O que o carvão colorindo as mãos ou encrustado no tronco nos diz? Que olhar ele nos lança diante de nós?
Frente aos rastros e restos das queimadas temos a nossa frente um pedido de socorro, um escancarado grito a nos acordar da naturalização frente ao findar da vida, de vidas vegetais e animais. É o tronco queimado, tornado carvão que nos alerta. O que vemos? O que nos olha?
As indagações frente a destruição do Cerrado apresentadas na exposição “Agora, antes de amanhã”, de Amanda Leite, até dia 30 de junho na Galeria SESC Palmas, é um convite a uma antecipação nossa frente ao que não queremos que se alastre a destruir por completo toda e qualquer poção da natureza. Encontramos ali, no silêncio, movimento, luzes e cores das obras uma importante aproximação com a natureza nossa do Tocantins.
Divulgada em seus atrativos turísticos a atrair gente de todo lugar, há uma poção dessa natureza que se esvai a cada dia, a cada gesto de destruição tão presente em nosso cotidiano, no campo e na cidade. As obras a nós mostradas por Amanda Leite apontam para esse degradante processo, aponta as relações sujeito humano e natureza em contradições existenciais.
Poderíamos parafrasear Latour em sua obra Diante de Gaia. Por Amanda Leite, diante do Cerrado. Parte composicional de Gaia. Parte constitutiva de nosso devir em terras tocantinenses, brasileiras. Ao sermos olhados pelo Cerrado em destruição provocada, que saibamos ler seu olhar naquilo que a lente e a sensibilidade da artista visual, fotógrafa, poetisa nos presenteia. Presente a nos exigir uma leitura daquela parte da natureza que nos olha. Indagativa.
Na articulação com o humano, o Cerrado nos apresenta vida. Seus frutos, suas flores, pássaros, autóctones em seus modos de vida criativo e preservacionista. Que nos alinhemos a beleza do fazer preservacionista presente nas imagens captadas e oferecidas a nós na exposição de Amanda Leite. Carvão e vida, carvão e semente, carvão e verde, carvão em atravessamento do humano.
As sementes insistentes de vida persistem em seus ciclo vitais. Em costuras humanas se entregam na busca de espalharem vida até onde os ventos e pássaros frugívoros as dispersem em recomposições.
Que o acelerar do carvão como composição do solo e ar do Cerrado não supere suas vidas e aqueles que nele habitamos. Nós.
Ao experimentar em seus fazeres artísticos, Amanda Leite é um convite à reflexão. Na série exposta que nomeei atravessamento do humano, em que os registros na natureza se amparam na figura humana e esta se compõe na natureza, nos diz de um engendramento existencial que estamos nele inseridos. Ali, a artista nos convida novamente a refletir nosso encontro com a natureza, com o Cerrado. Encontro a nos tornar outros, e outros. Em devires constantes.
Gestos, movimentos, pedidos, fusões, composições a nos definir humanos. A nos fazer reagir na busca de uma aproximação perdida no asfalto, nas queimadas, no envenenamento constante da mãe natureza. Necessitamos continuar a acreditar na vida, seus ciclos, suas insistências.