Breve história do lúdico no Brasil

Foram os indígenas, os portugueses e os negros que desenvolveram os modelos lúdicos que fazemos uso nos dias atuais no Brasil, pois ao olharmos para a história do Brasil, podemos verificar que nos últimos séculos o nosso país passou por uma enorme mistura de povos e raças, onde diversas crenças, culturas e educações se misturaram e se fundiram.

Cada uma com suas diferenças e com as suas peculiaridades, pois cada uma possuía sua própria maneira de desenvolver o lúdico entre os seus pares, porém podemos perceber que é justamente essa mistura que enriquece o nosso país no que tange o aspecto cultural e educacional (SANTA’ANA; NASCIMENTO, 2011).

Os autores também discorrem a respeito de que a herança cultural e educacional deve ser utilizada de forma integral no processo de aprendizado dos alunos, pois dentro do contexto escolar existe uma enorme diversidade de alunos que trazem consigo várias etnias, raças e povos, e sendo assim, devem “resgatar e desenvolver o que de mais importante houver de cada uma para o ensino dos alunos nos dias atuais”.

Os jogos e brincadeiras que vimos e usamos hoje em dia são provenientes dessa miscigenação que aconteceu nesse momento da história, porém não podemos dizer com certeza de qual povo é a origem fixa de tais, entretanto podemos evidenciar que o que nós temos hoje é sem dúvida um material de grande valia que nos foi trazido e construído ao longo dos anos pelos nossos antepassados, que devem ser preservados, cuidados e valorizados. Além de que, devem continuar sendo repassados para os alunos e trabalhados dentro do sistema de ensino, sem esquecer do valor e do peso histórico que cada um carrega (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

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Ao nos atentarmos para a cultura indígena, percebemos que os povos originários costumam valorizar seus costumes e práticas, repassando-as para os seus filhos, pois eles desde cedo são ensinados a pescar, a caça, as brincadeiras típicas e as danças do seu povo, que corresponde a uma forma lúdica de aprender, valorizando e demonstrando sua cultura, a educação e a tradição do seu povo.

Assim, seus filhos desde cedo são instruídos a construir seus próprios brinquedos com materiais que são retirados da natureza, além de que ao pescarem ou caçarem, possuem uma visão diferente daquela que o adulto possui diante do mesmo contexto, pois eles caçam ou pescam como uma forma lúdica de diversão, e não com o olhar adulto de conseguir o alimento para se manter e suprir as necessidades de sobrevivência (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

No que corresponde aos negros, os costumes que podemos perceber são parecidos com os costumes indígenas, pois desde criança, eles são instruídos a construir os próprios brinquedos, e a aprender a pescar e nadar, além de caçar. Podemos verificar como a cultura foi sempre implantada nessas crenças através do lúdico e da criatividade, e em contrapartida estavam satisfazendo as necessidades reais e existentes para a sobrevivência desses povos.

Podemos notar a diferença entre as crianças indígenas e as negras em relação as crianças portuguesas que vinham ao Brasil, pois no caso das crianças indígenas e das negras, elas possuíam contato com o universo lúdico, mas era por uma questão de sobrevivência e com a intenção de conseguirem algo para se alimentarem e etc.

Porém os filhos dos portugueses possuíam contato com o universo lúdico, mas com a finalidade de lazer e diversão, e para que pudessem enriquecer o desenvolvimento intelectual. Essas crianças traziam costumes que se afastavam muito dos costumes encontrados pelas crianças no Brasil, apesar de que muitos negros foram trazidos como escravos em navios negreiros vindos do continente Africano (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

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Nos últimos momentos da idade média e entrando na idade moderna, por volta do século XV, a igreja católica exercia grande poder na época, então fez uso desse poder e influência para desvalorizar e fazer com que os jogos caíssem em desuso por serem tidos como profanos.

No Brasil, os jesuítas foram expulsos e o Brasil encontrou-se sem nenhum tipo de sistema organizado de ensino, pois em alguns momentos alguns professores vindos de Portugal chegavam em terras brasileiras para ministrar cursos de álgebra, e tal informação consta numa carta régia com data de 1799 que relata sobre como foi o ensino de matemática no Brasil naquele período (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

Conforme Sant’ana e Nascimento (2011), no século XX houveram propostas como a Pedagogia Nova, que veio para construir e consolidar uma nova perspectiva sobre o ensino, também houveram o Positivismo e o Tecnicismo do ensino de ciências, e também foi no século XX que “o aprender fazendo, a pesquisa investigatória, o método da redescoberta, os métodos de solução de problemas como também as feiras e clubes de ciências foram as grandes mudanças ocorridas para um ensino que até então não tinha essa preocupação”.

No ano de 1930 com a revolução que gerou o fim da Primeira República e se tornou um dos mais notáveis e consideráveis movimentos do Brasil e da educação brasileira, as pessoas costumavam olhar para a educação e atribuir um grande valor e significado, alinhado com o viés ideológico existente, e foi a partir daí que foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, que tinha Francisco Campos no cargo de ministro da educação.

As necessidades do sistema econômico motivaram esse novo olhar e essa atenção dada à educação, pois essa revolução de 30 ficou vista como a porta de entrada e a abertura para o capitalismo de produção, “e o Brasil, por ter acumulado muito capital até então, passou a investir no mercado interno e na produção industrial. A partir daí temos uma nova realidade que era a necessidade de mão de obra especializada e para tal era preciso investir na educação” (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

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Os autores Sant’ana e Nascimento (2011), apontam que:

“Em 1932 foi lançado por um grupo de educadores, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, dirigido ao povo e ao governo, o documento apresentava a diversidade teórica e ideológica do grupo que o concebeu, mas com ideias consensuais. Destacamos a proposta de um programa de reconstrução educacional em âmbito nacional e o princípio da escola pública, leiga, obrigatória, gratuita e do ensino comum para ambos os sexos, que deu resultados num curto espaço de tempo, pois já na promulgação da nova Constituição em 1934, a educação passa a ser direito de todos, devendo ser ministrada pela família e pelos Poderes Públicos. Após a reforma o currículo do ensino secundário passou a ser seriado, com a disciplina de matemática reunindo a aritmética e a geometria. Da década de 30 até a década de 50, quase não houve alterações no ensino da matemática. Somente em 1955, com a realização do I Congresso Brasileiro de Ensino da Matemática em Salvador, é que foi reconhecido que o currículo secundário precisava ser atualizado, com o propósito de ser mais entrosado com o conteúdo do ensino universitário. Pelo mundo afora ocorria o mesmo movimento, mas com outros interesses.”

A proposta sugerida pelos educadores do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova era de revolucionar a educação, construindo uma escola de acesso para todos de forma gratuita. Esta proposta deu bons frutos, pois foi lançada em 1932, e já em 1934 foi promulgada a Constituição de 1943, na qual a educação passou a ser aclamada como um direito de todos e dever da família e dos Poderes Públicos.

Já na França era possível verificar “o sucesso da reorganização de todo conhecimento matemático numa apresentação axiomática e dedutiva da teoria dos conjuntos que Bourbaki realizou. A partir daí diversos educadores também propuseram a mesma organização no domínio da matemática elementar, colocando-a como elo entre a matemática secundária e superior” (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

Foi nesse momento da história que ocorreu o nascimento da matemática moderna que ganhou grande reconhecimento e notoriedade num intervalo curto de tempo, porém se espalhou por todo o mundo de maneira muito rápida, pois consistia numa abordagem de eliminar o ensino da matemática que tinha como base a memorização de regas e o processo de treinamento de algoritmos, incorporando a teoria dos conjuntos como uma possibilidade de juntar a linguagem das diversas vertentes da matemática, mas atentando-se aos procedimentos e separando a geometria (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

Todavia, no Brasil, inúmeros grupos de estudos surgiram e foram se formando com a finalidade de estudar a matemática moderna, “citamos alguns que foram criados à época: o Grupo de Estudos Ensino da Matemática (GEEM, São Paulo), o Grupo de Estudos Matemática de Porto Alegre (GEMPA, Porto Alegre) e Grupo de Estudos e Pesquisas de Matemática (GEPEM, Rio de Janeiro)” (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

E o Ministério da Educação e Cultura (MEC) se estruturou com essa nomenclatura no ano de 1953 quando o Ministério da Saúde passou a ocupar um espaço separado e desmembrado, e o ministério da educação e cultura apoiou de forma sutil as mudanças que estavam acontecendo na época devido a introdução e popularização da matemática moderna, entretanto foi apenas por volta da década de 70 que surgiu um movimento destinado e nomeado como Movimento de Educação Matemática que era voltado para o estudo, ensino e pesquisa em matemática.

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Os especialistas que compunham o grupo acreditavam de forma única que a maneira como a matemática estava sendo ensinada nas escolas era ultrapassado e não possuía mais tanta validade, e com base nisso dedicaram-se a estudar a psicologia do desenvolvimento do conhecimento da criança, para também entender como avaliá-las de uma forma distinta da que estava sendo utilizada pelos professores.

Eles procuraram levar em consideração questões de cunho social e o contexto sob o qual às crianças estavam inseridas e de que forma isso poderia interferir no processo de aprendizagem das mesmas. E nesse período da história, surgiram muitas publicações contendo técnicas e métodos para o ensino da matemática, conforme os pesquisadores e especialistas do movimento estudavam e publicavam, “os quais defendiam que a resolução de problemas, ao contrário do mecanicismo, ajudava os alunos a compreenderem os conteúdos matemáticos, devendo então ser aplicados antes dos conteúdos” (SANT’ANA; NASCIMENTO, 2011).

E Sant’ana e Nascimento (2011) denotam o que os pesquisadores e especialistas da época e do movimento acreditavam:

“Defendiam a utilização da modelagem para o ensino da matemática, ou seja, que ao invés do professor partir das teorias matemáticas para o ensino, que a realidade dos alunos fosse levada para dentro da escola, dentro da sala de aula e que as situações vividas pelos alunos fossem utilizadas como exemplos para o desenvolvimento da aprendizagem matemática. Defendiam que a história da matemática fizesse parte dos conteúdos a serem desenvolvidos com os alunos, com o intuito de compreenderem toda a evolução matemática e por que aprendê-la naquele momento de sua vida. Foi feito um movimento importante e fundamental para que os professores ao ensinar matemática levassem em consideração as experiências vividas pelos alunos no contato com a matemática, no seu cotidiano, pois de alguma forma esses alunos já tiveram contato como a matemática, digamos popular, não teórica – cientifica, mas fundamental para torná-la significativa para esses alunos, chamado de abordagem etnomatemática.”

Desta forma se estruturou o lúdico no Brasil, a partir de movimentos de professores e atores da educação que se esforçavam em construir uma narrativa onde o ato de educar e o ato de aprender fossem tirados do âmbito estritamente formal e asséptico, e passasse a integrar a zona da diversão também.

Nota-se que os professores de matemática se engajaram especialmente nesta empreitada. Por ser uma matéria que carrega o estereótipo de “difícil” ou “complicada”, é uma matéria que requer bastantes recursos a fim de fixar a atenção do aluno e facilitar sua aprendizagem.

Atualmente no Brasil, o lúdico pode ser observado em qualquer sala de aula da educação infantil. Ele se manifesta através de músicas, de figuras ilustradas nas paredes, no “espaço dos brinquedos” na sala de aula e em eventos realizados pelos professores, como o “dia do brinquedo” e coisas desse tipo, que estimulam as brincadeiras aliadas ao conhecimento.

Referências:

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BORBA, A. M. O brincar como um modo de ser e estar no mundo. In: BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de nove anos: Orientações para a inclusão de crianças de seis anos de idade. 2. ed. Brasília, 2006.

KISHIMOTO, T. M. O jogo e a Educação Infantil. São Paulo: Pioneira, 1994.

KLEIN, Melanie. A Psicanálise de crianças. Rio de Janeiro: Imago. 1997.

LACAN, J. O estádio do espelho como formador da função do eu tal como nos é revelada pela psicanálise (1949/1998). In Lacan, J. Escritos(pp.96-103). Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

LEAL, F. de L. A importância do lúdico na educação infantil. Monografia apresentada ao curso de Licenciatura Plena em Pedagogia – UFPI, novembro 2011.

LEONTIEV, A.N. Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil. In: VYGOTSKY, L.S. et al. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1998.

REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.

SANTANNA, Alexandre; NASCIMENTO, Paulo Roberto. A história do lúdico na educação

The history of playful in education. Revemat: Revista Eletrônica de Educação Matemática, Florianópolis, v. 6, n. 2, p. 19-36, maio 2012. ISSN 1981-1322. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/revemat/article/view/19400>. Acesso em: 20 de novembro 2020. doi:https://doi.org/10.5007/1981-1322.2011v6n2p19.