Aborto e morte materna, um tema emergente

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O Brasil tem sido palco de muitas discussões acerca da descriminalização do aborto, mas essas discussões são permeadas de questões morais e religiosas que dificultam o amplo aprofundamento do tema como sendo de saúde pública

O Organização das Nações Unidas (ONU) propôs a redução da mortalidade materna como meta do quinto Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, diante disso, ao verificarmos o recorte do Brasil na redução da mortalidade materna especificamente por aborto é ainda mais complexo, já que ele ocupa um lugar entre as cinco principais causas que levam mães ao óbito no país (MARTINS et al, 2017).

O Brasil tem sido palco de muitas discussões acerca da descriminalização do aborto, mas essas discussões são permeadas de questões morais e religiosas que dificultam o amplo aprofundamento do tema como sendo de saúde pública (LIMA, 2017). As dificuldades em debater o tema são provenientes sobretudo da  frente conservadora que encara o assunto com perspectivas religiosas, ignorando totalmente a laicidade do Estado.

Diante de um cenário onde o aborto é considerado crime percebemos que às mulheres ficam em desamparo quando decidem interromper voluntariamente a gravidez, desse modo tendem a buscar meios ilegais e consequentemente inseguros para aquelas que não podem pagar (LIMA, 2017). Segundo Martins (2017), no que tange a mortalidade materna decorrente do aborto, os dados denotam que mulheres com menor grau de instrução e negras sustentam o peso do óbito por aborto que é resultado de uma “iniquidade em saúde”.

Fonte: encurtador.com.br/fqHKL

No Brasil o aborto pode ser realizado em casos de estupro ou quando há risco para a mãe decorrente a má formação do feto, porém conforme Madeiro e Diniz (2016), as mulheres que procuram o serviço de aborto legal enfrentam muitas dificuldades e empecilhos, visto que me casos de estupro, o depoimento da vitima é sempre contestado e sofre inúmeros ataques para constatar a veracidade do mesmo, o que propicia maior fragilidade para essas mulheres que já estão vulneráveis emocionalmente.

Madeiro e Diniz (2016) denotam que até mesmo no que corresponde a formação da equipe básica para realizar o aborto legal tem sido algo difícil devido a possibilidade de que o profissional se recuse a realizar o procedimento por ter crenças e valores que considerem errado. Desse modo, notamos que essas mulheres sofrem inúmeras violências seguidas e continuas até conseguirem realizar o aborto legal, e muitas delas desistem por causa de tantas dificuldades e por estarem bastante fragilizadas para lidar com todo esse processo burocrático.

O procedimento de aborto legal ainda enfrenta outras variáveis de caráter geográfico, institucional ou de consciência dos profissionais responsáveis, pois em muitos municípios não há o atendimento instalado e funcionando da maneira correta, o que impacta que essa mulher tenha que se deslocar para outras cidades e até mesmo para outros estados para realizar o aborto legal (MADEIRO e DINIZ, 2016).

No recorte social de mulheres que estão às margens da sociedade e da assistência à saúde de qualidade nos deparamos com o gigantesco risco de óbito de mulheres que devido a falta de oportunidades e escolhas teve que optar pelo aborto inseguro (LIMA, 2017). Mulheres negras e pobres morrem mais no aborto inseguro do que outros recortes sociais e do que outras mulheres que ocupam outros marcadores sociais, pois conforme Martins (2017), que ao longo da história, mulheres negras sempre tiveram maiores dificuldades para acessar o serviço de saúde no que tange o direito sexual e reprodutivo, desse modo não é surpresa que elas sejam quem mais morrem ao realizar aborto no Brasil.

Fonte: encurtador.com.br/xDV29

Referências

MADEIRO, Alberto Pereira; DINIZ, Debora. Serviços de aborto legal no Brasil – um estudo nacional. Ciênc. saúde coletiva,  Rio de Janeiro ,  v. 21, n. 2, p. 563-572,  Feb.  2016 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232016000200563&lng=en&nrm=iso>. Acessado em  01  Dezembro  2019.  http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015212.10352015

MARTINS, Eunice Francisca et al . Causas múltiplas de mortalidade materna relacionada ao aborto no Estado de Minas Gerais, Brasil, 2000-2011. Cad. Saúde Pública,  Rio de Janeiro ,  v. 33, n. 1,  e00133115,    2017 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2017000105009&lng=en&nrm=iso>. Acessado em  01  Dezembro.  2019.  Epub Feb 13, 2017.  http://dx.doi.org/10.1590/0102-311×00133116.

LIMA, Nathália Diórgenes Ferreira. EXPERIÊNCIA E DIFERENCIAÇÃO NOS PROCESSOS DECISÓRIOS DE MULHERES JOVENS QUE RECORRERAM AO ABORTO ILEGAL. Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

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CFP se posiciona a favor da descriminalização e legalização do aborto no Brasil

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STF discute liberação do aborto até a 12ª semana de gestação

O Supremo Tribunal de justiça (STJ) intensifica debate sobre a descriminalização e legalização do aborto no Brasil. O Debate é construído por pessoas favoráveis e contrárias a legalização. O aborto é proibido no Brasil respaldado pelo artigo 128, incisos I e II do Código Penal Brasileiro. Hoje o aborto só é permitido em três casos: feto anencéfalo, estupro e/ou que cause risco à vida da mulher.

De acordo com a Folha de São Paulo, em dez anos, o Brasil teve entre 9,5 e 12 milhões de abortos provocados. Sendo estimado que exista meio milhão de abortos clandestinos por ano no país e que provavelmente 50% tem complicações. Resultando em um gasto de R$ 500 milhões, pelo SUS, em uma década.

Diante do cenário, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) se posiciona a favor da descriminalização e legalização do aborto no Brasil. Em carta o CFP se posiciona: ‘A autonomia das mulheres sobre seus corpos deve ser ampliada para que as mesmas tenham condições de decidir ou não interromper uma gravidez. A Psicologia deve se posicionar agindo sobre as situações que favorecem situações de vulnerabilidade social e psicológica, que provocam intensas situações de sofrimento psíquico, como é o caso da manutenção de uma gravidez que não foi escolhida pela gestante’. A carta aberta pode ser lida na integra no endereço https://site.cfp.org.br/cfp-defende-descriminalizacao-legalizacao-aborto-brasil/ .

Fonte: encurtador.com.br/mopvC

Joice Reitz, acadêmica de Psicologia do CEULP – ULBRA, se posiciona: ‘Sou a favor da legalização do aborto por que percebo, com o estudo que tenho do assunto, que temos muito mais a ganhar com isso. Entendo o choque inicial que a proposta pode causar na população, mas basta parar um pouco para pensar e perceber que, além de maior autonomia feminina, a prática legalizada vem para melhorar questões de saúde pública, uma vez que a mesma permite toda uma estrutura para a mulher que deseja o aborto, com apoio médico (não de açougueiros clandestinos), psicológico e social. Não dá mais para fechar os olhos para este assunto. Todos sabem que a prática ocorre a todo o momento e em todo lugar. A legalização dessa prática não se trata de uma ação “demoníaca” e “pecadora” como muitos alegam (e cabe aqui ressaltar que o Estado é laico), mas se trata de uma ação que dá visibilidade para uma realidade triste, dura e camuflada. Nosso país precisa de representantes políticos e cidadãos que tomem decisões e tenham posturas e atitudes livres de suas crenças pessoais, que sejam capazes de pensar no todo, no coletivo, e não somente no próprio umbigo.“

REFERÊNCIAS

TUROLLO, Reynaldo. STF começa debate sobre legalização do aborto até 12ª semana de gravidez. Disponível em < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/08/stf-comeca-debate-sobre-legalizacao-do-aborto-ate-12a-semana-de-gravidez.shtml > acessado em 03/08/2018.

COLLUCCI,Cláudia. FARIA, Flávia. SUS gasta R$ 500 milhões com complicações por aborto em uma década. Disponível em < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/07/sus-gasta-r-500-milhoes-com-complicacoes-por-aborto-em-uma-decada.shtml acessado em 03/08/2018.

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