Gestão do Turismo: destinos turísticos inteligentes e inovadores

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Diante de um mercado cada vez mais globalizado e competitivo, o turismo vem aprimorando cada vez mais, através da inovação, a oferta turística utilizando estratégias de diferenciação que sejam sustentáveis e inovadoras.

A inovação induz a um novo modelo de gestão do turismo, onde os destinos turísticos se convertam em espaços inteligentes e sustentáveis, garantindo dessa forma a satisfação dos visitantes e melhoria da qualidade de vida dos moradores locais.

Acompanhando os avanços do mercado digital, o turismo caracteriza-se por ser o segmento que rapidamente se construiu digitalmente, devido às demandas do consumidor e do mercado. Esse cenário de necessidade de informação com inteligência se aprimora a cada dia e se expande no mundo gerando novas oportunidades para o mercado turístico.

São inúmeros os aplicativos de smartphones que proporcionam informação e serviços que facilitam uma viagem em todas as suas fases, desde o planejamento do destino a ser escolhido até o retorno a sua origem. Outra mudança é a busca pela interligação dos serviços turísticos, de forma inteligente, por meio de novos modelos de negócios, com o objetivo de satisfazer e customizar a demanda dos turistas, que a cada dia ganha mais espaço e faz surgir uma nova forma de viajar.

Essa produção é um estudo exploratório com abordagem qualitativa onde foram empregados os métodos bibliográfico e documental.  Os dados bibliográficos foram obtidos por meio de periódicos científicos sobre o tema central, e os dados documentais foram extraídos de relatórios técnicos de âmbitos nacional e internacional disponíveis na internet.

DESTINOS TURÍSTICOS INTELIGENTES E INOVADORES

O conceito de Destinos Turísticos Inteligentes e Inovadores foi discutido pela primeira vez em 2013 pela Sociedad Estatal Española dedicada a la Gestión de la Innovación y las Tecnologías Turísticas (SEGITTUR) na Espanha. Foi apresentado uma proposta de modelo de Destino Turístico Inteligente que evidencia elementos-chave para a conversão de um Destino Turístico Tradicional em Destino Turístico Inteligente.

Para o Sebrae (2018) os Destinos Turísticos Inteligentes (Smart Tourism Destination) têm sua origem das Cidades Inteligentes (Smart Cities). Porém, há algumas diferenças entre eles, relacionadas aos limites geográficos, ao público-alvo e à interação com os visitantes. As cidades levam em conta competitividade, capital humano e social, participação, mobilidade, recursos naturais, qualidade de vida.

Para que o destino turístico inteligente seja inovador e se consolide de fato, de forma a sustentar suas ações inteligentes, é preciso criar um ambiente fértil para inovação e novas oportunidades de negócios na região turística (ZYGIARI, 2013). Desta forma, é necessário que ocorra uma reorganização do modelo tradicional de gestão do turismo, direcionando para uma eficiência organizacional com enfoque em destinos inteligentes.

Segundo Muñoz e Sánchez (2013) e Sánchez (2014), essa é uma maneira de alcançar vantagens competitivas, e os benefícios do setor turístico impactarem outros setores, aumentando a renda do território. A estrutura (Figura 1) desses destinos está fundamentada em dois elementos, denominados pilares: Novas Tecnologias da Informação e Comunicação e Desenvolvimento Turístico Sustentável, que contribuem para gerar quatro benefícios, que são: inovação na região, experiência turística, competitividade do local, qualidade de vida e desenvolvimento do território turístico.

Fonte: Segittur (2018)

Esses pilares só conseguem gerar tais benefícios a partir de um modelo de gestão de turismo que contemple a participação articulada entre todos os atores da cadeia do turismo. Esses atores são formados pelo governo local, empresas, instituições de ensino e principalmente pela comunidade.  Para tanto, o Sebrae (2018) apresenta algumas iniciativas que são necessárias, são elas:

  • Participação qualificada das lideranças empresariais nas governanças do setor;
  • Ambiente de negócios favorável aos pequenos negócios de turismo;
  • Competitividade dos destinos turísticos;
  • Aproximação entre os elos da cadeia de valor, incluindo as empresas dos segmentos que não são líderes;
  • Presença dos empreendimentos turísticos no mundo digital;
  • Novos modelos de negócio;
  • Soluções tecnológicas para os pequenos negócios e para os destinos turísticos;
  • Conectividade e interatividade para ambos, pequenos negócios e destinos turísticos;
  • Oferta de experiências turísticas que encantem os viajantes;
  • Ocupação de espaços públicos; e
  • Sustentabilidade dos destinos turísticos.

Pode se dizer então que o destino turístico inteligente é um destino turístico inovador também, consolidado sobre uma infraestrutura tecnológica, que garanta o desenvolvimento sustentável do território turístico por meio de alguns componentes considerados essenciais segundo a literatura. Esses componentes podem ser observados na Figura 2.

Fonte: Neiva (2017)

Portanto é importante ressaltar, com base no estudo realizado, que um destino turístico inteligente e inovador não se caracteriza apenas pela tecnologia digital. A sustentabilidade também agrega valor aos destinos e torna os produtos e serviços mais competitivos. Proteger o meio ambiente e respeitar as especificidades locais são formas de promover um turismo mais consciente, inteligente e sustentável.

CONSIDERAÇÕES

Este estudo partiu do interesse em explorar uma temática ainda pouco explorada no meio acadêmico, e contribuir para o debate acerca e um novo modelo de gestão sustentável e inovador como foco nos destinos turísticos inteligentes. Considera-se que a gestão exerce um papel importante em vários âmbitos que se interrelacionam, como a economia local, qualidade de vida, meio ambiente, e mobilidade.

Portanto, diante disso, com base no aporte teórico realizado nesse estudo, conclui-se que a consolidação dos destinos turísticos inteligentes dependem de algumas ações, dentre elas podemos citar: as parcerias público-privadas, com a finalidade de desenvolver a infraestrutura tecnológica dos locais; valorização do capital humano e do conhecimento, que pode ser feita por meios formais, informais, presencialmente ou virtualmente; e de uma participação mais efetiva da comunidade local, gerando entendimento e aceitação desse novo conceito de turismo quem se fortalecendo no mundo.

REFERÊNCIAS

MUÑOZ, A. L. Á, SÁNCHEZ, S. G. Destino Turístico Inteligente. Harvard Deusto Business Review. España. 2013.

NEIVA, D. N. Destinos Turísticos Inteligentes: um levantamento de práticas, barreiras e possíveis ações no contexto de Brasília (DF). Monografia (bacharelado) – Universidade de Brasília, Centro de Excelência em Turismo. Brasília, 2017.

SÁNCHEZ, A. V. (2014). Investigación Científica em Turismo: La experiencia Ibérica. Revista Turismo e Desenvolvimento. Univ. de Aveiro. Aveiro, Portugal.

SEBRAE. Destinos turísticos inteligentes. Disponível em <http://www.sebrae.com.br> Acesso em 03/10/2018.

SEGITTUR  (Sociedad Estatal Española dedicada a la Gestión de la Innovación y las Tecnologías Turísticas). Turismo e Innovación. Destinos Turísticos. ¿Qué es un Destino Turístico Inteligente? Disponível em <http://www.segittur.es> Acesso em 05/10/2018.

SOUSA, T. C. G. de. SOUZA; M. J. B. de; ROSSETO, C. R.; BAIDAL, J. A. I. Análise da transformação de um destino turístico tradicional (DTT) em destino turístico inteligente (DTI) à luz do modelo da SEGITTUR (2013). CULTUR, ano 10 – nº 02 – UESC. Ilhéus, Jun/2016.

ZYGIARIS, S. (2013). Smart City Reference Model: Assisting Planners to Conceptualize the Building of Smart City Innovation Ecosystems. Journal of the Knowledge Economy, 4(2), 217–231.

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Estudo aponta importância do bem-estar mental nas viagens pós-pandemia

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Pesquisa da Collinson traz dados exclusivos do Brasil e mostra quais propostas de bem-estar mental serão essenciais para ajudar os passageiros a voltarem a voar

Nova pesquisa revela que os passageiros tendem a considerar o bem-estar mental tão importante quanto o físico em um cenário de viagens pós-pandemia. O estudo “Jornada de Retorno” foi realizado pela Collinson, especialista global em fidelização de clientes e experiências dos viajantes, e traz dados inéditos de dois levantamentos feitos pela empresa em 13 países, incluindo um recorte dedicado ao Brasil.

A conscientização da sociedade e a importância da saúde mental aumentaram drasticamente nos últimos anos, e não é diferente quando se trata de viagens. No âmbito global, a pesquisa mostra que, a partir de agora, 73% dos passageiros vão priorizar mais seu bem-estar mental quando viajarem do que antes da Covid-19. No Brasil, esse percentual chegou a 90%.

O estudo demonstrou que os entrevistados do Brasil foram os mais preocupados com a saúde, os tornando mais propensos do que os dos outros países a pagar por serviços adicionais para melhorar seu bem-estar no aeroporto – quase metade (44%) disseram que pagariam por espaço extra para as pernas no avião, enquanto 41% pagariam por embarque prioritário. Os serviços pelos quais os brasileiros teriam mais probabilidade de pagar, em função da Covid-19, seriam os testes no embarque e desembarque no aeroporto. Quarenta e sete por cento relataram que pagariam pelo teste no desembarque, enquanto 53% disseram que o fariam no embarque. Mais pessoas no Brasil pagariam por testes no aeroporto do que em qualquer outro país, indicando uma demanda reprimida por viagens internacionais dos consumidores brasileiros.

Fonte: encurtador.com.br/kmwDL

Para Henrique Donnabella, Diretor Geral da Collinson Brasil, os dados demonstram que os brasileiros foram os mais preocupados em ter os protocolos de saúde e distanciamento social corretos antes de se sentirem confortáveis em viajar novamente. “Esses percentuais, provavelmente, decorrem de dois importantes fatores que estão diretamente relacionados a pandemia: 1) o medo da contaminação, tendo em vista que o Brasil foi severamente impactado pelo Covid 2) o medo da não aceitação, tendo em vista que o brasileiro está sofrendo restrições importantes para entrada em outros países. Os resultados mostram o que os passageiros procuram para ter confiança neste momento, além de fornecer uma visão dos problemas que já enfrentavam em suas viagens, antes da pandemia. Ambos os conjuntos de descobertas são necessários para se obter o panorama mais completo para ajudar o setor a se recuperar”, enfatiza.

Embora já houvesse uma preocupação entre os viajantes sobre o impacto que as viagens estavam tendo sobre seu bem-estar físico, 81% disseram que a pandemia aumentou essas preocupações. Apesar de haver uma demanda reprimida por viagens em todo o mundo, mais de dois terços (67%) dos viajantes globais acham que as viagens pós-pandemia serão mais estressantes no clima atual. Quando questionados sobre o que as empresas do setor de viagens poderiam fazer para ajudar nessa situação, 42% dos passageiros disseram que valorizam propostas que demonstrem consideração por sua saúde mental em suas viagens. Metade também afirmou desejar a mesma consideração por sua saúde física.

“A importância da saúde mental ao viajar talvez seja surpreendente, mas também é uma informação bem-vinda sobre o que os viajantes procuram conforme a recuperação do setor continua a ganhar terreno com novos testes e programas de vacinação”, explica David Evans, CEO da Collinson. “Esta é uma maneira de o setor de viagens olhar para sua oferta aos consumidores, permitindo que as empresas entendam o que os consumidores desejam e onde o setor precisa agir para reconstruir a confiança do viajante.”

Fonte: encurtador.com.br/eBGNT

Medidas a serem consideradas

A pesquisa também mostra que 88% dos passageiros em todo o mundo afirmaram que medidas visíveis de saúde e higiene no aeroporto são importantes para que se sintam seguros ao viajar em meio à pandemia, como álcool em gel para as mãos em todo o aeroporto (63%) e a exigência do uso de máscara (66%). Essas iniciativas são mais importantes para os viajantes brasileiros do que para os de qualquer outro país, representando 95% do total. O Brasil também liderou o percentual do levantamento em relação aos que mais tinham probabilidade de querer garantias ligadas a medidas de distanciamento social, totalizando 95%.

Quando questionadas sobre por que poderiam hesitar em viajar devido à Covid-19, o principal motivo alegado foi o temor de precisar ficar em quarentena na chegada ou no retorno (51%). O desejo de evitar longos períodos de quarentena provavelmente é um dos motivos pelos quais os passageiros consideram a realização de um teste na chegada um ingrediente importante para sua experiência de viagem (83%). Mas, curiosamente, quase o mesmo número de pessoas (82%) disse que o teste antes da partida também era importante, o que indica que o teste de Covid-19 já deixou de ser apenas um pré-requisito governamental para viajar para certos destinos e passou a ser um elemento desejado pelas pessoas, a fim de lhes dar a confiança necessária para voltar a voar.

Em última análise, os passageiros procuram uma experiência tranquila e sem estresse, com medidas de distanciamento social em vigor desde o check-in até a chegada, juntamente com uma jornada rápida e eficiente. Nesse sentido, mais de um terço (36%) afirmou estar disposto a pagar pelo fast track (não pegar fila no raio X), enquanto 38% pagariam mais por um assento livre ao seu lado no avião e 30% pagariam mais por espaço extra para as pernas.

Enquanto 87% das pessoas disseram que o distanciamento social era importante para elas ao se deslocar pelo aeroporto, a mesma proporção (87%) disse especificamente que deseja acesso a espaços socialmente mais tranquilos onde possam “desestressar” e “relaxar longe das multidões”. Na verdade, em alguns países, incluindo Reino Unido, EUA, Rússia e Austrália, mais pessoas disseram que queriam ter acesso a um lugar para relaxar do que ter um lugar para se distanciar. No entanto, a associação entre estresse e viagens não está, de modo algum, ligada exclusivamente à pandemia. Antes mesmo da COVID-19, quase metade (43%) dos viajantes relatou sentir estresse em pelo menos um momento durante a viagem, e um número semelhante (45%) admitiu telefonar ao trabalho no dia seguinte alegando doença para se recuperar de uma viagem.

Fonte: encurtador.com.br/rFQX7

Sobre a pesquisa

A pesquisa da Collinson foi realizada com 18,5 mil pessoas em 2019 e 12,6 mil em 2020. A primeira rodada buscou obter percepções sobre as atitudes dos viajantes de lazer e negócios em relação às viagens e a segunda teve o objetivo de atualizar esse levantamento à luz da pandemia. A empresa trabalha com parceiros de todo o ecossistema de viagens, incluindo companhias aéreas, aeroportos e grupos hoteleiros, bem como empresas com programas de fidelidade e cartões de crédito premium que oferecem benefícios de viagens.

Para a Collinson, é mais importante do que nunca que todas as partes do ecossistema se unam para ajudar a restaurar a confiança nas viagens. Todas as empresas que fazem parte da jornada de viagens e dependem do setor devem se unir para resolver alguns desafios críticos e criar uma experiência de viagem cada vez mais disruptiva.

“Está bem claro que o setor de viagens foi devastado pela pandemia, afetando desde o comércio e o crescimento econômico até centenas de milhares de empregos no setor em todo o mundo. Embora haja alguns sinais positivos para a recuperação do setor de viagens, a única maneira de torná-la um sucesso é compreender as necessidades e os temores existentes dos viajantes e como eles foram agravados pela pandemia”, continua David Evans. “É muito importante que o setor de viagens se recupere e é ainda mais importante que ele seja capaz de fazê-lo de forma colaborativa e bem-informada”.

“A pesquisa mostra que acalmar as preocupações das pessoas em relação ao seu bem-estar mental pode ser a chave para reconstruir a confiança do viajante. Embora, é claro, as preocupações com a saúde física estejam maiores durante este período, o mesmo ocorre com o impacto das viagens sobre a saúde mental – e é preciso responder a ambos. Trabalhando juntos nas questões salientadas neste estudo, todos aqueles que têm interesses no ramo de viagens podem ajudar a fazer mudanças agora para garantir que o setor volte a prosperar no futuro”, finaliza Evans.

Fonte: encurtador.com.br/pBH47

Sobre os dados

Em 2019, foram coletados dados de um total de 18,5 mil viajantes, sendo 17 mil deles a lazer e 9 mil a negócios (alguns entrevistados responderam em ambas as perspectivas). A pesquisa foi realizada na Austrália, Brasil, China, Índia, Japão, Rússia, Reino da Arábia Saudita, Coreia do Sul, Singapura, Emirados Árabes Unidos, Reino Unido e EUA. Em média, os viajantes a lazer faziam 2,24 viagens por ano e os viajantes a negócio, 2,34.

Os dados de 2020 foram coletados de um total de 12.607 viajantes, sendo 11.159 viajantes a lazer e 7.904 a negócio. A pesquisa foi realizada na Austrália, Brasil, China, Hong Kong, Índia, Japão, Rússia, Reino da Arábia Saudita, Coreia do Sul, Singapura, Emirados Árabes Unidos, Reino Unido e EUA.

Sobre a Collinson

A Collinson é líder global em fornecer experiências para viajantes, incluindo acesso a salas VIP de aeroportos, assistência médica e de segurança e serviços médicos em viagens. As iniciativas da Collinson neste setor incluem a gestão do maior programa de experiências e salas VIP de aeroportos do mundo, o Priority Pass, bem como soluções de seguro de viagem, assistência de identidade, atrasos de voos, saúde internacional e gestão de riscos de viagens.

A Collinson conta com mais de 2.000 funcionários atuando a partir de 20 localidades globalmente, todos trabalhando para oferecer uma ampla variedade de experiências de viagem que garantem a segurança, o bem-estar e o conforto de 55 milhões de viajantes de negócios e lazer ao redor do mundo. Sua unidade de negócios de assistência médica e de segurança em viagens tem mais de 55 anos de experiência no fornecimento de assistência médica e atendimento de emergência internacional, incluindo o manejo de pandemias como ebola, zika e coronavírus. Só no ano passado, a Collinson respondeu a mais de 95.000 chamadas de emergência, administrou mais de 40.000 casos médicos e conduziu mais de 3.000 evacuações aeromédicas nos 170 países que atende. Entre os principais clientes do Brasil, estão: Latam Airlines, Azul e Accor Hotels.

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Imersão ao máximo: Cultura Xerente

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Dr. Rogério deu uma volta por todo o espaço da aldeia e contando um pouco de como foi fazer sua pesquisa em torno daquela comunidade.

Aos onze dias do mês de maio, em um sábado, os acadêmicos de Psicologia do Centro Universitário Luterano de Palmas, das turmas de Estágio Básico 1 realizaram uma visita a Aldeia da etnia Xerente, com a supervisão das professoras Ana Letícia Covre, Muriel Rodrigues e o Dr. Rogério Marquezan. Tendo o objetivo de: conhecer uma nova cultura, seus costumes e fazer com que os alunos ‘’saiam de dentro da caixa’’ e assim experimentassem uma vivência única e inesquecível.

Ao chegarmos fomos recebidos pelo cacique que salientou que gosta muito de receber pessoas na comunidade pois ocorre uma troca de conhecimentos, o que na minha cabeça fez total diferença, pois para eles um simples lanche ofertado significa muita coisa, que vai muito além do que apenas comer e infelizmente nós não damos esse devido valor.

As primeiras impressões que tive ao chegar na aldeia foram que apesar das limitações da individualidade tudo se é resolvido na base do diálogo, quando chegamos os moradores estavam quase começando uma reunião para debater um tema que estava causando certa crise nos demais.

Fonte: Acervo Pessoal

O método utilizado durante a visita foi a típica aula dialogada, o que estamos habituados a assistir; durante a aula Dr. Rogério deu uma volta por todo o espaço da aldeia e contando um pouco de como foi fazer sua pesquisa em torno daquela comunidade.

Fomos recebidos pela professora Maria Helena, uma historiadora formada pela UFG que possui livros e artigos publicados. Ela cantou para todos ali presentes e expressou que estava muito feliz em receber alunos que se interessavam em conhecer a cultura daquela comunidade.

Após a cantoria Maria Helena e sua filha tiveram o prazer de nos pintar e nos inserir em suas ‘’famílias’’, elas eram Kubasi e Kuzê logo após o Dr nos levou para conhecer o riacho e alguns alunos tiveram o prazer de se refrescar na água e brincar junto com as crianças.

Fonte: Acervo Pessoal

Por vir de um município que matem contato direto com as comunidades tracionais eu já sabia como era toda a organização de moradia e um pouco de como eles resolvem seus ‘’problemas’’, então cheguei com a visão da aldeia bem desconstruída.

A experiência com certeza mexeu muito comigo pois notei que apesar de ter interesse o diálogo e a nossa inserção nas comunidades tradicionais é pouco e isso me despertou interesse em trabalhar nessa área, posso dizer com todas as palavras que me tornei uma pessoa melhor após essa visita.

Fonte: Acervo Pessoal
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Uma história de opostos em Green Book

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Concorre com 5 indicações ao OSCAR:

Melhor Filme, Melhor Ator (com Viggo Mortensen), Melhor Ator Coadjuvante (Mahershala Ali), Melhor Roteiro Original e Melhor Montagem.

Don Shirley (interpretado por Mahershala Ali) é um pianista negro brilhante que deseja fazer uma tour no sul dos Estados Unidos, uma região marcada pelo atraso, pelo preconceito e pela violência racialPara acompanhá-lo durante esses dois meses de shows ele resolve ir a procura de um motorista/assistente. 

Tony Vallelonga (vivido por Viggo Mortensen) – também conhecido como Tony Lip – é um malandro de origem italiana que trabalha na noite em Nova Iorque. A boate onde atuava, chamada Copacabana, precisa ser fechada e Tony se vê sem trabalho durante alguns poucos meses.

Responsável pelo sustento da família, Tony, que era casado com Dolores e tinha dois filhos pequenos, começa a procurar emprego para subsistir durante os meses em que a boate estava fechada.

Fonte: https://goo.gl/opdKij

O início da viagem

Um belo dia, Tony recebe um telefonema de um conhecido anunciando que um médico estava a procura de um motorista. Sem saber bem o que lhe espera, Tony vai para a entrevista. Chegando ao lugar, sente-se perdido porque o endereço lhe leva a um teatro. 

Quando conhece Don Shirley, na entrevista, Tony se surpreende ao saber que o tal doutor é na verdade um doutor na arte do piano. E é negro. Uma questão especialmente delicada para Tony que, apesar de negar, era preconceituoso assim como uma grande parcela da sociedade em que estava inserido. 

Muito conceituado entre o público, Shirley costumava ser chamado de doutor como sinal de admiração. Depois de algumas discordâncias, Tony, que desejava ser apenas motorista e não assistente pessoal, acha melhor não trabalhar com Shirley, especialmente tendo em conta a remuneração proposta. 

No dia a seguir, recebe um telefonema inesperado do famoso pianista, que desejava pedir a autorização de Dolores, mulher de Tony, para contratá-lo, cumprindo as exigências que o marido dela havia feito. O acordo é fechado e os dois embarcam rumo aos shows no Sul do país.

Vale lembrar que o contexto norte-americano, na realidade dos anos sessenta, que é a época em que o filme se passa, havia extremo preconceito racial no país. Ao longo do percurso vemos alguns casos explícitos de segregação. Durante uma das apresentações, por exemplo, o pianista é impedido de usar o banheiro do espaço, destinado apenas para brancos. Em outra ocasião Shirley é proibido de jantar no mesmo restaurante em que seu público estava. Ao longo da turnê, o músico também não pode se hospedar em uma série de hotéis reservados só para brancos. 

Tony aos poucos vai criando afeto pelo peculiar pianista e se irrita com as regras antiquadas e racistas da região. Os dois vão gradativamente criando um laço de afeto e crescendo pessoalmente com a experiência de lidarem um com outro, com personalidades tão distintas.   

Personagens principais

Tony Vallelonga (Viggo Mortensen) 

Fonte: https://goo.gl/2KKCFb

De origem italiana, Tony Vallelonga, também conhecido como Lip, é casado com Dolores e tem dois filhos. Ele trabalha como uma espécie de segurança numa boate em Nova Iorque e se vê em apuros financeiros quando o clube noturno decide fechar as portas por dois meses.

Durante esse período, o valentão precisa encontrar um trabalho provisório para pagar as contas da casa e acaba sendo contratado por Don Shirley para atuar como motorista.

Ao longo do seu percurso pelo sul dos Estados Unidos ele passa a sentir na pele o racismo vivenciado pelo pianista afro-descendente. A viagem serve de alerta para ele, que era um cidadão americano branco comum, nascido e criado no Bronx, que não tinha que lidar com qualquer dificuldade devido a cor da sua pele.

Don Shirley (Mahershala Ali)

Fonte: https://goo.gl/LdHsTj

Extremamente solitário, o pianista, que é um virtuoso, não tem amigos e nem família. Ele menciona rapidamente um irmão, com quem não tem contato há muito tempo. Em uma conversa com Tony também deixa escapar que já havia sido casado, mas que o casamento foi por água abaixo devido aos compromissos da carreira. 

Correto e honesto, Tony muitas vezes se irrita com algumas atitudes do motorista, que tem uma noção de certo/errado mais fluida.

Rude, muitas vezes antipático e arrogante, Shirley vai se deixando cativar por Tony e os dois vão criando com o tempo uma convivência harmoniosa que se transforma numa amizade plena. 

Don representa os negros norte-americanos que sofriam uma série de limitações e humilhações cotidianas devido única e exclusivamente a cor da pele. 

Dolores (Linda Cardellini)

Fonte: https://goo.gl/fjyU7a

A mulher de Tony é compreensiva com o marido, embora seja extremamente preocupada com o destino da família. Responsável, ela é dona de casa, cuida do lar, dos filhos e da gestão do orçamento doméstico. Quando a boate Copacabana fecha as portas provisoriamente, Dolores se desespera sem saber como fará para pagar as contas.

Doce, amorosa e gentil, a personagem interpretada por Linda Cardellini é uma típica mulher norte-americana dos anos sessenta: voltada para a família, responsável pela criação dos filhos e pela manutenção da rotina do lar. 

Análise do filme Green Book

Baseado em fatos reais

No ano de 1962, o famoso pianista negro Don Shirley resolveu fazer uma turnê pelo sul dos Estados Unidos.

A viagem aconteceu gerenciada pela Columbia Artists, empresa que administrava a carreira do artista, e durou cerca de um ano e meio (o filme na verdade condensa a história, como se a turnê tivesse durado dois meses). Durante o trajeto, o pianista tocou apenas para um público composto por brancos.

Para acompanhá-lo nesse ambiente sulista não muito hospitaleiro, Shirley sentiu que precisava de um motorista, mas também um assistente pessoal e uma espécie de guarda-costas.

Vale lembrar que a preocupação com a segurança não era desmedida, apenas alguns anos antes (em 12 de abril de 1956), o também músico negro Nat King Cole foi atacado no palco enquanto se apresentava para uma audiência branca no Alabama.

O verdadeiro pianista Don Shirley

O Don Shirley da vida real nasceu na Flórida, no dia 29 de janeiro de 1927, filho de pais imigrantes jamaicanos. O pai do pianista era um pastor e a mãe era professora. Shirley ficou órfão de mãe quando tinha apenas nove anos de idade.

Profundamente ligado à música, o menino começou a tocar quando tinha apenas dois anos e se apresentou profissionalmente aos dezoito.

Como o filme menciona rapidamente, Shirley gostaria de ter seguido a carreira de pianista clássico, mas acabou por enveredar no jazz porque ouviu conselhos de produtores que afirmaram que o público norte-americano não aceitaria um negro tocando canções clássicas.

Alguns hábitos e a residência do pianista, que aparece no longa, também são compatíveis com a realidade. Don Shirley viveu num suntuoso apartamento no Carnegie Hall durante cerca de cinquenta anos.

Verdadeiro pianista Don Shirley e Mahershala Ali, que interpreta seu papel no longa metragem. Fonte: HistoryvsHollywood.com, CTF Media

A procura do pianista por essa pessoa que o acompanhasse resultou na descoberta do segurança de boate Tony Vallelonga, que trabalhava em um clube noturno chamado Copacabana. 

Com o fechamento provisório do espaço, Tony, então sem emprego e com obrigação de sustentar a família, foi a procura de trabalhos esporádicos.

O encontro com Tony

Criado no Bronx, no seio de uma família ítalo-americana, Tony era o provedor de um lar composto pela mulher e por dois filhos.

Embora no filme o personagem não se assuma declaradamente como preconceituoso, a mulher, Dolores, deixa transparecer esse defeito do marido, que é compatível com a história real.

Apenas em uma breve cena vemos um pouco do preconceito anterior de Tony. Quando dois negros estavam na sua casa, ao retirar a louça da mesa, Tony, ao chegar na cozinha, joga no lixo os dois copos que os negros usaram. Outra ocasião em que o preconceito aparece surge quando Tony rotula o pianista, usando uma série de estereótipos para caracterizar os negros.

Tony Vallelonga da vida real e o ator Viggo Mortensen, que interpreta seu papel no filme.
Fonte: HistoryvsHollywood.com, CTF Media

A história contada pelo filho de Tony

Green Book tem como um dos roteiristas o filho de Tony, que incluiu uma série de dados reais no longa. As cartas de amor direcionada à Dolores foram efetivamente escritas pelo pai de Nick com a ajuda do pianista.

A história bebeu muito do real porque o filho, desde os anos 1980, estava interessado em fazer um filme sobre a amizade improvável do pai com Don Shirley. Ele havia gravado uma série de entrevistas detalhadas sobre o que os dois viveram na turnê. 

Nick Vallelonga ajudou a contar, em Green Book, a história do pai, Tony.
Fonte: HistoryvsHollywood.com, CTF Media

O destino de Tony e Don Shirley

Quando a viagem acaba e os dois regressam para casa, segundo o filme Tony volta à trabalhar no Copacabana, mas ele e o pianista seguem sendo grandes amigos até o final da vida. Os dois curiosamente falecem em datas muito próximas: Tony morre em 4 de janeiro de 2013 e Don em 6 de abril de 2013.

Na vida real, no entanto, parte da família do pianista – que aliás se opôs à criação do filme Green Book – garantiu em uma série de entrevistas que Don Shirley e o pianista não ficaram amigos até à morte.

Fonte: https://goo.gl/d1NBGk

Duas versões pairam sobre a lenda da amizade de Tony e Don Shirley: o longa metragem garante que os dois ficaram grandes amigos até o final da vida, já a família do pianista afirma que essa versão é falsa.

Uma história de opostos

Habitualmente a sociedade estava acostumada a assistir um negro trabalhando para um branco, poucas vezes o statuo quo se alterou e viu-se um branco trabalhando para um negro.

Essa estranheza social compareceu muitas vezes no filme, quando, por exemplo, no Sul, os policiais pararam a viatura onde Tony e Shirley se encontravam para pedir esclarecimentos.

Pondo provisoriamente a parte as questões sociais, em termos de personalidade Don e Tony parecem opostos: o primeiro muito preocupado com a questão social (com a imagem, com a conduta) e o segundo desbocado e irreverente. A lógica dos opostos comparece se pensarmos no nível de refinamento e cultura de ambos os personagens.

Assim como na vida real, Don carrega muito mais a noção de requinte, de conhecimento e de estudo do que Tony, que possui pele branca.

Se historicamente os negros tiveram pouco acesso à informação e à formação, na história do pianista a lógica se inverte e vemos um sujeito cultíssimo de pele negra e um, de certa forma, ignorante, de pele branca. 

Don viveu imerso em um ambiente de alta cultura e frequentou os grandes salões enquanto Tony nunca saiu do seu bairro de imigrantes de classe baixa, convivendo sempre com um universo muito semelhante de indivíduos.

Outra distinção de comportamento se dá se pensarmos na conduta social dos dois amigos. Shirley demonstra ser consciente do racismo e da luta de classes, Tony, por sua vez, parece alheio à essas questões e deseja resolver os casos pontuais em que é confrontado através da força bruta.

Extremamente racional, o pianista pensa em cada movimento e em suas consequências, profundamente impulsivo, Tony vive à flor da pele e é movido pelos seus sentimentos.

A amizade de Tony e Don se contrói através da diferença.
Fonte: https://goo.gl/vV9AqQ

Por que o filme se chama The Green Book?

The Negro Motorist Green Book, editado por Victor Hugo Greenera uma espécie de guia de viagem para negros que quisessem viajar sem se preocuparem com a segurança.

A ideia era assegurar uma lista de restaurantes, hotéis e lugares turísticos que garantissem que eles seriam tratados com igualdade com os brancos, sem qualquer tipo de preconceito.

O livro foi publicado pela primeira vez no ano de 1936 e continuou a ser vendido até 1966. Habitualmente distribuído nos postos de gasolina, o guia vendia cerca de 15.000 cópias por ano.

*Texto originalmente publicado em Cultura Genial (https://www.culturagenial.com/filme-green-book/)

O verdadeiro The Negro Motorist Green Book foi efetivamente usado na viagem de Tony com o pianista.

FICHA TÉCNICA:

GREEN BOOK- O GUIA

Título original: Green Book
Direção: Peter Farrelly 
Elenco: Viggo Mortensen, Mahershala Ali, Linda Cardellini; 
Ano: 2019
País: EUA
Gênero: Comédia Dramática, Biografia 

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Wild – Livre: uma jornada de autoconhecimento

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Com duas indicações ao OSCAR:

Melhor Atriz (Reese Witherspoon), Melhor Atriz Coadjuvante (Laura Dern)

A Dor – tem um Elemento de Vazio –
Não se consegue lembrar
De quando começou – ou se houve
Um tempo em que não existiu –

(Emily Dickinson in “Poemas e Cartas”)

“Wild” (Livre) é baseado no best-seller autobiográfico de Cheryl Strayed, publicado em 2012, dezessete anos depois que a autora vivenciou os eventos narrados no livro. Em 1995, Strayed iniciou uma caminhada solitária pela Costa do Pacífico nos EUA, percorrendo um total de 1,8 mil quilômetros (a pé). O filme estrelado por Reese Witherspoon e dirigido por Jean-Marc Vallée (deClube de Compras Dallas) apresenta de forma não linear os acontecimentos que culminaram nessa jornada e especialmente a viagem solitária e árida de uma mulher fragmentada demais para suportar a vida em um ambiente doméstico.

Há vários precipícios na Costa do Pacífico, mas talvez o que fica mais evidente desde o início é o precipício psicológico vivenciado por Strayed. Um abismo se formou de maneira abrupta em torno de sua aparente sanidade após a morte de sua mãe, a pessoa mais importante da sua vida. E para suportar a vida sem ela, Cheryl descontruiu a pessoa que ela tinha sido até então e iniciou uma queda vertiginosa em um precipício de relações fugazes e drogas, que resultou, inclusive, no fim do seu casamento.

 

“Se sua coragem negar-lhe, vá além de sua coragem.” (Emily Dickinson)

A difícil vivência do luto é um dos pontos evidenciados no filme. Alguns pesquisadores têm tentado definir as diversas fases do luto relatando sobre um período inicial de dormência que pode levar à depressão e, depois, a uma fase de reorganização e recuperação. No entanto, segundo Zisook e Shear (2009) em pesquisas recentes sobre o luto tem-se evidenciado o quão variáveis e fluídas podem ser essas experiências, pois elas podem diferir consideravelmente na intensidade e abrangência a partir de grupos culturais ou, mesmo, de pessoa para pessoa. Acrescentam ainda que até agora nenhuma teoria sobre as fases do luto tem sido capaz de explicar como as pessoas lidam com a dor da perda, por que elas experimentam diferentes graus e tipos de angústias em momentos diferentes, e como ou quando elas ajustam suas vidas sem seu ente querido. Mas, talvez, a resposta para isso esteja no sentido que cada indivíduo dá ao seu luto, assim, por mais universais que sejam alguns sofrimentos e algumas dores, há sempre particularidades que merecem ser observadas.

 

“Depois que me perdi na selvageria do meu luto, encontrei o caminho para fora da floresta”. (Strayed)

 

A decisão de parar, de tentar equilibrar-se novamente mesmo diante do peso da ausência (e as cenas das tentativas de suportar o peso da mochila gigante em suas costas são uma metáfora disso), foi criando forma e se solidificando através da lembrança da filha que ela um dia havia sido. Nessa decisão, as palavras calculadas e vazias do psicólogo que a atendeu não surtiram efeito.

Em seu manual do luto, o psicólogo resumiu em linhas gerais a dor vivida pela paciente, mostrando-lhe a fragilidade do seu estado a partir das suas atitudes. Mas, às vezes, palavras são apenas um amontoado de letras suspensas em um universo sem significado. Nesses momentos, o silêncio pesa, mas acalma. O silêncio, para ela, foi o elemento necessário para manter seus pés em movimento sobre o chão. Foi em busca do silêncio, de manter-se viva (e não simplesmente leve), que ela iniciou a jornada.

“Levei anos para ser a mulher que a minha mãe criou.”(Strayed)

Strayed tinha se transformado em um caos emocional, mas não estava indiferente, nem apática. E, de certa forma, foi isso que tornou possível uma reação. O filme poderia cair muito facilmente em uma mera e vazia encenação de alguma história de superação apresentada em um livro de autoajuda, mas salva-se graças aos recursos de feedback que ajudam a mostrar a natureza fragmentada da personagem em sua busca por reconstruir uma história na qual pudesse viver. Ela não é uma pecadora que se redime de seus pecados ao final, nem um herói solitário que sabe exatamente aonde quer chegar. Sua vida é um amontoado de acontecimentos, muitas vezes confusos e aleatórios. O final de sua caminhada é renovador porque, no silêncio e na solidão, ela conseguiu, finalmente, reconstruir a pessoa que foi, ou a pessoa que na lembrança que ela inventou ela deveria ser.


FICHA TÉCNICA DO FILME

LIVRE

Título Original: Wild
Direção: Jean-Marc Vallée
Roteiro: Nick Hornby, Cheryl Strayed (memoir “Wild: From Lost to Found on the Pacific Crest Trail”)
Elenco Principal: Reese Witherspoon, Laura Dern, Thomas Sadoski
Ano: 2014
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Amor e entrelaçamento quântico no filme “Interestelar”

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Com 5 indicações ao Oscar 2015:

Melhor design de produção; Melhores efeitos visuais; Melhor trilha sonora; Melhor edição de som; e Melhor mixagem de som.

Depois de desafiar os espectadores com desconstruções narrativas como “Amnésia” e articular sucessivas camadas de mundos oníricos em “A Origem”, agora Christopher Nolan em “Interestelar” (Interstellar, 2014) nos desafia com os paradoxos da mecânica quântica e relatividade.  Aqui não há mais heróis tentando salvar a Terra, mas pessoas que se sacrificam na procura de um caminho para a humanidade abandonar um planeta agonizante. E a única saída será através de buracos negros e “buracos de minhoca” cósmicos. Porém, as equações falham em tentar conciliar a dimensão quântica e a relatividade. Qual a solução proposta por Nolan? Amor e Comunicação, os únicos elementos que atravessam os diferentes espaços-tempos e que resolveriam o enigma do chamado “entrelaçamento quântico”. Tudo com muitas alusões gnósticas e religiosas, criando uma poderosa atmosfera mística.

John Smith trabalha como projetista em um cinema nos EUA. John fez um curioso relato no início desse mês: ao receber a cópia do filme Interestelar percebeu que ela veio embrulhada e rotulada como “Flora’s Letter” – The Hollywood Reporter, 22/10/2014.

Já é bem conhecida essa estratégia onde os filmes são distribuídos ou mesmo produzidos com títulos falsos a fim de dificultar a pirataria ou roubo.

Mas também é conhecido que muitos produtores não resistem à tentação de deixar nesses falsos rótulos pistas inteligentes e sugestões. É o exemplo de filmes anteriores de Nolan que foram distribuídos dessa maneira, com intrigantes pistas: “Backbreaker” para o filme Batman – O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008) e “Be Kind, Rewind” para Amnésia (Memento, 2000).

Ora, Flora’s Letter oficialmente seria uma alusão a uma das quatro filhas de Nolan, Flora. Mas também poderia ser uma sincrônica referencia a “Carta para Flora” ou “Epístola para Flora”, texto gnóstico atribuído a Ptolomeu, discípulo do professor gnóstico Valentino no cristianismo primitivo, onde assume que Jesus fora enviado não para destruir a Lei Mosaica (materializada nos Dez Mandamentos), mas para completa-la. Por ser obra não de Deus mas de um Demiurgo, a Lei era imperfeita e necessitava ser completada.

 

Simbolismos religiosos

Coincidência ou Sincronismo? O fato é que Interestelar de Nolan lida com os paradoxos das leis da Mecânica Quântica e da Teoria da Relatividade. Passamos as quase duas primeiras horas do filme acompanhando todo o esforço de um projeto que tenta salvar a raça humana da extinção baseado nas equações do Professor Brand (Michael Caine). Porém, as equações do professor falham por não encontrar a solução para aquilo que toda a Física até agora não conseguiu: achar o chamado “Campo Unificado” que conciliaria a relatividade com a dimensão quântica.

Porém, assim como no texto gnóstico Carta para Flora, um Salvador deve chegar para completar a Lei imperfeita, acrescentar o componente que falta na equação. E para Nolan, aquilo que ultrapassaria o Tempo e o Espaço, conciliando as dimensões relativísticas e quânticas, seria o Amor – Jesus?.

Assim como essa sincrônica referencia gnóstica, Interestelar possui uma série de simbolismos religiosos: os doze apóstolos (Dr. Brand teria enviado anteriormente através do buraco de minhoca cósmico “doze bravas almas” que lá estariam à espera do salvador da humanidade); lá existe uma espécie de Arca de Noé; o primeiro planeta com ondas gigantescas (dilúvio bíblico?); há um anjo caído (Dr. Mann que vira um demônio em uma espécie de Jardim do Éden invertido); todo o projeto secreto da NASA se chama “Lázaro” (referência ao personagem bíblico que ressuscitou dos mortos); a heroína salva a humanidade aos 33 anos de idade (a idade de Jesus).

Nolan parece espalhar esses simbolismos na narrativa para fazer a delícia dos críticos de cinema. Porém, o filme vai mais além do que essa lista de simbolismos mais evidentes: Interestelar lida com o tema do amor de uma forma bem peculiar – como o elemento mais importante da equação, capaz de atravessar o contínuo tempo/espaço, ir além da atração gravitacional. Para tanto, veremos como Nolan introduz o conceito de entrelaçamento quântico, conceito que curiosamente Jim Jarmusch também introduz no seu último filme Amantes Eternos.

 

O Filme

A maioria dos filmes de Hollywood baseia-se em narrativas sobre o amor romântico ou sexo. Mas Interestelar quase não tem casais para se obter o tradicional par romântico que salvará o mundo. Ao invés disso, vemos diferente formas de amor, de geração em geração, ao longo do tempo e espaço.

O filme começa em uma fazenda onde vemos o amor do avô Donald (John Lithgow) pelo seus netos e o amor dos filhos pelo pai viúvo e astronauta aposentado da NASA Cooper (Matthew McConaughey). Eles estão metidos em uma crise ambiental global onde os alimentos desaparecem e tempestades de areia arrasam com plantações.

Por meio de uma estranha anomalia gravitacional que a filha Murph (Jessica Chastain) descobre em um cômodo da casa (ela pensa que há algum fantasma derrubando livros da estante) , eles descobrem coordenadas que levam a um laboratório subterrâneo e secreto onde a NASA planeja uma forma de salvar não o planeta, mas a humanidade: Dr. Brand desenvolve equações para solucionar problemas relativísticos e quânticos para levar a humanidade para um novo planeta do outro lado do Universo por meio de um “buraco de minhoca” (wormhole) encontrado nas cercanias de Saturno. E tudo leva a crer que esse buraco cósmico foi uma criação artificial de alguma outra civilização disposta a nos ajudar.

Cooper é convocado para o Projeto Lazaro para ser o piloto de uma espaçonave que atravessará o “buraco de minhoca” em busca de uma nova Terra. Com isso, a narrativa passa a ser movida pelo amor mesclado com raiva da filha Murph, ressentida pelo pai abandonar a família por décadas. Para ela, o pai abandonou a família em um planeta à beira da extinção.

Há ainda outra forma de amor: doze “apóstolos” ou astronautas saíram sozinhos na vanguarda do Projeto Lázaro, sacrificando suas vidas para serem congelados e renascerem em algum lugar do outro lado do Universo.

Parece que o tempo inteiro Nolan quer nos mostrar a força magnética que liga pessoas que estão distantes; como pessoas separadas por longas distâncias no Universo podem ainda exercer uma força gravitacional. Todos no filme anseiam por reencontros, assim como no outro filme do diretor, A Origem (Inception, 2010), o protagonista Cobb tentava retornar para casa.

E assim como em A Origem, Nolan lida com camadas de realidades no tempo e espaço que funcionam em diferentes cronologias. Quando o protagonista Cooper vai para o espaço deixa para trás os paradigmas da vida terrena para entrar nos paradoxos da mecânica quântica e relatividade: a gravidade torna-se variável em diferentes planetas, o espaço dobra sobre si mesmo, astronautas voam por buracos de minhocas que conectam um ponto a outro distante no Universo e naves ganham impulsos gravitacionais em horizontes de eventos de um buraco negro.

 

O entrelaçamento quântico

 

Com isso, Nolan introduz o conceito de entrelaçamento quântico: como duas partículas que se interagem, ao serem separadas continuam a ter estranhos padrões como se ainda estivessem conectados a distâncias imensas. Interestelar mostra como pessoas que se amam adquirem alguns desses mesmos recursos e reagem da mesma forma, ao mesmo tempo para as mesmas coisas.

Baseado nas ideias do físico Kip Thorne, Insterestelar mostra como Ciência e emoção podem se misturar criando uma poderosa atmosfera mística. De início, Nolan opta por um pressuposto narrativo gnóstico: a ideia de uma Terra seca e devastada da qual o homem deve fugir, assim como Dorothy no filme clássico O Mágico De Oz, é a metáfora da condição humana no Gnosticismo – prisioneiro em um cosmos imperfeito e decadente do qual somente poderá escapar por meio da gnose, a busca da iluminação interior – sobre esse tema em O Mágico de Oz clique aqui.

E no filme essa gnose é a descoberta de que vivemos em um Universo onde o entrelaçamento quântico faz tudo parecer emergente e interligado. A vida parece menos como uma máquina e mais com padrões infinitamente complexos de ondas e partículas.

Em Interestelar, os personagens estão frequentemente experimentando transversais e conexões místicas que transcendem o tempo e o espaço. Parece que tanto Nolan como Jarmusch em Amantes Eternos parecem ter se inspirado na obra-prima My Bright Abyss do poeta norte-americano Christian Wiman:

“Se o entrelaçamento quântico for verdade, se as partículas relacionadas reagem de maneiras semelhantes ou opostas, mesmo separadas por distâncias enormes, então é óbvio que o mundo inteiro está vivo e se comunica por diversas maneiras que não compreendemos totalmente. E nós somos parte dessa vida, dessa comunicação” WIMAN, Christian. My Bright Abyss – Meditation of a Modern Believer).

 

A solução do entrelaçamento quântico: amor e comunicação (spoilers à frente)

Levamos quase duas horas do filme para compreendermos qual o elemento que falta para a equação do professor Brand unificar relatividade e mecânica quântica, o que possibilitaria trazer Cooper de volta para casa dobrando o tempo-espaço no sentido inverso: amor e comunicação, aquilo que resolveria o enigma do entrelaçamento quântico.

Numa alusão ao filme 2001 de Kubrick, ao entrar no buraco negro Cooper descobre que seres da quinta dimensão prepararam para ele um espaço tridimensional de onde observa o quarto da casa na Terra onde está a filha Murph em tempo-espaço simultâneos na infância e na atual vida adulta. O presente dobra-se no passado: através de quantuns de energia em código morse, Cooper se comunica com Murph simultaneamente no passado e presente.

O suposto fantasma da estante na infância era o próprio pai no futuro tentando se comunicar, trazendo a solução que retirará a humanidade de um planeta agonizante.

Nessa sequência final, Nolan faz também uma curiosa alusão às comunicações dos espíritos do início do Espiritismo do século XIX com os fenômenos de batidas no chão e mesas girantes como formas de comunicação tiptológica dos mortos com os vivos.

Seriam os espíritos não apenas pessoas que já morreram, mas na verdade seres interdimensionais tentando se comunicar conosco através de diferentes tempo-espaços? Seriam seres do futuro ou do passado? Assim como os seres da quinta dimensão que, por algum motivo misterioso, tentam ajudar a humanidade em Interestelar, os espíritos também tentam se comunicar conosco?

Será que assim como os seres da quinta dimensão, é o amor por nós que move os espíritos a tentarem a comunicação?

 

Mais filmes indicados ao OSCAR 2015: http://ulbra-to.br/encena/categorias/oscar-2015

 


FICHA TÉCNICA DO FILME

INTERESTELAR

Diretor: Christopher Nolan
Roteiro: Jonathan Nolan, Christopher Nolan
Elenco: Matthew McConaughey, Anne Hathaway, Jessica Chastain, Michael Caine, John Lithgow
Produção: Legendary Pictures
Distribuição: Warner Bros South (Brasil)
Ano: 2014
País: EUA

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El Camino de Compostela

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Nada tão humano quanto viver na terra sonhando com a redenção do paraíso, ter os pés colados ao chão pelos infinitos entardeceres, mas lançar a alma nas divinais manhãs onde sempre se reacende a esperança da eternidade.

Vida, mistério absoluto, cega tanto os arraigados à razão quanto os sedentos apenas de fé. Ninguém, por mais que anseie se liberta da ameaça constante do nada, da ‘coisa alguma’. Animais comem, se reproduzem e simplesmente morrem. Gente não, gente sonha, reza, ama, odeia e faz poesia para suportar o gosto amargo da fruta que ceifou pra sempre o éden. Maldita sina essa voracidade por conhecimento e o desejo de maravilhar-se com palavras, sons ou cores, pois advêm invariavelmente dessa fome, desalento e desamparo.

Definitivamente não há criação sem dor… Todos ao nascer partem para empreender longa caminhada, seja ela qual for e por onde quer que siga, ou ainda, quanto tempo dure. Só se para quando se morre. Chegar é que é a morte, já o viver é um eterno caminhar onde cada descanso traz nova cidade, novo espetáculo, novos atores…

Fui longe, muito longe para tentar decifrar a vida e não decifrei nada. Ao invés disso vi gente do mundo todo andando incansavelmente por pequenos e intermináveis caminhos de terra carregando a vida nos ombros. Vi outros já meio sem vida fugindo da morte estampada pela ausência radioativa dos cabelos, dos pelos… Vi muitos deles falando sozinhos com Deus, pedindo, brigando, agradecendo, praguejando.

Vi Deus entrando por rajadas de luz em florestas escuras de hayas e pinheiros onde se respirava o frescor das flores silvestres e o doce aroma das maçãs que iam caindo pelo caminho. Decifrei encruzilhadas e cruzei montanhas íngremes, guiado apenas por flechas amarelas pintadas toscamente em pedras no chão, mas com precisão absoluta que me levaram de vilarejos a palácios de épocas muito remotas. Cheguei às portas da cidade de Tiago e vi profetas enlouquecidos pregando o evangelho a paredes seculares que, cansadas, os escutavam pacientes enquanto artistas de rua entoavam árias em meio à revoada de pombos na imensa praça tomada por esfarrapados que riam e choravam a conquista do ‘caminho’.

Cheguei ao mar e vi do alto de um penhasco o ‘fim do mundo’ onde as almas dos tempos antigos davam saltos para o purgatório tentado encontrar logo o paraíso tão desejado. Vivi mil anos de História no interior de catedrais góticas onde a penumbra e o cheiro de vela trouxeram o passado no mais completo silêncio, fazendo ecoar vozes de reis e plebeus que ali foram devorados pelos séculos, desaparecendo por completo na mais profunda escuridão do tempo que inexoravelmente se foi.

Peregrinos, cavaleiros templários, andarilhos, artistas, todos iguais. Somos eles carregando o fardo da existência por entre longos caminhos que serpenteiam o viver com bosques, florestas, campos floridos e desertos. A vida é o Caminho de Compostela, nós, os peregrinos que buscam incessantemente sentido e razão. Que poesia, humor e humildade possam ser algumas das verdadeiras armas que valham a pena para que, se ao menos não podemos derrotar o inevitável, tornemos a jornada mais bela e suave, seja a nossa, a de seres amados ou simplesmente a de andarilhos desconhecidos que estarão sempre ao nosso lado.

Não sei se isso é uma espécie de oração cristã, mas se o for, que assim seja: amém.

 


Fotos: Lincoln Almeida

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Uma viagem pelos sentidos

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Sim, muitos jovens tem a oportunidade de estudar em outro país e, afortunadamente, eu estou inserida nesse grupo. Daí, um dos primeiros impactos: quanta gente diferente tem por aqui (e porque não dizer quanta gente esquisita, pois, na maioria das vezes é esse estranhamento que predomina, particularmente em mim)! E mesmo sabendo que não é preciso se deslocar para tão longe para se impactar desse jeito, constando a diversidade cultural, racial, econômica e étnica que há em nosso próprio país, digo que esse impacto, de fato, se redimensiona aqui, d’outro lado do Oceano Atlântico, onde as pessoas costumam falar outra língua, comer muita batata e preservar, como podem, os resquícios do que um dia foi uma importante civilização, a celta.

Arquivo pessoal

Hoje moro num país que é uma ilha. Moro numa cidade costeira, húmida e extremamente chuvosa. Salva-me engano, em 275 dias do ano chove. Estou encerrando a minha segunda semana na Irlanda com uma efusão de sensações que ainda não encontrou todas as válvulas de escape necessárias. No entanto, sei que escrever sobre essa efusão é um caminho bastante saudável para mim. Vim para cá de avião. Vim para cá com uma tremenda sensação de suspensão que ainda não passa (ainda bem que a gripe e a dor de ouvido passaram). Aterrissei, mas meus pés ainda não sentiram o chão. E mesmo tendo levado uma queda de bicicleta em meu terceiro dia, onde pedaços de minha pele se misturaram ao asfalto, e vice-versa, o sentido do tato afeta-me, agora, de forma bastante diferente. Falta abraço, sobra mímica. Sobra vento e frio, falta abraço. Em quesito de gesticulação e interpretação, o corpo reaprende seus limites naquela velha história de dançar conforme a música. Ainda falando do tato, a pele começa a se acostumar com a textura das coisas e com a diferença que há em muitas das coisas que tocamos e que, obviamente, nos tocam.

Arquivo pessoal

Só ratificando, a palavra “sentido” (não como verbo no particípio, mas sim como substantivo masculino) corresponde, em seu simplificado significado, a um conjunto de faculdades que usamospara processar (não sei se essa seria a palavra correta a usar) as sensações e percepções que temos do mundo. Didaticamente, dizemos do tato, do olfato, da audição, do paladar e da visão que, trabalhando conjuntamente, ajudam e compõe o que é chamado de processo cognitivo, embora eu prefira dizer que, quando os sentidos trabalham conjuntamente, faz mais sentido. Acredito que exploramos nossos sentidos de acordo com as vivências que temos, ou, as vivências que temos aguçam mais uns sentidos do que outros. Talvez seja só questão de explorar. Disso, compus meu texto viajando pelas sensações e percepções que tive nesses 13 dias.

Viajo agora pelo sentido da audição, que tem sido bastante usado nessa nova experiência. Escutar, ouvir. Ouvir e escutar. De novo. Mais uma vez. Quantas vezes forem necessárias para o entendimento. Quando você não sabe um idioma, a escuta é como uma pescaria: sorte a sua quando pega um peixe, ou melhor, sorte a sua quando entende uma palavra dentre as inúmeras que escuta. O bom disso tudo é que, embora pareça ter dias em que o mar não está para peixe, não há dias em que sua cesta volta vazia. Definitivamente não há. E a audição vai sendo explorada, amplificada, expandida. E de repente é possível distinguir vários idiomas, e é possível até saber que aquela pessoa que está falando em inglês é, na verdade, um brasileiro. Bom, mas como eu disse, os sentidos costumam trabalhar conjuntamente e, desse trabalho, imensa é a importância da visão.

É difícil fazer essa divisão didática para falar das impressões, mas digo asseguradamente sobre o quanto a visão tem me ajudado nessa orientação. Como muitos devem saber, a orientação do tráfego é inversa à nossa. Os volantes dos carros ficam no lado direito. A via de ida é a da esquerda e a de volta da direita. Perante o movimento do centro de Galway, olhar para todos os lados tem me livrado de alguns atropelos. E sendo a configuração da vida irlandesa bastante diferente da que eu estou acostumada, olhar me orienta, ver me fascina, ler me ajuda, e observar me ensina muito. Novos olhares são propulsores de novas imaginações e outras criatividades. Os inúmeros olhares se cruzam, se misturam. Olhares azuis, castanhos, maquiados, cansados, alegres, jovens, chorosos. Olhares diversos que guardam toda uma vida de riquezas. Além disso, diante de tanto impacto, o olhar pede, quase implora, pelo registro de tanta peculiaridade.

Arquivo pessoal

Falar do olfato, assim como do paladar, é falar de uma amplidão sem fim. Mesmo no verão, para mim, o cheiro da vida aqui é cheiro de mofo. Ao falar isso, não pejoro os ares irlandeses, muito pelo contrário, os considero milenarmente abençoados e talvez por isso tenham cheiro de mofo. Mas não sufocam, abrem os pulmões. Na beira do mar, o vento dança e se renova sem parar. Há o cheiro das lindas e diversas flores, dos diversos perfumes, da grama molhada, das interessantíssimas comidas dos restaurantes. Há o cheiro dos peixes, assim como o gosto deles. Falando em gostos… ahhh… quantos gostos diferentes! Quantos temperos, quantos sabores! Quanta mistura. Não digo melhor ou pior, apenas diferentes.

Arquivo pessoal

E de toda essa profusão de sentidos (agora já me refiro aos sentidos como o significado de algo), onde paradigmas vão sendo estraçalhados e reconstruídos rotineiramente, talvez uma das únicas certezas que prevaleça seja a de que eu sou apenas mais uma diferença diante de tantas outras. Hoje, sou diferença. Sou diferente. E assim vou me sentindo a cada dia: desterritorializada, ainda incomodada (faz parte), mas também animada com (e por) isso.

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