É preciso refletir sobre a desigualdade racial no Brasil, não somente, no mês da Consciência Negra

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Comemorado no dia 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra celebra o orgulho da população negra, que ainda sofre racismo cotidianamente, no Brasil. A data foi escolhida por ser o dia da morte do líder quilombola, Zumbi dos Palmares, conhecido por liderar movimentos contrários a escravidão, no período colonial. Atualmente, artistas como Emicida e Mano Brow, Thais de Araújo são vozes da valorização do povo negro, que ainda é vítima de violência.

  Conforme o Atlas da Violência 2020, os casos de homicídios contra a pessoa preta aumentaram 11,5%, nos últimos anos, sendo que os Estados com maior taxa de violência com morte, encontram-se nas regiões Norte e Nordeste. Roraima lidera a estatística, de 87,5 mortos para cada 100 mil habitantes, seguida do Rio Grande do Norte com 71,6 vítimas negras.  Sobre esses números assustadores, Ribeiro (2006) explica que a violência contra a população negra pobre brasileira, é parte de um processo histórico sustentado e manifestado permanentemente “por uma sociedade que já nasceu capitalista e que hierarquiza e institucionaliza as relações sociais em diversidades de classes, raça.”

Uma conquista recente para a população negra, foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que equipara o crime de injúria racial ao de racismo, isto é, passível de punição a qualquer momento. De acordo com o artigo 140, do Código Penal Brasileiro, injúria racial consiste na conduta de ofender à dignidade de uma pessoa, por meio de palavras depreciativas referentes a raça e a cor. Agora com a resolução, o crime de injúria passa ser imprescritível e inafiançável, como o crime de racismo prevista no artigo 5º da Constituição Federal (CF), de 1988.

 

Fonte: Freepick

 

Infelizmente, os casos de racismo no Brasil são divulgados diariamente pelos veículos de comunicação.  No ano passado, um homem negro foi espancando até morte, por seguranças de uma empresa terceirizada que atuava no grupo Carrefour, em Porto Alegre. O caso teve uma intensa repercussão nacional. À época o hipermercado enviou uma nota de indignação sobre o ocorrido, bem como os envolvidos foram presos em flagrante e respondem por homicídio qualificado.  Devido a esses casos que é preciso ter leis mais duros contra crimes de cunho racista, no Brasil.

Para contribuir com o fim da desigualdade racial é preciso que o ensino público passe por uma reformulação, sendo imprescindível que os professores conversem com os alunos sobre as inúmeras desigualdades sociais, econômicas e raciais contra a pessoa da cor negra, no país.  Nessa perspectiva, Lima (2006) atenta que um currículo para a formação humana é aquele orientado para a inclusão de todos no acesso os bens culturais e ao conhecimento. Já Onofre (2007) afirma que “a diversidade é característica da espécie humana nos saberes, modos de vida, culturas, personalidades, meios de perceber o mundo, o currículo precisa priorizar essa universalidade.”

No mês da Consciência Negra uma dica de leitura para entender o racismo no Brasil é a obra “Pequeno Manual Antirracista”, da filósofa e escritora Djamila Ribeiro. O objetivo do livro é construir caminhos de reflexão antirracistas para a transformação da sociedade, no intuito de gerar um espaço para o negro.

Fonte: Freepick

 

 

Referências

Atlas da Violência 2020. Disponível em < https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/download/24/atlas-da-violencia-2020> Acesso: 04, de nov, de 2021.

G1 Notícias, Rio Grande do Sull. Homem negro é espancado até a morte em supermercado do grupo Carrefour em Porto Alegre. Disponível em < https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2020/11/20/homem-negro-e-espancado-ate-a-morte-em-supermercado-do-grupo-carrefour-em-porto-alegre.ghtml>  Acesso: 04, de nov, de 2021.

Planalto, Constituição Federal da República de 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso: 04, de nov, de 2021.

Onofre(2007) REPENSANDO A questão curricular: caminho para uma educação antirracista. Disponível em < https://core.ac.uk/download/pdf/236650248.pdf> Acesso: 04, de nov, de 2021.

LIMA, Elvira Souza. Currículo e desenvolvimento humano. Indagações sobre currículo. Brasília (2006)

RIBEIRO, C. A. C. Classe, raça e mobilidade social no Brasil. Dados: Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro. (2006)

Ribeiro, Djamila. Pequeno Manual Antirracista(2019). Disponível em < https://books.google.com.br/books?id=zJm2DwAAQBAJ&hl=pt-PT&source=gbs_navlinks_s>  Acesso: 04, de nov, de 2021.

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Milena: a primeira personagem negra da Turma da Mônica

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A turma do limoeiro já conta com diversos personagens fortes como Luca (cadeirante), Tati (síndrome de Down) e Dorinha (deficiente visual) com o intuito de mostrar às crianças que a diversidade é algo normal e natural.

Mauricio de Sousa apresenta Milena, a primeira personagem negra da Turma da Mônica. A nova integrante apareceu pela primeira vez na Corrida Donas da Rua, no Parque Ibirapuera, em São Paulo. Ela é da Família Sustenido, cheia de atitude e ama música e futebol. A turminha já possuía Jeremias, personagem negro e antigo que nunca havia protagonizado um gibi e que ganhou, no ano de 2018, ‘Jeremias Pele’. Maurício afirma estar corrigindo um erro: não ter dado protagonismo a Jeremias. A turma do limoeiro já conta com diversos personagens fortes como Luca (cadeirante), Tati (síndrome de Down) e Dorinha (deficiente visual) com o intuito de mostrar às crianças que a diversidade é algo normal e natural.

Historicamente, pessoas negras foram segregadas e consideradas inferiores ao resto da população e, por mais que não aparente, em pleno século 21 ainda há preconceito racial. Raça é um conceito apenas biológico para definir categorias de uma espécie, relacionado somente a fatores hereditários, não incluindo condições culturais, sociais ou psicológicas. Portanto, é comprovado cientificamente que não há subgrupos humanos e que o termo correto para se referir a negros e outros grupos é etnia.

Fonte: encurtador.com.br/gmGJN

“Ninguém nasce odiando o outro devido à cor da sua pele. As pessoas aprendem a odiar e, se elas podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar, porque o amor ocorre mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto.” – Nelson Mandela

O racismo no Brasil é fruto da escravidão do período colonial e o fato dessa mentalidade perpetuar até os dias atuais deu origem a um racismo camuflado, disfarçado de democracia racial. Tal pensamento é tão perigoso quanto o racismo assumido, declarado e pode se manifestar tanto nos regimes autoritários quanto nas democracias. Se fizermos um balanço de algumas passagens históricas, verificaremos que, por tradição, o brasileiro tem uma mentalidade racista e antissemita. Maurício de Sousa quebra essa cultura e dá voz a uma personagem negra de atitude que mostra que o preconceito é baseado em falsas ideias.

Fonte: encurtador.com.br/hAK09

Nelson Mandela, líder ativista e ex-presidente da África do Sul lutou contra o apartheid, regime segregacionista. A África do Sul era governada por descendentes dos colonizadores ingleses que marginalizavam a população negra através de leis que regulavam o “lugar de branco e o lugar de negro’’. Nelson é um exemplo de amor que tentou e conseguiu mostrar ao mundo que a única diferença entre um negro e um branco é a cor da pele.

Fonte: encurtador.com.br/vKSY6

Logo, Mauricio de Sousa traz, através da Turma da Mônica, uma garota empoderada que luta contra o preconceito e passa a mensagem de igualdade e amor. A preocupação do cartunista em retratar temas tão importantes para crianças é admirável, uma vez que desconstruir o preconceito desde cedo é uma forma linda de espalhar mais amor e menos ódio.

 

REFERÊNCIAS

AZEVÊDO, Eliane. RAÇA Conceito e preconceito. São Paulo: Ática S.a, 1990.

CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. O racismo na História do Brasil. São Paulo: Ática S.a, 2003.

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Princesa Aqualtune: o dia da Consciência Negra é para quem?

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O Quilombo dos Palmares foi tido como o maior, mais importante e duradouro local de refugiados negros, escravos, da América em seu período colonial, pois perdurou por quase 100 anos. Era localizado na Capitania de Pernambuco, onde hoje é conhecida como o município de União dos Palmares, no estado de Alagoas. Em 20 de novembro de 1695, foi morto o último líder desse quilombo, Zumbi, por um grupo de bandeirantes que tinha como guia Domingos Jorge Velho.

Figura 1: Pintura retratando Zumbi dos Palmares
Figura 2: Pintura de Zumbi de Antonio Parreiras (1860-1937)

Esse texto não possui o propósito de exaltar a história de Zumbi dos Palmares, apesar de ela ser de extrema importância para o movimento de resistência contra a escravidão, e sim a de seus ancestrais, que vieram forçados de seu país de origem, e obrigados a servirem como escravos. Foram recortados violentamente de suas culturas, crenças e inseridos em um local onde a subjugação e preconceito permanecem de forma indireta e direta no tempo presente.

Começarei com a história de Aqualtune, princesa africana, filha de um rei do Congo não identificado pela história. O reino de Aqualtune possuía rivalidade com outros reinos, e em uma guerra, onde liderou cerca de 10 mil guerreiros, foram derrotados e com a interferência do reino português, foi vendida como escrava com os companheiros de batalha; seu pai, o rei de Mani-Kongo, foi decapitado e teve sua cabeça exibida em uma igreja, para aqueles que ousassem iniciar uma revolução novamente.

Figura 3: suposta fotografia de Aqualtune, princesa africana

Foi enviada em um navio negreiro, sendo este uma grande embarcação com um grande número de escravos para serem vendidos, para um forte em Gana para ser batizada por um bispo católico, e após isso, seguiu percurso para o Brasil onde desembarcou em Recife. Durante a viagem para o Brasil, há especulações históricas de que foi estuprada por outros escravos e teria engravidado, sendo assim, escolhida para ser uma escrava para fins de reprodução por conta de seu porte forte e saudável.

O dono da fazenda em que Aqualtune foi vendida, a entregou para seus piores homens, quando soube da origem da princesa e que ainda havia alguns escravos que a veneravam. Em seu sexto mês de gestação, soube do “Reino dos Palmares”, lugar onde escravos refugiados se abrigavam, e junto com um grupo de insurgentes, destruíram a casa grande e no caminho para o local, mais escravos se juntaram a ela. Há histórias de que Aqualtune chegou com 200 escravos no Reino dos Palmares e que por ter sido reconhecida como princesa do Congo, se tornou a líder do local de refugiados, que passou a ser chamado de Quilombo dos Palmares. Seus filhos, nascidos no quilombo, Ganga Zumba, Ganga Zona, ficaram conhecidos por serem guerreiros, e Sabina, que viria a ser mãe de Zumbi.

Figura 4: cartaz do filme que retrata a história de Gamga Zumba, dirigido por Cacá Diegues, em 1963

Ganga Zumba, assumiu a posição de líder do Quilombo dos Palmares, que havia crescido bastante até então. Em certa época, o Quilombo foi atacado, e o líder sertanista Fernão Carrilho, conseguiu 47 prisioneiros e entre eles, estavam os filhos de Ganga Zumba. Aceitando um tratado de paz que foi oferecido pelo Governador Pedro de Almeida, Ganga Zumba e seu irmão se mudaram com os habitantes do Quilombo de Palmares para o Vale do Cucaú. Há muitas versões do desfecho da história de Ganga Zumba, uma delas é que ao chegar ao Cucaú, se deparou com um lugar infértil e que era um campo onde foi reaprisionado e feito novamente de escravo. Outras dizem que cometeu suicídio, e também, há uma versão que diz que seu sobrinho, Zumbi, teria se revoltado contra ele, por não acreditar na proposta do Governador, e mandou um de seus seguidores envenená-lo.

A última personalidade importante na história de resistência negra é Dandara dos Palmares, uma das líderes femininas guerreiras que lutou a favor da libertação e autonomia dos escravos negros, durante o período escravocrata brasileiro. Sabe-se que cometeu suicídio para que não retornasse à sua condição de escrava, após ser presa novamente. Sua história não possui muitos registros e está encoberta de mistérios. Dandara me faz lembrar-se da personagem Bertoleza, do livro “O Cortiço”, de Aluísio de Azevedo, que do mesmo modo, também comete suicídio para não retornar às atividades abusivas escravistas. Ainda há muito do que gostaria de falar sobre histórias de personalidades que lutaram em prol do fim da escravidão, principalmente figuras femininas, no entanto, o objetivo principal deste texto, é reconhecer o motivo da Consciência Negra.

Figura 5: fotografia sem título, por Carlos Vergara

Pessoas negras passaram por mais de 300 anos de subjugação brutal em troca de poucos recursos para sua sobrevivência. Pode-se dizer que a “carta de alforria” foi para diminuir despesas, pois a população negra ficou sem suporte para que pudesse ascender e assim, essa falta de alicerce que os ajudasse e promovessem direitos básicos passou a ser hereditário, com negros sofrendo de abusos e sendo submetidos a trabalhos secundários.

Desse modo, faço essa pergunta em relação ao Dia da Consciência Negra. Consciência para quem? A “Consciência” não seria apenas para nós, negros. Seria para que todos aqueles que não enxergam que o racismo ainda é uma questão presente no Brasil e em vários lugares do mundo. Para que percebam que nunca houve um tratamento igual entre pessoas negras e não negras. E que com essa reflexão, pessoas negras e não negras, comecem e que continuem a procurar e criar formas de combate ao racismo; para que por fim, façam valer a pena a luta das personalidades que citei nesse texto e muitas outras que gostaria de ter citado.

REFERÊNCIAS:

Conheça Aqualtune, avó de Zumbi dos Palmares. Disponível em: <https://www.ceert.org.br/noticias/historia-cultura-arte/12428/conheca-aqualtune-avo-de-zumbi-dos-palmares>. Acesso em: 22 de Novembro de 2018.

Aqualtune: princesa no Congo, mas escrava no Brasil (cordel biográfico). Disponível em: <https://www.geledes.org.br/aqualtune-princesa-no-congo-mas-escrava-no-brasil/> Acesso em: 22 de Novembro de 2018.

Ganga Zumba, biografia. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/ganga-zumba/> Acesso em: 22 de Novembro de 2018.

Ganga Zumba: herói ou traidor? Disponível em: <https://www.recantodasletras.com.br/artigos/1032080> Acesso em: 22 de Novembro de 2018.

Personalidades negras – Dandara. Disponível em: <http://www.palmares.gov.br/?p=33387>. Acesso em: 22 de Novembro de 2018.

Negros no Brasil: quem foi Dandara dos Palmares? Disponível em: <http://nossacausa.com/negros-no-brasil-quem-foi-dandara-dos-palmares/>. Acesso em: 22 de Novembro de 2018.

BOULOS JÚNIOR, Alfredo. História sociedade & cidadania: volume único. 1ª edição. São Paulo: Editora FDT, 2011.

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