Terminando o curso de psicologia: a solidão e monotonia que nos atravessa

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O último ano de qualquer curso do ensino superior é algo que sempre nos leva a dois sentimentos latentes: a ânsia de finalizar essa etapa e pegar o diploma; e o medo de errar, de não estar pronto para esse processo. 

Desde pequena, sempre quis minha independência, morar sozinha em uma cidade grande, seguir meus próprios caminhos com liberdade de escolha. Isso não só lançou uma sombra sobre a minha infância e adolescência, marcada pela sensação de não pertencimento e de insatisfação pelas limitações físicas e emocionais dessas fases. Eu sonhava em me tornar adulta e viver os prazeres geralmente associados à fase, tendo em mente obviamente das dificuldades e obstáculos.

Quando finalmente entrei na faculdade, senti que entrei em um outro universo, um mais flexível e repleto de oportunidades e chances de escolha, especialmente por causa da grade aberta. Eu não era necessariamente novata na psicologia por ser transferida, mas também não era uma veterana, o que acabou me colocando em uma posição de um certo “não pertencimento” novamente, porém não na mesma magnitude que no ensino médio e fundamental.

Apesar das circunstâncias, fui capaz de cultivar boas amizades e relações ao longo desse percurso, de uma forma que minha própria percepção de self mudou de forma positiva. Andar pelos corredores e ser cumprimentada de forma genuína, receber perguntas de colegas, curiosos para me conhecer melhor, tudo isso amenizou a sensação de que eu sempre seria a “esquisitinha sem amigos”. Conheci gente de todas as idades, formas, gostos e estilos de vida, o que abriu meu olhar sobre o que o mundo e a vida adulta poderia oferecer: era mais do que eu poderia ter imaginado enquanto criança.

Ao longo dos semestres, fui percebendo aos poucos o que a grade aberta e a transferência com aproveitamento de disciplinas implicava: um processo gradual de distanciamento dos outros, que aos poucos pegavam cada vez menos matérias comigo.

Acho que o fim da picada de fato foi o último ano de curso. Comecei a tomar antidepressivos, a pouca vontade que eu já tinha de levantar da cama e fazer algo (especialmente atividades de lazer) parecia ter sumido. Ao longo do curso eu já havia perdido interesse nos amados videogames, em desenhar, em sair de casa…já no último ano eu não só comecei a ver o lazer como uma obrigação e mais uma responsabilidade para cumprir, como também comecei a procrastinar o meu autocuidado para me dedicar às responsabilidades do último ano. Juntando tudo isso com a minha tendência ao medo de abandono extremo (graças ao borderline), eu comecei a ter a total certeza de que eu poderia sumir e que isso não faria a menor diferença.

E justo quando a gente pensa que não pode piorar, piora. Último semestre… não sei nem por onde começar a descrever as sensações que esse semestre está me proporcionando… para começar, já digo logo que a sensação é de que estou fazendo o 9º período de novo. Nada de novo, nada de diferente, nada excitante ou minimamente motivador. E para piorar, é cada vez mais difícil de conseguir achar horário em comum com meus amigos para podermos sair no final de semana. Sinceramente? Eu estou no último período e assim que me formar vou me mudar de cidade, e sinto que sequer estou conseguindo aproveitar esses últimos momentos de vida universitária com meus amigos.

Tudo bem, eu to entendendo que sua vida tá corrida, que você tem outros problemas e responsabilidades, mas se a gente sequer consegue achar um tempo de troca, isso sequer é amizade? O que é a relação com outro se não uma troca? O que estamos trocando? Bom dia(s) apenas? “Opa, tudo bom?” E passa reto sem ouvir uma resposta… ah, sem falar de como isso muda completamente quando nosso coleguinha fica solteiro… volta o cão arrependido…

Tô ligada que existem níveis de prioridade, mas é sacanagem ver a falta de esforço e compromisso zero que as relações de amizade possuem atualmente. “To cansado, hoje não dá…” mas se fosse para uma rapidinha insalubre com um desconhecido, a pessoa é capaz de mover oceanos.

Mas se eu decido ficar em casa, deitada, mofando, olhando pro teto porque não há absolutamente nada minimamente reforçador no meu dia a dia, eu tenho que ouvir que sou completamente responsável por isso. Tem finais de semana que eu praticamente imploro por migalhas de atenção dos meus amigos, mas sim, eu com certeza tô escolhendo ficar nesse estado de paralisia que (se choquem agora) eu sequer tenho vontade de comer, mesmo com a barriga doendo de fome. Tá tudo tão sem graça que eu sinto meu corpo lentificando, minha fala se arrastando e até o corpo caindo pro lado, lentamente. Isso porque eu estou com a terapia e medicamentos em dia. 

O resumo da ópera é bem simples: meu discurso pode não fazer o menor sentido para você leitor, até você chegar no último semestre e perceber que novamente está no “do terceirão pra vida” (ninguém nunca mais se falou). Aqui lavo minhas mãos e digo, BRASÍLIA EU TO CHEGANDO!

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Mais amor, por favor

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No último século, estamos sendo pautados constantemente sobre assuntos relacionados à saúde mental. E não. Esse não é um bom sinal. Falar sobre isso é importante, mas não por razões como o crescente aumento de casos de depressão, ansiedade, suicídio e outras doenças psicológicas. A sociedade, por si só, não está evoluindo.

Recentemente, fomos bombardeados com notícias sobre tortura psicológica em programas de reality show. A prática dessa violência é cometida através de punições emocionais repetidamente com intenção de ferir emocionalmente a vítima.

No BBB21, por exemplo, participantes foram julgados e isolados por seus companheiros de casa por atos falhos cometidos, mas sequer conseguiram ser ouvidos e perdoados. Já no programa da Itália, uma participante brasileira foi alvo de ataques pelo simples fato de não possuir a mesma nacionalidade que os demais, sofrendo com comentários misóginos e xenofóbicos.

Mas o mesmo acontece, por exemplo, no ambiente de trabalho, quando uma pessoa recebe punições fora do “normal” de seus superiores, não consegue ser ouvida ou recebe críticas não-construtivas por tudo que faz. O ciclo se torna vicioso. Esgotado, a pessoa chega em casa e diminui a esposa, a esposa diminui o filho e o filho faz o mesmo com o coleguinha na escola.

Fonte: encurtador.com.br/rwzAR

Quando uma crítica te puxa para cima, não julga você e, sim, suas ações, ela apresenta uma direção para melhorar. O resultado se torna positivo, principalmente, quando essa informação passa pelo filtro pessoal de reflexão e a pessoa entende que errou. Ela é considerada uma crítica construtiva, pois te faz querer evoluir e se aperfeiçoar.

No entanto, a infeliz “Era do cancelamento” não permite a oportunidade de errar, evoluir e melhorar. Errar faz parte da vida. Discordar do outro também. Porém, é preciso entender até que ponto o conflito de opiniões é tolerável. É claro que a opinião é individual e que ninguém precisa estar de acordo para conviver bem. Mas o respeito à diversidade de pensamentos, opostos ou não, é necessário para se conviver bem em sociedade, desde que não machuque o próximo.

As consequências para o cancelado podem ser desde depressão, ansiedade, baixa autoestima, transtorno de personalidade e até automutilação ou suicídio. Já as consequências negativas do “cancelador” só vão ser vistas e percebidas quando ele procurar ajuda tendo consciência do mal que fez. Isso porque o agressor sempre irá possuir características autoritárias e uma única visão do que é certo. A maldade e o egoísmo sempre vão estar nos outros, nunca nele.

Para tentar lidar com todo esse julgamento, primeiro é preciso o autoconhecimento. A partir disso, sabendo qual é a sua verdadeira identidade, a pessoa será capaz de não permitir que ninguém a diminua. Para esses casos, acompanhamentos com psicólogos sempre serão recomendados, além de queixa-crime.

A vida é feita de ciclos. Passamos tanto tempo sendo oprimidos. Podemos achar que revidar a opressão com mais opressão é a solução. Às vezes, chegamos a acreditar que esse ciclo de violência acontece apenas na televisão. Mas convivemos com isso no nosso dia a dia. Precisamos interromper esse ciclo. Lembre-se: não somos aquilo que o outro fez comigo, mas aquilo que escolhemos ser. Portanto, distribua mais o amor.

Fonte: encurtador.com.br/abyzM
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Ano novo e as promessas de vida nova

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Os melhores anos de sua vida são aqueles em que você decide assumir seus problemas e percebe que controla o seu destino.

– Albert Ellis

Embalados pelas festividades de fim e começo de ano, tendemos a analisar o ano que passou e planejar, com inúmeras promessas (muitas vezes ilusórias), o ano que chega. Começa desde comprar roupa nova, pular sete ondas, até pagar seis meses de academia com a esperança que esse ano seja diferente. Mas, esperança apesar de ser um norte, é passiva. É necessário mais. Transformar essa disposição interna em realizações, para que não se torne somente um delírio individual ou coletivo de felicidade.

Leandro Karnal, um historiador, filósofo, escritor e professor brasileiro, diz que: “mudar é difícil, não mudar é fatal”. Apesar de se renovar ser custoso, estamos sempre em busca de mudanças. Desde os primórdios da sociedade, seres humanos apresentam uma constante necessidade de ritos: ao nascer, ao morrer, ao entrar para a vida adulta, religiões. Marcos temporais como a virada de ano, de mês e até de semana, conhecida como “segunda-feira eu começo a dieta”, nos leva a um sentimento de renovação que nos inspira a concluir ciclos, por exemplo, término de relacionamentos prejudiciais, e iniciar outros: um novo curso que vem acompanhado por um novo corte de cabelo.

Mas porque associamos essas datas à renovação? Cristiano Nabuco, psicólogo da USP, afirma que por sermos apegados a esses ritos durante séculos, ao chegar essa data nos lembramos automaticamente de tudo que foi prometido e não foi feito: “O réveillon assume o papel mágico de nos dar forças para pôr tudo em prática. É um pensamento até infantil, o pote de ouro no final do arco-íris no final do calendário. Mas não recrimino, o que funcionar para você está ótimo”.

Fonte: https://bit.ly/2TVZYd3

“O processo da vida plena… significa lançar-se de cabeça no fluxo da vida. ”

– Carl Rogers

Com 365 novas possibilidades não devemos deixar esse novo livro cair na história da Cinderela, em que a magia acaba à meia noite. Manter esse ânimo para colocar em prática o que foi prometido com tanta veemência. Em paralelo a tantos planos, para Carl Rogers, famoso psicólogo estadunidense, ter uma vida plena não é ser imutável, ter uma identidade fixa, mas sim acompanhar as nuances da vida, ser aberto a possibilidades e viver o momento pois a vida é instantânea e está sempre em movimento. Na opinião dele, preconceber um roteiro de vida, como um esquema sistemático para o ano todo, impede a total fluidez do ser, pois ao seguir esse roteiro, deixamos de lado os impulsos, as emoções surpreendentes e outras diversas opções.

Já dizia o poeta espanhol António Machado: caminhante, não há caminho, se faz caminho ao andar. A vida é um trajeto de infinitas possibilidades, como um labirinto, que tem vários caminhos, erros e acertos, um processo de amadurecimento e transformação que só para ao chegar à saída.

REFERENCIAS

Disponível em: < https://www.google.com/amp/s/oglobo.globo.com/cultura/saiba-como-ano-novo-mexe-com-seu-cerebro-22239709%3fversao=amp > Acesso em: 10 Jan. 2019

Disponível em < https://www.google.com/amp/s/cristianonabuco.blogosfera.uol.com.br/uol_amp/2016/12/30/ano-novo-vida-nova-a-psicologia-da-virada-do-ano/ > Acesso em: 10 Jan. 2019

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Oxumaré: o símbolo da continuidade e permanência

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Oxumaré é um Orixá complexo, suas funções são múltiplas. Na Mitologia yorubá é considerado o Orixá dos movimentos e de todos os ciclos.

Senhor da mobilidade e da atividade, é representado pela cobra e pelo arco-íris, por isso é considerado o senhor de tudo o que é alongado, como, por exemplo, o cordão umbilical.Em sua mitologia é filho mais novo e preferido de Nanã. É irmão de Omulu, Ewa e Ossain.

Representado por uma serpente que morde a própria cauda, se mostra como símbolo da continuidade e permanência. Ao mesmo tempo em que representa a movimentação e mobilidade da Terra, com seus movimentos de rotação e translação, segundo Verger, Oxumaré enrola-se em volta da terra para impedi-la de se desagregar. Se perdesse as forças, isso seria o fim do mundo. Portanto, ele controla os movimentos para que não sejam nem rápidos nem lentos demais.

Seus domínios estão nos movimentos regulares, que não podem parar, como a alternância entre chuva e sol, dia e noite, frio e calor, positivo e negativo. O arco-íris, a grande serpente colorida, representa a comunicação entre o céu e a terra, um elo entre os dois. A ligação entre o velho e o novo, entre os homens e seus antepassados é assegurada pelo cordão umbilical.

Ainda sobre Oxumaré, Verger em Orixás diz:

“Oxumaré é, ao mesmo tempo, macho e fêmea. Esta dupla natureza aparece nas cores vermelha e azul que cercam o arco-íris. Ele representa também a riqueza, um dos benefícios mais apreciados no mundo dos iorubás.”

É o Orixá da tese e da antítese. Oxumaré é então um Orixá ambíguo. Macho e fêmea, belo (arco-íris) e perigoso (serpente), céu e terra, exprime, portanto a dualidade, a união dos opostos. A vida se expressa por meio do conflito entre os opostos, estar vivo é estar em meio aos opostos, dia e noite, sofrimento e prazer, calor e frio. Podemos afirmar, então, que Oxumaré exprime a vida humana, encarnada.

 

 

Arquétipo, onde está sintetizada a duplicidade humana, seu corpo mortal e seu espírito imortal. A imagem da serpente que engole a própria cauda, enrolada ao redor do planeta pode ser comparada ao trunfo XXI do tarô, O Mundo. Neste trunfo, está representada a Ouroboros, símbolo da eternidade, dos ciclos da vida, a espiral da evolução, a dança da morte e ressurreição.

A Ouroboros está ao redor de uma figura metade macho, metade fêmea, simbolizando os opostos, o negativo e o positivo. E também aparece rodeada por quatro animais, que simbolizam os quatro elementos.

Esse trunfo, assim como Oxumaré, nos remete a um universo ordenado, em harmonia com os ciclos da vida e em consonância com o Self. É então, a totalidade, a harmonia, o equilíbrio, mas também o início de uma nova jornada, não mais centrada no ego.

Outro paralelo está na mitologia judaico-cristã, onde a serpente simboliza o mal, a queda do homem, Satanás. E no arco-íris, símbolo da aliança de Javé com o seu povo, após o dilúvio.

Oxumaré é uma imagem ideal. Como seres humanos, essa totalidade raramente é encontrada. Mas como arquétipo Oxumaré mostra a necessidade de movimento e de transformação. Ele é o movimento psíquico, a dinâmica entre o inconsciente e o consciente, a relação entre ego e Self.

Sem esse arquétipo, a vida psíquica se torna estagnada e o processo de individuação paralisado.  Esse arquétipo, quando ativado na dinâmica psíquica do individuo, leva a descoberta dos opostos dentro de si. Negá-los é negar a vida. A dualidade é condição humana e aceita-la é o princípio da individuação.

E assim é a caminhada humana, sempre mudando, crescendo, sempre em movimento. Em estado de renovação, sem nunca alcançar o centro, o Self, mas sempre em direção à totalidade.

Referências:

BARCELLOS, M. C. Os orixás e a personalidade humana. Rio de Janeiro: Pallas, 2010.

JUNG, C. Os Arquétipos e o inconsciente coletivo. 2 ed. Petrópolis, RJ, Vozes 2002.

VERGER, P. F. Orixás. Círculo do Livro.

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