Olá! Sou uma pessoa ansiosa. Não sei se o que estou fazendo é válido ao contexto em que ele será inserido, mas é que me deu uma vontade insuportável de falar sobre mim.
Sou acadêmico de Medicina e venho aqui para falar de ansiedade e dos transtornos que ela nos causa no dia-dia.
Já são 01h07 da manhã. Já tentei dormir, mas não consegui, pois minhas ideias não param desde que pensei em escrever algo sob o ponto de vista do ansioso.
Forgiarini e Ricci et al (2010) definem a ansiedade como se segue:
A ansiedade é um estado de humor desconfortável, uma inquietação e uma apreensão interna em relação ao futuro. Manifestações estas que levam a respostas somáticas, fisiológicas e psíquicas.
Sparks, Taylor e Dyer (2000) associam a ansiedade ao temor, geralmente ligado à morte ou à incapacidade de realizar uma tarefa. Porto (2009), fala que a síndrome ansiosa é uma das principais síndromes psiquiátricas e que costuma ser acompanhada de sintomas físicos. Ainda segundo autor, a ansiedade pode apresentar-se através de sentimentos de desrealização e despersonalização, medo de morrer ou de ficar louco, entre outros sintomas. Kaplan, Sadock e Grebb (2003), falam que a ansiedade pode se dá de forma normal ou patológica, mas a intenção deste é falar sobre questões rotineiras da ansiedade.
O pensamento insistente é uma das características da ansiedade e se me perguntarem se sofro com transtorno de ansiedade, não saberia responder. Mas a verdade é que, quando fico ansioso, isso me causa muitos transtornos. Um exemplo: a preocupação com coisas que não preocupariam a maioria das pessoas me deixa – como se diz: “Um pé no saco!”. Não sei o nome do autor da máxima citada, mas ela reflete exatamente como me sinto: fico muito chato. Isso sem falar da expectativa irritante que me acompanha. Tenho ataques de coceira (É mole uma porra dessa?). E para que tanta caspa? A minha cara fica parecendo estar repleta de “pano branco” e, nesse período, ninguém chega muito perto de mim, com medo de ser infectado por algum fungo maldito.
Aliás, os sintomas orgânicos relacionados com a ansiedade são vastos e, por vezes, inusitados. Kaplan, Sadock e Grebb (2003) ainda listam no Compêndio de Psiquiatria algumas manifestações periféricas da ansiedade: diarréia, hiperidrose, palpitações, síncope, urgência urinária e outras.
Sinceramente, a impressão que me dá é que ninguém tá nem aí para a minha doença. Ninguém se importa em entender o ansioso – e não estou falando de sentir pena – mas é que a ansiedade, para ser notada, tem de ser extrema. A pessoa tem que estar em quadros de pânico ou agorafóbicos (Casseta! Tenho que está quase morrendo para ser compreendido?).
Perceba só a diferença de quando se diz: “Estou muito ansioso!” ou “Estou deprimido”. O tratamento é totalmente diferente! A primeira situação, por vezes, é tratada como frescura; já na outra, o tratamento é mais acolhedor e carregado de atenção. Não estou dizendo que a depressão não deve ser vista com atenção. Ela é grave e deve ser tratada como tal quando, de fato, for DEPRESSÃO. Hoje, qualquer tristeza é confundida com ela, pois a depressão está muito banalizada. Mas o que eu tento dizer é que essa situação em particular nos remete ao jeito com que a saúde é tratada no Brasil: de forma meramente curativista.
A impressão que me cabe é que essa conversa de universalidade, integralidade e equidade, pregada pelo SUS (Sistema Único de Saúde), é conversa jogada fora. Principalmente a integralidade. As pessoas não querem se envolver no processo de adoecimento. Elas preferem te ver bem (saudável) ou ferrado (doente). Não percebo ninguém lutando pela manutenção da saúde mental, mas não raro vejo pessoas hospitalizadas em busca de uma “cura” milagrosa, quando não cabe mais a prevenção da doença. Em outras palavras, ninguém anda visitando um “quase doente”, mas se gasta tempo e dinheiro para ir ao velório de um ente querido.
Vale ressaltar que não estou criticando os movimentos psiquiátricos em si, esses foram e são importantíssimos para o SUS, pois acredito terem inspirado, por exemplo, a forma descentralizada com que a Estratégia de Saúde da Família trabalha hoje. Segundo Amarante (2007) esses movimentos, desde o final dos anos 60 e começo dos anos 70 quando de fato chegaram ao Brasil, lutam para que a atenção à saúde mental se dê mais no sentido da autonomia do que no da institucionalização. O que estou criticando é que, na prática, não se faz nada antes do indivíduo ter o diagnóstico de uma doença, como transtorno de ansiedade, no caso.
Para mim, o maior problema é lidar com as pessoas, com as quais eu geralmente me desgasto durante uma crise de ansiedade. Na verdade, não haveria necessidade de enfrentamento, pois tudo se resolveria por si só no dia seguinte ou horas depois. Mas a vontade de não deixar que nada de errado passe sem que seja citado é tão grande que -muitas vezes – ela me leva a demandas com pessoas que, geralmente, mais me ajudam do que eu a elas; ou com pessoas que julgo superiores a mim (meus pais e professores). Minha irritação já me causou algumas perdas (amigo, por exemplo). Sentimentos como inquietação psíquica, irritabilidade – por causa deste também já apanhei – falta de concentração e dificuldades com julgamento de terceiros são outros sintomas psíquicos que me deixam irritado. Kaplan, Sadock e Grebb (2003) também descrevem esses sintomas em sua obra.
O que espero desse trabalho é tornar possível a identificação de sintomas ansiosos e assim melhorar a convivência das pessoas. Espero que os amigos de pessoas que sofram com a ansiedade saibam reconhecer esses sintomas, de forma que os ansiosos tenham um tratamento mais justo, porque ficar ansioso não está na ordem da vontade: essa merda nos acompanha! Mas não se sintam obrigados a aguentarem o humor irritadiço do ansioso. De vez em quando vocês podem até mandar um “VAI SE FERRAR!”, desde que depois façam as pazes. O fato é que não se pode perder amigos sem que lhes seja dada a oportunidade de conhecerem essa tal ANSIEDADE.
Na real, a minha verdadeira intenção aqui é que um amigo, que há tempos perdi, possa encontrar este trabalho e, dessa forma, me perdoar.
Nota: o texto é resultado de uma atividade da disciplina de Psiquiatria, do curso de Medicina do ITPAC – Porto.