O Lado bom da vida – Vícios, depressão e ‘bipolarismo’

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03O lado bom da vida é um filme que retrata a vida do jovem Pat Solitano Jr. (Bradley Cooper) que é diagnosticado com transtorno bipolar na vida adulta após ter presenciado um episódio de infidelidade com sua companheira Nikki (Brea Bee) e, por isso, acaba sendo preso por agressão.

Pat é uma pessoa extremamente explosiva, que busca encontrar meios de se ressocializar para reconquistar sua esposa que havia pedido medidas protetivas contra ele.

Ronnie (John Ortiz) é um grande amigo de Pat e por isso marcou um jantar em sua casa onde introduziu Pat para sua também amiga Tiffany Maxwell (Jennifer Lawrence), e ambos têm momentos intensos dada as condições emocionais de cada um.

Tiffany havia perdido seu companheiro e, por esta razão, estava em uma situação delicada, entrando em relacionamentos abusivos de homens oportunistas. Pat, por sua vez, vivencia um momento de extrema contenção de seus impulsos, de modo que ele sofre e acaba extravasando em vários momentos com seus amigos e familiares, inclusive, tendo uma briga calorosa com seu pai (vias de fato) por conta de um surto em que acabou machucando sua mãe acidentalmente.

Fonte: encurtador.com.br/dkzZ3

O pai de Pat, o Sr. Pat (Robert De Niro), é um apostador compulsivo e por diversas vezes demonstrou sinais de que seu vício em apostas prejudicou o lar, inclusive com prejuízos astronômicos e sempre culpou seu filho Pat pelos maus resultados que obtinha em suas apostas.

O bipolarismo de Pat Jr. é bem perceptível, vez que este oscila constantemente entre o maníaco e o melancólico. Nos momentos em que o personagem sofre com as cartas de sua companheira até o ápice revelador de um amor oculto que Pat sentia por Tiffany que se mostrou um apoio extremamente importante para o personagem obter a melhora necessária para seguir com sua vida.

A mensagem do filme é de uma superação inigualável de uma pessoa que sofreu desde sua infância com um transtorno desconhecido, além de um que demonstrou um comportamento obsessivo por apostas e que o culpava quando perdia suas riquezas em jogos de futebol.

O final do filme apresenta um novo Pat Jr. que consegue superar o amor por sua ex-companheira e se declara para seu novo amor, que se mostrou mais sintonizado com este que sua antiga parceira jamais fora.

Título: Silver Linings Playbook (Original)

Ano produção: 2012

Dirigido por: David O. Russell

Duração: 122 minutos

Classificação: 12 anos

Gênero: Comédia Romântica – Drama

País de Origem: Estados Unidos da América

REFERÊNCIAS

ALDA, Martin. Transtorno bipolar. Brazilian Journal of Psychiatry [online]. 1999, v. 21, suppl 2 [Acessado 2 Março 2022] , pp. 14-17. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S1516-44461999000600005>. Epub 04 Out 2000. ISSN 1809-452X. https://doi.org/10.1590/S1516-44461999000600005.

ZANIN, Carla Rodrigues e VALERIO, Nelson Iguimar. Intervenção cognitivo-comportamental em transtorno de personalidade dependente: relato de caso.Rev. bras. ter. comportamento. cogno. [on-line]. 2004, vol.6, n.1, pp. 81-92. ISSN 1517-5545.

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Transtorno Bipolar: é possível vencer?

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O Transtorno Bipolar é uma doença caracterizada por episódios de mudança repentina de humor, que vão desde estados de alegria e tristeza, até episódios de euforia e depressão, podendo ocorrer simultaneamente ou não. Em casos mais graves o paciente pode apresentar sintomas psicóticos, como alucinações e delírios.

A causa para o Transtorno Bipolar não é inteiramente conhecida, no entanto sabe-se que questões biológicas, genéticas, sociais e psicológicas formam um conjunto de fatores que podem desencadear a doença.

O Transtorno Bipolar tem grande impacto na vida do paciente, de sua família e da sociedade. Além do sofrimento psíquico, o paciente tem dificuldade em suas relações sociais e pode ter prejuízos em sua vida financeira, em sua saúde e até mesmo em sua reputação.

Para mostrar que com o tratamento correto é possível que o paciente bipolar viva bem, o (En)Cena conversou com Raphael Henrique Travia, Tecnólogo em Gestão Hospitalar e Conselheiro Municipal de Cultura em Joinville-SC. Desde a infância Raphael já apresentava sintomas de transtorno mental. Foi tratado por muitos anos de forma errada e encontrou no CAPS de Joinville o diagnóstico e o tratamento correto, o que mudou sua vida radicalmente.

Foto: Jaksson Zanco

(En)Cena – Como foi sua infância?

Raphael Henrique Travia – Sou uma pessoa com deficiência física devido à paralisia cerebral por falta de oxigênio no meu cérebro no momento do parto. Meus pais se separaram quando eu tinha 5 anos de idade. Aos 7 anos fiz uma cirurgia para corrigir um problema no pé direito (pisava apenas com a ponta do pé). Numa noite, aos 7 anos, acordei de um pesadelo e comecei a enxergar aranhas e cobras coloridas pelo meu quarto. Essas visões desapareciam quando eu acendia a luz. Na escola sempre gostei de estudar, de escrever e odiava educação física. Posso dizer que passei grande parte da infância assistindo televisão, adorava os desenhos japoneses como “Os Cavaleiros do Zodíaco”.

(En)Cena – Em que a paralisia cerebral afetou em sua vida? As aranhas e cobras coloridas que você começou a enxergar depois daquele pesadelo aos 7 anos, foi por causa da paralisia cerebral ou foi o começo dos surtos psicóticos?

Raphael Henrique Travia – As aranhas e cobras que comecei a enxergar aos 7 anos foram o princípio do transtorno mental. Quanto à paralisia cerebral, ela me trouxe a deficiência física e não posso dizer que isso é legal, pois o mundo é cruel com todos aqueles que não se enquadram no padrão da perfeição. Mas posso dizer que tive até sorte, pois as únicas sequelas que tive foram ter ficado manco e com leves problemas de coordenação motora, tenho pouca visão no olho direito e estrabismo, mas para isso existe óculos.

(En)Cena – Quando você foi diagnosticado pelos médicos que possuía um transtorno mental? E psiquiatricamente falando, que transtorno você possui?

Raphael Henrique Travia – Aos 15 anos tive um surto bem forte, enxergava o meu corpo deformado e estava numa forte depressão, pois minha mãe tinha acabado de perder sua fortuna. Passamos de uma situação financeira excelente para a miséria do dia para a noite. Passei 10 anos sendo tratado como se tivesse esquizofrenia, várias internações onde eu só voltava pior. Aos 25 anos quando entrei na faculdade tive um surto de felicidade e daí fui corretamente diagnosticado como Bipolar.

(En)Cena – Você passou 25 anos da sua vida sem saber exatamente o que tinha, sendo tratado de forma errada. Em que isso te prejudicou?

Raphael Henrique Travia – Entrava em cursos que não conseguia terminar porque o surto chegava. Algumas pessoas achavam que eu era perverso, estranho e idiota. Que eu era mau caráter. Um dos psiquiatras que me atendeu dizia que eu não tinha transtorno mental nenhum, que eu era o eterno Peter Pan. Fiz alguns inimigos, e inclusive fui mandado para o manicômio pelo CAPS que frequentei antes de chegar em Joinville.

(En)Cena – Qual o seu grau de bipolaridade e quais os sintomas?

Raphael Henrique Travia – Quando estou em surto, a televisão, rádio e todos os meios de comunicação começam a falar comigo, é como se eu fosse perseguido por eles. Fatos e falas da minha vida aparecem repentinamente em novelas, jornais etc. Quando estou em alta não consigo parar de rir, tenho ideias brilhantes e sou um persuasivo, enfático demais. Na fase baixa não tenho vontade de fazer nada, não consigo dormir e fico perdido como uma criança pequena. Não sei dizer o grau da bipolaridade, sei que agora ela não me incomoda mais e nem incomoda os outros. Faz uns três anos que estou bem.

(En)Cena – Há três anos você está bem. É o tempo que você está em Joinville? Sabemos que você frequentou o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) em Joinville. Foi isso que te ajudou?

Raphael Henrique Travia – Morei um tempo sozinho no meio Oeste Catarinense. Em 2008 minha família (mãe, irmão, cunhada e sobrinhos) saiu do Meio Oeste e veio para Joinville tentar uma vida melhor. Naquele tempo eu estava fazendo curso de aprendizagem em desenho mecânico no SENAI e queria terminar o curso, mas surtei. Fui internado numa ala psiquiátrica do Hospital Geral e não funcionou. Então o CAPS daquela cidade tentou me interditar e me mandou para o manicômio. Quando saí do manicômio vim para Joinville ficar com a família. No primeiro momento o pessoal do CAPS de Joinville não aceitou me atender. Eu estava tão dopado de remédios que eles acharam que eu tinha deficiência mental e eles achavam que eu era uma pessoa ruim devido às informações duvidosas que receberam do CAPS da cidade do interior onde eu morava.

(En)Cena – Mas e depois eles aceitaram te atender?

Raphael Henrique Travia – Me reaproximei do CAPS de Joinville em 2009. Cursava o 1° semestre do Curso Superior de Tecnologia em Mecatrônica Industrial e resolvi escrever um artigo científico para um concurso do CNPq sobre o gênero feminino e a saúde mental. Daí eles puderam perceber que eu não era tão ruim assim. Em 2010 fiz novo vestibular e ingressei no curso de Gestão Hospitalar e quando precisei de ajuda fui aceito.

Raphael presente no 2º Seminário Internacional de Inovação sobre participação e controle social. Foto: Arquivo Pessoal

(En)Cena – E qual foi o papel do CAPS em sua vida? Como você foi ajudado?

Raphael Henrique Travia – Primeiramente em Joinville existe o CAPS III 24 Horas, então eu pude ficar em hospitalidade. Internação nunca mais. E pude entender que algumas características minhas também são frutos da bipolaridade. Pude aprender a exercer liderança sem machucar ninguém e a minha família ao perceber minha melhora começou a aceitar a loucura e a saúde mental. E inclusive fui Conselheiro Municipal de Saúde, me formei na faculdade, pude começar e terminar com dignidade as empreitadas da vida. O CAPS estabeleceu uma grande parceria com a minha faculdade para que eu pudesse me formar, e um dos frutos dessa parceria também é o site www.folhadelirio.com.br. O CAPS é parte da minha vida e eu sou mais um dos muitos personagens que dá vida ao CAPS.

(En)Cena – Você ainda frequenta o CAPS?

Raphael Henrique Travia – Não. Recebi alta em setembro de 2011, mas tenho uma grande ligação com eles. Sempre que posso participo dos eventos abertos à comunidade e estabeleci uma amizade tão forte que sempre que preciso desabafar para não enlouquecer, posso contar com eles. E para viabilizar e atualizar o site www.folhadelirio.com.br nossos encontros e conversas são frequentes, mas não estou lá no papel de usuário.

(En)Cena – Tem algo que você gostaria de falar e que eu não perguntei?

Raphael Henrique Travia – Eu gostaria de dizer que é possível vencer sim! Que a saúde mental machuca, mas que precisamos encontrar forças para resistir. Convido a todos a ler o novo artigo que escrevi sobre a folha de lírio http://www.incubadora.ufsc.br/index.php/cbsm/article/view/2384. Gostaria de informar que o site www.folhadelirio.com.br precisa de novo patrocínio para continuar a existir, pois a nova gestão de Joinville não valorizou este trabalho feito por usuários de saúde mental. E-mail: contato@folhadelirio.com.br

 

Confira os artigos já publicados por Raphael:

Entre lírios e delírios: igualdade de gênero em saúde mental

https://periodicos.ifsc.edu.br/index.php/publicacoes/article/view/1009

 

Folha de Lírio: o jornal virtual da saúde mental

http://www.incubadora.ufsc.br/index.php/cbsm/article/view/2384

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A Esquizofrenia em mim e seus duplos sentidos

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Foto: Duane Michals

Sou esquizofrênica.

Trago em mim marcas que sinalizam duplos sentidos: vejo o que quero e não quero ver; sinto o que não posso controlar. Tenho um olfato aguçadíssimo e sentimentos à flor da pele. Nessa onda de percepções, procuro dar outro sentido para o mundo e para as pessoas que me cercam.

Quase sempre não sou bem interpretada, talvez pelo fato de as pessoas não terem conhecimento ou não saberem sobre a minha “diferença”. Acredito sempre que elas têm pensamentos prepotentes o que me fazem sentir inferior. Me excluem das relações sociais.

Acredito em Deus, tenho fé na matéria, mas acredito na imortalidade da alma em crenças diversas. Procuro o ecumenismo às vezes para me sentir melhor, para escrever… tenho procurado inspiração.

Não sou orgulhosa, mas tenho orgulho próprio, que são duas coisas distintas, pois ser diferente é ser bacana, é procurar harmonia, é ser invejada… mas, sou pisada pela inferioridade da raça humana.

Não me importo com os rótulos, nem com discriminação.

Tenho autoestima, embora já tenham tentado me destruir em todos os campos da minha vida.

Confesso ser agressiva, mas o meu temperamento é de calma, paz e amor.

Penso na guerra.

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Depressão, Autismo, TDAH, Esquizofrenia e Bipolaridade compartilham a mesma base genética?

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Depressão, Autismo, TDAH, esquizofrenia e bipolaridade são doenças mentais categorizadas no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) a partir de um conjunto de sinais e sintomas. Esses sintomas podem mudar substancialmente de uma categoria para outra. Agora, a questão é: e se todos esses transtornos mentais compartilhassem um mesmo fator genético?

O artigo publicado na revista científica The Lancet (http://www.thelancet.com) na quarta-feira (27/02/2013) mostra o resultado de uma pesquisa baseada em dados genéticos de mais de 60.000 pessoas e que apresenta algumas informações elucidativas para o entendimento das premissas desencadeadoras de vários transtornos mentais. Um grupo de cientistas de diversas instituições de ensino aponta que essas pesquisas sobre o material genético e sua relação com os transtornos psiquiátricos podem ser a mais relevante da atualidade nesse contexto. O resultado dessa pesquisa em específico começa a indicar que, em um dado nível, os fatores de riscos genéticos podem ser mais salutares para o tratamento das doenças do que seus sintomas. Mas, os pesquisadores estão cautelosos com a apresentação dos resultados, dada a complexidade da temática, assim o Dr. Jordan Smoller, um dos responsáveis pela pesquisa e professor de psiquiatria na Harvard Medical School, diz que “o que foi identificado é provavelmente apenas a ponta de um iceberg“, pois entender os fatores genéticos por detrás dos problemas psíquicos não é algo trivial, já que há uma série enorme de genes envolvida e a descoberta dessas variações aponta para um caminho que pode ser refutado ou comprovado em pesquisas posteriores.

Para entender a pesquisa (iniciada em 2007), é interessante uma contextualização:

  • Participantes: dois grupos de pessoas, 33.332 com transtornos mentais e 27.888 sem incidência alguma de doença mental (o grupo de controle). Material genético de pessoas de 19 países.
  • Coleta de dados: de exames de DNA.
  • Procedimentos: verificação de variações em trechos de material genético (considerando que cada DNA tem bilhões de letras, é um trabalho que requer o uso de tecnologia de ponta e algoritmos computacionais complexos).

Para Jonathan Sebat, professor assistente de psiquiatria e medicina celular e molecular da Universidade da Califórnia, a seguinte situação já era comumente observada: “dois diagnósticos diferentes podem ter o mesmo fator de risco genético”. Assim, um ponto relevante de contribuição dessa pesquisa é a possibilidade de ampliação das variáveis para a elaboração dos diagnósticos desses transtornos mentais, agregando aos sinais e sintomas, fatores genéticos observáveis em exames.

Segundo o Dr. Smoller, o novo estudo contribuiu na descoberta de quatro regiões do DNA que conferem um pequeno risco de transtornos psiquiátricos. Para duas dessas regiões, a situação ainda não está clara, pois não se sabe quais genes estão envolvidos ou o que fazem.  Já as outras duas envolvem genes que fazem parte dos canais de cálcio, que são utilizados quando os neurônios enviam sinais ao cérebro.

A descoberta acerca do envolvimento dos canais de cálcio nessas regiões sugere que os tratamentos que afetam tais canais podem ter efeito sobre uma série de doenças, mas o Dr. Smoller é prudente em dizer que isso é apenas um grande “se”, logo ainda são necessárias mais pesquisas para a devida comprovação.

Há algum tempo já existem no mercado medicamentos que são usados para bloquear os canais de cálcio, utilizados para o tratamento da hipertensão arterial. Alguns pesquisadores já tinham postulado que tais medicamentos podiam ser úteis para o tratamento do transtorno bipolar antes mesmo dos resultados dessa pesquisa virem à tona. Mas, ainda há um (longo) caminho para a comprovação desse postulado. Um exemplo de tentativas de comprovação desse postulado é a investigação do Dr. Roy Perlis, do Hospital Geral de Massachusetts, que concluiu o tratamento em um pequeno grupo de pessoas (dez) com transtorno bipolar utilizando bloqueadores de canais de cálcio. Seu próximo passo é expandir a pesquisa para um grupo maior de participantes.

Mas, é claro que esse “se” já deve ter causado um alvoroço na indústria farmacêutica. Por isso, é importante ater-se ao “se”, pois uma hipótese ainda não é um fato. Assumir que bloqueadores de canal de cálcio podem contribuir no tratamento da bipolaridade e, a partir da aceitação da associação que há na base genética desse transtorno com os demais, transformar tal droga “em potência” em um novo Santo Graal da indústria farmacêutica pode ser o início de mais uma doença e não de um processo de cura. Essas pesquisas são importantes desde que sejam compreendidas como um processo dinâmico (passível de refutação, mudança e comprovação), não como uma verdade absoluta e imediata.

Referências:

http://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736%2812%2962129-1/fulltext
http://www.nytimes.com/2013/03/01/health/study-finds-genetic-risk-factors-shared-by-5-psychiatric-disorders.html

 

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