com especialistas e coordenadores do departamento de bem-estar da escola, fui introduzida ao mundo complexo do TPAC. Esses alunos não buscavam confundir ou desafiar minha autoridade, mas sim enfrentavam dificuldades em processar a informação oral.
De acordo com o Núcleo de Estudos Fonoaudiológicos, o TPAC aflige aqueles que não conseguem processar e compreender os sons de maneira convencional, pois algo no seu sistema cerebral interfere na interpretação adequada dos estímulos sonoros. Ele não deve ser confundido com um distúrbio de aprendizagem. Em um ambiente de sala de aula, isso se traduz em desafios para acompanhar debates, ler e escrever, bem como compreender instruções e enunciados de problemas matemáticos.
Fonte: https://br.freepik.com/
O TPAC é uma questão auditiva, não cognitiva, e muitas vezes, os alunos sentem-se constrangidos ao admitir que não entenderam uma instrução ou orientação.
Contudo, a American Academy of Audiology (2010) destaca que essa condição frequentemente é mal interpretada, uma vez que seus sintomas se assemelham a outros distúrbios, como atrasos na fala e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Identificar o TPAC requer uma abordagem sensível e conhecimento aprofundado.
Muitas vezes, estes alunos sequer têm consciência de seu próprio problema, devido ao impacto na compreensão auditiva. O TPAC, como destaca o Núcleo de Estudos Fonoaudiológicos, é uma questão auditiva, não cognitiva, e muitas vezes, os alunos sentem-se constrangidos ao admitir que não entenderam uma instrução ou orientação.
Ainda segundo o Núcleo de Estudos Fonoaudiológicos, crianças com TPAC são diversas e podem manifestar sintomas na sala de aula. Embora somente um profissional habilitado possa diagnosticar, os educadores podem estar atentos aos sinais, como:
Habilidades auditivas pobres;
Dificuldade em acompanhar o ritmo de colegas;
Dificuldade com consciência fonológica;
Desafios em leitura e escrita;
Sensibilidade a ruídos de fundo;
Dificuldade em recordar informações verbais;
Repetição frequente de “Hã?”, “O quê?”, “Eu não ouvi”;
Necessidade de repetições ou reformulações;
Dificuldade em participar de discussões em sala de aula;
Desatenção durante as aulas;
Dificuldade com enunciados de problemas matemáticos.
Diante disso, como facilitar a compreensão desses alunos?
Em primeiro lugar, os pais precisam buscar ajuda especializada, como o Exame de Processamento Auditivo, conduzido por médicos e fonoaudiólogos. O diagnóstico precoce é crucial. Em segundo lugar, os educadores devem se familiarizar com o transtorno e implementar estratégias que otimizem a escuta e compreensão, a fim de criar ambientes de aprendizado inclusivos e acolhedores. O Núcleo dos Estudos Fonodiólogos sugere adaptações físicas, como:
Redução do ruído de fundo;
Posicionamento estratégico na sala de aula;
Repetição e esclarecimento de instruções;
Comunicação clara e pausada;
Uso de apoio visual.
Embora não haja cura definitiva, estratégias bem aplicadas podem melhorar a escuta e desenvolver a via auditiva ao longo do tempo. Crianças com TPAC podem prosperar, especialmente quando apoio e compreensão estão presentes. Como pontua o Núcleo de Estudos Fonoaudiológicos, uma atitude positiva, realista e autoestima saudável são catalisadores para o sucesso.
Fonte: https://br.freepik.com/
Com a combinação certa de apoio, estratégias e sensibilização, alunos com TPAC podem atingir suas metas acadêmicas e pessoais
Lidar com alunos com TPAC requer paciência e empatia, mas também proporciona a oportunidade de empoderamento. Com a combinação certa de apoio, estratégias e sensibilização, alunos com TPAC podem atingir suas metas acadêmicas e pessoais, reforçando que a superação é alcançável para todos.
Em um mundo onde cada aluno enfrenta suas próprias batalhas em busca do conhecimento, é nosso dever como educadores compreender e abraçar cada jornada singular. Dessa forma, capacitamos nossos alunos a enfrentarem os desafios com coragem e alcançar o sucesso com confiança.
Ao compreender a complexidade do TPAC e as estratégias que podem auxiliar alunos a superar seus desafios, abrimos as portas para um ambiente educacional mais inclusivo e enriquecedor. Cada aluno é uma história única de potencial, e é nosso privilégio como educadores ajudá-los a escrever capítulos de sucesso em suas jornadas de aprendizado.
Biografia:
Fonte: Acervo pessoal
Débora Gerbase é uma professora e tradutora que atua nas áreas de inglês, português e português para estrangeiros. Atualmente, reside em São Paulo, onde concluiu sua formação em Letras – Tradução e Pedagogia e, posteriormente, obteve pós-graduações em Psicopedagogia e Formação de Docentes para o Ensino Superior.
Além de seu trabalho como educadora, Débora é autora dos livros “Sem pé nem cabeça – Expressões idiomáticas em português” e “Manual de Sobrevivência para o Professor Esgotado”, e coordenadora e coautora do livro “A realidade diversa na sala de aula: como lidar com a inclusão e a educação Socioemocional nas escolas” e coautora do livro “Alfabetização Bilíngue: benefícios e mitos na formação de crianças bilíngues”. Tem paixão pelo ensino e aprendizagem, bem como por seu compromisso com o sucesso de seus alunos.
Referências:
American Academy of Audiology. Clinical practice guidelines. Guidelines for the diagnosis, treatment and management of children and adults with central auditory processing disorder; 2010.
Núcleo de Estudos Fonoaudiológicos. Orientações à Escola. São Paulo.
Vygotsky ocupou-se das demandas políticas de seu tempo, e mergulhou na vida acadêmica para produzir uma psicologia de base marxista, que atendesse a criação de um novo homem
Lev Semenovich Vygotsky nascido na cidade de Orsha (1896), Rússia, morreu com apenas 38 anos em Moscou (1934). Formado em Direito, História e Filosofia nas Universidades de Moscou e A. L. Shanyavskii. Com essas informações de sua história percebe-se o que possivelmente induziu a sua produção e exercício: a Revolução Russa de 1917 e o percurso de solidez que se sucede. Vygotsky é um marxista e procura instrumentar uma Psicologia com essas qualidades (OLIVEIRA, 1993).
Para ele, o indivíduo é algo que se transforma no contato com o sociocultural, entendendo a necessidade desse contato com outro indivíduo. Acreditava que essa construção se dava na interação entre o indivíduo com os outros em sua volta. Desse modo, a pessoa se molda a partir do contato com o seu meio e vice-versa. Assim, esse interagir de cada indivíduo com o seu meio, essa vivência única de cada um, é primordial a ele. E com isso, a metodologia de aprendizagem de Vygotsky teve a nomenclatura socioconstrutivismo com eixos de foco na aprendizagem e ciclo vital. Assim seu trabalho pesou na desconstrução de paradigmas anteriores em metodologias pedagógicas existentes.
Esse olhar social é capaz de determinar o desenvolvimento cognitivo e o especialista deve traçar respostas favoráveis impostas pela subjetividade do ensino na sala, no qual o profissional utiliza essa ciência na construção do ensino-aprendizagem, sendo perceptível a visualização, no trajeto do ciclo infantil, o progresso na mostra do pensar e de se expressar desse indivíduo podendo ser verbal ou não (MOREIRA, 1995).
Fonte: encurtador.com.br/uzLS1
Os fundamentos de Vygotsky trabalham com as primícias do homem no mais substancial, a criatividade, a autonomia, o estar desse indivíduo nesse processo e não enxergando só como algo aleatório, mas como um ser pensante. A educação faz parte de todos os aspectos gerais na construção de alguém e de uma sociedade. Desta forma, esse trabalho pretende trazer a visão da abordagem de Vygotsky e a medicalização infantil dentro do contexto da educação básica e das práticas educacionais brasileiras, para o trabalho do psicólogo na Psicologia da Aprendizagem.
Vygotsky
Vygotsky ocupou-se das demandas políticas de seu tempo, e mergulhou na vida acadêmica para produzir uma psicologia de base marxista, que atendesse a criação de um novo homem, de uma nova sociedade e de uma nova educação. Foi assim que nasceu o que hoje conhecemos como teoria histórico-cultural (BORTOLANZA; RINGEL, 2016). A escola de Vygotsky formada por Luria, Leontiev e Vygotsky, apresenta o contexto histórico-cultural na constituição do ser humano como ser social.
Décadas antes de se tornar conhecido como o homem que ao unir marxismo e psicologia criou a teoria histórico-cultural, o menino Lev Semenovich nasceu a 17 de novembro de 1896, em uma pequena cidade provinciana, conhecida por Orsha, ainda bebê, mudou com a família para a cidade de Gomel, onde viveu por um longo período, na companhia de seus pais e de seus sete irmãos (REGO, 1995).
Vygotsky, de origem judaica, cresceu com sua família com situação econômica estável no que diz respeito ao aspecto econômico, o que possibilitou a valorização da educação, propiciando-lhe um ambiente desafiador em termos intelectuais (BORTOLANZA; RINGEL, 2016). Seu pai trabalhava em um banco e em uma companhia de seguros. Sua mãe professora formada, falava vários idiomas, dedicou grande parte da sua vida à criação dos filhos (BORTOLANZA; RINGEL, 2016).
Fonte: encurtador.com.br/cuIM7
Vygotsky passou a frequentar aulas de História e de Filosofia na Universidade Popular de Shaniavski, onde embora não tenha recebido nenhum título acadêmico, aprofundou seus estudos em psicologia, filosofia e literatura, o que foi de grande importância em sua vida profissional posterior (OLIVEIRA, 1993). Concomitantemente aos seus estudos na Universidade Popular Shaniavski, Vygotsky seguiu o curso de Direito na Universidade de Moscou, e formou-se no ano de 1917.
No fim de 1917, Vygotsky retorna a Gomel, “onde assumiu vários trabalhos, como: lecionando Literatura Russa em escolas, Psicologia Geral, Infantil e Pedagógica nos cursos técnicos de pedagogia e, também, se dedicando às atividades culturais” (PUENTES; LONGAREZI, 2013, p. 54). Em Gomel, Vygotsky entra em contato com uma nova realidade. Com seu trabalho na escola de formação de professores, lhe colocou em contato com os problemas de crianças com defeitos congênitos – cegueira, surdez, retardamento mental – o que estimulou a descobrir maneiras de ajudar tais crianças a desenvolver suas potencialidades individuais. Foi ao procurar respostas para estes problemas que se interessou pelo trabalho dos psicólogos acadêmicos (LURIA, 1988).
A teoria histórico-cultural, popularmente conhecida como escola de Vygotsky, constitui-se como uma vertente da psicologia que se desenvolvia na União Soviética, no início do século XX. Essa corrente de pensamento foi denominada histórico-cultural, por seus autores, ao partir do pressuposto de que o homem é um ser de natureza social. Admitia a origem animal do homem, sendo que cada um com suas especificidades frente aos outros animais (MELLO, 2008).
A aprendizagem é uma vivência do meio que os cerca, sendo conectada pelo uso de instrumentos e signos. Entendendo os aspectos socioculturais de cada indivíduo, onde acontece a junção da fala e do comportamento. Um signo então, diz ser um significado de alguma coisa para a pessoa, como o dialeto falado e escrito. Esse intermédio entre pessoas, disponibiliza a construção de novos repertórios e de saberes (MOREIRA, 1995).
Fonte: encurtador.com.br/cjzQ7
Para Vygotsky, esse progresso cognitivo do aluno acontece pelas vivências sociais, assim sendo, pela relação com outras pessoas e com o ambiente em sua volta. De tal modos que, para a substancialidade acontecer precise pelo menos o envolvimento de duas pessoas fazendo trocas de vivências e saberes (MOREIRA, 1995).
Para que a aprendizagem ocorra, a relação social tem que ser dentro da zona de desenvolvimento proximal (ZDP), sendo ao trajeto a percorrer daquilo que existe para o que se sabe, seu saber de fato, e o que se tem disponibilidade interna para aprender, sua potencialidade de inteligência. Desse modo, a aprendizagem ocorre na pausa da ZDP, onde a inteligência real é a que o indivíduo consegue fazer só, e a potencialidade é aquela que ele precise de ajuda de outros para fazer (MOREIRA, 1995).
O papel do professor é de fazer a mediação da aprendizagem e traçando conteúdos que sejam capazes de levar o aluno a potencialidades de saberes de maneira independente dos outros e o estimule nessa construção de saberes, assim criando uma nova ZDP a todo instante. O professor por sua vez, estimula através de trabalhos em grupos e fazendo a junção com técnicas motivacionais, intermediando a aprendizagem e diminuindo sensações de exclusão do aluno (MOREIRA, 1955).
Mas este professor deve sempre estar em observações constantes, para entender melhor a cada aluno, com estratégias que sejam capazes de construir mais vivências e saberes em grupo com interação ativa e cooperativa desse grupo. Essa estratégia de metodologia possibilita novos meios de atuação, parceria e imutáveis estímulos (MOREIRA, 1995).
Fonte: encurtador.com.br/bhrMQ
Educação Básica
A educação básica é um nível de ensino que corresponde aos primeiros anos da educação escolar. De acordo com a Classificação Internacional Normalizada da Educação (ISCED), a educação básica inclui no primeiro estágio ou educação primária a aprendizagem básica da leitura, da escrita e das operações matemáticas simples; e no segundo estágio ou ensino secundário inferior corresponde à consolidação da leitura e da escrita e às aprendizagens básicas na área da língua materna, história e compreensão do meio social. Já no ensino secundário superior são lecionados conteúdos associados às áreas vocacionais e de preparo para o mercado de trabalho e o ensino superior (ALVAREZ, 2015).
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada pela UNICEF e a Assembleia Geral das Nações Unidas em 1989, estabelece a educação básica como um dos direitos das crianças, estabelecendo os padrões mínimos de educação. A oferta da educação básica universal é considerada como uma das principais prioridades para iniciar o processo de mudança social e de desenvolvimento sustentado dos países em vias de desenvolvimento, sendo por isso o objetivo do programa Educação para Todos (Education For All) patrocinado pela UNESCO.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 traz a ideia de educação como direito de todos e dever do Estado e da família. Mas, é com a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que se define a grade curricular, a divisão dos níveis escolares, a formação dos profissionais da educação e a distribuição de recursos financeiros educacionais. A constituição federal garante o direito à educação a todos através do ensino público, obrigatório e gratuito.
Outras leis importantes para a Educação brasileira que podemos citar são: Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8069/90; Lei nº 10.098/94 que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências; Lei nº 10.436 de 2002 que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais, Lei nº 7.853 de 1989 sobre apoio às pessoas portadoras de deficiência, Lei 10.172 de 2001, conhecida como Plano Nacional de Educação, consoante art. 9º inciso I da LDB e Lei 9131 de 1995 que criou o Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão responsável por auxiliar o Ministério da Educação na formulação e avaliação da política nacional de educação;(SERENNA, 2019)
Fonte: encurtador.com.br/bjKZ5
A lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional também estabelece a coordenação do Ministério da Educação, sobre a educação básica brasileira, colaborando com a união, os estados e os municípios. É competência da união elaborar o plano nacional de educação e a elaboração de diretrizes para educação básica. Pela lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional as escolas possuem autonomia e são responsáveis por criar o projeto pedagógico, bem como administrar equipe de colaboradores e recursos financeiros. Garantindo assim a autonomia em métodos a cada instituição escolar. É importante ressaltar que a responsabilidade pela Educação não é somente do Estado, mas também da família e da sociedade.
Educação Básica No Brasil
No Brasil, a educação básica compreende a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, e tem duração ideal de dezoito anos. É durante este período de vida escolar que se toma posse dos conhecimentos mínimos necessários para uma cidadania e serve também para tomada de consciência sobre o futuro profissional e área do conhecimento que melhor se adapte.
Primeiro estágio é destinado a crianças de cinco a onze anos, caracteriza-se por proporcionar destrezas básicas em leitura, escrita e matemática, além de formar uma base para a compreensão das áreas essenciais do conhecimento, incluindo o desenvolvimento pessoal e social dos estudantes. O segundo estágio normalmente destinado a adolescentes de doze a quinze anos, caracteriza-se por aplicar um modelo mais orientado por disciplinas, como física, química, biologia, história, geografia, com a finalidade de introduzir conceitos teóricos sobre uma ampla gama de temas.
Alguns sistemas educativos oferecem também programas vocacionais orientados a desenvolver habilidades pessoais para o acesso ao mercado de trabalho. Como exemplo destes temos as escolas de ensino médio que oferecem curso técnico profissional integrado. A segunda parte do ensino secundário é destinado a adolescentes de quinze a dezoito anos. Caracteriza-se por consolidar a educação secundária com instrução mais diversificada, avançada e especialista, visando à preparação para Educação Superior, ou proporcionando destrezas para a formação profissional de nível médio.
Fonte: encurtador.com.br/eHT24
Medicalização Na Educação
O termo “medicalização” refere-se ao processo de converter questões não médicas, eminentemente de origem social e política, em questões médicas, isto é, tentar encontrar no campo médico as causas e soluções para problemas dessa natureza (COLLARES e MOYSÉS, 1994).Na atualidade, a medicalização das manifestações humanas tem se expandido no Brasil e em outros países em diferentes áreas, saúde, estética, educação, administração, esporte, direito, etc. Em consonância com essa expansão, tal fenômeno tem sido pautado em diversos âmbitos, como na ciência, pesquisa, política, mídia (impressa, eletrônica, televisiva), enfim na sociedade em geral (RIBEIRO, 2014)
Atualmente, verifica-se um aumento do número de diagnósticos médicos e de subsequente ingestão de medicamentos por crianças e jovens em idade escolar, o que reflete uma crescente medicalização em particular, da educação. Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtorno desafiador opositivo, transtorno obsessivo compulsivo e mesmo obesidade e dislexia constituem uma parte substancial das patologias ou distúrbios que ocupam as salas de aula das escolas (PAIS, MENEZES e NUNES. 2016).
Queixas a partir das quais ocorrem encaminhamentos de alunos a clínicas de saúde estão, em geral, relacionadas a questões comportamentais, de atenção e de aprendizagem. Prioritariamente formuladas por professores, tais queixas referem-se a alunos que: “não conseguem permanecer sentados por muito tempo”; “pedem para sair da sala constantemente”; “mostram-se distraídos”; “não se engajam nas atividades”; “não copiam do quadro”; “têm inscritas em que faltam letras”; “cujos textos não têm sentido”; “têm dificuldades para aprender”; “não conseguem ler”; “são agressivos”, “não aceitam regras” etc. Esses relatos acabam sustentando diagnósticos, indicação de tratamentos, e, muitas vezes, prescrição de medicamentos para o controle dos sinais que se manifestam em sala de aula (SIGNOR, 2013).
O Brasil é citado como o segundo maior consumidor mundial de metilfenidato (IBUM,2012). Medicamento que tem por finalidade controlar a atenção e o comportamento. E mesmo consumindo esse medicamento de forma expressiva, o índice de dificuldade de aprendizagem é absurdo. O que leva o questionamento sobre não somente a parte biológica comprometida, mas o contexto social, a qual essa criança está inserida.
No contexto escolar essa ideia contribui com o pensamento equivocado de que crianças são geradoras do seu próprio fracasso escolar, pois carregam algum tipo de distúrbio ou problema que atrapalha o processo de aprendizagem. Esse discurso de que problemas de saúde são as causas de grande parte do fracasso escolar faz com que problemas maiores sejam encobertos, tornando mais fácil culpar a criança, parte mais vulnerável, do que criar novas práticas e estratégicas pedagógicas para melhorar o ensino (NEGREIROS et al., 2016).
O TDAH – Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade é um diagnóstico exemplo destas problematizações que vem sendo bastante discutido. Descrito pela grande maioria das pesquisas atuais como um dos transtornos neuropsiquiátricos mais comuns à infância, com hipóteses de que afetaria cerca de 7% da população mundial, teria como tratamento, muitas vezes único e exclusivo, a prescrição de psicofármacos. Suas características, seriam marcadas pela tríade desatenção, hiperatividade e/ou impulsividade, aspectos que supostamente assumiram formas combinadas ou separadas. No entanto, a popularização do termo “criança hiperativa” passou a preocupar muitos estudiosos que questionam suas bases biológicas e seu tratamento medicamentoso e denunciam a banalização deste diagnóstico para a infância contemporânea (CRUZ et al., 2016).
Fonte: encurtador.com.br/duxyI
O fato é que os problemas de comportamento, aprendizagem e de atenção nem sempre são sintomas de algum distúrbio e podem estar relacionadas ao método de ensino. Conforme Vygotsky (2004), a cognição se constitui na interação, é por meio do olhar do outro (o professor) que a criança se torna “atenta” ou “desatenta”, “ativa” ou “hiperativa”, “boa” ou “má” aprendiz. Assim, o sintoma pode (ou não) ser produzido a depender do contexto interacional. Há de se entender, nessa direção, a relevância da afetividade para o desenvolvimento da criança na escola. O sujeito responde às interações nas quais está inserido; responde de forma favorável às interações que propiciam o desenvolvimento e a aprendizagem e de forma opositiva às interações desfavoráveis.
De acordo com Vygotsky (2010), “toda a aprendizagem só é possível na medida em que se baseia no próprio interesse da criança. Outra aprendizagem não existe”. Ainda segundo o autor, a atenção infantil é orientada e dirigida quase exclusivamente pelo interesse, e por isso a causa natural da distração da criança é sempre a falta de coincidência de duas linhas na questão pedagógica: do interesse propriamente dito e daquelas ocupações que são propostas como obrigatórias.
Para Vygotsky (2010), se na criança foram criadas formas antissociais de comportamento, a regra para a reversão do problema é justamente o contrário daquela aplicada aos infratores das leis na sociedade, onde a medida é a exclusão do meio social: “Ali, é ínfima a preocupação com a personalidade do próprio infrator, e tudo se volta para neutralizá-lo e proteger o meio de sua influência”. Na escola, assegura o autor, a regra é distinta; isto é, a regra é o contato social mais estreito, pois é na convivência mediada que as crianças desenvolvem capacidades ligadas à criação e manutenção de laços afetivos.
Fonte: encurtador.com.br/fqvGR
A contradição de Vygotsky a esses pensamentos medicalistas, evidencia então a existência de diferentes formas de interpretação da realidade e mostra que há a necessidade de uma profunda reflexão sobre os problemas que se apresentam em relação à escola brasileira. Tal reflexão possibilitaria uma revisão crítica de nossas representações sobre o homem, a sociedade que queremos construir, o papel do Estado e da escola, o processo de produção de conhecimentos, a relação família-escola, os valores que a escola não pode se eximir de trabalhar com seus alunos, enfim, seria um processo que possibilitaria uma ampla ressignificação de nossos referenciais políticos e ideológicos (SIGNOR et al., 2017).
CONCLUSÃO
As questões aqui expostas apontam para as contribuições de Vygotsky na educação básica, tendo como enfoque sua teoria histórico cultural e as reflexões da medicalização infantil. O autor da teoria apresenta o sujeito como um ser de natureza social, ora produtor da sua cultura, ora produto de suas internalizações. De maneira que o contato do ser humano com o outro produz transformação no mesmo. Cabe acrescentar nesse meio que, os acontecimentos básicos que fundamentaram o surgimento da educação básica hoje asseguram o indivíduo do direito de receber um ensino justo e gratuito. O que possibilita novas interações dentro de um contexto escolar, e conforme tais relações forem estabelecidas propiciará ou não a aprendizagem.
Essa interação no âmbito escolar tem exposto alguns conflitos entre professores e alunos, no que diz respeito aos comportamentos apresentados, visto como “comportamentos problemas”. Graças à busca por soluções milagrosas que possam sanar as dificuldades da vida é que inúmeras crianças são medicalizadas nas instituições de educação. Professores depositam essa incumbência na ciência médica, mas o problema, na maioria das vezes, tem outro caráter. A educação sofre influência de déficits não orgânicos, mas econômicos e sociais, como o baixo incentivo, salas lotadas, desvalorização da atuação profissional, além de cursos despreparados para formação de profissionais qualificados, entre inúmeros outros.
Fonte: encurtador.com.br/fqxHO
A partir desses levantamentos há de se entender de acordo com a teoria socioconstrutivista, a relevância da afetividade para o desenvolvimento da criança na escola. De modo que a atenção é orientada pelo interesse, e culpar, diagnosticar, medicalizar a criança é caminho mais curto e fácil para “solucionar” os possíveis problemas dentro da educação. Vale conscientizar e refletir sobre as consequências advindas de tais condutas.
BORTOLANZA, Ana Maria Esteves; RINGEL, Fernando. Vygotsky e as origens da teoria histórico-cultural: estudo teórico. Revista Educativa-Revista de Educação, v. 19, n. 3, p. 1020-1042, 2017.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituição/constituicaocompilado.htm. Acesso em 25 de mai de 2019
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei nº 9394, 1996. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l9394.htm. Acesso em 25 de mai de 2019.
COLLARES, C. A. L.; MOYSÉS, M. A. A. A transformação do espaço pedagógico em espaço clínico (a patologização da educação). Série Idéias, São Paulo, n. 23, 1994. Disponível em: <htpp://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/idéias_23_ p025-031_c.pdf>. Acesso em: 20 mai. 2019.
CRUZ, M. G. A.; OKAMOTO, M. Y.; FERRAZZA, D. A. O caso Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e a medicalização da educação: uma análise a partir do relato de pais e professores. Interface, Botucatu, vol. 20, n. 58, 2016.
LONGAREZI, A. M.; PUENTES, R. V. Ensino Desenvolvimental: vida, pensamento e obra dos principais representantes russos. Uberlândia: EDUFU, 2013.
LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1988.
NEGREIROS, F.; COSTA, T. S.; DAMASCENO, M. A. Medicalização da educação e concepções de professores brasileiros: um estudo descritivo na rede pública de ensino. Clínica & Cultura, v. 2, n. 1, p. 28-35, jul./dez., 2016.
MELLO, S. A. A Escola de Vygotsky In: CARRARA. K. (Org) Introdução a Psicologia da Educação. São Paulo: Avercamp, 2008. p. 135-154.
MOREIRA, M. A.; Teorias de Aprendizagens, EPU, São Paulo, 1995.
OLIVEIRA, M. K. Vygotsky. Aprendizado e Desenvolvimento. Um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1993.
PAIS, Sofia Castanheira; MENEZES, Isabel; NUNES, João Arriscado. Saúde e escola: reflexões em torno da medicalização da educação. Cadernos de Saúde Pública, [s.l.], v. 32, n. 9, p.1-10, 2016. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/0102-311×00166215.
REGO, T. C.. VYGOTSKY. Petrópoles: Vozes, 1994.
REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.
RIBEIRO, M. I. S. A medicalização da educação na contramão das diretrizes curriculares nacionais da educação básica. Revista Entreideias, Salvador, v. 3, n. 1, p. 13-29, jan./jun. 2014.
SERENNA, Nathalia. Leis que regem o sistema Educacional Brasileiro. 2019. Disponível em: <https://serenna.jusbrasil.com.br/artigos/605460083/leis-que-regem-o-sistema-educacional-brasileiro>. Acesso em: 25 maio 2019.
SIGNOR, R.C. F. O sentido do diagnóstico de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade para a constituição do sujeito/aprendiz. 2013. Tese. (Doutorado em Linguística) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2013.
SIGNOR, Rita de Cassia Fernandes; BERBERIAN, Ana Paula; SANTANA, Ana Paula. A medicalização da educação: implicações para a constituição do sujeito/aprendiz. Educação e Pesquisa, [s.l.], v. 43, n. 3, p.743-763, 3 nov. 2016. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1517-9702201610146773.
VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Teoria e método
Compartilhe este conteúdo:
Análise do Comportamento aplicado ao uso de aplicativos digitais em sala de aula
A Psicologia é uma ciência que procura compreender o homem e seu comportamento. Essa, fornece subsídios para que o indivíduo saiba e/ou aprenda a lidar consigo mesmo e com as experiências da vida. Logo, ela se preocupa com o homem na sua totalidade, visto que esse indivíduo é entendido como um ser singular, único e especial, não apenas porque pensa, fala, ri, chora, cria, faz cultura, tem autoconsciência e consciência da morte, mas também porque o meio social é seu ambiente específico.
Contudo, em seu caminhar “ele deverá conviver com outros homens, numa sociedade que já encontra ao nascer, dotada de uma complexidade de valores, filosofias, religiões, línguas, tecnologia” (TELES, 1999). A Psicologia e a Tecnologia são duas esferas que se comunicam, se relacionam e se integram entre si, pois ambas são igualmente importantes para o processo de aprendizagem e desenvolvimento do sujeito.
Segundo Lima Júnior, (2007), a Tecnologia é definida como um reflexo ou extensão do modo operativo do pensar humano, capaz de elaborar abstrações dentro dos variados contextos encontrados transformando a si mesmo e o mundo ao seu redor. Ou seja, a relação entre o homem e a tecnologia é de um processo indissociável no qual o homem usa recursos materiais e imateriais para conviver em “harmonia”, ele cria, atua e se (auto)transforma. Vive em simbiose com este ser e estar no mundo tecnologizado numa busca constante por inovações e renovações cotidianas.
Aqui, tecnologia refere-se à forma específica da relação entre o ser humano e a matéria, no processo de trabalho que envolve o uso de meios de produção para agir sobre a matéria com base em energia, conhecimento e informação (OLIVEIRA, 2001). Assim, este é um texto de mão dupla, o homem em busca de criação e aprendizado, produto e produtor deste processo. Logo, Psicologia e Tecnologia se dão em uma intersecção que se faz necessária na vida do homem.
Na Educação, a primeira função que psicólogos desempenharam no âmbito escolar foi a de medir habilidades e classificar as crianças quanto a sua capacidade de aprender. Era uma atividade extremamente segregadora, pois categorizaram e excluíram os alunos da possibilidade de vivenciar o processo educacional regular, propondo a elas métodos especiais de educação a fim de ajustá-los aos padrões de normalidade.
Ao longo dos anos atribuíram-se os problemas de aprendizagem no aluno e a sua incapacidade, ao invés de considerar os diversos fatores sociais que influenciam o ensino. A partir da década de 1980, essa visão começou a mudar, sendo que os aspectos históricos, econômicos, políticos e sociais passaram a ser vistos como constituintes de problemas de aprendizagem (LIMA, 2005). No entanto, ainda prevalece a medicalização do fracasso escolar, ou seja, o discurso em qual atribuem dificuldades do aluno a aspectos da saúde individual e não à educação (LIMA, 2005).
Segundo Martins (2003), o psicólogo escolar traduz metodologias e resultados em ação nas escolas, fornecendo condições de aprendizagem para que a escola possa tomar as melhores decisões enquanto programas educacionais. Em suma, pode-se dizer que o psicólogo escolar age como facilitador do processo de ensino-aprendizagem.
Para auxiliar na aprendizagem, vários autores defendem o uso de tecnologias como apoio pedagógico na escola. Aparatos tecnológicos tornam a experiência da aprendizagem mais prazerosa pelo contexto de diversão e o fato que a tecnologia faz parte do dia-a-dia do aluno. Os professores, que não cresceram neste contexto, enfrentam com isso um grande desafio ao se adaptar a essa realidade. Muitos não se adaptam e excluem a tecnologia da sala de aula por desconhecimento da utilização da mesma. Além disso, os aspectos pedagógicos não são bem conhecidos pelos educadores e, muitas vezes, ignorados.
Dentro do leque amplo de tecnologias disponíveis, há as Tecnologias da Informação e Comunicação Móveis e Sem Fio (TIMS). Entre as TIMS, temos o celular, um aparelho popular, com aplicativos que podem vir a ser utilizados em sala de aula como recurso pedagógico (BENTO; CAVALCANTE, 2013).
Existem várias formas de utilizar um celular em sala de aula, seja um celular simples ou um mais moderno. Com um celular simples pode utilizar a calculadora, o conversor de moeda, de comprimento, de peso, de volume, de área, e de temperatura, tem também. E os mais modernos possuem, além disso, diversos aplicativos, gravador de voz, câmera e a internet. Mas para que o uso de dispositivos móveis se torne um hábito comum em sala de aula, os professores necessitam de um treinamento para adquirir conhecimento sobre as mudanças que vêm acontecendo na era da tecnologia, e assim aproveitar melhor o celular como uma forma de educação e não só para comunicação (BENTO; CAVALCANTE, 2013).
Segundo Saccol, Schlemmer e Barbosa (2011),
se adotarmos uma concepção epistemológica de que o conhecimento é fruto de construção do indivíduo feita em colaboração com professores e colegas, devemos selecionar tecnologias que permitam interação intensiva entre as pessoas, por exemplo, por meio de ambientes virtuais que disponibilizem fóruns, chats, espaços para compartilhamento de projetos, arquivos de interesse comum (p.31).
Assim, perseguimos como objetivo descrever os benefícios do uso de aplicativos digitais em sala de aula, a partir de conceitos e metodologias da Análise do Comportamento.
ANÁLISE DO COMPORTAMENTO E APRENDIZAGEM
O comportamento e os processos que influenciam o comportamento são o objeto de estudo da Análise do Comportamento. Skinner, que fundou o ramo Behaviorismo Radical, que gerou a Análise do Comportamento, enfatiza as consequências do comportamento que influenciam a frequência do mesmo e compreende o surgimento de comportamentos apenas em termos da interação do organismo com o ambiente (RANGÉ, 1995). Esse comportamento, em qual o organismo age ou opera sobre o ambiente chama-se de comportamento operante.
A unidade de análise para este tipo de comportamento são as contingências tríplices, que mostram as relações funcionais, ou relações de dependência, entre o operante e o ambiente com o qual o organismo interage, utilizando dos termos evento antecedentes, comportamento ou resposta e evento consequente. Segundo Moreira e Medeiros (2007) os operantes (andar, pensar e etc.) geram consequências no ambiente e são influenciados por essas consequências. Em outras palavras, os efeitos do comportamento retroagem sobre o organismo.
Para Skinner, todo comportamento pode ser aprendido, e entende aprendizagem como “qualquer mudança relativamente duradoura do comportamento induzida pela experiência” (DAVIDOFF, 1983, p.158). Esse processo de aprendizagem ou condicionamento implica que a frequência de um comportamento é aumentada ou diminuída pela influência das consequências deste comportamento (DAVIDOFF, 1983). Por exemplo, o comportamento de estudar gera a consequência de obter notas boas, o que aumentará a frequência do estudo.
Para melhor entendimento do condicionamento operante, é preciso compreender as noções de reforço e punição. Reforço, de acordo com Davidoff (1983), é aquilo que aumenta a probabilidade de um comportamento ser apresentado novamente em situações semelhantes. Alguns reforçadores implicam a apresentação de estímulos, sendo reforços ou reforçadores positivos. Por exemplo, uma criança que limpou seu quarto e consequentemente recebeu uma balinha, é mais provável a limpar o quarto novamente no futuro. Outros consistem na supressão ou remoção de estímulos, sendo denominados reforços negativos.
Existem dois tipos de reforço negativo, sendo fuga e esquiva. Fuga ocorre quando o aumento da frequência de um comportamento acaba ou elimina uma consequência desagradável. Por exemplo, tampar os ouvidos para não escutar mais o barulho alto. Esquiva, por outro lado, implica que o aumento da frequência do comportamento evita a apresentação de uma consequência desagradável. Tomar injeção, por exemplo, para evitar uma doença.
Contudo, tanto reforços positivos quanto negativos irão aumentar a probabilidade da apresentação do comportamento ou resposta (SKINNER, 1953). Certamente há diferenças entre indivíduos quanto às consequências que são reforçadores. O que serve de reforço para um, não necessariamente é vantajoso para o outro. Por isso, quando se tenta entender o motivo de um comportamento, é preciso fazer este levantamento de contingências. Não pode simplesmente perguntar para a pessoa o que serve de reforço para ela, pois muitas vezes a relação entre a resposta e a consequência não é percebida por ela.
Outro conceito que está intimamente relacionado com reforço é punição. É exatamente o contrário do reforço, ou seja, é aquilo que diminui a probabilidade de um comportamento ser apresentado novamente em situações semelhantes. Novamente existem duas formas, sendo punição positiva e negativa. Fala-se de punição positiva quando a apresentação de uma consequência aversiva diminui a probabilidade de o comportamento ocorrer de novo. Por exemplo, passar mal por causa de uma comida e, portanto, não comer este prato no futuro. Punição negativa ocorre quando a remoção de uma consequência reforçadora diminui a probabilidade da resposta. Por exemplo, uma pessoa que dirigiu rápido demais, cuja carteira de habilitação foi prendida, pode não dirigir com alta velocidade mais no futuro (DAVIDOFF, 1983).
Resumido, à medida que o comportamento muda, pode-se dizer que se está aprendendo alguma coisa. Na Análise do Comportamento, estudar a aprendizagem é estudar o comportamento modificado e como as diversas variáveis afetam esse comportamento.
ANÁLISE DO COMPORTAMENTO E O USO DE APLICATIVOS DIGITAIS NA EDUCAÇÃO
Fracasso na aprendizagem geralmente é fruto do procedimento e não de características intrínsecas a pessoa ou do meio. Para uma educação eficaz, precisa-se considerar alguns aspectos ou procedimentos. Em primeiro lugar, para uma aprendizagem eficaz, é necessário especificar o que se deseja ensinar. Os softwares dos aplicativos desenvolvidos com fins pedagógicos, já são baseados em certos objetivos (aumentar conhecimento de história, língua portuguesa). Os dispositivos que não servem apenas para fins educativos necessitam de um estudo prévio pelo professor, para que ele entenda as possibilidades do aparelho e possa construir um planejamento incluindo o uso do mesmo.
O uso de tecnologia não pode significar uma desculpa para não planejar a aula ou para simplesmente não dar aula, o aparelho serve apenas como auxilio no ensino. Ou seja, o recurso tecnológico nunca substituirá o professor (MOUSQUER; ROLIM, [s.d.]).
Em seguida, o aluno deve receber um reforço imediatamente após de apresentar o comportamento desejado. Aplicativos proporcionam a consequência (erro ou acerto) logo depois da ação do aluno, estabelecendo assim uma contingência de reforço ou punição. Enquanto o aluno, muitas vezes, não recebe o feedback necessário, ou o recebe muito tempo depois de executar a tarefa (correção de prova, atividade), diminuindo a efetividade do retorno.
Ao apresentar feedback, é importante reforçar apenas aqueles comportamentos efetivamente apresentados e não comportamentos parecidos. Por exemplo, elogiar o aluno apenas quando conseguiu completar a tarefa desejada. Reforçando comportamentos que não são os comportamentos-objetivos, aumenta a probabilidade de o aluno apresentar os mesmos novamente em futuras situações semelhantes, e não conseguir emitir as respostas realmente desejadas. Nesse sentindo, os softwares dos dispositivos móveis oferecem uma resposta imediata confirmando, ou não, o êxito da tarefa.
Além disso, é importante evitar situações que levem o aluno ao erro, pois podem se tornar estímulos aversivos e diminuir a adesão à tarefa. Como a maioria dos aplicativos funcionam em torno de um jogo, o aluno estará brincando e não se sente tão pressionado ao errar.
Outro ponto imprescindível é que pessoas aprendem mais facilmente quando o conteúdo é apresentado em pequenos módulos, recebendo um feedback imediato de acordo com o sucesso na realização da tarefa. Os softwares nesse processo podem facilitar a aprendizagem por proporcionarem um processo de progressão gradual, em qual o aluno somente avança para o próximo estágio quando domina o conteúdo anterior. Dessa forma, cada aluno progride no seu próprio ritmo: quem aprende a tarefa de forma mais rápido, avança mais rapidamente para o estágio seguinte. Ainda mais, devido ao fato de funcionar a partir da progressão gradual, o aluno acerta as questões com mais facilidade, já que o grau de dificuldade é menor.
Portanto, neste processo de uso de aplicativos é importante escolher cuidadosamente as situações antecedentes de ensino-aprendizagem, ou seja, o conteúdo, elementos e objetivos do aplicativo, já que, de acordo com Skinner (1953), para planejar uma consequência que almejamos, precisamos definir os estímulos ambientais que levarão ao comportamento desejado.
Por fim, ao utilizar os aplicativos, as respostas dos usuários serão registradas e fornecem ao programador muitas informações para realizar mudanças que possam melhorar o aplicativo. Então, ao mesmo tempo que os alunos aprendem com os aplicativos, também exercem uma influência e ajudam a definir novos conteúdos, metodologias etc.
PARA UMA REFLEXÃO AMPLA
Diante de tudo que foi exposto, é possível entender a importância de utilizar o máximo de recursos possíveis em prol da melhoria da aprendizagem e do desenvolvimento. É preciso compreender este processo para poder mudar o modelo educacional e só então avançar com ações de fato – o uso dos aplicativos digitais em sala de aula.
Alunos e professores precisam ser preparados para essa nova realidade, e então se concebe a aprendizagem não como uma ação individual, mas como uma atividade coletiva. Logo, com o trabalho de aquisições e cooperatividade de ambos é possível lidar melhor com a autonomia e com o respeito sabendo dos direitos e dos deveres de cada um.
Nessa relação da Psicologia com a Tecnologia, o educador passa a ter um papel fundamental de mestre que conduz seu aprendiz neste processo de vida, de construção e experimentação, produtos e produtores de relações, fornecendo ao aluno as condições ou estímulos necessários para que ele consiga construir o conhecimento.
Referências:
AGUIAR, I.; PASSOS, E., A Tecnologia como Caminho para uma Educação Cidadã, [s.d.].
BENTO, M.C.M.; CAVALCANTE, R.S., Tecnologias móveis em Educação: o uso do celular na sala de aula, ECCOM, vol. 4, n. 7, [s.l.], 2013.
DAVIDOFF, L. Introdução à Psicologia. São Paulo: Mc GrawHill, 1983.
LIMA, A.O.M.N., Breve Histórico da Psicologia Escolar no Brasil.Psicologia Argumento, vol. 23, n. 42, Curitiba, 2005, p. 17-23.
LIMA JÙNIOR, A. S., A escola no contexto das tecnologias de comunicação e informação: do dialético ao virtual. Salvador: Eduneb, 2007.
MARTINS, J.B., A atuação do psicólogo escolar: multirreferencialidade, implicação e escuta clínica.Psicologia em Estudo, vol. 8, n. 2, Maringá, 2003, p. 39-45
MOREIRA, M.B.; MEDEIROS, C.A. Princípios básicos de análise do comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2007.
MOUSQUER, T.; ROLIM, C.O., A utilização de dispositivos móveis como ferramenta pedagógica colaborativa na educação infantil. URI, Santo Angelo (RS), [s.d.].
OLIVEIRA, M. Rita N. Sales. Do mito da tecnologia ao paradigma tecnológico: a mediação tecnológica nas práticas didático-pedagógicas. Revista Brasileira de Educação. São Paulo, n.18, Set/Dez 2001, p.101-107.
RANGÉ, B. (Org.). Psicoterapia comportamental e cognitiva. Campinas, São Paulo: Editorial Psy, 1995.
SACCOL A.; SCHLEMMER E.; BARBOSA J. m-learming e u-learning– novas perspectivas da aprendizagem móvel e ubíqua. São Paulo: Pearson, 2011.
SKINNER, B.F. Ciência e Comportamento Humano. 10.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1953.
TELES, Maria Luiza Silveira. O que é Psicologia.Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1999.