A história de Olga Benário Prestes suscita reações intensas. Os espectros políticos classificam-na desde uma heroína, mulher corajosa que estava disposta a morrer pelo que acreditava até uma farsa construída pela “esquerda”.
Passados 110 (cento e dez) anos de seu nascimento e 76 (setenta e seis) anos de seu assassinato, a vida, luta e morte de Olga Benário ainda suscita curiosidade, inspira militâncias e consagram-na como um dos maiores nomes dentro do comunismo na luta contra o nazifascismo.
Olga Gutmann Benário nasceu em uma família judia de classe média na cidade de Munique, Alemanha, no dia 12 de fevereiro de 1908. Filha de um advogado conhecido por ajudar os pobres, Léo Benário, que era afiliado ao Partido Social-Democrata Alemão. Sua mãe Eugénie Gutmann Benário era uma socialite que sempre deixou claro suas divergências em relação ao posicionamento político da filha.
Olga começou cedo na militância. Aos 15 (quinze) anos de idade começou a fazer parte do Grupo Schwabing. Esse grupo era formado por jovens com menos de 18 anos ligados à Juventude Comunista. Foi aí que Olga conheceu Otto Braun, um professor, com quem começou a namorar e aos 16 anos, se mudou com ele para Berlim.
Em Berlim, Olga passou a atuar mais ativamente na organização comunista, ocupou o posto de secretária de Agitação e Propaganda de Berlim, e alcançou o posto de uma das figuras mais importantes do Partido Comunista Alemão. Cada vez mais engajada na luta, e com a ascensão do fascismo, acabou por se envolver em confrontos diretos, nas ruas, com grupos nazistas. Após um desses confrontos, foi presa, em 1926, juntamente com o namorado Otto. Olga foi libertada antes que o namorado, e junto com a juventude comunista, liderou a remoção e fuga dele da prisão.
Por este motivo, Olga teve que fugir do seu país, e se refugiar em Moscou, na Rússia, onde ingressou na Internacional Comunista, e recebeu treinamento militar e formação política. Foi em Moscou que Olga conheceu Luiz Carlos Prestes. Ele residia em lá desde 1931 e em 1934, sendo membro do Partido Comunista Alemão, foi incumbido de voltar ao Brasil para liderar uma rebelião contra o governo de Getúlio Vargas e instalar um governo socialista. Olga ficou encarregada da sua proteção pessoal. O disfarce para a viagem era de um casal em lua de mel. Nesta missão, a ficção virou realidade e Olga e Prestes se tornaram um casal.
A Intentona Comunista, liderada por Prestes, não obteve o sucesso desejado. Em novembro de 1935, eles incentivaram a revolta armada no Rio Grande do Norte, que deveria ser seguida pelo restante do país, mas apenas as unidades de Rio de Janeiro e Recife aderiram. Getúlio Vargas estava pronto para esmagar a revolta, e o casal passou a viver foragido da justiça.
O esconderijo deles foi descoberto em março de 1936, e há relatos de que mesmo nessa hora, Olga colocou entre o marido e a polícia, cumprindo as ordens a respeito de sua proteção pessoal. Há quem diga que isso também foi a garantia de que o marido sobreviveria, dado o fato de que haviam ordens de que ele fosse levado morto às autoridades.
Olga foi levada para a Casa de Detenção e lá descobriu que estava grávida. Como estrangeira alemã, foi ameaçada de ser deportada. Isso significava a sua imediata morte, pois sendo judia e comunista (naquele momento a Alemanha tomada pelo nazismo), certamente seria enviada para um campo de concentração.
Os familiares de Prestes iniciaram um movimento internacional pela libertação do casal e Olga foi julgada, atendendo ao pedido que o governo nazista fez para sua extradição. Mesmo que sua defesa tenha alegado que a prisioneira estava grávida e sua deportação significaria colocar um filho brasileiro sob um governo estrangeiro, o Supremo Tribunal Federal aprovou o pedido de extradição de Olga Benário.
Getúlio Vargas, então presidente, não assinou seu indulto e Olga, com gravidez avançada, foi deportada para a Alemanha juntamente com Elise Saborovsky, sua amiga, conhecida como Sabo. Foi transportada no navio cargueiro La Coruña, e aportando, já era esperada pelos oficiais da Gestapo.
Olga deu a luz à sua filha (Anita Leocádia) na prisão Barnimstrasse e conseguiu ficar com ela até o final da amamentação. Cedendo à pressão internacional, o governo nazista entregou Anita à avó Dona Leocádia, mãe de Luiz Carlos Prestes.
Após a entrega de sua filha, Olga passou por campos de concentração, e de acordo com o Partido Comunista Brasileiro, desenvolveu atividades como aulas de ginástica e de história com as outras prisioneiras, como uma forma de resistir e exercer a solidariedade.
Em 23 de abril de 1942, já no campo de extermínio Bernburg, aos 34 anos de idade, Olga Benário Prestes foi assassinada em uma câmara de gás, juntamente com outras 199 prisioneiras. A família só receberia a notícia de sua morte em 1945.
A história de Olga Benário Prestes suscita reações intensas. Os espectros políticos classificam-na desde uma heroína, mulher corajosa que estava disposta a morrer pelo que acreditava até uma farsa construída pela “esquerda”. Não se pode negar, entretanto, que sua morte ocorreu em circunstâncias óbvias de privação de direitos e prevalência da vertente exponencialmente aumentada do fascismo, o nazismo.
Como milhões de judeus e judias, foi assassinada sob um governo que ignorava a democracia e acredita que as diferenças individuais deveriam ser condenadas. Atualmente, é possível observar, no mundo, vários governos ascendendo baseados no autoritarismo e desprezo aos direitos humanos.
Em resposta, várias Olgas também surgem. Pessoas corajosas que denunciam as atrocidades e que infortunadamente sofrem repressão e em diversos casos, são assassinadas por defenderem seus ideais. É preciso resistir e um trecho da última carta de Olga a sua filha Anita e seu marido, disponibilizada pelo Instituto Luiz Carlos Prestes, ela ensina isso dizendo:
Lutei pelo justo, pelo bom e pelo melhor do mundo. Prometo-te agora, ao despedir-me, que até o último instante não terão porque se envergonhar de mim. Quero que me entendam bem: preparar-me para a morte não significa que me renda, mas sim saber fazer-lhe frente quando ela chegue. Mas, no entanto, podem ainda acontecer tantas coisas… Até o último momento manter-me-ei firme e com vontade de viver. Agora vou dormir para ser mais forte amanhã (BENÁRIO, 1942)
A vida continuou, apesar de Olga não ter podido ver sua filha crescer, e nem se reencontrar com o esposo. Sua filha, Anita Leocádia Prestes é hoje uma historiadora, e publicou um livro sobre a vida da mãe, a partir dos documentos da Gestapo (a polícia alemã nazista).
Seguindo os passos da mãe, ela também se envolveu com a luta do pai e foi perseguida por seus ideais políticos. A semente que Olga plantou continua viva, com reconhecimento na Alemanha, no Brasil e no mundo, como exemplo de mãe que sofreu com o holocausto e de pessoa que está disposta a lutar pelos seus ideais.
Quem tem medo de Olgas, a ponto de querer, a qualquer custo, calar suas vozes, ainda não compreendeu que a despeito das adversidades, o sonho vale a luta.
REFERÊNCIAS CONSULTADAS
BENÁRIO, Olga. Ultima Carta de Olga Benário. 1942. Disponível em: <http://www.ilcp.org.br/prestes/index.php?option=com_content&view=article&id=93:ultima-carta-de-olga-benario&catid=29:sobre-olga&Itemid=158>. Acesso em: 17 jan. 2019.
FOLHA DE SÃO PAULO. São Paulo, 30 maio 2017. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2017/05/1888523-filha-de-olga-benario-narra-morte-da-mae-a-partir-de-arquivo-da-gestapo.shtml>. Acesso em: 17 jan. 2019
MENDES, Giovana Oliveira. Olga Benário em duas narrativas biográficas: da história para a ficção. 2014. 143 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Letras, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2014. Disponível em: <https://repositorio.ufsm.br/bitstream/handle/1/9901/MENDES%2C%20GIOVANA%20OLIVEIRA.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 17 jan. 2019.
O GLOBO. [s.i], 03 jun. 2017. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/cultura/livros/livro-traz-revelacoes-do-arquivo-da-policia-nazista-sobre-olga-benario-21430770>. Acesso em: 17 jan. 2019.