O oxigênio da vida

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Eles moravam em um dos bairros mais violentos de São Paulo. Estavam perto dos 20 anos. Eram três amigos de infância. Um dia, olharam para a estrada à frente e viram uma bifurcação: de um lado, uma placa indicando a rota conhecida; do outro, um livro abandonado.

Bifurcados, só tinham uma certeza: o caminho conhecido havia sido percorrido por muitos de seus outros amigos, onde alguns se perderem e outros perderam o oxigênio. Os três sonhavam alto: cursar uma faculdade. Diploma não era futuro, era delírio. Como incluir na dispensa de casa um item tão luxuoso como estudo? Das 24 horas do dia, 14 trabalhavam. Remuneração baixa, mas vital para o sustento das famílias.

Era preciso coragem de guerreiro para correr atrás de escassas oportunidades e resiliência de bambu para colecionar nãos. Entraram para a faculdade. Nos bancos escolares, agarravam-se aos livros para abandonar a realidade que, desde o berçário, assegura a alguns a evolução e a outros a submissão. Na árdua jornada, a fome esmagava o estômago e o sono abatia o corpo.

Fonte: encurtador.com.br/zNSX6

Fortaleciam-se na leitura de biografias, repletas de histórias de sucessos conquistadas por escaladas de fracassos. O que a realidade negava, os sonhos consentiam. Jamais desistiram de erguer o canudo no pódio da formatura. Eram escoltados pelo vigor da juventude, onde os olhos se perdiam no imenso horizonte de vida.

O sol energizava o caminho da persistência e a chuva limpava a poluição do desânimo. Final dos anos 2000, três amigos subiram ao pódio: um erguia o canudo de Ciência da Computação, outro de Comunicação e o outro de Administração de Empresas. Quando se viram bifurcados, decidiram seguir pela estrada do livro abandonado.

No caminho, encontraram o “Diário de Bitita”, de Carolina Maria de Jesus (1914-1977), que foi catadora de lixo, moradora de favela e tornou-se escritora de sucesso traduzida para vários idiomas: “Eu passava os dias lendo ‘Os Lusíadas’, de Camões, com o auxílio do dicionário. Eu ia intelectualizando-me, compreendendo que uma pessoa ilustrada sabe suportar os amarumes da vida”.

Eles sabiam aonde queriam chegar. Escolheram o melhor GPS para os guiar até o destino escolhido. Eles orientam. Eles consolam. Eles guiam. Jamais te abandonarão. Carolina os catou nos lixos e eles acalmavam sua dor. Estarão sempre perto de você para te receber de páginas abertas.

Livros, o oxigênio da vida.

Respire-os.

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Cartas a um amigo

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Alano de Freitas, aos sessenta anos, é – em minha opinião – um menino que brinca com letras, sons e imagens. De cabelos alvos e desgrenhados, carrega mais livros em sua inseparável bolsa a tiracolo do que quilos em seu corpo. Ácido de superfície e doce de coração, freqüentou e freqüenta quase diariamente as tardes e as noites da Praia de Iracema, em Fortaleza, bairro em que mora há décadas. Em tempos outros, podia ser encontrado, quase sempre, em algum ponto do curto trajeto entre a tabacaria, o bar e seu apartamento. Na tabacaria, conversas requentadas a cigarros e cafés; no bar (onde pagava a conta com desenhos em guardanapos), papos gelados a Coca-Cola; em seu apartamento,  discussões ilustradas com inúmeras obras suas (que se acumulam em pilhas ou se dependuram nas paredes). É com prazer que o (En)Cena apresenta abaixo um pouco de Alano por ele mesmo.

Mardônio Parente

Alano de Freitas por ele mesmo

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