Vida acadêmica: da expectativa ao enfrentamento de dificuldades

Josélia ingressou na faculdade no ano de 2014, com 39 anos de idade, havia concluído o ensino médio há mais ou menos 20 anos. Não obstante a mesma já tinha iniciado outros dois cursos superiores, mas não havia dado certo. Iniciou a faculdade de Psicologia com muitas expectativas, sonhos, como se estivesse indo para escola pela primeira vez. Josélia, além de ser acadêmica, era filha, mãe de dois filhos de 22 e 12 anos, esposa e empreendedora. Cursar Psicologia naquele momento era uma realização pessoal de muito, muito tempo atrás, um sonho que não foi possível realizar antes, mas agora tinha investimento, recursos e talvez tempo para arriscar a realizar este sonho.

Logo no primeiro semestre se deparou com uma disciplina muito complexa para quem há tanto tempo permaneceu afastada dos estudos. Foi neste momento que ela teve sua primeira frustração e desencanto, pois o seu rendimento acadêmico não foi um dos melhores, uma vez que sua nota foi baixíssima por ter dificuldade de assimilar o conteúdo e compreendê-lo. Para ela, a única explicação, foi o fato de ter passado tanto tempo acomodada no que tange aos estudos, mas afinal, quem sabia da sua história mais do que ela mesma? A resposta seria: “Naquele momento, apenas ela!”.

Logo após ter recebido o resultado de sua primeira avaliação, Josélia sofreu bullying por parte de um dos professores, foi chamada de burra, não só uma, mas várias vezes pelo fato de não entender a matéria. Tal professor fazia questão de dar o “atestado de burrice” a qualquer aluno(a) que demonstrasse falta de entendimento na sua disciplina. Josélia ficou estarrecida e volta e meia se questionava, como uma instituição de ensino daquele porte, com professores renomados, num curso de Psicologia, poderia ter esse tipo de comportamento?

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O que ocorreu naqueles primeiros momentos marcou profundamente a vida acadêmica e pessoal dela, seu sofrimento foi tanto que pensou em desistir. Certo dia, ao chegar à sua residência, trancou-se em um dos quartos e chorou descompassadamente como criança. O sentimento dela era de que o seu mundo havia desmoronado, o seu sonho havia se tornado um pesadelo. E não era apenas a pressão acadêmica que gerava sofrimento a ela, mas os vários papéis que tinha de desempenhar, como ser mãe, ser trabalhadora, ser esposa.

Infelizmente, ela se sentia só e não tinha uma rede de apoio suficiente para ter melhores resultados acadêmicos e se dedicar o suficiente aos estudos, como queria. Percebeu então que carecia de outros recursos além dos financeiros para poder se formar, como tempo para estudar e se dedicar.

 Seus familiares não entendiam o que havia acontecido, pois ela não tinha coragem de falar por vergonha de dizer que fraquejou, pelo baixo desempenho e pela vergonha que passou perante todos seus colegas de disciplina. Talvez eles nunca se dessem conta do quão imenso foi o sofrimento causado na vida dela. O mais doloroso foi ter que retornar às aulas como se nada tivesse ocorrido, mesmo ciente de que as mais profundas marcas de dor e tristeza não eram visíveis exteriormente, mas interiormente nela.

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É importante destacar que essa pressão, o excesso de demandas acadêmicas, às cobranças constantes da rotina universitária fizeram com que Josélia desenvolvesse sintomas que nunca sentiu antes, identificados por ela como reações psicossomáticas. Tristeza constante, paralisação, procrastinação, ansiedade excessiva, falta de confiança, baixa autoestima foram alguns dos sintomas que ela começara a desenvolver depois dessa experiência e de outras semelhantes.

Josélia após se dar conta de que sua longa caminhada estava apenas iniciando decidiu passar por cima de toda aquela dor para tentar ser melhor e mais forte. Assim o fez e mesmo com pouco apoio e se esforçando sozinha, vieram às avaliações, ela deu o máximo de si e conseguiu recuperar sua nota e ser aprovada no final. O mesmo professor que a humilhou perante todos, reconheceu os seus esforços e mudou seu posicionamento e sua percepção em relação à sua “burrice” no passado. A partir desse ocorrido, ela tornou-se uma nova estudante, mais dedicada, porém também, mais retraída.

Contudo, mesmo que ela tenha superado essa experiência, sequelas ainda permaneceram ao decorrer da trajetória acadêmica, pois outra situação semelhante a essa acabou passando. Um exemplo disso foi quando ela passou por procedimentos intensos de saúde para tratamento de hanseníase e mesmo passando mal por conta disso foi assistir aula. Na sala de aula, passou mal, chegando a evacuar na roupa por ter perdido o controle do esfíncter decorrente da dor no estômago que sentia e dos efeitos colaterais do tratamento (poliquimioterapia), após isso desmaiou. Após acordar, várias pessoas estavam ao seu redor juntamente com a professora.

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O tratamento da professora quanto a esse ocorrido foi bastante frio, distante e robotizado, como se fosse um procedimento automatizado e mecânico. Não se direcionou empaticamente a estudante, era como se a acadêmica fosse culpada por atrapalhar e interromper a aula (essa foi a visão dela e de muitas outras colegas diante da forma como a professora reagiu naquele momento). Durante esse período percebeu que já estava passando dos seus limites físicos, psicológicos e emocionais e que estava totalmente esgotada, mas pretendia continuar mesmo assim.

Ao decorrer dos semestres, Josélia percebeu que a rotina acadêmica exigia muito esforço e, portanto, é um cenário que pode ser desencadeador de adoecimento psíquico, e não era nada do que imaginava no começo. Mesmo passando por decepções dentro da faculdade, ela viu também outras vantagens, como enxergar a realidade em uma percepção diferente e até mais apurada da realidade a partir do aprendizado de conteúdos relacionados ao curso que escolheu.