Eu tive várias experiências com o Sistema Único de Saúde (SUS), algumas ruins outras boas, mas quero relatar sobre a melhor de todas que tive até hoje em minha vida. Tive o meu primeiro filho com 15 anos, e ele nasceu com pneumonia (pelo fato de não ter esôfago. Engoliu a urina que fez dentro da barriga e foi direto para o pulmão), devido a esse fato foi transferido para o hospital Dona Regina de Palmas –TO, e lá ele faz vários exames e raio-X, para verificar a proporção da pneumonia, só que foi nesse momento que o médico descobriu que ele havia nascido com Atresia Total de Esôfago.
E foi aí que começou nossas frequentes estadias e idas ao hospital. Ficou internado na U.T.I. desse mesmo local por 26 dias, e com apenas quatro dias de vida precisou passar por sua primeira cirurgia, para começar a se alimentar. Foi feita a cirurgia na qual, o médico fez uma pequena abertura (buraco) no pescoço para que a saliva tivesse por sair (para não cair direto no pulmão), e colocado uma sonda na barriguinha dele para que pudesse alimentar-se por ela.
Durante esses 26 dias tivemos todo o apoio dos médicos da U.T.I., do médico cirurgião pediátrico, do quadro de enfermeiros, nutricionista, psicólogas. Tinha uma base fortalecedora muito boa, em todos os âmbitos, um auxilio e um apoio por parte dessa equipe muito grande. Porém depois da alta, tínhamos que voltar no Hospital Dona Regina de 15 em 15 dias para fazer novos exames, para consultas pediátricas e consultas com o médico cirurgião. Esse processo quinzenal durou em média 4 meses, depois o período foi de 30 em 30 dias.
Quando o meu pequeno completou 1 ano e 6 meses, fomos avisados que ele iria partir para a segunda etapa do processo (de fazer um esôfago), ficamos internados antes da intervenção cirúrgica no hospital por duas semanas, para que todos exames fossem feitos, as dietas nutricionais adequadas fossem seguidas. Após todo protocolo seguidofoi realizada a segunda cirurgia, na qual o médico (fantástico) usou parte do intestino do meu filho e fez o esôfago, segundo ele foram feitas quatro emendas para que esse intestino se “transformasse” em esôfago. Porém a pequena abertura no pescoço agora eram duas, uma continuava sendo para a saída da saliva, e outra, a nova era o novo esôfago que estava preso ali, se ele vomitasse sairia por esse nova abertura (buraco), ele continuou com a sonda. Em meio a tudo isso, foram feitas duas dissecações de veias para que não fosse preciso fura-lo tantas vezes para passar o soro e os medicamentos.
Fui muito bem orientada sobre essas novas intervenções cirúrgicas, como deveria agir caso ele vomitasse (foi o que mais aconteceu). Foram longos anos nesse segundo processo, muitas idas e vindas ao hospital, consultas e exames a cada 30 dias, sem interrupções, mas sempre muito bem assistida pelo SUS. A última intervenção cirúrgica foi realizada dia 19 de abril de 2009, mas antes disso ficamos novamente internados no hospital para fazer os cabíveis procedimentos pré cirúrgicos. Em um desses momentos de “pegar” veia para colocar soro, teve um dia de muito sofrimento para todos, incluindo as enfermeiras do setor, ele foi furado 22 vezes, chorava tanto que no final já não mais forças, e só pedia para minha mãe orar pra Deus ajudar que desse certo. Muitas enfermeiras já estavam chorando junto conosco nesse momento difícil, mas deu certo.
Então dia 19 de abril ele foi operado pela última vez, Hospital Dona Regina, todas as cirurgias demoravam por volta de quatro horas e meia, porém essa demorou um pouco mais, eram horas e horas de espera por algum tipo de notícia, mas ela não vinha. Quando veio, foi dizendo que ele seria encaminhado às pressas para a U.T.I. do Hospital Geral de Palmas (HGP), foi um grande susto, mas novamente tivemos um grande apoio em todos os aspectos, não foi fácil, mas deu certo. Para nossa surpresa não foi tirada a sonda como imaginamos, ele continuava lá, e continuou por algum tempo. Ele precisava ficar sedado por dez dias, porque estava todo entubado, respirando por aparelhos, e era tão pequeninho ainda, não tinha nem 4 aninhos.
Assim começou as sedações na U.T.I. do H.G.P., ele ficou quietinho por dois dias, depois começou a se mexer, e a dose do sedativo foi tendo que ser aumentada cada vez, e não estava resolvendo, até que um dia eu chego no horário da visita (em U.T.I., não podia todo o tempo, ele dormia “sozinho”) ele estava com a mãozinhas e os pés amarrados, porque havia tentado tirar os tubos e os aparelhos que estavam ligados a ele.
A noite então o médico cirurgião (o mesmo sempre) me incumbiu de mais uma decisão difícil, segundo ele não poderia aumentar mais nenhuma gota do sedativo, pois ele já estava tomando dose de um adulto, e ele era apenas um “bebê”, ou tirava o sedativo e eu convencia esse bebê de três anos e poucos a ficar quietinho, sem mexer em nada que estava de estranho em seu corpo, pois se tirasse algum aparelho poderia morrer, ou continuar com o sedativo que poderia mata-lo. Claro escolhi pela retirado do sedativo, mas ele não ficou quieto, e tentava todo tempo tirar os aparelhos que lhe davam a sobrevivência.
Como previsto ele não ficou quieto, cheguei no outro dia e ele estava novamente amarrado, fiquei muito desesperada, as enfermeiras tentaram me acalmar, mas foi em vão. Mas um milagre aconteceu, ele ficou super quietinho, pois meu pai por telefone prometeu-lhe um cavalo quando ele saísse do hospital. Para nossa surpresa fomos transferidos novamente para o Dona Regina antes do esperado, devida a rápida recuperação que ele teve depois que tirou o sedativo e os aparelhos.
Voltamos, e lá ele ficou em um quarto separado, por alguns dias, depois fomos transferidos, para o quarto comum, mas ele pegou infecção hospitalar duas vezes, depois dessa transferência. Fomos novamente isolados em um quarto sozinhos e restringiram o contato, somente eu e minha mãe. A cirurgia que já tinha mais de 20 dias foi aberta no pescoço, devida uma das infecções, voltou a tomar vários medicamentos, e médico ia vê-lo duas ou três vezes ao dia. Foi um processo de uma semana muito longo, pareceu até mais, porém o médico achou melhor libera-lo, para que não pegasse mais nenhuma infecção hospitalar, mesmo com o pescoço aberto. Em meio todo esse processo ele ainda se alimentava por sonda.
Fomos para caso com vários tipos de medicamentos, em vários horários, o médico nos disse a seguinte frase “ele tem até um mês para se recuperar, e esse buraquinho no pescoço se fechar, ou senão teremos que fazer todo o processo novamente, desde o primeiro, e ele possivelmente não resistirá, antes ele era bem gordinho, hoje ele está bem magrinho”. Então fizemos nossa parte em casa e com 30 dias retornamos ao hospital, e o buraquinho havia fechado. Mas o médico então nos deu uma nova tarefa, “Vocês tem que faze-lo comer em 45 dias e retornem aqui dia 20 de setembro, pra eu ver ele comer pela boca.”
Durante esses dias íamos duas vezes na semana na fonoaudióloga, que o SUS nos disponibilizou, para auxiliar nesse processo, porém ele não obteve avanço com ela. Então paramos de ir e ficamos de casa tentando, minha mãe conseguiu fazer ele comer. Voltamos no médico dia 20 de setembro (no dia que ele completou 4 anos), e então ele disse que ele estava comendo bem pela boca, mas que iria continuar com a sonda até o próximo retorno com 30 dias, retornamos após esses dias e então a sonda enfim foi retirada.
Ele precisou fazer dilatações de esôfago por três vezes, fizemos todas disponibilizados pelo SUS, em Goiânia no Hospital das Clínicas. Essas dilatações tem o risco de estourar todas as intervenções cirúrgicas que ele já fez até hoje, mas é obrigatório faze-las, para que ele possa comer com mais facilidade. Pois o seu novo esôfago é como se fosse um canudo, não tem contração, não tem fechamento, é sempre um tubo liso. Devido esse fato ele tem refluxo desde antes dos 2 anos e terá para sempre.
Até hoje fazemos o acompanhamento com esse médico que operou desde a primeira vez, porém hoje com um espaço de tempo bem maior, nos últimos 4 anos, foram visitas anuais. Muito obrigada Deus, muito obrigada SUS, muito obrigada Dr. Renato.