A Solidão do “Criador” em Rick and Morty

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A série animada “Rick and Morty” é conhecida por sua capacidade de abordar uma vasta gama de temas, muitas vezes com uma abordagem filosófica e crítica. Foi criada por Justin Roiland e Dan Harmon, dois criadores com trajetórias distintas, mas complementares, que se uniram para desenvolver uma das séries de animação mais influentes e populares dos últimos tempos. A série combina a estrutura da ficção científica clássica com um humor sórdido, explorando questões profundas sobre a existência, a moralidade e a condição humana. Tudo isso,  envolta em enredos aparentemente absurdos e hilários.

Uma das principais características da série é a exploração do conceito de multiverso, em que inúmeras versões de realidades alternativas coexistem. Isso permite à série explorar questões sobre identidade, livre-arbítrio e o impacto de nossas escolhas. Em vários episódios, Rick e Morty encontram versões alternativas de si mesmos e lidam com as consequências de suas ações em diferentes realidades. A série frequentemente satiriza aspectos da sociedade moderna, incluindo consumismo, religião, política e o papel da ciência. Rick, com seu cinismo extremo, frequentemente faz críticas contundentes sobre o sentido da vida, questionando valores morais e instituições sociais. Essa abordagem filosófica lembra o niilismo, Rick demonstra uma visão de mundo onde nada tem importância intrínseca, o que contrasta com a tentativa de Morty de encontrar significado e propósito.

No centro de Rick and Morty está a dinâmica disfuncional da família Smith. As interações entre Rick, Morty, Summer (a irmã de Morty), Beth (a mãe) e Jerry (o pai) são uma fonte constante de conflito e drama. A série usa essas relações para explorar abandono, auto-estima, fracasso, e o impacto de traumas geracionais. Apesar do humor sombrio, a série frequentemente revela momentos de vulnerabilidade e afeição entre os personagens, no qual surpreende as expectativas do público sobre o que significa ser uma família.

A série também mergulha em questões de psicologia e existencialismo. Rick, em particular, é um personagem complexo que luta com depressão, alcoolismo e uma visão niilista da vida. Ele é uma representação do “herói trágico” moderno, cuja genialidade é também sua maldição. A série aborda como o intelecto superior: “O Criador”. Este fato o isola dos outros e o deixa preso em um ciclo de autodestruição e vazio existencial.

Embora trate de temas significantemente pesados, Rick and Morty é, acima de tudo, uma comédia. O humor da série é frequentemente absurdo, misturando elementos de cultura pop, ciência e paródias de outros gêneros. A série não tem medo de ser provocativa ou bizarra, utilizando desde piadas simples até referências intelectuais complexas, muitas vezes desafiando o espectador a refletir sobre o significado por trás da comédia.

O que indaga muitas vezes as pessoas se identificarem com essa série, com isso é perceptível que são personagens multifacetados. Dito isso, Rick é um gênio alcoólatra com uma visão cínica da vida, enquanto Morty é um adolescente inseguro lutando para encontrar seu lugar no mundo. Essa complexidade permite que os espectadores se vejam em diferentes aspectos de suas personalidades e lutas.

Apesar do cenário e do humor, a série explora temas universais como o propósito da vida, a busca por significado e a complexidade das relações familiares. Essas questões são abordadas de uma forma que, embora muitas vezes exagerada, compartilha com as experiências e sentimentos do público. Rick and Morty, frequentemente faz comentários sobre a sociedade e a cultura de forma crítica e irônica. Essa crítica, muitas vezes disfarçada de humor, pode fazer os espectadores refletirem sobre suas próprias vidas e o mundo ao seu redor.

Rick: Entre Amor e Controle

No episódio “Auto Erotic Assimilation” de Rick and Morty, a relação entre Rick Sanchez e Unity ilustra complexas dinâmicas de controle e poder dentro dos relacionamentos. Unity, uma entidade coletiva que inicialmente parece ser a solução perfeita para as necessidades emocionais e intelectuais de Rick, acaba se tornando uma metáfora poderosa para explorar o controle narcisista e os impactos sobre a identidade pessoal.

Rick, como uma figura narcisista, utiliza seu relacionamento com Unity para atender suas próprias necessidades de validação e controle. Ele manipula Unity para moldar um mundo ao seu redor que se ajuste às suas próprias expectativas e desejos. Essa dinâmica é analisada por Daniel Martins de Barros em seu livro “O Lado Bom do Lado Ruim”, onde ele explora como situações difíceis podem revelar aspectos de crescimento pessoal e autodeterminação. Barros destaca que “a capacidade de manter a autonomia, mesmo em cenários desafiadores, é essencial para o bem-estar emocional” (Barros, 2020, p.127). Essa afirmação ecoa a luta de Unity ao tentar manter sua própria identidade, enquanto Rick tenta controlá-la.

Unity, por outro lado, enfrenta um dilema emocional significativo. Inicialmente, a assimilação de outras consciências e a adaptação ao desejo de Rick parecem oferecer uma forma de felicidade e integração. No entanto, à medida que Unity começa a recuperar sua própria identidade e questionar o controle de Rick, ela se depara com um conflito interno sobre manter sua integridade ou se submeter novamente ao controle de Rick. Segundo Barros, “a preservação da identidade em contextos de pressão emocional é fundamental para a saúde mental e para a realização pessoal” (BARROS, 2020, p. 128). A decisão de Unity de se afastar de Rick é um reflexo direto dessa necessidade de preservar sua autonomia e evitar a manipulação emocional.

Fonte: br.pinterest.com

Esse episódio demonstra como o controle narcisista pode corromper a autenticidade e a saúde emocional dos relacionamentos, ilustrando a importância de manter a integridade pessoal e a autonomia, mesmo em face de uma conexão emocional intensa. A luta de Unity para manter sua identidade é um exemplo claro da necessidade de proteger a própria autonomia em qualquer relação que envolva controle e manipulação.

O episódio “Auto Erotic Assimilation” também ilustra o conceito de ciclo de abuso, conforme discutido pela psiquiatra brasileira Ana Beatriz Barbosa Silva em seu livro “Mentes Perigosas: O Psicopata Mora ao Lado”. Silva descreve como, em muitos relacionamentos abusivos, existe um padrão recorrente de tensão crescente, seguido por um incidente de abuso, e posteriormente uma fase de reconciliação ou “lua de mel”, onde o abusador promete mudar ou se arrepende (Silva, 2008).

No episódio, vemos uma variação desse ciclo. A presença de Rick inicialmente “liberta” Unity, levando-a a excessos que desestabilizam o equilíbrio da entidade. Enquanto Unity se entrega a festas e indulgências sob a influência de Rick, ela começa a perceber o impacto negativo que ele exerce sobre sua vida. Silva explica que “o ciclo de abuso é marcado por uma repetição de padrões que reforçam a dependência e a destruição emocional”. Ao perceber isso, Unity decide romper o relacionamento para preservar sua integridade, uma decisão difícil, mas necessária para interromper o ciclo de destruição.

Unity representa a vítima que reconhece o ciclo de abuso e, ao tomar a difícil decisão de sair do relacionamento, preserva sua própria saúde emocional e mental. Como Silva afirma, “o reconhecimento do ciclo é essencial para que a vítima possa tomar as rédeas de sua vida e interromper a sequência de abuso”. Ao decidir deixar Rick, Unity dá um passo crucial em direção à sua autonomia e bem-estar.

Rick Sanchez, o protagonista de Rick and Morty, frequentemente demonstra traços de narcisismo exacerbado. Ele é apresentado como uma pessoa que possui uma confiança inabalável em sua própria inteligência e habilidades, mas que simultaneamente exibe uma profunda falta de consideração pelos sentimentos e necessidades das outras pessoas. Este comportamento é típico de indivíduos com traços narcisistas, que frequentemente acreditam que são superiores aos outros e merecem tratamento especial.

César Souza, em seu livro “Você é o Líder da Sua Vida”, explora como o narcisismo pode influenciar negativamente tanto o próprio indivíduo quanto as pessoas ao seu redor. Souza discute como a busca incessante por validação e superioridade pode levar ao isolamento emocional e a relacionamentos destrutivos, características que são claramente observáveis em Rick. Segundo Souza, “um líder narcisista frequentemente aliena aqueles ao seu redor ao priorizar suas próprias necessidades e desejos acima dos outros” (Souza, 2016). Essa alienação é evidente na vida de Rick, onde sua incapacidade de se conectar emocionalmente com os outros o deixa profundamente isolado, apesar de suas realizações intelectuais.

No episódio “Auto Erotic Assimilation”, vemos como o narcisismo de Rick o leva a interações disfuncionais com Unity, uma entidade coletiva que, inicialmente, atende às suas necessidades emocionais e físicas. Contudo, quando Unity começa a recuperar sua autonomia e questiona o relacionamento, Rick tenta buscar novamente o controle, resultando em um colapso emocional. A tentativa de Rick de dominar Unity espelha o que Souza descreve como “a tendência dos narcisistas de manipular os outros para manter sua autoimagem e controle” (Souza, 2016).

Essa dinâmica ilustra como o narcisismo pode destruir relacionamentos, corroendo tanto o narcisista quanto as pessoas ao seu redor. Rick é incapaz de manter relações saudáveis porque sua necessidade de controle e validação supera sua capacidade de genuinamente se conectar com os outros. A decisão de Unity de deixar Rick, apesar de sua conexão, reflete a importância de preservar a autonomia emocional e evitar relações onde o narcisismo domina.

Unity, como uma entidade que controla mentalmente uma sociedade inteira, levanta questões profundas sobre identidade e livre-arbítrio. Rossandro Klinjey, em seu livro “Help: Me Eduque!”, aborda como a perda de identidade individual pode ser uma consequência de uma dependência excessiva em outra pessoa ou em uma entidade maior. Klinjey discute como, em relações onde há uma fusão excessiva de identidades, a individualidade de cada parceiro tende a se diluir, resultando em uma forma extrema de codependência.

No episódio, Unity representa essa perda de identidade ao assimilar outros seres e suprimir suas individualidades em favor de uma mente coletiva. Klinjey explica que, quando uma pessoa se anula em prol de outra, seja em uma relação amorosa ou em um contexto mais amplo, ela corre o risco de perder sua essência e, com isso, sua capacidade de tomar decisões autônomas (Klinjey, 2017).

Além disso, Unity enfrenta um dilema interno: continuar com Rick e arriscar perder sua estabilidade, ou se separar dele para preservar sua integridade. Esse dilema reflete a luta de muitas pessoas em relacionamentos tóxicos, que, apesar de reconhecerem o impacto negativo da relação, encontram dificuldade em sair dela devido à intensa conexão emocional. Klinjey afirma que a capacidade de preservar a própria identidade dentro de um relacionamento é essencial para a saúde emocional, e que o livre-arbítrio deve ser exercido para evitar que uma pessoa se perca completamente na outra (Klinjey, 2017).

Assim, a decisão de Unity de deixar Rick para manter sua integridade é um passo crucial para romper com a codependência e preservar sua individualidade. Essa narrativa ressoa com as reflexões de Klinjey sobre a importância de manter a autonomia e a identidade pessoal, mesmo dentro de relacionamentos íntimos, onde o equilíbrio entre conexão emocional e independência é fundamental para a saúde psicológica de ambos os parceiros.

As referências a autores brasileiros contemporâneos, como Daniel Martins de Barros, Ana Beatriz Barbosa Silva, César Souza e Rossandro Klinjey, acrescentam uma camada de profundidade à análise desses temas. Barros, explora como o controle emocional e a manipulação podem desestabilizar a saúde psicológica, um conceito que se aplica à relação entre Rick e Unity, Silva discute como o ciclo de abuso emocional pode prender indivíduos em padrões destrutivos, enquanto Souza ilustra os efeitos corrosivos do narcisismo de Rick sobre seus relacionamentos. Klinjey, por sua vez, destaca a importância de manter a autonomia emocional e a identidade pessoal em face de relações que ameaçam a individualidade.

Unity, ao reconhecer o impacto negativo de Rick sobre sua coesão e decidir se afastar, exemplifica a luta por preservação da identidade e exercício do livre-arbítrio em situações de codependência. A decisão de Unity de romper com Rick para manter sua integridade emocional reflete o que Klinjey descreve como essencial para a saúde emocional: a capacidade de preservar a própria identidade e exercer o livre-arbítrio em relacionamentos.

Essa narrativa reforça a mensagem de que, para alcançar relacionamentos saudáveis, é crucial reconhecer e interromper ciclos de abuso, resistir ao narcisismo que desumaniza o outro e preservar a autonomia emocional. Rick and Morty nos lembra que a verdadeira conexão, deve ser construída sobre a base do respeito mútuo e da independência, sem comprometer a integridade de nenhum dos parceiros envolvidos.

No final, o episódio serve como um poderoso lembrete dos altos custos emocionais associados a relacionamentos disfuncionais e da importância de proteger a própria integridade emocional. Rick and Morty demonstra, através da narrativa de Rick e Unity, que a busca por controle e poder nas relações não só prejudica os outros, mas também desintegra quem exerce esse controle. Por isso, preservar a própria identidade e autonomia é essencial para o bem-estar emocional em qualquer relacionamento.

Referências: 

BARROS, Daniel Martins. O Lado Bom do Lado Ruim. São Paulo: Planeta do Brasil, 2014.

KLINJEY, Rossandro. Help: Me Eduque! São Paulo: Academia, 2017.

RICK and Morty. Auto Erotic Assimilation. Direção de Bryan Newton. Roteiro de Dan Harmon e Justin Roiland. EUA: Adult Swim, 9 ago. 2015. Disponível em: <link>. Acesso em: 22 ago. 2024

SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes Perigosas: O Psicopata Mora ao Lado. 6. ed. Rio de Janeiro: Fontanar, 2018.

SOUZA, César. Você é o Líder da Sua Vida: E Se Você Não Lidar Bem Consigo, Como Vai Lidar com os Outros? Rio de Janeiro: Alta Books, 2016.

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Autonomia: a busca pelo êxito

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Muitas pessoas desejam ter autonomia financeira, emocional, em tomar as próprias decisões. No entanto, qual é o conceito de autonomia, que está em diversos contextos na vida de cada um? Conforme Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), autonomia significa independência administrativa em relação a um poder central, liberdade moral ou intelectual, faculdade de um país administrar suas próprias leis; ou seja, a autonomia pode ser entendida como independência sobre algo, em determinado contexto, como a autonomia financeira, em não precisar a recorrer a empréstimos para pagamento de dívidas.

De acordo com Paiva (2006) definir autonomia não é uma tarefa fácil, principalmente, porque existem variados contextos para sua aplicabilidade. Segundo Paiva, na perspectiva de Dickinson (1987), a autonomia nunca está sozinha, mas sempre associada a algo, como exemplo, estudar sozinho, já está inserido nos próprios livros de estudos, que servem como guias.  Sendo assim, estudar sozinho “não é necessariamente sinônimo de autonomia, pois muitas das decisões sobre a aprendizagem e seu gerenciamento já se encontram inseridos nos materiais.

Em um sentindo mais simplificado, Holec (1981) define autonomia como a habilidade de responsabilizar-se pelo próprio aprendizado.  Enquanto Little (1991) aponta que autonomia é a “capacidade de planejar, monitorar e avaliar as atividades de aprendizagem, e, necessariamente, abrange tanto o conteúdo quanto o processo de aprendizagem”. Em uma analogia com as tarefas do cotidiano, a autonomia se traduz como o desejo de ter uma independência sobre determinado assunto, e por meio de um aprendizado direcionado o indivíduo passa a ser livre para tomar suas próprias decisões.

Bronfenbrenner (1996) aponta que os ambientes mais próximos da pessoa, “como a escola, os amigos, os vizinhos e os avós, exercem um papel importante no desenvolvimento do indivíduo, bem como a aquisição da autonomia”. O pesquisador infere o conceito desta, no que tange a fase da adolescência, momento oportuno para desenvolver a autonomia como um processo de vida, como, ser autônomo em suas escolhas profissionais, amizades e independente em suas emoções, por exemplo.

Fonte: Imagem no Freepik

Para Reichert e Wagner (2007) a autonomia pode ser entendida “como a capacidade do sujeito decidir e agir por si mesmo”. Segundo os autores, o desenvolvimento da autonomia, bem como sua aquisição de habilidade exercem influência “do contexto em que o jovem se desenvolve”. Assim como eles, Bronfenbrenner (1996) também trabalha o assunto na fase da adolescência, em que o indivíduo é bombardeado por diversas informações pelas redes sociais, e por isso a necessidade de desenvolver essa prática.

Morin (1996) entende que a autonomia é “construída pelo próprio indivíduo, na medida em que existe uma relação de seu mundo interno, de sua própria auto-organização, com as condições externas em que ele se desenvolve”. Isto é, para ter essa capacidade, a pessoa precisa construir em si mesma suas próprias conclusões acerca de determinados assuntos a qual está inserida socialmente, o que seria o sentido externo proposto por ele.

Em uma perspectiva familiar Ríos González (2005) explica que os pais exercem um papel fundamental na construção da autonomia dos filhos, no sentindo de criar indivíduos livres para enfrentar os desafios cotidiano oriundos da vida, bem como ter sua própria opinião.  E para isso, o autor afirma que é imprescindível que os pais saibam ouvir os próprios filhos, bem como respeitar a individualidade de cada um cultivar sua liberdade e o poder de expressar a afetividade.

A autonomia realmente tem uma definição muito ampla, por isso torna-se um assunto tão complexo para ser analisado de forma superficial, por isso faz importante trazer várias observações diferentes para ter um olhar mais apurado sobre o assunto. Diante disso, é preciso atentar que esse conceito precisa ser levado em consideração desde a infância no sentindo de os pais criarem filhos autônomos em suas opiniões, forma de pensar, para que estes não sejam influenciados pelas redes sociais, e em determinados grupos os quais estão inseridos; pois essa autonomia leva a independência e a liberdade de tomar suas próprias decisões.

Fonte: Imagem no Freepik

Referências

BRONFENBRENNER, U. A ecologia do desenvolvimento humano: experimentos naturais e planejados. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001).

DICKINSON, L. Self-instruction in language learning. Cambridge: Cambridge University Press (1987).

HOLEC, H. Autonomy and foreign language learning. Oxford: Pergamon (1981).

LITTLE, D. Learner autonomy: definitions, issues and problems 1. Dublin: Authentic(1991)

MORIN, E.; PRIGOGINE, I. et al. A sociedade em busca de valores. Lisboa: Instituto Piaget, 1996.

PAIVA, Vera. Autonomia e complexidade. Disponível em <https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/rle/article/viewFile/15628/9815>. Acesso: 19, de nov de 2021.

Reichert, C e Wagner,A. Considerações sobre a autonomia na contemporaneidade(2007). Disponível em: <https://www.redalyc.org/pdf/4518/451844615004.pdf> Acesso: 19, de nov de 2021.

RIOS GONZÁLES, J. A. Los ciclos vitales de la família y la pareja: ?crisis u oportunidades?. Madrid: Editorial CCS, 2005.

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As origens da família moderna e a Geração Canguru

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O capítulo “As Origens da Família Moderna”, do livro de Jonas Melman, “Família e Doença Mental – repensando a relação entre profissionais de saúde e familiares”, discorre sobre o processo histórico que resultou na constituição da família moderna da forma como se configura nos dias atuais. A obra aborda a temática das transformações sociais ocorridas desde o final da Idade Média até a atualidade e aponta como esses acontecimentos sociais influenciaram e condicionaram as mudanças ocorridas na estrutura da organização familiar ao longo dos séculos.

Busca compreender como as mudanças na estrutura da sociedade influenciam na estrutura e dinâmica do grupo familiar, detendo-se em aspectos como criação dos filhos, afetividade, ambiente familiar, separação entre vida profissional, vida privada e vida social, educação escolar, dentre outros.

De acordo com o autor, a estrutura familiar, centrada na afeição e na intensificação das relações entre pais e filhos é uma invenção recente na história do homem ocidental (MELMAN, 2001, p. 39). Ele toma como exemplo a sociedade medieval, que não dispunha de condições propícias para construir essa noção de privacidade e intimidade que temos hoje, por conta da forma como os indivíduos se relacionavam com o espaço familiar.

Além de conviverem pessoas alheias ao núcleo familiar, como servidores e criados, a família se agrupava em grandes casas onde se reuniam amigos, religiosos, clientes e visitantes. E essa condição não dependia de classe econômica. Enquanto nos grandes casarões conviviam dezenas de pessoas, nas casas das pessoas mais pobres, pequenas e menos habitadas, a situação era a mesma, não havia espaço para o isolamento em ambientes privados.

Outro aspecto importante diz respeito à educação da criança. A transmissão de saberes e valores não era responsabilidade da família. Geralmente ao completar sete anos de idade, esta ia residir com outra família que ficava responsável pela sua socialização, onde tinham obrigações, realizavam trabalhos domésticos e eram tratados como aprendizes.

Dessa forma, desde muito cedo a criança se tornava independente da própria família, embora muitas vezes a ela retornasse. Nessas condições, não se alimentava um sentimento profundo entre pais e filhos, ao contrário, a família representava mais uma responsabilidade moral e social, destinada à transmissão dos bens e do nome.

Fonte: encurtador.com.br/vOVW7

O estudo mostra como se deu essa passagem da família medieval para a família moderna, construindo-se um novo modelo de família em que a escola passa a ser o principal meio de iniciação social da criança, desde a infância até a fase adulta. Gradativamente, com o aumento do número de instituições de ensino, a partir do século 18, a escola vai se estendendo aos diversos setores da sociedade. Ao mesmo tempo, impõe sua autoridade moral e passa a adotar um sistema disciplinar cada vez mais rigoroso.

Esse movimento vem acompanhado de modificações também no ambiente familiar, que vai perdendo seu aspecto de espaço aberto à visitação pública e passa ter uma fisionomia de espaço privado, reservado à segurança, intimidade e privacidade dos seus membros. A partir do final do século 19, a configuração da família vai se modificando, sendo raras as famílias mais abastadas que viviam como as famílias medievais, afastando as crianças da casa dos pais como processo de formação.

Após estudarmos um pouco mais sobre a história das origens da família, nos questionamos a forma como vivem hoje as famílias modernas, em que há um excesso de proteção por parte dos pais e até que ponto essa forma de educação contribui para a ampliação de experiências, para o alcance da autonomia da criança/jovem e sua preparação para a vida.

Temos observado com frequência, famílias em que os filhos entre 25 e 34 anos têm adiado a saída da casa dos pais, uma tendência em ascensão no Brasil. Atualmente, apenas um de cada cinco jovens nessa faixa etária já conquistou sua independência e autonomia. Há pouco mais de 10 anos, a proporção era maior, quando um de cada quatro jovens entre 25 e 34 anos eram independentes. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ainda destaca que a maioria dos jovens da Geração Canguru é composta por homens (60,2%).

Fonte: encurtador.com.br/vCEJO

Ou seja, o que era um processo natural há alguns anos – buscar a independência pessoal, seguir o próprio caminho – vem mudando gradualmente e dando origem a uma nova perspectiva. A lógica de caminhar com as próprias pernas tem ficado para trás, e vem dando espaço à chamada “Geração Canguru”.

Muitos fatores podem estar por trás do crescimento desse fenômeno no Brasil, que já foi registrado em outros países. O primeiro é financeiro. O aumento do custo de vida, principalmente nas grandes cidades, faz com que os jovens acabem morando por mais tempo na casa dos pais.

O segundo motivo que pode incentivar o crescimento da Geração Canguru é o receio de colocar em risco questões emocionais importantes, como a autoestima e a autoconfiança. Ou seja, possivelmente pela falta de oportunidades propiciadas ao longo da vida, o jovem/adulto não se sente preparado para enfrentar uma vida independente sem a proteção dos pais.

Daí a importância de questionar até onde é válida a educação nos moldes da família contemporânea, pois alimentar essa relação de dependência pode prejudicar não somente o amadurecimento dos jovens, mas ser prejudicial para toda família.

Referência

MELMAN,  J.  As origens da família moderna. In: Família e Doença Mental, repensando a relação entre profissionais de saúde e familiares. São Paulo: Escrituras Editora, 2001. p. 39-54.

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“Por lugares incríveis”: uma proposta de intervenção com adolescentes

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“Por Lugares Incríveis” é um filme de drama romântico adolescente americano de 2020, dirigido por Brett Haley, a partir de um roteiro de Jennifer Niven e Liz Hannah. É apresentada a história de dois adolescentes, Violet Markey e Theodore Finch, ambos possuem transtornos mentais porém se diferenciam com a forma de lidar com os mesmos.

Sabe-se que a adolescência é um marco onde ocorrem mudanças biológicas e psicológicas. De acordo com Einsenstein (2005) a adolescência é a transição da infância para a vida adulta, onde o sujeito passa por desenvolvimentos físicos, mentais, emocionais, sexuais e sociais, nos quais o indivíduo se esforça para conseguir alcançar as expectativas culturais. Além de passar por todas essas mudanças que a adolescência exige, Violet precisa aprender a viver com o luto da morte de sua irmã e Theodore, que vive altos e baixos, possui traumas e episódios depressivos. Os dois, por fim, acabam se unindo para fazer um trabalho de escola, na qual vivem momentos bons e engatam um relacionamento.

O filme “Por lugares incríveis” vai além de um típico filme para adolescentes pois retrata uma dura realidade vivida entre os jovens do século XXI. “Aliás, por baixo da aparência de normalidade dos adolescentes de Indiana, há bulimia, automutilação e aqueles transtornos cheios de letrinhas (TDAH, TOC, TOD), ‘tratados’ com Ritalina e drogas tarja-preta”. (FARIA, 2020).

Fonte: encurtador.com.br/bjX23

Tudo isso implica muito na forma como os adolescentes reagem ao mundo e na formação de suas personalidades. É importante mencionar que nessa fase é onde o adolescente constrói encontros e relações, onde questiona valores e começa a construir seus projetos de vida. Nesse processo de desenvolvimento é onde o adolescente busca sua individualidade e autonomia, e é onde começa os conflitos, não é mais criança, e se ver a frente de uma série de descobertas, problemas e escolhas.

A Revista de Psicologia da UNESP (2013) levantou dados em que afirmam que um dos principais problemas enfrentados na fase da adolescência é “dificuldade no âmbito escolar decorrente de problemas da aprendizagem e/ou de comportamento, transtornos alimentares, mau comportamento, depressão, insegurança, retração, problemas de relacionamento familiar, falta de higiene pessoal, hetero e auto agressão, comportamentos antissociais, como furtos, mentiras, uso de drogas, comportamento sexual exacerbado.”

Sobre o filme, a narrativa gira em torno da adolescente Violet, que vive um momento de depressão, devido o trauma que sofreu sobre a morte de sua irmã em um acidente de carro. Enfrenta a depressão se isolando do mundo e de seus amigos da escola. Também conta a história de Finch, um garoto egocêntrico, problemático e inteligente. O mesmo também tem uma vida difícil e marcada por histórias que o perturbam até sua vida atual.

Fonte: encurtador.com.br/BHSZ5

Segundo Zimerman (2008), “o natural no adolescente é a existência de dúvidas existenciais e ideológicas…” . Nessa fase da vida, há muitas queixas e dúvidas sobre, por exemplo, se estão traçando um caminho correto. Isso se mostra muito presente na vida dos dois personagens. Várias queixas, dúvidas sobre o morrer e o viver assombram a vida desses dois adolescentes.

Diante desses desafios vividos na adolescência, os programas de atenção aos adolescentes são voltados para essas problemáticas vividas por eles. “As intervenções podem ter melhores resultados para os adolescentes quando os aspectos afetivos, cognitivos e sociais são inter-relacionados e as informações repassadas de maneira abrangente.”(Minto, Elaine; Pedro, Cristiane; col. 2006).

É importante trabalhar os problemas com os adolescentes, abrindo possibilidades para que eles possam ter condições e habilidades de trabalhar os desafios que lhe são impostos no decorrer da vida. “As habilidades de vida sugeridas pela OMS são: autoconhecimento, relacionamento interpessoal, empatia, lidar com os sentimentos, lidar com o estresse, comunicação eficaz, pensamento crítico, pensamento criativo, tomada de decisão e resolução de problemas” (WHO, 1997).

Fonte: encurtador.com.br/krA29

Segundo Minto e Col, 2006 essas habilidades permitem que:

“os adolescentes relatam aumento da capacidade de reflexão em situações de resolução de problemas, melhora dos relacionamentos interpessoais e da comunicação, da qualidade de vida física e mental… Acredita-se que a descrição detalhada das estratégias empregadas para a apresentação e discussão de cada uma das habilidades de vida poderá auxiliar os psicólogos ou profissionais que tenham interesse em implementar programas de saúde integral para os adolescentes, fornecendo-lhes um modelo bem-sucedido.”

Essas habilidades podem servir de base para que profissionais possam trabalhar com adolescentes, promovendo assim uma mudança de vida dos indivíduos que passam por momentos delicados no decorrer da vida e não sabem como lidar.

 FICHA TÉCNICA

Título Original: All the Bright Places
Direção: Brett Haley
Elenco:  Elle FanningJustice SmithAlexandra Shipp
Ano: 2020
País: Estados Unidos da América
Gênero: Drama, Romance

REFERÊNCIAS

EISENSTEIN, Evelyn. Adolescência: definições, conceitos e critérios. Adolescência e Saúde, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, p. 1-1, jun./2005.

FARIA, Ângela. Filme ‘Por lugares incríveis’ faz um tocante retrato da adolescência. Estado de Minas. Cultura. 2020. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/cultura/2020/03/28/interna_cultura,1133274/filme-por-lugares-incriveis-faz-um-tocante-retrato-da-adolescencia.shtml. Acesso em 14 de julho de 2020.

ZIMERMAN, D. E. Manual de técnica psicanalítica. Porto Alegre : Artmed, 2008

VERCESE F. A; SEI M.B; BRAGA C. M. L; A demanda por psicoterapia na adolescência: a visão dos pais e dos filhos . Revista de Psicologia da UNESP 12(2), 2013.

MINTO, Elaine Cristina; PEDRO, Cristiane Pereira e col. Ensino de habilidades de vida na escola: uma experiência com adolescentes. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 11, n. 3, p. 561-568, set./dez. 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/pe/v11n3/v11n3a11. Acesso em 14 de julho de 2020.

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CFP se posiciona a favor da descriminalização e legalização do aborto no Brasil

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STF discute liberação do aborto até a 12ª semana de gestação

O Supremo Tribunal de justiça (STJ) intensifica debate sobre a descriminalização e legalização do aborto no Brasil. O Debate é construído por pessoas favoráveis e contrárias a legalização. O aborto é proibido no Brasil respaldado pelo artigo 128, incisos I e II do Código Penal Brasileiro. Hoje o aborto só é permitido em três casos: feto anencéfalo, estupro e/ou que cause risco à vida da mulher.

De acordo com a Folha de São Paulo, em dez anos, o Brasil teve entre 9,5 e 12 milhões de abortos provocados. Sendo estimado que exista meio milhão de abortos clandestinos por ano no país e que provavelmente 50% tem complicações. Resultando em um gasto de R$ 500 milhões, pelo SUS, em uma década.

Diante do cenário, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) se posiciona a favor da descriminalização e legalização do aborto no Brasil. Em carta o CFP se posiciona: ‘A autonomia das mulheres sobre seus corpos deve ser ampliada para que as mesmas tenham condições de decidir ou não interromper uma gravidez. A Psicologia deve se posicionar agindo sobre as situações que favorecem situações de vulnerabilidade social e psicológica, que provocam intensas situações de sofrimento psíquico, como é o caso da manutenção de uma gravidez que não foi escolhida pela gestante’. A carta aberta pode ser lida na integra no endereço https://site.cfp.org.br/cfp-defende-descriminalizacao-legalizacao-aborto-brasil/ .

Fonte: encurtador.com.br/mopvC

Joice Reitz, acadêmica de Psicologia do CEULP – ULBRA, se posiciona: ‘Sou a favor da legalização do aborto por que percebo, com o estudo que tenho do assunto, que temos muito mais a ganhar com isso. Entendo o choque inicial que a proposta pode causar na população, mas basta parar um pouco para pensar e perceber que, além de maior autonomia feminina, a prática legalizada vem para melhorar questões de saúde pública, uma vez que a mesma permite toda uma estrutura para a mulher que deseja o aborto, com apoio médico (não de açougueiros clandestinos), psicológico e social. Não dá mais para fechar os olhos para este assunto. Todos sabem que a prática ocorre a todo o momento e em todo lugar. A legalização dessa prática não se trata de uma ação “demoníaca” e “pecadora” como muitos alegam (e cabe aqui ressaltar que o Estado é laico), mas se trata de uma ação que dá visibilidade para uma realidade triste, dura e camuflada. Nosso país precisa de representantes políticos e cidadãos que tomem decisões e tenham posturas e atitudes livres de suas crenças pessoais, que sejam capazes de pensar no todo, no coletivo, e não somente no próprio umbigo.“

REFERÊNCIAS

TUROLLO, Reynaldo. STF começa debate sobre legalização do aborto até 12ª semana de gravidez. Disponível em < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/08/stf-comeca-debate-sobre-legalizacao-do-aborto-ate-12a-semana-de-gravidez.shtml > acessado em 03/08/2018.

COLLUCCI,Cláudia. FARIA, Flávia. SUS gasta R$ 500 milhões com complicações por aborto em uma década. Disponível em < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/07/sus-gasta-r-500-milhoes-com-complicacoes-por-aborto-em-uma-decada.shtml acessado em 03/08/2018.

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Das coisas que deveriam ser aprendidas no decorrer do curso mas não são

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Esses dias me falaram que eu estou me tornando aquele tipo de gente que eu criticava. Quando retruquei com um “hããã??” responderam “sim, aquelas pessoas do último período da faculdade”. Vejo da seguinte forma: Graças a Deus me tornei uma pessoa crítica. E tenho ficado indignada, com raiva e ao mesmo tempo, entristecida com a atitude de algumas pessoas, principalmente colegas que estão no último período ou ano do curso. Eu sei que a gente não deve ser psicólogo em todas as nossas relações (e nem dá né), mas o curso muda a nossa forma de ver o mundo, de tratar as pessoas (ou pelo menos deveria).

O amadurecimento que o curso proporciona não é só teórico e profissional, mas também é pessoal. É muito triste ver um psicólogo em formação com tanta maldade no coração. É lamentável ver, ouvir e saber que o coleguinha estava falando mal sobre o orientador e/ou supervisor ou que seja somente dos professores. Lamentável escutar coisas do tipo “estou pagando pra me servirem” ou com essa conotação. Na verdade, em relação a supervisor e orientador acho que há uma confusão muito grande sobre o que cabe a cada um. E no geral, eu sempre ouvi falar sobre a autonomia do aluno (e acho o máximo). Discordo da ideia de que “se paga pra que o professor te sirva”. É como se você afirmasse que precisa do professor pra segurar a sua mãozinha e te guiar durante todo o caminho. Como se você afirmasse que não consegue fazer nada sozinho.

Fonte: goo.gl/aCuiaB

Durante esse processo fiquei furiosa, chorei dias (e quem me conhece sabe que chorei por dias real oficial) seja pela derrota que senti no TCC1, seja pelas injustiças nos estágios. Eu chamei minha banca de falsianes, falei que ia pisar na cara deles – e de certa maneira, fiz isso quando aprimorei o meu trabalho com base nas considerações deles! O que eu nunca fiz foi sair denegrindo a imagem ou ser maldosa e por vezes cruel ao me referir à eles. Pelo contrário: não poderia ter acontecido da melhor maneira. Todos professores (até vocês sabem quem), Orientadora, Superviores nos estágios e a minha banca me permitiram voar. Como diz meu querido supervisor “vocês podem mais do que não podem, desde que estejam amparados teoricamente”. Talvez o que falta é segurança e assumir a fraqueza, pois se torna mais fácil quando culpabilizamos os nossos erros naqueles que “deveriam nos ensinar”.

Honestamente, autonomia é não precisar da minha orientadora para saber o que eu devo ler de referencial teórico pra colocar no meu trabalho ou como e o que eu devo escrever. Autonomia é não esperar que ela me diga que eu tenho que corrigir isso ou aquilo. Autonomia é não precisar que ela me diga o que deve conter nos meus capítulos, o que deve ser informado nos resultados e discussões ou na introdução. Autonomia é não ter que esperar que ela me dê o aval pra mandar meu trabalho. Autonomia é não precisar esperar que o meu supervisor diga pra eu aplicar esse ou aquele instrumento. Eu preciso deles pra me apoiarem e me fortalecerem teoricamente, mas não preciso deles pra toda e qualquer decisão que eu vá fazer. Eu sei caminhar sem eles. A falta deles não me imobiliza. Autonomia é isso. Ser aluno é isso!

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CAOS: População idosa também merece cuidados

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Nesta quinta-feira 24 de agosto, ocorreu na sala 405 do Ceulp/Ulbra as sessões técnicas com apresentações de trabalhos acadêmicos, no Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia – CAOS. Um dos trabalhos apresentados levava o título “As eventuais infrações contra o ordenamento jurídico brasileiro nas instituições de longa permanência de idosos no estado do Tocantins”, por Victor Hugo Martins Correa e Vinícius Renato de Paula Pires, acadêmicos de Direito da Faculdade Católica do Tocantins (FACTO).

Essas instituições de longa permanência de idosos (públicas ou privadas) são alternativas de cuidados para essa população, onde Estado e mercado dividem com a família essa responsabilidade. No entanto, essa não é uma prática comum no Brasil, sendo muitas vezes confundida com asilos. Através de pesquisa qualitativa, os autores do trabalho buscaram compreender, interpretar e sistematizar como ocorre o cuidado com a população idosa nessas instituições.

Os pesquisadores levantaram algumas necessidades dessa população, como “métodos de prevenção e asseguração em todos os setores e níveis de atuação, independentemente de quaisquer discrepâncias, como as socioeconômicas” e a atuação de profissionais da saúde, inclusive de psicólogos, que se faz imprescindível.

Os resultados e discussões demonstraram que os funcionários seguem as orientações de Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais para o cuidado dos idosos, promovendo a autonomia, a inclusão social e a melhoria da qualidade de vida dos idosos e que, ainda que os cuidados com os idosos na instituição sejam simples, eles são adequados no que diz respeito as necessidades dos residentes.

Por fim, concluíram que os cuidados não se concentram apenas na área da saúde, mas também na moradia, proteção, alimentação, educação, cultura, lazer, respeito e nos demais direitos assegurados no Estatuto do Idoso, sendo esses adotados nos procedimentos de cuidados da instituição.

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Ser e tornar-se Psicoterapeuta Humanista-Fenomenológico

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No sentido de conhecer os princípios básicos na construção do psicoterapeuta embasados na fenomenologia-existencial, torna-se necessário compreender e refletir as principais influências dessa abordagem para o processo psicoterapêutico. A fenomenologia surgiu no final do século XIX, sendo esta considerada um método e uma filosofia, tendo como principal precursor Edmund Husserl (ARANHA; MARTINS, 2003).

A fenomenologia origina-se da palavra fenômeno, palavra grega, que significa o manifesto, o que se torna evidente, sendo assim fenômeno pode ser considerado como o que é aparente, como se mostra à consciência (ARANHA; MARTINS, 2003, RIBEIRO, 1985). Nesse contexto, as psicoterapias de natureza Fenomenológicas-existenciais, a Fenomenologia de Husserl é uma das mais importantes colaborações filosóficas (RAFFAELLI, 2004), sendo esta uma “ciência descritiva das essências da consciência e seus atos, uma vez que a correlação sujeito-objeto só se dá na intuição originária da consciência” (RIBEIRO, 1985, p. 44). Nessa conjuntura, Aranha e Martins (2003), afirma que a consciência é “ doadora de sentido, fonte de significado ( p. 150).

Para Husserl para que se faça fenomenologia é necessário deixar posturas “ontológicas” e conhecimentos empíricos, nessa perspectiva não se tem a intenção de chegar ao mundo e a realidades tomadas em si mesmas, mas a relação que se estabelece entre o homem e mundo (REHFELD, 2013). Nesse ínterim, Ribeiro (1985, p. 44), aponta que: “não se trata de uma sumária descrição da realidade, pois a consciência é muito mais ampla do que ela própria, nela nós percebemos a essência daquilo que ela não é, o sentido mesmo do mundo em direção ao qual ela não cessa de ‘explodir’ […]”.

Fonte: http://3.bp.blogspot.com

De acordo com Aranha & Martins (2003), na fenomenologia busca a experiência que cada ser humano vivencia, sendo que a realidade torna uma descrição individual do sujeito. Nesse sentido, “a fenomenologia é uma filosofia da vivência”, sendo indispensável às experiências de cada pessoa na compreensão do fenômeno (ARANHA; MARTINS, 2003, p.150, RIBEIRO, 1985).

No processo psicoterapêutico, o cliente se apresenta muitas vezes com contato voltado ao mundo externo das situações, vendo o que acontece, não percebendo o modo que ver, ou o fenômeno deste. Sendo que estas aparências vistas pelo cliente, ocultam o verdadeiro significado do ser. Nesse sentido, a psicoterapia busca separar a aparência do fenômeno, trabalhando com o quê e o como, indo ao encontro com o fenômeno (RIBEIRO, 1985).

O psicoterapeuta humanista-existencial

A relação entre psicoterapeuta e cliente constitui uma ferramenta fundamental no processo psicoterápico. Para Carl Rogers, o processo de desenvolvimento da “pessoa plena” é facilitado por uma relação terapêutica na qual torna possível a emergência de questões subjetivas do cliente, o que não seria possível através do método objetivo e empírico das ciências naturais (BARRETO, 2002).

O poder é retirado das mãos do psicoterapeuta, e a relação estabelecida é permissa e livre, ocasião em que “o próprio contato terapêutico é uma experiência de desenvolvimento” (BARRETO, 2002, p. 173). Dada a importância dessa relação, compreende-se que as características e a postura do psicoterapeuta são variáveis que influenciam esta relação. Neste sentido Rogers (1988) definiu três elementos fundamentais para esse processo, denominados de “atitudes psicológicas facilitadoras”: a) autenticidade, sinceridade ou congruência; b) aceitação incondicional; c) compreensão empática. Antes de esmiuçar tais conceitos, faz-se necessário primeiro compreender alguns aspectos filosóficos envolvidos.

Verifica-se que há uma relação significativamente influente da filosofia fenomenológica-existencial sobre a abordagem criada por Rogers. Considerando isto, analisa-se que ao tomar a experiência prática, vivida, como ponto de partida para formular sua teoria e método psicoterapêutico, ao incluir a subjetividade do terapeuta e do cientista e ao se interessar pela compreensão dos significados atribuídos pela própria pessoa às suas vivências e pelos modos de experienciação dos mesmos, Rogers assume, em seu modo de trabalho, a prática de uma atitude humanista e fenomenológica (BEZERRA; BEZERRA, 2012, p. 23).

Fonte: http://zip.net/bntL4V

Sob o prisma da fenomenologia-existencial, o indivíduo é compreendido como um ser capaz de criar condições para se lançar para frente rumo ao desenvolvimento e liberdade. Esta perspectiva de homem vai ao encontro do que Rogers (1983) definiu como a hipótese central de sua abordagem: a tendência atualizante, na qual “os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para autocompreensão e para a modificação de seus autoconceitos, de suas atitudes e de comportamento autônomo” (ROGERS, 1983, p. 38).

Compreende-se que o terapeuta humanista-existencial trabalha com a concepção dialética de ser humano envolvido na inter-relação entre a filosofia fenomenológica-existencial e a Abordagem Centrada na Pessoa. Embora não seja possível afirmar que Rogers foi direcionado por essa filosofia (BEZERRA; BEZERRA, 2012), uma vez que a conheceu tardiamente, a postura do psicoterapeuta defendida por ele, revela possibilidades de contribuir para o autodesenvolvimento livre.

O primeiro elemento facilitador do processo de crescimento do sujeito é a autenticidade, sinceridade ou congruência, que diz respeito à transparência do psicoterapeuta na relação com o cliente, sendo o que se é verdadeiramente, removendo barreiras profissionais e pessoais (ROGERS, 1983; ARAÚJO; FREIRE, 2014). O segundo elemento é a aceitação positiva incondicional, representada por uma postura de consideração genuína pelo cliente e de suspensão de valores (BARRETO, 2002). Não diz respeito a aprovar ou desaprovar, pois nesta direção ainda caberia um juízo de valor por parte do psicoterapeuta.

Por fim, o terceiro elemento descrito por Rogers (1983) é a compreensão empática, ocasião em que o psicoterapeuta é hábil em captar sentimentos e emoções do cliente e, assim, comunicar isto à ele. Mais do que isto, a empatia envolve o entendimento de que considerar a alteridade é abrir-se para ela, procurar “ouvi-la” com todos os sentidos e acolhê-la com portas e janelas abertas […] o valor do cliente convoca o psicoterapeuta a oferecer uma escuta qualificada, procurando perceber seu campo fenomenológico e compreendendo-o sem distorções, o máximo possível (ARAÚJO; FREIRE, 2014, p. 100).

Fonte: http://zip.net/bltLxL

Para além, Rogers (1983) considera que o processo de comunicação na relação terapêutica é de suma importância, pois o compreende como um processo complexo que diz respeito desde às reações mais íntimas do organismo até os pensamentos, sentimentos e a emissão de palavras. Rogers relata, ainda, que a experiência de se dispor ao processo de comunicação, exercendo a escuta das demandas do outro, favorece o crescimento individual.

Rogers (1997) traz a reflexão de que as demandas nas psicoterapias concernem às falhas nos processos de comunicação. Quando determinado organismo possui dificuldades de adaptação e necessita de trabalhos psicoterápicos, em primeiro plano, houve uma ruptura da comunicação do sujeito com si próprio e que consequentemente influenciaram de forma direta na dificuldade de estabelecimento de comunicação com outros sujeitos. Ao relatar sobre a capacidade de escuta, Rogers (1983) afirma que o ato de ouvir o outro traz consequências, pois quando há uma escuta apurada em um processo de comunicação, não se ouve apenas as palavras que são emitidas, mas todos os significados que são atribuídos em suas experiências, isto é, a pessoa como um todo.

Amatuzzi (2008, p. 68) diz que “não há palavra viva que seja sem emoção, pois ela interfere com a realidade, cria um mundo novo, mais do que simplesmente retrata a realidade. Se ficarmos na mera palavra, então estamos matando sua vida”. Desta forma, o autor traz a reflexão de que o papel do terapêuta concerne em criar mecanismo que favoreçam a expressão da palavra e de seu pleno significado. Desta forma, a construção do ser e tornar-se psicoterapeuta humanista-existencial é dialética, envolve um conjunto de perspectivas filosóficas existenciais aliadas às contribuições das experiências vivenciadas e relatadas por Rogers. Considerando isto, será descrito algumas características inerentes ao psicoterapeuta humanista-existencial.

  1. Psicoterapeuta não seleciona o caminho que o cliente deve percorrer.

Através de uma postura não-diretiva, o psicoterapeuta confia na capacidade de autorregulação da pessoa, entendendo que é inerente à natureza humana possuir condições de autodesenvolver-se, tendo habilidade para decidir sobre a própria vida. Na atitude psicoterapêutica, apresenta-se condições psicológicas facilitadoras para propiciar o processo de autodesenvolvimento do cliente. “Se posso proporcionar certo tipo de relação, a outra pessoa descobrirá dentro de si a capacidade de utilizar esta relação para crescer, e mudança e desenvolvimento pessoal ocorrerão” (ROGERS, 2009, p. 37).

Fonte: http://zip.net/bttMKx
  1. O cliente é um ser-no-mundo.

A natureza humana é relacional. O homem é compreendido como pessoa em inter-relação com o mundo, entrelaçado à ele, cuja experiência não pode ser fragmentada do ser que a vivencia (CORREA; MOREIRA, 2016). Esta noção vai ao encontro da perspectiva de ser-no-mundo, uma visão ontológica desenvolvida pelo filósofo Heidgger. Nesta perspectiva, o indivíduo é “homem na exata medida de seu ser-em, isto é, na exata medida em que possui um mundo ou abre o sentido de um mundo” (BARBOSA, 1998, p. 4).

  1. O psicoterapeuta não é neutro em relação ao seu cliente

Psicoterapeuta se permite afetar e ser afetado pela experiência do cliente, percebendo-o não um como um objeto a ser estudado, mas como um ser relacional e digno de respeito. No processo relacional ocorrido no setting terapêutico, o psicoterapeuta apresenta-se ativo e comprometido com o seu cliente a medida em que divide a carga com o ele. Sobre isto, Moreira (2009) afirma que este processo tem uma grande importância para o cliente que se sente sozinho, mesmo que esteja cercada por muitas pessoas. “Sua solidão é, frequentemente, fruto da sensação de não ser compreendido em sua dor. Dividir a carga desta dor passa a ser, então, um primeiro momento na psicoterapia tendo um grande significado” (MOREIRA, 2009, p. 64).

Perpassando destas atitudes fenomenológicas, o papel do terapeuta será assim o de, “partir do ponto de vista fenomenal do cliente, procurar a compreensão da consciência vivencial da experiência de si e do mundo” (SANTOS, 2004, p. 19). Para tanto, Rogers (1947) propõe, que o terapeuta deve “ver através dos olhos da outra pessoa, perceber o mundo tal como lhe aparece, aceder, pelo menos parcialmente, ao quadro de referência interno da outra pessoa”.

Fonte: http://zip.net/bhtL9N

Uma relação terapêutica estabelecida através dessas premissas (empatia, congruência aceitação) implica uma importante redefinição do seu papel. Mais do que as técnicas ou os instrumentos utilizados, o terapeuta constrói-se por meio de atitudes que trazem para a relação e que compõem o verdadeiro fator impulsionador da mudança. Tendo em conta os princípios que justificam e dão sentido a essas atitudes, o terapêuta humanista torna-se um verdadeiro facilitador do processo de autoconhecimento do cliente, pois sabe que ninguém melhor que ele mesmo para interpretar, construir e modificar sua própria realidade.

 

REFERÊNCIAS:

AMATUZZI, M. M. (2008). Por uma psicologia humana. 2ªed. Campinas: Alínea.

ARANHA, M. L. A.; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2003.

ARAUJO, I. C.; FREIRE, J. C. Os valores e a sua importância para a teoria da clínica da abordagem centrada na pessoa. Rev. abordagem Gestalt. Goiânia , v. 20, n. 1, p. 86-93, jun. 2014 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672014000100012&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 21 maio 2017.

BARBOSA, M. F. A noção de ser no mundo em Heidegger e sua aplicação na psicopatologia. Psicol. cienc. prof.,  Brasília ,  v. 18, n. 3, p. 2-13,    1998 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141498931998000300002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 maio 2017.

BARRETO, C. L. B. T. A evolução da Terapia Centrada no Cliente. IN: GOBBI, S. L.; MISSEL, S. T.; JUSTO, H.; HOLANDA, A. (Org). Vocabulário e noções básicas de Abordagem Centrada na Pessoa. São Paulo: Vetora, 2002. p. 167-181.

BEZERRA, M. E. S; BEZERRA, E. do. N. Aspectos humanistas, existenciais e fenomenológicos presentes na abordagem centrada na pessoa. Rev. NUFEN, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 21-36, dez. 2012. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S217525912012000200004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 21 maio 2017.

CORREIA, K. C. R.; MOREIRA, V. A experiência vivida por psicoterapeutas e clientes em psicoterapia de grupo na clínica humanista-fenomenológica: uma pesquisa fenomenológica. Psicol. USP, São Paulo, v. 27, n. 3, p. 531-541. 2016 Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010365642016000300531&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 maio 2017.

MOREIRA, V. Da empatia à compreensão do lebenswelt (mundo vivido) na psicoterapia humanista-fenomenológica. Rev. Latino-americana de psicopatologia fundamentada.  São Paulo, v. 12, n. 1, p. 59-70, Mar. 2009.   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141547142009000100005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 maio 2017.

RAFFAELLI, R. (2004). Husserl e a psicologia. Estudos de Psicologia, 9(2), 211-215. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/epsic/v9n2/a02v9n2.pdf>. Acesso em: 01 jun 17.

REHFELD, A. Fenomenologia e Gestalt-terapia. In: FRAZÃO, Lilian Meyer; FUKUMITSU, K. O (Org.). Gestalt-terapia: Fundamentos Epistemológicos e influências filosóficas. São Paulo: Summus, Cap. 2. 2013.

RIBEIRO, J. P. Gestalt-terapia: refazendo um caminho. 6. ed. São Paulo: Summus, 1985.

ROGERS, C. R. Algumas observações sobre a organização da personalidade. American Psychologist , 2 , 358-368. 1947. Disponível em: <http://psychclassics.yorku.ca/Rogers/personality.htm> Acesso em 09 jun 17.

ROGERS, C. R. Um jeito de ser. 1. ed. São Paulo: EPU, 1983.

ROGERS, C. R. Tornar-se pessoa.6. ed.  São Paulo: Martins Fontes, 2009.

SANTOS, C. B. Abordagem Centrada na Pessoa: Relação Terapêutica e Processo de Mudança. Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Fernando Fonseca. 18-23. 2004.

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Um Senhor Estagiário – Uma visão a partir da Saúde Mental e do Trabalho (Segunda Parte)

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Depois de aposentado, Ben Whittaker (Robert De Niro) já viúvo, percebe que aposentadoria não era lá um mar de rosas. Entediado com a monotonia de sua vida, resolve “voltar à ativa”, entra como estagiário sênior para uma empresa que gerencia um site de moda. Essa empresa foi fundada e gerida por Jules Ostin (Anne Hathaway), uma jovem, que rapidamente explodiu no mundo na moda e no mercado online.

A empresa tomou proporções que Jules não esperava em tão pouco tempo. Agora ela batalha para o melhor da empresa, o melhor para seus funcionários e para sua vida familiar. Nenhuma dessas batalhas é uma tarefa fácil para essa jovem empreendedora. Filme dirigido por Nancy Meyers. É um filme para crianças, jovens, adultos e idosos, uma comédia que segura a risada do público. Este   trabalho tem como objetivo analisar a empresa de Jules, a partir da visão da saúde mental e do trabalho. Esse texto é a parte dois, ou seja continuação do anterior (parte 01).  A fim de se ser elucidativo foi dividido a temática da Saúde Mental e do Trabalho em oito eixos:

  1. Espaço Físico
  2. Autonomia no Trabalho
  3. Estruturação do Tempo
  4. Pressão e responsabilidades
  5. Reconhecimento
  6. Relacionamentos interpessoais
  7. Lidar e Solucionar Problemas
  8. Bem-Estar dos Trabalhadores

No texto que segue, será explicitado o os quatro últimos aspectos (Reconhecimento, Relacionamentos interpessoais, Lidar e solucionar problemas e Bem-estar dos trabalhadores) do ponto de vista teórico e contrastado com o filme. No trabalho anterior foi apresentado outros quatro primeiros.

RELACIONAMENTO INTERPESSOAL

Cardozo e Silva (2014, p. 25), ressalta que analisando a interação, pode-se perceber que dentro de cada relacionamento interpessoal, efetua-se trocas de sentimentos e experiências e é necessário o empenho de ambas as partes para que esse convívio seja o mais harmonioso possível.

O trabalho é fator primordial na vida de todo ser humano e o relacionamento interpessoal é uma das principais características para o sucesso da organização, visto que uma rede de relacionamentos sadios gera um ambiente satisfatório, contribuindo para o desenvolvimento profissional e pessoal do indivíduo. Sem pessoas, não há produtividade, não existem empresas, ou seja, sempre existirá a relação homem e trabalho (CARDOZO e SILVA, 2014).

Isso é percebido durante a cena em que Ben estabelece um maior vínculo com os estagiários, ajudando-os com dicas sobre relacionamento conjugal e até mesmo chamando um deles para residir em sua casa por algum tempo.Os mesmos autores enfatizam que no mercado de trabalho, a forma como nos relacionamos com as pessoas é um dos fatores mais importantes para manter um bom clima organizacional.

A maneira de ser, pensar e agir influencia diretamente os relacionamentos dentro e fora da empresa. O trabalho requer a convivência com colegas e superiores, requer respeito, confiança e certa liberdade entre meio às relações, para que assim seja necessário conciliar os interesses pessoais com os interesses e objetivos da organização, bem como manter um ambiente de trabalho saudável.

O oposto disso é quando Jules se mostra não tão “participante” nas confraternizações e convivências com equipe, pois ela como uma jovem empresária, cheia de responsabilidades, estava sempre correndo contra o tempo, assim seus relacionamentos com os colaboradores acabam sendo superficiais. Isto é notado na cena em que Jules está andando de bicicleta dentro da empresa e não para pra comemoração de aniversário por causa do “tempo”. Outro momento em que é evidenciado a superficialidade e distanciamento das relações é quando percebe-se o comportamento do motorista em relação à família de Jules. Na cena ele toca a campainha e se distancia para esperar que ela abra a porta.

No entanto, no decorrer do filme ocorre um processo de mudança que dá início quando há aproximação dos colaboradores (eles saem para beber para comemorar grande feito do dia), e há também uma aproximação maior entre Jules e Ben. Ben começa a frequentar sua casa e conhece sua família. Sobre essas interrelações Carvalho (2009, p. 82 apud CARDOZO e SILVA, 2014, p. 25), salienta que “os relacionamentos possuem vida própria e está sempre em processo de mudança. Essas mudanças estão relacionadas ao comportamento e as ligações afetivas, que podem gerar relações brandas […]”.

RECONHECIMENTO

Sendo assim, quando o indivíduo faz algo que acredita ser útil para as pessoas em sociedade e que está contribuindo de certa forma para uma melhoria daqueles que estão sendo afetados, no sentido benéfico do termo.  Logo, essa pessoa quer ser reconhecida. Desse modo, reconhecimento significa ser valorizado por aquilo que faz de melhor, como por exemplo, ganhar um elogio, aplauso ou uma promoção.

No entanto, a insatisfação é dificilmente expressada em palavras. Visto que, apenas percebem quando ela já está instalada como doença. Assim, a falta de reconhecimento, da mesma forma da insatisfação, é um sinal de sofrimento evidenciado. Mas ao mesmo tempo essa falta é muitas vezes identificada como “normal”, com a qual o sujeito se conforma, acostumando-se com o fato de não ser elogiado, de não ter seu trabalho reconhecido. Assim, o sofrimento provocado pela falta de reconhecimento pela falta de reconhecimento é identificado. Mas em seguida é coberto por uma resposta racionalizada “Ah, acontece em todas as empresas mesmo” (VASCONCELOS e FARIA, 2008, p. 6).

Portanto, a empresa que é descrito no filme há reconhecimentos. Porém, reconhecimentos “injustos”. Dado que, funciona para alguns, mas para outros não funciona. Como por exemplo, a pobre Becky que estudou em uma grande universidade e trabalha como secretária, ao buscar reconhecimento de sua chefe, que estava muito ocupada para notar.

É formada e preparada para analisar dados completos, nunca teve a oportunidade de pegá-los, nem trabalhar com eles, o que faz é observar os outros fazerem isso, e se sente cada vez mais infeliz no seu trabalho, pois trabalha muito, em uma rotina caótica (rotina da chefe), tendo que lidar com muitas informações, e resolver situações rápidas em virtude da agenda lotada de Jules, e ainda não faz o que quer e o que gosta. Sempre buscando o tão reconhecimento, mas ninguém vê.

LIDAR/SOLUCIONAR PROBLEMAS

Por outro lado, Ben em tão pouco tempo dentro da empresa, sempre realiza as atividades propostas para ele com êxito, já consegue ganhar um bônus no trabalho e é notável o reconhecimento de sua contribuição e esforço.  No que consiste, os colaboradores da empresa lhe aplaudir e tocar um sino, como era de costume ser feito sempre que alguém colaborasse com algo importante.

No filme é retratado algumas cenas que Ben colabora a identificar e solucionar problemas às vezes pequenos, porém importantes e notório como fatores de risco para adoecimento, como por exemplo, quando ele arruma a mesa que ficava uma grande quantidade de papéis, que acabava incomodando os colaboradores, porém ninguém nunca se disponibilizou antes para arrumar. Ben também esteve disponível e ajudou Jules a esclarecer suas decisões em relação a contratação do novo chefe dela, solucionou o problema do email errado que Jules enviou para sua mãe e ajudou a mesma em suas tarefas de rotina familiar.

No filme mostra Ben sempre muito centrado e paciente, ele sempre buscava uma forma de lidar e solucionar problemas que aparecia na empresa. Isso mostra que Ben com todos os seus anos de trabalho conseguiu adquirir experiência e habilidades. Ressaltando que no filme é visto cenas que de exaustão emocional de Becky, não sabendo como solucionar alguns problemas, assim não deixando de ser um fator prejudicial para a sua saúde mental e interferindo na realização das suas tarefas do trabalho. Sendo assim, a exaustão emocional

 é caracterizada por um sentimento muito forte de tensão emocional que produz uma sensação de esgotamento, de falta de energia e de recursos emocionais próprios para lidar com as rotinas da prática profissional […] (RABIN, FELDMAN e KAPLAN, 1999, apud, ABREU et al, 2002, s/p).

Outro aspecto visível em solucionar problemas é quando Jules tem que tomar uma importante decisão para a empresa, e fica de certa forma pressionada para realizar a mesma, pois ela não queria isso, mas pensando na melhoria da convivência da sua família se viu obrigada decidir isso. Desta forma, com todo esse tumulto de tomada de decisão afetando- se emocionalmente.

BEM ESTAR DOS TRABALHADORES

A preocupação com os ambientes de trabalho e sua influência no processo saúde-doença dos trabalhadores não é recente. Trata-se de uma preocupação frequente, visto que a maior parte do dia se passa no ambiente de trabalho.

A Saúde do Trabalhador é uma área da Saúde Pública que visa intervir nas relações entre o trabalho e a saúde, promovendo e protegendo a saúde dos trabalhadores através das ações de vigilância dos riscos presentes nos ambientes, das condições de trabalho, dos agravos à saúde e da organização e prestação da assistência aos trabalhadores (BRASIL, 2011, s/p apud GRECO e DE MOURA, 2014, p. 4).

É visível o bem-estar que os colaboradores da empresa têm, este deve-se ao espaço físico (confortável e espaçoso), às relações saudáveis entre colegas (não há competitividade), dentre outros fatores. Isto é confirmado à medida em que os colaboradores demonstram satisfação com o trabalho.Uma outra questão que tem sido discutida amplamente no campo da saúde mental do trabalhador e de grande importância, é o trabalho como prioridade, desconsiderando as necessidades fisiológicas como alimentação e as demais vertentes como lazer, família, dentre outros, fator este que reflete na saúde mental, havendo potenciais consequências sobre a saúde.

Jules afirma não dormir, pois preocupa-se com o trabalho que têm a ser feito. Segundo Lima, Assunção e Francisco (2002), o turno fixo noturno é outro elemento que tem sido bastante estudado e associado a distúrbios psíquicos. Estudos afirmam que não há dúvidas de que este é um fator que contribui consideravelmente para o sofrimento psíquico. Sabe-se que, grande parte das pessoas têm suas funções físicas orientadas para atividades diurnas, dedicando a noite ao descanso. Além disso, existem estudos que relacionam períodos prolongados de privação de sono com uma desorganização psíquica, podendo, inclusive, provocar delírios e alucinações.

Os autores supracitados afirmam que um dos principais problemas identificados por esses estudos, refere-se aos ritmos circadianos que se mantêm inalterados, pois, mesmo quando o horário de trabalho é invertido, a vida social continua em movimento: a sociedade e a família permanecem com seu ritmo de atividade inalterado, surgem então os conflitos. As pesquisas revelam que o maior desgaste dos trabalhadores em turnos noturnos consiste no fato de viverem constantemente na contramão da sociedade, o que resulta em um maior desgaste físico e mental.

Este aspecto é visível, quando se trata de Jules. Por ser a chefe, assume uma grande sobrecarga e abstêm-se do lazer, do tempo com a família e de outras atividades fora do ambiente de trabalho. Outro fator consequente dessa sobrecarga demonstrado no filme é o distúrbio do sono apresentado por Jules, caracterizado por Martinez, Lenz e Menna Barreto (2008 apud VIEIRA, 2009) como sonolência, queixas de insônia, qualidade de sono insatisfatória e sono encurtado. Jules sente dificuldade em dormir a noite inteira, por vezes, acorda durante a noite e resolve adiantar o serviço através do uso do computador.

REFERÊNCIAS

ABREU, K.L; STOLL, I; RAMOS, L.S; BAUMGARDT, A; KRISTENSEN, C. K. Estresse ocupacional e Síndrome de Burnout no exercício profissional da psicologia. Brasília: Psicologia: Ciência e Profissão, vol.22, n.2, jun. 2002.Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414-98932002000200004&script=sci_arttext&tlng=es> . Acesso em: 03 de abril de 2017.

CARDOZO, C. G; SILVA, L. O. S. A importância do relacionamento interpessoal no ambiente de trabalho. Dourados/MS: Interbio. v.8 n.2,  2014.  Disponível em:<http://www.unigran.br/interbio/paginas/ed_anteriores/vol8_num2/arquivos/artigo3.pdf>. Acesso em: 02 de abril de 2017.

GRECO, R; DE MOURA, D. C. A. Condições de Trabalho e a Saúde dos Trabalhadores de Enfermagem. Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Juiz De Fora, 2014. Disponível em: <http://www.ufjf.br/admenf/files/2015/03/Aula-Condi%C3%A7%C3%B5es-de-trabalho-e-a-sa%C3%BAde-dos-trabalhadores-de_enfermagem-1.pdf> Acessado em: 01 de Abril de 2017.

LIMA, M. E. A; ASSUNÇÃO, Ada A.; FRANCISCO, J. M. S. D. Aprisionado pelos ponteiros de um relógio: o caso de um transtorno mental desencadeado no trabalho. Saúde Mental & Trabalho: leituras, Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

VASCONCELOS, A; FARIA, J. H. Saúde mental no trabalho: contradições e limites. Florianópolis Sept. /Dec. Psicol. Soc, vol.20, no.3, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822008000300016>. Acesso em: 1 de abril de 2017.

FICHA TÉCNICA DO FILME

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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