“Além da Sala de Aula”: afetividade no processo de aprendizagem baseada em Wallon

Lançado em abril de 2011, com a direção de Jeff Bleckner, o filme Além da Sala de Aula é baseado em fatos reais e conta a história de Stacey Bess, que sonhou desde criança em ser professora e, aos 24 anos, enfrenta o desafio de lecionar pela primeira vez num projeto de ensino, em um abrigo para crianças em situação de vulnerabilidade social. O foco do filme está na relação que Stacey constrói com os alunos, formada com o alicerce da afetividade, que resulta em transformações biopsicossociais retratadas durante o longa.

Os desafios começam no momento em que a professora recém-formada chega para ministrar as aulas e se depara com um local totalmente inapropriado, com uma sala suja adaptada para ser a de aula, sem livros e estímulos visuais, sem iluminação, com partes da construção desmoronando e sem estrutura para a realização de atividades de ensino. Também há uma grande quantidade de crianças com variação de idade e falta de alimentação, o que dificulta a realização do trabalho. Ao perceber os obstáculos, Stacey pensa em desistir do projeto, mas decide transformar a vida e o processo de aprendizagem das crianças através da afetividade, relação professor-aluno e proporcionando recursos educacionais e de estrutura física mais adequados.

Segundo Wallon (1995), a criança “[…] atribui a emoção como os sentimentos, desejos e manifestações da vida afetiva, demonstra os sentimentos como um papel fundamental no processo de desenvolvimento humano”. O teórico sustenta que as emoções possuem um papel essencial para o desenvolvimento da pessoa por inteiro como consequência de uma construção dos conjuntos motor, cognitivo e afetivo, o que resulta na aprendizagem original.

Dentre as contribuições da professora para as transformações biopsicossociais estão a reforma física na sala, construção de mural com conteúdos lúdicos, a disponibilização de alimentos para que as crianças possam comer para se concentrarem mais e o trabalho com cantos temáticos que retratam suas personalidades para expressarem suas emoções.  Além de conversar com os alunos focando na afetividade e considerando a subjetividade, Stacey também requer a participação dos pais, o que fortalece os vínculos afetivos e cria novos significados para o processo de ensino-aprendizagem de forma integradora.

Fonte: encurtador.com.br/nvAM0 – Foto: Reprodução/Rede Globo

A professora Stacey Bess proporcionou mudanças significativas na vida das crianças e seus familiares, utilizando a construção de uma nova sala de aula para fortalecer a participação dos alunos e a afetividade para influenciar no desenvolvimento biopsicossocial dos mesmos. A Teoria da Afetividade de Wallon veio questionar o ensino tradicional com seu autoritarismo, falta de criatividade, forte característica abstrata, exigindo um aluno passivo, sem personalidade, e sem levar em conta o caráter afetivo, social e político da educação, pois, a escola, como um fato social, deve: “refletir a realidade concreta na qual esse sujeito vive, atua e, muitas vezes, procura modificar”. (LAKOMY, 2003 p.60).

Na visão do construtivismo, desenvolvida pelo psicólogo e epistemólogo suíço Jean Piaget, a aprendizagem é um processo e resultado entre fatores biológicos, psicológicos e sociais construídos ao longo de experiências e vivências, sendo um movimento biopsicossocial. No filme, a afetividade presente na relação professor-aluno, a mudança no ambiente físico, a colaboração e a motivação proporcionaram a realização de atividades lúdicas, o que intervém no processo de aprendizagem e vivências das crianças.

Com as modificações que a professora viabilizou, fica evidente que o vínculo afetivo interfere e contribui com o processo de ensino-aprendizagem demonstrando que a afetividade é um fator potente no desenvolvimento humano de forma biopsicossocial. Na concepção de Wallon (1968), a afetividade é vista como uma linguagem, pois o ser humano se comunica com o outro desde sempre.

Portanto, durante diversos contextos do filme “Além da Sala de Aula” é perceptível o quanto a afetividade interfere e resulta em implicações para a educação das crianças. A influência da afetividade contida na relação professor-aluno no processo de ensino-aprendizagem, bem como fatores como motivação, paciência, consideração da subjetividade, adaptação à situação vulnerável, consciência de classe e o incentivo resultaram no crescimento biopsicossocial e educativo das crianças.

A afetividade, as emoções, a paixão e os sentimentos presentes nesses momentos afetaram de forma positiva e contribuíram para o processo de aprendizagem, o que deve-se considerar a importância não apenas dos conteúdos ministrados, mas a relação construída entre a facilitadora e as crianças. O olhar de Stacy interfere na sua atuação e, consequentemente, faz com que os alunos se sintam mais acolhidos, valorizados e desenvolvedores de suas capacidades. A afetividade e as relações tornam-se, portanto, ponte para a qualidade e transformações biopsicossociais no processo de ensino-aprendizagem entre o facilitador e o aluno, assim como defende a perspectiva da teoria do filósofo, médico e psicólogo pós-construtivista Henri Wallon.

FICHA TÉCNICA

Fonte: encurtador.com.br/ntyBQ

Título Original: Beyond the Blackboard

Título no Brasil: Além da Sala de Aula

Ano: 2011

Dirigido por: Jeff Bleckner

Duração: 95 minutos

Gênero: Drama

Classificação: Livre

País de origem: Estados Unidos da América

REFERÊNCIAS

GALVÃO, Izabel. Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento infantil/Izabel Galvão. – Petrópolis, RJ ; Vozes, 1995. – (Educação e conhecimento)

WALLON, Henri. As origens do caráter na criança. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1995a.

LAKOMY, Ana Maria. Teorias Cognitivas da Aprendizagem. Curitiba: FACINTER, 2003.

Martins Tassoni, Elvira Cristina; da Silva Leite, Sérgio Antônio. Afetividade no processo de ensino-aprendizagem: as contribuições da teoria walloniana Educação, vol. 36, núm. 2, mayo-agosto, 2013, pp. 262-271 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Porto Alegre, Brasil.