Interfaces da Anorexia no filme “O Mínimo para Viver”

Restringir a alimentação ou passar por períodos de compulsão e purgação podem ser sinais de um transtorno alimentar. Se não tratados, os distúrbios alimentares podem ter efeitos devastadores na saúde mental e física do indivíduo.

“O Mínimo para viver”, tradução do filme “To the Bone”, é um filme lançado na Netflix em 2017 que mostra a história de Ellen sobre a luta contra a anorexia e o sofrimento que surge com esse transtorno alimentar.

O filme conta que Ellen abandonou a faculdade e está lutando para concluir o tratamento hospitalar para seu diagnóstico e, como resultado, volta a morar com o pai e a madrasta. A história segue Ellen através de seu processo de tratamento, que é auxiliado por familiares próximos, amigos e terapeutas que querem ajudá-la a continuar progredindo nessa busca pela cura. Este filme captura o impacto psicológico que a anorexia pode ter na pessoa e também na sua rede de apoio. Ele fornece uma visão sob a ótica do paciente, e seus pensamentos e sentimentos experimentados durante o diagnóstico e o tratamento do transtorno.

Após diversas internações e tratamentos frustrados Ellen conhece o médico Dr. William Beckham (Keanu Reeves), famoso pelo seu método nada comum de tratar doenças como a dela. Depois de se convencer que o tipo de tratamento que ele oferece é sua melhor e talvez até sua última opção, Ellen começa a frequentar a clínica de Beckham, um lugar diferente, mais confortável e com ares de lar, onde ela divide o teto com outros seis pacientes.

A trama demonstra a complexidade da doença, e todas as nuances que a envolvem. Não se trata apenas de voltar a se alimentar normalmente. Como em uma relação de causa e efeito, outras enfermidades podem surgir em decorrência da anorexia, desde o mal funcionamento de órgãos à osteoporose.

A decepção consigo mesma é repetidamente vivida no corpo, entre comer e vomitar, controlando severamente e castigando seu corpo nos exercícios doloridos, para conseguir um pouco de alívio no seu sofrimento psíquico.

Fonte: encurtador.com.br/finLP

A Anorexia Nervosa (AN) é um transtorno alimentar (TA) caracterizado pela auto-inanição, ou seja, é a própria pessoa provocar um estado de debilidade extrema por falta de alimentação que leva o corpo a consumir os seus próprios tecidos para obter as calorias necessárias para se manter vivo, degradando órgãos, músculos e gordura corporal. Se caracteriza também pela preocupação exacerbada da forma física e um medo extremo de comida.

A Anorexia Nervosa tem sido associada a vários fatores de risco e manutenção de transtornos. Os fatores de risco são quaisquer situações que aumentem a probabilidade de ocorrência de uma doença ou agravo à saúde. Os fatores de manutenção predizem persistência de sintomas versus remissão ao longo do tempo em indivíduos já sintomáticos para um transtorno.

Em algumas cenas durante o filme, Ellen contava as calorias presentes na comida que estava em seu prato além de mostrar ela fazendo abdominais e medindo o braço para verificar se ela conseguia fechar a mão ao redor do bíceps. A menção ao uso de laxantes também aparece, além de mostrar a rotina da instituição na qual ela estava fazendo tratamento, com altos e baixos, recaídas e a real dificuldade do tratamento.

Estas cenas demonstram como a anorexia não só reflete na saúde física de alguém, como impacta muito a saúde mental do indivíduo, e tal fator é determinante no curso da doença. Como citado anteriormente, além da alteração física, há o medo de ganhar peso e alteração da imagem corporal e da consciência sobre o transtorno. Os pensamentos a respeito do problema influenciam fortemente na manutenção do transtorno, pois a pessoa se olha no espelho e enxerga alguém gorda ou que não está suficientemente magra, e não há evidências externas que façam a pessoa se convencer do contrário.

Nesses casos a tendência de o sujeito com anorexia falar que está com tudo sob controle ou de negar a doença é alta. Geralmente a busca por tratamento acontece já em um estado avançado e os prejuízos já estão muito acentuados.

O filme também enfatiza como é essencial a participação da família na prevenção e no curso do tratamento. É importante que os familiares estejam alinhados sobre o transtorno para o sucesso neste processo.

No caso da família da personagem principal, o filme mostrou as dificuldades que eles tinham de lidar com o transtorno. A mãe não suportou o quadro da filha e fez com que Ellen se mudasse para a casa do pai o qual é ausente e aparentemente irritado, tenta constantemente se manter alheio de todas as situações, encontrando pretextos para não se encontrar com a filha e não comparecer à terapia familiar.

A madrasta e a irmã são as mais presentes e as que mais encorajam o tratamento de Ellen, porém ambas (assim como a mãe também), fazem menções inadequadas que atingem ela, como por exemplo falar constantemente sobre como sua aparência está, e falas que não contribuem como  “coma Ellen” e “se você morrer eu te mato”.

Fonte: encurtador.com.br/uwDGQ

A Terapia Cognitivo Comportamental tradicionalmente se concentra em relatos baseados em sintomas, sugerindo que tanto o controle quanto a supervalorização do peso e forma física mantêm a AN. A TCC se baseia em dois princípios: o primeiro diz que nossas cognições têm influência sobre o nosso comportamento; o segundo refere-se ao fato de que o modo como agimos afeta nossas emoções e pensamentos.

Algumas características em relação à AN podem incluir: perfeccionismo clínico, baixa autoestima, intolerância ao humor e dificuldades interpessoais como focos adicionais de tratamento.

O tratamento pode conter diversas complicações, com probabilidade de recaídas, já que o fator psicológico tem muita influência, como ilustrado no filme. Utilizando técnicas cognitivas e comportamentais, a TCC busca aumentar a motivação para a mudança, aumentar diretamente o ganho de peso ao mesmo tempo em que aborda preocupações com peso e forma e se prepara para contratempos para manter os ganhos obtidos a longo prazo. A TCC também é importante para o trabalho da imagem corporal e dos padrões estéticos que são muito elevados nas pessoas com AN.

Dentre alguns objetivos, levar o paciente a desenvolver um padrão regular e flexível de alimentação é um grande passo na recuperação da saúde e bem estar deste indivíduo. E este resultado está intimamente ligado ao surgimento de um indivíduo com capacidade de tomar consciência, dar sentido, regular, aceitar, expressar e transformar a experiência emocional, usando-a de forma flexível e adaptativa para se conhecer, buscar formas saudáveis de agir consigo mesmo, nos seus relacionamentos e no mundo.

FICHA TÉCNICA

Título: O Mínimo para Viver
Dirigido por: Marti Noxon
Data de Estreia: 22 de janeiro de 2017
Duração: 107 minutos
Classificação: 14 anos
Gênero: Comédia/Drama
País de Origem: EUA

REFERÊNCIAS

NARDI, Helena Beyer; MELERE, Cristiane. O papel da terapia cognivo-comportamental na anorexia nervosa. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, São Paulo, v. 16, 2014. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-55452014000100006. Acesso em: 31/05/2022.

VTM Neurodiagnóstico. Tratamento para anorexia e o filme “O Mínimo Para Viver”. Disponível em: https://vtmneurodiagnostico.com.br/cine_psiconeurologia/tratamento-para-anorexia-e-o-filme-o-minimo-para-viver/. Acesso em: 2/06/2022.

DESENVOLVIVER. O mínimo para viver: conscientizações e problematizações. Disponível em: https://desenvolviver.com/psicoterapia/o-minimo-para-viver-conscientizacoes-e-problematizacoes/#:~:text=%E2%80%9CO%20m%C3%ADnimo%20para%20viver%E2%80%9D%20%C3%A9,a%20realidade%20que%20este%20mostra.. Acesso em: 02/06/2022.

FRONTEIRAS PSICOLOGIA. Anorexia Nervosa e um Eu Emocional Perdido: Uma Formulação Psicológica do Desenvolvimento, Manutenção e Tratamento da Anorexia Nervosa. Disponível em: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2019.00219/full#F1. Acesso em: 31 mai. 2022.