Você já parou para pensar sobre o quão vale a pena sonhar e buscar fazer desse sonho uma realidade? Quando falamos sobre jovens atletas, a imagem que se passa é de um talento a ser lapidado a qualquer custo, que costuma se sobrepor a uma realidade muitas vezes invisível. Por trás das cortinas, os jovens passam por muitas pressões emocionais e psicológicas, que para um jovem não são normais. Amador (2018), dirigido por Ryan Koo, é um drama que explora essa realidade de forma profunda, trazendo à tona o dilema de um adolescente em busca do sucesso no basquete, mas confrontado com os custos desse sonho: a perda de sua identidade e o peso de ser tratado como um produto no sistema esportivo.
A história de Terron, um prodígio do basquete de 14 anos, é simples, mas marcante. Ele é um garoto da periferia que, ao ser descoberto por um olheiro de uma escola preparatória de elite, tem sua vida transformada. De um dia para o outro, Terron troca sua vida simples pela promessa de um futuro brilhante no esporte. A partir de então, sua vida vira de cabeça para baixo num mundo de cobranças na hipótese de se tornar um astro do basquete americano. Na prática, ele se vê num sistema que, ao invés de nutrir o seu talento, o vê apenas como produto de um mercado altamente lucrativo. A princípio, era uma oportunidade de ouro, mas será que vale a pena passar por tudo isso em busca do sucesso?
A história de Amador não é só sobre a carreira de um jovem com sede de realizar o seu sonho, mas também lança holofotes para esse sistema esportivo juvenil, onde as promessas de sucesso nem sempre coincidem com a realidade de sacrifícios pessoais e emocionais. O filme mostra o dilema de um talento precoce, como o de Terron, que vai sendo moldado para estrear em um mundo que obriga a transformar suas paixões em algo lucrativo, uma mercadoria a ser consumida. Esta crítica ao sistema é um dos pontos centrais da trama, que explora as dinâmicas complexas de expectativas e pressões sobre o jovem atleta.
O filme nos coloca no centro de um sistema que, ao invés de valorizar a essência do jovem atleta, se concentra apenas em seu potencial de gerar lucro e resultados financeiros. Terron, ao entrar nesse mundo do alto rendimento, começa a ser tratado como um produto – o “produto” de seu talento. Suas habilidades no basquete são o mais importante, e a expectativa sobre ele se torna cada vez maior. O foco em performance física e nos resultados rápidos gera um afastamento de sua humanidade e de suas emoções.
Em momentos do filme, é apresentado como o mundo esportivo coloca os jovens atletas em uma posição desconfortável, forçando-os a se moldar a um ideal que não necessariamente corresponde à sua verdadeira essência. Terron, ao ser inserido nesse novo ambiente, experimenta uma cultura diferente da sua realidade, pois, até então, ele estava acostumado com uma vida simples. Agora, ele se vê no meio de um universo onde a aparência, as roupas e o comportamento de um atleta profissional são mais valorizados do que a verdadeira essência do esporte, o que cria uma pressão sobre sua identidade original.
O filme também reflete sobre como essa pressão externa pode afetar a vida de um jovem atleta fora da quadra. Ao ser recrutado para uma escola de elite, Terron deixa de ser apenas um garoto que joga basquete e passa a ser uma promessa de futuro, uma peça no tabuleiro de um jogo que envolve dinheiro, prestígio e fama. Sua vida pessoal e suas emoções ficam em segundo plano, à medida que ele começa a ser tratado como um produto que precisa entregar resultados a qualquer custo. A complexidade dessa transformação é ilustrada pelo crescente distanciamento de Terron em relação à sua família e à sua comunidade, o que torna cada vez mais difícil para ele manter um equilíbrio entre suas raízes e as novas expectativas que pesam sobre ele.
Em Amador, a pressão que Terron enfrenta não é apenas física, mas, principalmente, psicológica. Embora ele seja um talento natural no basquete, o maior desafio do garoto não é o treino intenso ou os jogos em si, mas o conflito interno que surge ao tentar conciliar o que os outros esperam dele com o que ele realmente é. O filme explora com sensibilidade o impacto emocional que o ambiente competitivo tem sobre ele: ao mesmo tempo em que luta para se destacar no esporte, Terron se vê obrigado a abandonar uma parte de sua identidade.
A maneira como o filme lida com a dislexia de Terron é bem marcante. A condição não é apenas uma complicação acadêmica, mas uma metáfora para os desafios internos que ele enfrenta. Terron não só precisa dominar o basquete e se adaptar a um novo sistema educacional, mas também lidar com o fato de que, ao ser um prodígio, ele precisa se adaptar às novas expectativas das pessoas e da cultura ao seu redor. A dislexia, que impede Terron de interpretar instruções de maneira normal, reflete o quanto ele se sente deslocado e fora de lugar nesse novo ambiente. Esse desencaixe é parte do problema psicológico do personagem: até onde ele deve abrir mão de quem realmente é para se encaixar e se tornar o que todos esperam dele?
O filme também faz uma reflexão sobre o papel dos treinadores e dos familiares na vida de um jovem atleta. O treinador de Terron, Professor Gaines, por exemplo, é uma pessoa incerta. Embora ele se mostre preocupado com o desempenho de Terron, é evidente que ele só vê Terron como uma máquina de ganhar jogos. Ele representa o tipo de pessoa que prioriza o sucesso em vez de cuidar das necessidades emocionais e psicológicas do atleta. Nesse sentido, o relacionamento entre Terron e Gaines acaba sendo mais artificial do que genuinamente acolhedor, criando um ambiente em que o garoto precisa se adaptar constantemente para agradar à figura de autoridade de Gaines, que não se importa com seus sentimentos.
Um dos aspectos mais interessantes de Amador é como ele critica o ambiente do esporte juvenil, que transforma jovens como Terron em produtos. A busca interminável pelo sucesso e pelo ganho financeiro acaba gerando um ambiente em que o acolhimento individual do atleta é minimizado. O sistema que deveria apoiar e desenvolver os jovens talentos se torna, na verdade, um mecanismo que explora seus problemas.
Terron, ao ser transformado em uma estrela do basquete, se vê cercado por interesses de todos os lados. Sua vida pessoal, sua história e suas emoções ficam em segundo plano. O que importa agora é o que ele pode oferecer dentro da quadra. A pressão para corresponder a essas expectativas vai se acumulando, e a distância entre quem ele era e quem ele precisa ser aumenta cada vez mais. A perda de sua própria identidade ou a necessidade de se reinventar para se adaptar é um dos aspectos mais tristes de sua jornada. O filme deixa claro: em um sistema que exige alto desempenho a todo momento, a humanidade do atleta é muitas vezes sacrificada.
A transformação de Terron em um “produto” não é algo que acontece de uma hora para outra. Ela é contínua, fruto de um sistema que transforma os jovens talentos em ferramentas para gerar lucros. A escola preparatória, o treinador, os colegas de time e até a família do garoto se tornam parte desse problema, em que a identidade do atleta se dissolve em nome do sucesso. O filme nos lembra de que, por trás das estatísticas e vitórias, existe um ser humano com sentimentos, emoções e sonhos, e que, muitas vezes, esses pontos cruciais ficam esquecidos.
Amador é uma crítica à reflexão sobre o preço do sucesso no esporte. O filme questiona até que ponto vale a pena pagar o custo emocional e mental de se transformar em uma máquina de ganhar para realizar um “sonho”. Ao focar no desenvolvimento psicológico de Terron, o filme enfatiza uma análise das pressões que jovens atletas enfrentam dentro de um ambiente que muitas vezes coloca seus interesses e seu bem-estar em segundo plano. Embora o filme não forneça soluções fáceis, ele oferece um ambiente para que o público reflita sobre como as expectativas sociais, familiares e esportivas impactam a vida desses atletas.
No final, Amador não apenas conta a história de um garoto que quer chegar à NBA, mas nos lembra de que a verdadeira essência de um atleta vai além da vitória ou fama. A verdadeira vitória está em preservar a identidade e a dignidade ao longo do caminho, algo que o sistema esportivo, muitas vezes, falha em reconhecer.
Ficha Técnica:
Título Original: Amateur
Ano de Lançamento: 2018
Direção: Ryan Koo
Roteiro: Ryan Koo
Elenco: Michael Rainey Jr.; Josh Charles; Brian J. White; Tekola Cornetet
Gênero: Drama, Esporte
Duração: 1h 36min
Distribuição: Netflix
Sites utilizados para esta resenha
Poltrona Nerd – https://poltronanerd.com.br/filmes/critica-amador-entrega-uma-historia-bonita-mas-generica-69513/
Unir – https://www.ri.unir.br/jspui/handle/123456789/3308
Vórtex Cultural – https://vortexcultural.com.br/cinema/critica-amador/