Sexualidade e saúde mental: experiências, serviços e descrédito

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Devidas indagações convenientes à procriação e sexo se apresentam como inquietações acentuadas no mundo de hoje para todo mundo e, em especial, para clientes de serviços de saúde mental, pois esses usuários se localizam em cenários de extrema vulnerabilidade. Dentre esses quesitos, evidenciam-se as questões que falam sobre gravidez, ao parto, ao puerpério, gestação, ao anticoncepcional e ao aborto, às doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), os elos entre estas e o comportamento sexual, o uso de preservativos, a promiscuidade e a pluralidade de formas de contato sexual e violência sexual. Além do mais, tem que levar em consideração que a medicalização, o efeito da discriminação e do descrédito relativos à orientação sexual e às relações de gênero, bem como a homofobia e o machismo, e da expressão representada dos diferenciais de poder e seus determinantes macrossociais, englobando a pobreza e o racismo, também se deparam linkados à prática da sexualidade (Barbosa, Souza & Freitas, 2015; Paiva, 2008; Wainberg et al., 2016).

Sobre a vivência da maternidade, Vacheron, Ducroix e Choudey (2008) constataram que os transtornos mentais de uma coletividade de mulheres não procederam em impacto negativo sobre seus bebês, visto que aspectos ambientais, como o apoio dos acompanhantes e a realização de intervenções precoces, se mostraram como mais fundamentais. De maneira similar, Solari, Dickson e Miller (2009), apontando diretrizes para o tratamento sem medicamento de mulheres com esquizofrenia em especial durante a gravidez e o período pós-parto, retrataram que, apesar dos desafios, a intervenções psicoeducativas e psicoterapêuticas são vias capazes de aperfeiçoar a qualidade das precauções da mãe dispensadas ao bebê.

Ziliotto e Marcolan (2014), em uma pesquisa qualitativa feita com enfermeiras e auxiliares de enfermagem de um serviço de saúde mental, apuraram que cada profissional se dispunha de um modo distinto com relação aos clientes e, deste modo, elaborava uma visão particular sobre a sexualidade dos mesmos. Portanto, apontam que preconceitos, tabus e juízos de valor pretendem conduzir e, acima de tudo, afetar de forma negativa o exercício de profissionais de saúde, contudo daqueles que, à primeira vista, aparentam se representar por certa neutralidade em relação às manifestações da sexualidade nessa comunidade. Em um estudo anterior, os mesmos autores salientaram que falhas institucionais colaboram para esta situação, tendo em vista a inexistência de um local para discussões sistematizadas em cima da temática em programas de capacitação (Ziliotto & Marcolan, 2013).

Fonte: encurtador.com.br/apAIM

Mesmo em encargo desse tipo de problema, Possas, Simão, Delgado, Galbinski e Sá (2008) apontam que o progresso de ações de prevenção e atenção às DSTs e ao HIV/AIDS nos serviços de saúde mental necessita de novas condutas em relação tanto à sexualidade quanto ao sofrimento psíquico. Para os autores, na visão dos direitos humanos, a sexualidade teria que ser vista como algo saudável e necessário, nesta população e em qualquer outra comunidade, e a diversidade precisaria ser aceita e respeitada, e não exercer como mais um mecanismo de discriminação e exclusão. É benéfico destacar, inclusive, que as políticas públicas inerentes à saúde mental determinam que os usuários tem que ser protegidos de qualquer tipo de discriminação associada a sua condição (Ministério da Saúde, 2004).

Cumpre especificar que sexualidade e saúde mental são expressões que não admitem uma definição unívoca. Contudo, considera-se aqui um conceito antiessencialista da sexualidade, em que ela é compreendida como fenômeno social, sendo vivida em distintos lugares e tempos de uma maneira típica (Borges, Canuto, Oliveira, & Vaz, 2013; Paiva, 2008). Nessa mesma diretriz, compreende-se aqui, também, que saúde mental se diz a respeito a algo maior do que apenas a falta de transtornos mentais, mas como um fornecedor de diversas interações que englobam fatores biológicos, sociais e psicológicos (Alves & Rodrigues, 2010).

Cook (2000) apanhou, na literatura especializada, indicadores do estigma sofrido por essa população, que sucederia, essencialmente, da falta de informação e complicaria uma vida sexual salutar. Prontamente em uma análise realizada com mulheres com diagnóstico de transtornos mentais diversos, Lyon e Parker (2003) reiteraram que as mesmas sentiram que suas funções de “mulheres” foram mudadas pelas funções de “doentes mentais”.

Referências:

Agénor, M., & Collins, P. Y. (2013). Preventing HIV among U.S. women of color with severe mental illness: Perceptions of mental health care providers working in urban community clinics. Health Care for Women International, 34(3-4), 281-302.

Alves, A. A. M., & Rodrigues, N. F. R. (2010). Determinantes sociais e económicos da saúde mental. Revista Portuguesa de Saúde Pública, 28(2), 127-131.

Bardin, L. (2006). Análise de conteúdo (L. de A. Rego & A. Pinheiro, Trads.). Lisboa: Edições 70. (Obra original publicada em 1977).

Barbosa, J. A. G., Guimarães, M. D. C., & Freitas, M. I. F. (2013). Sexualidade e vulnerabilidade social em face das infecções sexualmente transmissíveis em pessoas com transtornos mentais. Revista Médica de Minas Gerais, 23(4), 455- 461.

Barbosa, J. A. G., Souza, M. C. M. R., & Freitas, M. I. F. (2015). A abordagem da sexualidade como aspecto essencial da atenção integral de pessoas com transtornos mentais. Ciência & Saúde Coletiva, 20(7), 2165-2172.

Borges, L. S., Canuto, A. A. A., Oliveira, D. P., & Vaz, R. P. (2013). Abordagens de gênero e sexualidade na Psicologia: revendo conceitos, repensando práticas. Psicologia: Ciência e Profissão, 33(3), 730-745.

Brasil. Ministério da Saúde. (2004). Saúde mental no SUS: os Centros de Atenção Psicossocial. Brasília: Ministério da Saúde.

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A nova She-Ra: mudanças bem-vindas para nossa realidade

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A série de animação She-Ra: A Princesa do Poder, criada por Larry DiTilio e J. Michael Straczynski durante os anos de 1985 a 1986, conta a história da princesa Adora, sua descoberta do poder de She-Ra e sua luta contra os vilões da Horda para libertar o platerna Ethernia do ditador Hordak. O desenho dos anos 80 é um spin-off com a mesma proposta da animação He-Man e os Mestres do Universo, também exibido na televisão durante os anos 70 a 80. A ligação entre as duas séries é que Adora (She-Ra) e Adam (He-Man) são irmãos gêmeos.

http://abre.ai/bv0n

O design dos personagens dos anos 80 seguem um padrão corporal, heteronormativo e étnico, com apenas UMA personagem negra, que possui pouquíssimo tempo de tela em comparação com os outros, mas a série não deixou de fazer sucesso por causa desses detalhes.

No ano de 2019, uma nova versão de She-Ra foi lançada na plataforma Netflix, tendo como produtora e criadora Noelle Stevenson, chamada de She-Ra e as Princesas do Poder. Essa nova versão da princesa dos anos 80 tem uma proposta totalmente inovadora e inclusiva, dando visibilidade para diversos outros grupos étnicos, orientação sexual e até mesmo gênero, saindo de um olhar nada dentro da caixa. A nova She-Ra expandiu seus horizontes com mudanças quentinhas, bem-vindas e muito importantes para nossa atual realidade. Uma realidade de subjetividades abertas.

http://abre.ai/bv0D

Até mesmo a protagonista, Adora, se mostra, inicialmente, seguir totalmente os padrões impostos pela sociedade, sendo uma mulher segura de si, bonita e sem defeitos, como mostra nos desenhos dos anos 80. No entanto, a Adora de 2019, é uma adolescente, com suas inseguranças, expondo seus ideais, se revoltando com injustiças, mudando de opinião e descobrindo sua sexualidade. Resumindo, é uma personagem imperfeita e isso é lindo, pois se aproxima do que é real e de situações que muitas meninas e adolescentes passam ou que mulheres adultas já passaram.

http://abre.ai/bv0W

Muito se discutiu em fóruns na internet que a nova She-Ra não era uma boa personagem por simplesmente não ter o “sex-appeal” muito esperado e desejado por homens. O que as pessoas se esqueceram simplesmente foi que a Adora de 2019 é uma adolescente de 16 anos, criada não para satisfazer vontades sexuais. E até mesmo a Adora dos anos 80, apesar de ter o ar de “perfeição”, nos mostra uma personagem forte e dona de si mesma. A sexualização das mulheres em desenhos animados, programas em live-action e games é um problema mundial que deve ser debatido e problematizado adequadamente.

A Princesa Cintilante também alterou seu design, deixando a personagem mais real. A etnia do personagem Arqueiro também se modificou. Agora ele é negro e tem dois pais.

http://abre.ai/bv1e

A Princesa Serena também mudou sua etnia, sendo uma mulher negra.

http://abre.ai/bv1l

A Princesa Perfuma, é uma mulher trans. Essa informação foi confirmada pela criadora e produtora da série Noelle Stevenson, no entanto, isso não foi abordado na série pois ainda existem muitos tabus e preconceito envolvidos diante de personagens transsexuais.

http://abre.ai/bv4Q

Temos mais presença de personagens homoafetivos como Spinerella e Netossa. O casal é interacial e Spin é uma mulher gorda.

http://abre.ai/bv4R

Temos também a presença de personagens não binários como Double Trouble.

http://abre.ai/bv4Y

A Princesa Gélida, diferente das outras, foi representada por uma criança.

http://abre.ai/bv41

A Princesa Scorpia é uma mulher lésbica e apesar de seu design ameaçador, é meiga, empática e super preocupada com seus amigos.

http://abre.ai/bv43

A rival de Adora, Felina, teve suas modificações em comparação com o desenho antigo, mas o principal é que esta tem sentimentos de ódio e de amor com a protagonista, motivados por sentimentos de abandono, já que Adora deserda da Horda para se juntar à Aliança das Princesas e ser a She-Ra.

http://abre.ai/bv44

Até mesmo Hordak, vilão da animação, foi bem desenvolvido, mostrando suas inseguranças em relação ao “Mestre da Horda”, seu irmão, por ser uma falha.

http://abre.ai/bv46

A motivação de Hordak a conquistar o povo e o planeta Ethéria, além de fazer isso para ter a confiança de seu irmão e se mostrar “merecedor” de respeito, pode ser analisado de forma que Hordak é considerado uma falha, um mero erro, e a dominação deste planeta, onde sua população é fora do comum e onde possui a “magia”, é uma forma de mostrar como ditaduras funcionam. Como algo que é diferente não é bem aceito pela sociedade, mas isso foi feito de modo sutil para que ficasse subentendido pelos espectadores.

Esse desenho me fez lembrar de uma infância onde Princesas não eram negras, e que muito menos podiam ser fortes. Que meninos não choram. Que casais homoafetivos não existiam. Sou grata por essas modificações terem acontecido, pois imagino crianças, adolescentes e até mesmo adultos como eu, vendo esse desenho e pensando “Que bom que isso está sendo abordado. Agora me sinto representada(o) por X personagem” e isso é maravilhoso.

http://abre.ai/bv5a

She-Ra e as Princesas do Poder é uma animação que ultrapassou as barreiras do preconceito e mostrou que o poder da amizade e principalmente do amor são armas poderosas para transformar as pessoas e nações. É um desenho necessário e indicado para todas as idades, sem restrições. Não é apenas mais uma animação sobre Garotas Mágicas. É muito mais.

FICHA TÉCNICA

http://abre.ai/bv5c

Título Original: She-Ra and the Princesses of Power
Direção: Adam Henry, Jen Bennett, Lianne Hughes, Roy Burdine e Stephanie Stine
Duração: 24 minutos por episódio (5 Temporadas)
Classificação: Livre
Ano: 2018 – 2020
Gênero: Animação, Aventura
País: Estados Unidos da América
Onde assistir: Netflix

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