A ansiedade tem saídas pela Psicanálise?

Ana Laura Araújo Dutra – CRP 23/2499 – Pós-graduanda em Neuropsicologia – E-mail: neuropsianalaura@gmail.com – Instagram: @neuro.psianalaura

 

“Quando a dor de não estar vivendo for maior do que o medo da mudança, a pessoa muda” – Freud

 

Os resultados de um atendimento psicoterapêutico é um processo com muitas etapas e que despende uma gama de variáveis para ser construído e finalizado. De acordo com Bursztyn e Figueiredo (2012), “a construção do caso clínico como uma proposta de trabalho e de investigação de orientação psicanalítica, ao privilegiar a discussão clínica, visa nortear a transmissão da singularidade dos sintomas do sujeito.”

Apesar de a Psicanálise contribuir grandemente para pesquisas científicas, formulação de métodos e construção de casos, a mesma sempre foi questionada por não atender a metodologia proposta pela ciência experimental. Com isso, afirma-se que “o trabalho do psicanalista deve vir acompanhado de comentários, interrogações, algo que faça daqueles sintomas que o sujeito apresenta algo também inusitado e enigmático, implicando a equipe e a instituição” (DELORENZO, MEZAN E CESAROTTO, 2000).

Sendo assim, ao se constituir um manejo adequado, pensa-se sobre o sujeito que se apresenta durante o processo. Em seus discursos com elementos reconhecidos e recalcados, mas também nas situações terapêuticas em que foi possível visualizar sua posição subjetiva (VORCARO, 2010).

Pensando em Psicanálise, encontramos duas conceituações que podem se confundir, e o primeiro passo é saber diferencia-las para que o manejo e as provocações corretas sejam utilizados. O que vem a ser a ansiedade? E como separa-la, por exemplo, do que é conhecido como angústia.

O que é explicado por Abla (2009, p. 156), ao citar Freud: o medo que em geral está ligado a uma experiência que é possível nomear, ou segundo Freud, um objeto; a ansiedade é o processo no qual o objeto começa a se esfumaçar, mas não se sabe ao certo de que é o medo, há uma certa indeterminação, porém o sujeito já espera algo que está para acontecer. “Medo e angústia caracterizam um tempo subjetivo que leva o paciente à busca de um saber que o livre do medo e alivie do mal-estar”.

Essa ânsia/ansiedade tem a ver com o desejo, é uma espécie de crise do desejo, a expectativa do querer mais, de querer muito uma coisa e não saber se ela irá acontecer; ou o não querer muito uma coisa que já é realidade, mas ter receio de mesmo assim não consegui-la.

Já a angústia propriamente dita, seria um quadro além dessa escala, seria o que é chamado e conhecido como pânico, e a mesma foi descrita pela primeira vez pelo próprio Freud (1894) – como neurose de angústia. Sendo assim, o espectro da angústia envolve ainda uma outra forma de manifestação muito frequente, que são os quadros atuativos, acting out ou a passagem ao ato.

Todos esses exemplos, são formas de ansiedade que muitas vezes não são percebidas como tal, pelo próprio sujeito ou pelos que o envolvem, porque são resolvidas com ações que servem apenas para que o sujeito não pense, não pare para pensar, ele vai fazendo em vez de pensar e sentir. Essa maneira de agir acaba se tornando uma outra forma de angústia, geralmente associada a uma espécie de treinamento de fantasias na realidade. Isso faz com que o sujeito esteja sempre preocupado em controlar tudo que irá ou não acontecer, seja no momento presente ou no futuro próximo.

Outra possibilidade é o surgimento de angústias somáticas, que são sensações de desconforto, inadequação, mal estar, por vezes acompanhados por dores e respectivas formações somáticas; essas “reações” nada mais são que destino para a angústia. Na clínica psicanalítica a angústia está intimamente ligada com o plano da depressão, e consequentemente um lugar em que o desejo aparece ao sujeito de forma extraída, reduzida a uma certeza e indexado a experiência que somos apenas um corpo.

Portanto, segundo Lacan (1962-1963), não é que falte um objeto (quando se fala sobre angústia) mas que ele estaria excessivamente presente, não como objeto empírico, não como objeto dotado de imagem – como é o caso da fobia e do medo – mas é na sua presença de objeto A, que é fonte essencial do trauma, do mal encontro, do não simbolizável e que determina a causalidade do nosso desejo.

Dessa forma, o tratamento das ansiedades, em suas diferentes modalidades é no fundo o redimensionamento da relação do sujeito com o desejo, tentando então reduzir a captura desse desejo pelo ego, pelas imagens narcísicas, a captação desse desejo nas demandas do mundo e em formas de gozo corporais, semicorporais ou experienciais.

O tratamento então da angústia e da ansiedade, passa pela subjetivação do desejo, podendo parecer algo simples de ser teorizado e trabalhado, porém o primeiro passo o qual devemos compreender é que a ansiedade nunca se extingue, ela é apenas manejada, porque jamais viveremos sem angústia, mas pode ser algo que jogue a nosso favor.

 

REFERÊNCIAS

ABLA, Dalmara Marques. Experiência de Saber – Escola Letra Freudiana –Reflexões sobre o objeto no medo e na fobia. Rio de Janeiro: 7 letras, 2009.

BURSZTYN, D.C & FIGUEIREDO, A. C. O tratamento do sintoma e a construção do caso na prática coletiva em saúde mental, 2012. Tempo psicanalítico. Rio de Janeiro, 44(1),131-145.

DELORENZO, R. M. T; MEZAN, R.; CESAROTTO, O. Narrar a clínica. 2000. Percurso, 25, 2º sem. Disponível em: <https://www.psicomundo.com/brasil/percurso/percurso25.htm>. Acesso em: 06 de set. 2022.

FREUD, Sigmund. Extratos dos documentos dirigidos a Fliess. Rascunho E (1894). ESB. Rio de Janeiro: Imago, 1976, v. I, p.261.

LACAN, J. O seminário, livro 10: a angústia (1962-1963). Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 2005. (Campo Freudiano no Brasil).

VORCARO, A. Psicanálise e método científico: o lugar do caso clínico, 2010. In Pesquisa em psicanálise: uma transmissão na Universidade. Fuad Kyrillos Neto; Jacqueline Oliveira Moreira (Org.) Barbacena- MG: EdUEMG. 179p.