A Psicologia Jurídica na mediação de conflitos

A Psicologia se relaciona intimamente com o ser humano em seu aspecto mais íntimo: “De acordo com o conceito fornecido pela Associação Americana de Psicologia, a psicologia é a ciência que tem por objeto o estudo das funções mentais e do comportamento” (LORDELO, 2017). Na discussão dos métodos de resolução de conflitos, ela ajuda a compreender a verdadeira intenção das partes com o processo, muitas vezes saindo do aspecto jurídico e abarcando interesses derivados das relações e interações sociais.

Ultimamente, percebe-se uma ampla comunicação entre a Psicologia e a área jurídica, derivada da necessidade de melhor compreender o comportamento humano. A interface da Psicologia com o Direito constitui a Psicologia Jurídica, que até então, vem delimitando seu campo de atuação, contribuindo com a ampliação entre essas duas ciências, permeando pelas seguintes varas da jurisdição: varas da infância e da juventude, vara da família, direito do trabalho, direito penal e direito civil, dentre outras (SILVA, 2012).

O que se pretende com a colaboração entre a Psicologia e o meio jurídico é atingir a justiça de maneira justa, capaz de satisfazer as necessidades do povo, pois o desígnio é resolver o conflito de fato e não só extinguir o processo. Os métodos alternativos de resolução de conflitos, exemplificados posteriormente no presente trabalho pela conciliação e mediação, já são utilizados por todo o país na intenção de amenizar a situação do Judiciário.

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Conforme Müller (2005), a Mediação de Conflitos é uma técnica de resolução na qual os assistidos buscam ou aceitam a intervenção de um terceiro imparcial e qualificado, o mediador. Esse facilitador os auxilia por meio da reabertura do diálogo a encontrar soluções criativas e alternativas para o conflito, na qual ambos ganhem. Portanto, na mediação a decisão não é imposta por um terceiro. E esse é um aspecto significativo e diferencial de seu procedimento: não é o mediador quem trará a solução como ocorre na justiça estatal mas sim as próprias partes.

Assim, a mediação é um método de solução de conflito pelo qual um terceiro neutro facilita o diálogo entre as partes para ajudá-las a chegar a um acordo (HIGHTON & ÁLVAREZ, 1999). Uma de suas peculiaridades, segundo Müller (2005), é a capacidade de expansão das discussões tradicionais que são feitas para chegar a um acordo, ampliando-as para além das questões jurídicas envolvidas, como já foi dito.

Em conflitos familiares (guarda e visitação dos filhos), a mediação familiar se apresenta como um instrumento amplamente favorável para as partes e para o Judiciário, uma vez que as próprias partes chegaram à resolução pacífica de seus conflitos sem a necessidade de embate judicial que demora vários anos para serem resolvidos, contribuindo de forma eficaz para o exercício da guarda compartilhada.

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Determinadas situações da vida humana requerem a atuação de profissionais de diferentes áreas do conhecimento, assim como ocorre com a criminalidade, a pobreza e a família. De acordo com Maria Berenice Dias (2011), no que se refere à família, torna-se relevante o envolvimento conjunto de vários profissionais das áreas jurídica, sociológica, psicológica, de serviço social, etc. Desta forma, “o aporte interdisciplinar, ao ampliar a compreensão do sujeito, traz ferramentas valorosas para a compreensão das relações dos indivíduos, sujeitos e operadores do direito, com a lei” (DIAS, 2011, p. 84).

A mediação, utilizando técnicas da Psicologia, tais como o rapport, resumo e enquadre, amplia e torna mais compreensíveis as diversas mensagens e mostra a importância da escuta ativa, da interpretação do que está por detrás do discurso, da linguagem corporal etc. 

Na mediação, a comunicação é ponto fundamental. Dado que as partes estão submetidas a uma autocomposição, sem o diálogo eficaz a solução do conflito não se materializa (BACELLAR, 2016). Pode se dizer que todo o processo é envolto das técnicas comunicacionais, pois as partes sozinhas, a partir de uma conversa bem estruturada, terão mais chances de chegar a um consenso.

Como preleciona Rosemberg (2006), o método da comunicação não violenta deve ser aplicado em todas as áreas do convívio social, acolhendo conflitos pessoais, como uma briga entre amigos, e de repercussão internacional, como a questão da Palestina: “É um processo poderoso para inspirar conexões e ações compassivas. Ela oferece uma estrutura básica e um conjunto de habilidades para abordar os problemas humanos, desde os relacionamentos mais íntimos até conflitos políticos globais.” (ROSEMBERG, 2006, p.357).

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A falta de comunicação entre as partes ou uma comunicação não apropriada criam mais conflitos e tornam difícil a realização da mediação. Para isso, “em mediação, a comunicação deve ser direta, autêntica, desprovida de artifícios e de jogos de poder” (ÁVILA, 2002).

A Psicologia auxilia a interpretação dos diálogos travados entre as partes, influindo diretamente no desfecho da situação conflituosa. A conciliação de ideias que envolve cada caso concreto levado à apreciação do Poder Judiciário deve ser compreendida integralmente para chegar à finalidade de pacificação social visada. Diante disso, há perfeita harmonia da Psicologia com o Direito, uma vez que o objeto para o qual se volta o estudo daquela é justamente o comportamento humano, sendo este incisivo no momento de proceder à solução das contendas sociais.

Uma das possibilidades de trabalho de psicólogos em contextos jurídicos é nos processos de Mediação Familiar. Segundo Ávila (2002), a mediação familiar proporciona uma separação menos traumática e mais humana, considerando que as formas tradicionais de finalizar um casamento ou união estável não estão suprindo as reais necessidades dos envolvidos e de seus filhos.

A mediação familiar no contexto de separações judiciais surge, parafraseando Ávila (2002) como, “uma forma inovadora de abordagem jurídica e também como alternativa ao sistema tradicional judiciário para tratar de conflitos”, na qual dois aspectos são fundamentais: a cooperação entre as partes e a disponibilidade de solucionar o conflito para que aconteça um acordo entre os envolvidos.

REFERÊNCIAS

ÁVILA, E. M. (2002). Mediação familiar. Florianópolis: Divisão de Artes Gráficas do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. ed. São Paulo (SP): Saraiva, 2016.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. São Paulo: RT, 2011.

HIGHTON, E. I., & ÁLVAREZ, G. S. (1999). A mediação no cenário jurídico: Seus limites &– A tentação de exercer o poder e o poder do mediador segundo sua profissão de origem. Em D. F. Schnitman, & S. Littlejonh (Orgs.), Novos Paradigmas em mediação (pp. 185-206). Porto Alegre: Artmed.

LORDELO, João Paulo. Noções gerais de direito e formação humanística. Salvador (BA): Juspodivim, 2017.

MULLER, F. G. (2005). Competências Profissionais do mediador de conflitos familiares. Dissertação de Mestrado. Programa de pós-graduação em Psicologia, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC.

ROSEMBERG, Marshall Bertram. Comunicação não violenta: técnicas para aprimorar relacionamento pessoais e profissionais. São Paulo (SP): Ágora, 2006.

SILVA, D. M. P. Psicologia Jurídica no Processo Civil Brasileiro: a interface da psicologia com o direito nas questões de família e infância. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. 

Psicóloga egressa do CEULP/ULBRA e pós-graduanda em Terapia Cognitiva Comportamental.