Thoreau: queijo ou escritor?

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DESEJO dizer uma palavra em nome da natureza, em nome da liberdade absoluta, em nome da amplidão, que contrastam com a liberdade absoluta, em nome da amplidão, que contrastam com a liberdade e a cultura das cidades – no sentido de considerar o homem como um habitante da natureza, ou parte e parcela dela, e não como um elemento da sociedade (THOREAU, 1950, p. 1)

O filósofo norte-americano Henry David Thoreau (1817-1862) acreditava que “todas as coisas boas são selvagens e livres”, que as leis do homem suprimem em vez de proteger as liberdades civis e que era dever do individuo protestar contra as leis injustas. (BURNHAM; BUCKINGHAM, 2011, p. 204). Por ter ideias como estas, é considerado o pai do anarquismo.

Às margens do lago Walden, em Massachusetts, nasce o livro Walden, o qual foi atributo ao seu irmão já falecido John. Este é um dos livros mais importantes, juntamente com o livro Desobediência Civil (L&PM, 2016). Em sua obra Walden (1854), Thoreau apresenta um ensaio sobre a vida simples, modesta e natural, embasado no “desejo de simplificar a sociedade e eliminar as desnecessárias complexidades da vida contemporânea”.

Em seu livro Desobediência Civil (1849), Thoreau coloca “o julgamento final sobre qualquer ato no âmbito da consciência do indivíduo e demonstrando claramente a incapacidade do governo” (WOODCOCK, 2006, p. 242). Thoreau introduz com o lema “o melhor governo é aquele que menos governa” (THOREAU, 1950, p. 1); levado ao limite, esse lema seria abrangido para “o melhor governo é o que não governa de modo algum” (idem). Essa seria a forma de governo, para quando os seres humanos estivessem preparados.

O próprio governo, que é simplesmente uma forma que o povo escolheu para executar a sua vontade, está igualmente sujeito a abusos e perversões antes mesmo que o povo possa agir através dele (IDEM).

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Os homens passam a desenvolver no estado o papel das máquinas. Polícias, exército, os carcereiros e assim por diante. É comum que tais homens, sejam apreciados como bons cidadãos, apesar que, para o estado não são mais que um espantalho, cachorro ou pedaço de madeira (THOREAU, 1950). Há outra parcelas de homens que servem ao estado com a cabeça, são os legisladores, políticos, advogados, funcionários e dirigentes, Thoreau confronta que provavelmente “eles sirvam tanto ao Diabo quanto a Deus – sem intenção -, pois raramente se dispõem a fazer distinções morais” (IDEM). E por fim, há os homens que servem com a consciência, este são os heróis, os patriotas, os mártires e reformadores. Em síntese “a massa de homens serve ao Estado não na sua qualidade de homens, mas sim como máquinas, entregando os corpos” (IDEM).

Thoreau: na natureza selvagem

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O drama Na Natureza Selvagem (Into The Wild, 2007), dirigido e roteirizado por Sean Penn, baseado no livro (1996) de mesmo nome do autor Jon Krakauer, narra a história do jovem Christopher McCandless (Emile Hirsh) que trocou a vida agitada na cidade e as cobranças sociais pela morosidade da vida simples na natureza, mudando seu nome para Alexander Supertramp, e ainda descartou documentos pessoais e dinheiro. A atitude tomada representa uma cisão com a sociedade e consequentemente com sua família, sendo um protesto individual, que Thoreau denominava “a ação por princípio” que para ele “era por si só “essencialmente revolucionária”: todo homem deveria agir de acordo com a sua consciência e não em obediência às leis criadas pelo Estado” (WOODCOCK, 2006, p. 242).

Em paralelo com a caminhada de Supertramp, Thoreau apresenta um ensaio nomeado Walking, com suas traduções em “Andar a pé” ou mesmo, “Caminhada”. Neste ensaio (THOREAU, 1950) o autor discorre sobre as façanhas e historietas de andar a pé. Por sua vez é o estilo de vida elegido por Supertramp. Estar ao sol, ao vento, entre as árvores, no bosque e na floresta é para o homem, a liberdade e o encontro consigo. O aprender e o desenvolver, entrar em contato com a vida. Muito tempo trancado em casa ou prédio desenvolve no ser humano uma hipersensibilidade. Em contraposição, em contato com as adversidades da natureza, gera no homem capacidade de se adaptar e suportar problemas/dificuldades. Esse homem na e da natureza é o ser humano que se desenvolve de forma plena. O ser humano da cidade apresenta uma pele fina e sensível; assim como a pele é o contato com o mundo, também é dessa forma homem o contato com o mundo, com o outro e consigo, de forma sensível, delicada, e cuidadosa.

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Supertramp, durante a sua aventura, registra em um diário o contato com a natureza e com outras pessoas que encontra ao longo de sua jornada. Essa sua conduta possivelmente foi inspirada na experiência de Thoreau narrada em seu livro Walden, que relata acontecimentos corriqueiros vivenciados num período de dois anos em que ele esteve solitário. Algo que também se torna interessante na fala de Supertramp, e que, pode ser percebido talvez como fundamental na existência humana, é quando ele relata que ‘’a felicidade só é verdadeira se for  compartilhada’’. Essa frase pode levar o leitor a repensar, após conhecer a jornada vivenciada pelo sujeito, de que cada um de nós precisamos estar atentos as consequências de nossas escolhas e a valorizarmos cada passo de nossas jornadas e relacionamentos que surgem ou sugira nesse processo.

O protagonista do filme, inspirado em autores como Tolstoi, Thoreau e Lord Byron, deixa a proteção da família em busca de viver verdadeiramente, pois apenas na natureza o ser humano consegue encontrar e experienciar o real sentido da vida, já salientava Thoreau (1950).

(Des)curso

Thoreau teoriza que os seres humanos estão vivendo apenas de acordo com as leis dos homens, deixando de lado experiências que podem servir para ampliar e fortalecer mente e corpo dos sujeitos. O autor deixa claro que a convivência com a natureza pode levar o homem a se tornar um ser que consegue se adaptar melhor ao meio que vive, desenvolver soluções para as dificuldades e tornar-se menos frustrado com a vida.

Este teórico com seus postulados desestabiliza o indivíduo contemporâneo, ao colocar sobre sua ótica o real sentido de estar vivo contrapondo-se ao ideal publicizado nas mídias, ao discurso preconizado pelo modelo econômico. Convida a todos a se desprender do comum, sair da zona de conforto, adentrar na Natureza desvelado para desvelar sua identidade.

 Os pensamentos de Thoreau vêm tornando-se um grito de protesto contra a hipocrisia, as falácias e a superficialidade das relações humanas deterioradas pelo instituído.

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A experiência cinematográfica e literária fomentou nos acadêmicos um novo olhar sobre a natureza/homem, a vida mais simples, sendo uma atitude oposta á conduta socialmente aceita, superando, talvez, este “velho” paradigma, de uma vida convencional, com seus padrões de comportamento e consumo.

Por seu enredo instigante e atemporal o filme se torna uma experiência sensorial- certamente influenciado pela excelentíssima trilha sonora de Eddie Vedder- assisti-lo novamente é inevitável. O telespectador identifica-se com a vivencia e decisões dos personagens, levando-o a uma reflexão das escolhas e suas consequências, certamente o longa não despertará o mesmo tipo de reação em cada um que o assistir, no entanto não há como ficar indiferente a ele.

Referências

BURNHAM, Douglas.; BUCKINHAM, Will. O livro da Filosofia. Editora Globo, São Paulo, SP, 2011.

THOREAU, Henry David. Andar a pé. Rio de Janeiro: Domínio Público, 1950. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/andarape.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2016.

L&PM. Thoreau. Vida e Obra. Disponível em: <http://www.lpm.com.br/site/default.asp?TroncoID=805134>.Acesso em: 25 mar. 2016.

NA NATUREZA SELVAGEM. Direção de Sean Penn. Produção de Art Linson, Sean Penn, William Pohlad. Eua: Paramount Pictures, 2007. Son., color.

WOODCOCK, George. História das ideias e movimentos anarquistas – v.2: O movimento.Porto Alegre: L&PM, 2006.