“O Primeiro da Classe”: vivências de uma pessoa portadora da Síndrome de Tourette

Você já ouviu falar sobre a Síndrome de Tourette? Esta patologia vista pelos estudiosos como um distúrbio neuropsiquiátrico é destaque de um filme denominado “O Primeiro da Classe”. O episódio protagoniza uma história real de um professor americano, chamado de Brad Cohen, interpretado pelo ator Joseph Wolk, que desde criança convive com a Síndrome de Tourette (ST). O filme retrata toda a trajetória do preconceito sofrido por Brad e suas conquistas, como portador da referida síndrome.

Desde a infância, Brad era incompreendido, sofria humilhações e preconceitos em razão do problema que tinha; nem mesmo seu pai aceitava a condição dele, para as pessoas, Brad tinha condições de controlar os movimentos causados pela Tourette.  Sua mãe que o apoiava e reconhecia nele um problema, cansada de presenciar o sofrimento do filho e por não encontrar respostas nem mesmo dos profissionais da saúde da época, começou a pesquisar e descobriu que Brad tinha uma doença chamada Síndrome de Tourette, portanto os movimentos que ele fazia, diferentemente do que muitos pensavam, era involuntários, assim não podia controlá-los.

Na escola Brad era oprimido pelos demais colegas e ainda incompreendido pelos professores, que muitas vezes o chamava atenção e o fazia prometer que não iria mais fazer os barulhos e se comportar de tal forma. Um dia, em uma determinada escola, durante uma palestra, em que todos os alunos estavam presentes, o Diretor chamou Brad ao palco e ao perguntar por que ele fazia barulhos estranhos, Brad respondeu que tinha Síndrome de Tourette e que gostaria de ser aceito, assim todos entenderam sua situação e foi aplaudido pelos presentes.

Na idade adulta, após concluir seus estudos, Brad teve o desejo de dar aulas, assim participou de várias entrevistas em busca da realização desse sonho. Em quase todas as escolas foi reprovado, devido sua condição de saúde, no entanto uma delas resolveu dar-lhe uma chance. Assim a escola organizou o ambiente para recebê-lo e deu-lhe uma turma de crianças para dar aula. Com isso, ele realizou aquilo que muito desejava e ficou em paz e feliz. Tudo isso contribuiu para seu maior enfrentamento da síndrome, pois naquele lugar ele era reconhecido pelo seu trabalho e não pela sua condição de saúde. A sua dedicação foi tanta que ele ganhou um prêmio como melhor professor do ano.

Nessa mesma época, Brad conheceu uma garota, pela internet, com quem se casou e viveu bons momentos da sua vida. Posteriormente recebeu aceitação do seu pai, chegando até mesmo a ganhar estantes para a escola na qual ele trabalhava. Quanto a síndrome, nas suas falas, Brad disse que ela foi sua “companheira” desde os seis anos, sendo a principal razão para ele se tornar um professor de verdade.

Fonte: encurtador.com.br/quwPR

Quando se pesquisa sobre a Síndrome de Tourette, percebe-se que ela tem seu início na infância e resulta-se numa série repentina de vários tiques motores somados a um ou mais tiques vocais; ocorrendo assim num período mínimo de um ano, com início antes dos dezoito anos. Para tanto, teve sua primeira descrição como uma patologia neuropsiquátrica, em 1825. (Teixeira et al. 2011, apud AMERICAN PSYCHIATRY ASSOCIATION, 1994; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2000; PETERSON, 2001; PAULS, 2003). Os tiques são classificados comomotores e vocais, subdivididos em simples e complexos. As pessoas inicialmente apresentam tiques simples e com os anos evoluem para complexos, mas isso depende de cada pessoa. (Teixeira et al.2011, apud LECKMAN, 1995; MERCADANTE, 2004).

De acordo com Hounie e Petribu (1999), dentre os tiques motores simples estão as caretas faciais, piscar de olhos, desvio do globo ocular, levantar os ombros, tensão da parte do corpo, sacudidelas da cabeça. Quanto aos complexos são gestos de mãos, empurrar, estiramento de língua, movimentos de arrumação, dobrar-se, retorcer-se, beliscar, morder a boca, bater a cabeça, ecopraxia e copropraxia etc. Quanto aos vocais,    dentre os simples estão  coçar a garganta, cuspir, fungar, gritar, sorver inúmeros sons;  no que se refere aos complexos são proferição súbita de sílabas inapropriadas, palavra “êpa”, ops”, frases curtas e complexas, incluindo palilalia, coprolalia e ecolalia, dentre outros.

Para se caracterizar a síndrome é necessário a presença de tiques motores, um ou mais vocais, em um dado momento, durante o processo da doença, não necessariamente acontecendo ao mesmo tempo; ocorrência de vários tiques em quase todos os dias ou algumas vezes, durante um período de mais de um ano, não havendo para tanto nenhum período superior a três meses com faltas dos tiques. Nos últimos anos, há um crescente aumento de diagnósticos da Síndrome, tendo em vista o número maior de informações levantadas   por equipes de saúde e grupos de pesquisa (HOUNIE; PETRIBU, 1999).

De acordo com Loureiro (2005), entre as patologias associadas à síndrome está o transtorno de déficit de atenção, somados a hiperatividade e sintomas obsessivo-compulsivos.  Muitas crianças que apresentam o distúrbio e tem transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e podem também apresentar prejuízos na aprendizagem (apud ROBERTSON E YAKELY, 1996; MERCADANTE et al., 2004  ARZIMANOGLOU, 1998).

Ainda segundo Loureiro (2005), após a percepção dos sintomas, são indispensáveis o diagnóstico e o tratamento precoces, pois com isso evita-se prováveis prejuízos psicológicos para o paciente. Para cada pessoa com a síndrome, existe uma forma de tratamento, destacando assim abordagens farmacológicas e psicológicas. Esta última além de oportunizar terapias ao paciente, ajudando-lhe no enfrentamento do problema, garante aos pais e familiares mais próximos, instrução de como ocorre a doença e ainda como deve-se lhe dar com a pessoa portadora da síndrome (HOUNIE e PETRIBU, 1999; MERCADANTE et al., 2004).

Fonte: encurtador.com.br/elxJW

Em se tratando do filme, percebe-se que o mesmo é muito interessante, pois trata da vivência de uma pessoa com uma patologia ainda não muito conhecida na atualidade   para a área científica, bem como para o público em geral, como a Síndrome de Tourette. Outra situação levantada no episódio refere-se a questão da inclusão e ainda a força de enfrentamento de alguém que tem um objetivo e mesmo diante dos desafios da vida não se rende a eles e com isso consegue alcançar aquilo que verdadeiramente lhe dar sentido à  vida.

Durante toda trajetória do filme, foi possível perceber o quanto as pessoas que possuem Síndrome de Tourette enfrentam aos mais variados tipos de dificuldades, isso muitas vezes motivado pelo desconhecimento sobre a síndrome. Até mesmo nas famílias elas são incompreendidas; quando crianças, vistas como sem limites e adultas como mal-educadas. Para Brad foi muito difícil conviver com toda essa situação, pois por onde passava as pessoas o tratavam como estranho e ainda se recusavam entendê-lo. Na escola por exemplo, em vez de perceber o seu potencial, os professores o corrigiam, maltratavam e ainda o expunha na sala, trazendo vergonha e constrangimento para ele.

Outro tema tratado no filme refere-se a inclusão, no caso de Brad a exclusão.  Durante toda vida, Brad foi excluído devido sua condição. Infelizmente isso ainda é muito presente em nossos dias, nem sempre as pessoas estão preparadas para aceitar aquilo que é diferente da maioria e com isso agem com indiferença, preconceito e discriminação, como se pessoas assim não tivessem os mesmos direitos. Para muitos ainda é difícil entender que uma demonstração de empatia, amor ao próximo, tolerância, respeito, equidade, são indispensáveis para a construção de relações saudáveis e ainda reafirma a dignidade das pessoas, independentemente de suas diferenças.

Ainda sobre o filme, o que nos chama atenção também é a perseverança de Brad.  Independente de circunstâncias ele rompeu com o preconceito, as indiferenças, a exclusão, a falta de aceitação até mesmo de seu pai e conseguiu realizar seus sonhos, tanto profissionalmente como familiar, tal como diz Viktor Frankl, um Austríaco, visto como pai da Logoterapia “a pessoa humana tem dentro de si ambas as potencialidades; qual ser concretizada, depende de decisões e não de condições” (FRANKL,1987, p. 74).

Assim finaliza-se o filme que conta a vida de um homem que foi além daquilo que lhe foi apresentado  e com isso conseguiu realizar seus sonhos e ser feliz, deixando para todos nós uma lição de que mesmo diante das adversidades da vida não devemos desistir, pois temos um lugar ao sol para conquistarmos e isso nem sempre ocorre  da forma mais fácil, mas, mesmo assim, devemos prosseguir ou seja, “dizer sim a vida, apesar de tudo”( FRANKL,1987, p. 75).

Fonte: encurtador.com.br/BHMR9

FICHA TÉCNICA DO FILME

O Primeiro da Classe

Título original: Front of the Class

País: EUA

Ano: 2008

Gênero: Drama

Direção: Peter Werner

Elenco: Sarah Drew, Treat Williams, Dominic Scott Kay, Jimmy Wolk, Patricia Heaton, Joe Chrest, Johnny Pacar, Mike Pniewski, Charles Henry Wyson, Charlie Finn, Dianne Butler, Helen Ingebritsen, Laura Whyte, Kathleen York, Michael Cole

Duração: 95 minutos

Referências:

FRANKL, V. Em busca do sentido: um psicólogo no campo de concentração. Tradução  de  Walter O. Schlupp e Carlos C. Aveline. São Leopoldo:Sinodal, 1985. 174 p.

LOUREIRO, et al.; Tourette: por dentro da síndrome. Scielo, 2005. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/rpc/v32n4/26056.pdf >. Acesso em: 16  de abr. de 2021.

HOUNIE, A. PETRIBU, K. Síndrome de Tourette – revisão bibliográfica e relatos de casos. Sciello, 1999. Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44461999000100011>. Acesso em: 16 de abr. de  2021.

TEIXEIRA et al. Síndrome de La Tourette: revisão de literatura. Sciello, 2011. Disponível em:< https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-487> Acesso em:  16  de abr. de 2021.